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Certos autores dizem que, a despeito do calendário comum, o século XX começou, de fato, em 1914. Essa afirmação explicita o impacto histórico da Primeira Guerra Mundial. Até 1914, o mundo ainda vivia um eco da “Belle Époque” (Bela Época), isto é, a fase do progresso e do otimismo vivida na Europa dos grandes Impérios desde o fim da década de 1870. A “inauguração” do século XX com uma guerra de proporções catastróficas (chamada por muitos de seus contemporâneos de “apocalíptica”) parecia ser um prenúncio da sucessão de guerras sangrentas que se alastrariam ao longo do século.
Contudo, antes mesmo de o primeiro conflito mundial acontecer, algumas guerras setoriais estouraram. Duas merecem destaque: a Guerra Russo-Japonesa(1904-1905) e a Guerra dos Bálcãs(1912-1913). Essas guerras, sobretudo a dos Bálcãs, delineavam um pouco do que aconteceria em 1914, haja vista que foi na Bósnia (um dos países da Península Balcânica) que o arquiduque austríaco Francisco Ferdinando foi assassinado. Como sabemos, a sua morte foi tida como o estopim da guerra.
A grande máquina de guerra da Primeira Guerra Mundial pertencia ao então II Reich (Segundo Império) alemão, que havia modernizado sua infraestrutura e seu arcabouço militar após a unificação, ocorrida em 1870. O II Reich, comando por Guilherme II, era uma das nações mais poderosas da época e, assim como outras, tinha pretensões expansionistas. As dimensões da guerra logo se tornaram evidentes com a quantidade de soldados, armamento, munições, bombas e veículos utilizados só no primeiro ano. O uso de armas químicas, como gases tóxicos que matavam instantaneamente, também revelou uma face terrível da guerra.
O Império Alemão, mesmo tendo entrado na guerra com o exército mais moderno, acabou perdendo e sendo obrigado a se submeter às sanções instituídas pelos seus inimigos, sobretudo pela França, prescritas no Tratado de Versalhes.Vale ressaltar que uma das consequências diretas da guerra foi a Revolução Bolchevique, levada a cabo na Rússia, em outubro de 1917. Os revolucionários russos, liderados por Lenin, aproveitaram-se do enfraquecimento que o Império do Czar Nicolau II sofreu durante a Primeira Guera para empreender a ação revolucionária.
Tópicos deste artigo
- 1 - O período entreguerras
- 2 - Desencadeamento da Segunda Guerra
- 3 - Do dia “D” às bombas atômicas
- 4 - Guerra Fria
- 5 - Conflitos na Ásia e no Oriente Médio
- 6 - Corrida espacial e corrida armamentista
- 7 - Situação no fim do século
O período entreguerras
As décadas de 1920 e 1930 foram marcadas pelas tentativas de reestruturação dos países europeus afetados pela devastação da guerra. O mais afetado deles, a Alemanha, viu seu império ser desmanchado e o regime republicano conhecido como República de Weimar ser instalado.
A situação política e econômica dos alemães estava tão caótica nesse período que muitos movimentos políticos radicais ganharam adesão popular, como o movimento espartaquista – facção comunista da Alemanha –, que tentou um golpe revolucionário em 1919, e o movimento nacional socialista dos trabalhadores alemães, que fundou o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, que ficaria conhecido como Partido Nazista. Adolf Hitler entrou para esse partido em 1921, dando um novo formato para ele.
Ao mesmo tempo, a Itália, no início da década de 1920, viu a tomada do poder pelos fascistas, liderados por Benito Mussolini. A Rússia, que havia sofrido a ação revolucionária bolchevique, incorporou ao seu domínio outras nações eslavas, criando a União Soviética. Com a morte de Lenin, o primeiro líder soviético, em 1924, Stalin tornou-se o comandante do império soviético. Todo esse cenário é conhecido em História como o “Período entreguerras”, haja vista que foi o totalitarismo desenvolvido pelos Estados descritos acima que montou o cenário para a Segunda Guerra Mundial.
Se as guerras entre o Japão e Rússia e nos Bálcãs introduziram a Primeira Guerra Mundial, a Segunda Guerra Sino-Japonesa (iniciada em 1937 e só finalizada em 1945) e a Guerra Civil Espanhola (1936-1939) foram o prefácio da Segunda. O segundo conflito entre China e Japão acabou incorporando-se, em 1939, à Segunda Guerra europeia, quando os japoneses aliaram-se à Alemanha nazista e à Itália fascista. Francisco Franco, general espanhol, por sua vez, comandou a revolução nacionalista com viés fascista na Espanha, tendo recebido forte auxílio dos nazistas. Quando a Alemanha invadiu a Polônia em setembro de 1939, o cenário da guerra já estava montado.
Desencadeamento da Segunda Guerra
A Segunda Guerra, como postulam alguns historiadores, foi, de certa forma, uma continuação da Primeira, haja vista que alguns dos motivos eram similares, como o desejo de expansão imperialista da Alemanha, que, sob o jugo de Hitler, declarou-se como o III Reich (terceiro império). Porém, a devastação e o morticínio dessa guerra foram inigualáveis, sem contar as atrocidades que foram cometidas fora da zona de combate, como o holocausto nazista e os gulags soviéticos, já que tanto nazistas quanto comunistas desejam levar a cabo a construção de um império global, como diz o historiador Timothy Snider, em seu livro Terras de Sangue – A Europa entre Hitler e Stalin:
“Stalin, não menos que Hitler, falava em eliminações e limpezas. Assim mesmo, o raciocínio stalinista para a eliminação sempre estava relacionado com a defesa do Estado soviético ou com o avanço do socialismo. No stalinismo, o extermínio em massa nunca seria mais do que uma bem-sucedida defesa do socialismo, ou um elemento na história do progresso rumo ao socialismo; nunca a vitória política em si. O stalinismo era um projeto de autocolonização, expandindo-se quando as circunstâncias o permitissem. A colonização nazista, ao contrário, dependia totalmente da conquista imediata e absoluta de um novo e vasto império no Leste, que teria impedido o desenvolvimento da Alemanha pré-guerra. Ele entendia a destruição de dezenas de milhões de civis como pré-requisito para seu empobrecimento. Na prática, os alemães geralmente matavam pessoas que eram cidadãos soviéticos.”[1]
A União Soviética, que desde 1939 havia firmado um pacto de não agressão com os nazistas, rompeu com estes em 1941, tornando-se a inimiga do “eixo” na Frente Leste. Nos anos seguintes, os aliados ocidentais articularam-se com a URSS em prol de combater o inimigo em comum. A entrada dos Estados Unidos na guerra, que ocorreu também em 1941, em razão do ataque japonês à base naval de Pearl Harbor, fez com que a guerra se acelerasse e que tivesse dois grandes polos: o continental (europeu) e o do Pacífico (batalhas travadas no Oceano Pacífico, em especial nas ilhas japonesas). A partir desse evento, houve o início da formação da aliança entre Inglaterra, Estados Unidos e outros países a eles associados contra as chamadas “Potências do Eixo” (Alemanha, Itália e Japão).
Do dia “D” às bombas atômicas
A articulação dos aliados teve o seu cume no chamado Dia D, isto é, uma gigantesca operação militar realizada em 06 de junho de 1944 que consistia em um projeto de libertação da Europa a partir do litoral francês. O objetivo dessa operação era liberar a França, a Holanda, a Bélgica e os demais países da Europa Ocidental ocupados pelos nazistas e chegar até a Alemanha.
Do lado oriental, os soviéticos fizeram também um processo de avanço sobre o espaço nazista até chegar à Alemanha. Aos poucos, as forças alemãs foram minguando e, em abril de 1945, foi noticiado o suicídio de Adolf Hitler. Em agosto desse mesmo ano, a guerra chegou ao fim em solo europeu, mas prosseguiu no Pacífico contra o Japão. Foi nesse país que foram lançadas as duas bombas atômicas, nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, em 06 e 09 de agosto, respectivamente, por um bombardeiro dos Estados Unidos, provocando a morte instantânea de dezenas de milhares de pessoas. Após essa catástrofe nuclear, a guerra finalmente chegou ao fim com a rendição do Japão em 02 de setembro de 1945.
Guerra Fria
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, começaram a aparecer as divergências entre as potências vencedoras em razão das diferentes visões de mundo e dos diferentes projetos políticos. No mundo ocidental, prevaleceu o modelo da economia de mercado e do sistema democrático de direito. Na Europa Oriental e em grande parte da Ásia, prevaleceu a economia estatal planificada, regida pelo sistema comunista.
Houve, portanto, paulatinamente, um delineamento geopolítico entre uma zona de influência encabeçada pelos Estados Unidos, que abrangia a Europa Ocidental, o continente americano e a Oceania, e uma zona de influência soviética, que se assenhorava da Europa Oriental e de quase toda a Ásia. No começo dos anos 1950, essas divergências passaram a ficar explícitas e temerosas com o estouro da Guerra das Coreias – em que havia um núcleo apoiado pelos soviéticos (o norte-coreano) e outro apoiado pelos ocidentais (o lado Sul da Coreia). Essa atmosfera de rivalidade entre superpotências ficou conhecida como Guerra Fria, que durou até o fim dos anos 1980.
Conflitos na Ásia e no Oriente Médio
Além da Guerra da Coreia, outras guerras que estouraram na Ásia, como a Guerra do Vietnã, tiveram suas fontes nessas divergências ideológicas entre ocidentais e soviéticos. Além desses conflitos setoriais com motivações político-ideológicas, outros também tiveram destaque nos primeiros anos da Guerra Fria. Foi o caso dos Conflitos Árabe-Israelenses, que tinham motivação político-religiosa.
Esses conflitos começaram após o reconhecimento do Estado de Israel, pela ONU, em 1948. Países de orientação muçulmana, como Egito, Transjordânia, Iraque, Síria e Líbano, não reconheceram a legitimidade da existência do Estado de Israel e entraram em guerra contra esse país. Muitos outros conflitos ocorreram, no período da Guerra Fria, na região do Oriente Médio envolvendo o Estado israelense, como a chamada Guerra do Yom Kippur, ocorrida em outubro de 1973. Muitos outros ocorreram entre os próprios muçulmanos, como a Guerra Irã-Iraque.
No continente africano, nesse mesmo período de Guerra Fria, houve as guerras pela descolonização. Muitos países que ainda eram colônias de potências europeias passaram a reivindicar sua independência, como a Argélia, que era colônia da França. Já no mundo ocidental, os conflitos não tiveram a intensidade vivida nas regiões descritas acima, mas consistiram, grosso modo, em golpes de Estado, sobretudo na América Latina.
Esses golpes de Estado, ao contrário do que muitos pensam, eram menos coordenados pelo “imperialismo dos EUA” do que empreendidos por instituições civis-militares altamente nacionalistas e anticomunistas. As justificativas para esses golpes (como o que houve no Brasil em 1964) tiveram, em suma, o argumento de refrear as possíveis revoluções comunistas que poderiam entrar em curso, estimuladas e fomentadas pelos cubanos (que haviam feito a sua revolução em 1959) e pelos soviéticos. Essas tentativas revolucionárias eram coordenadas por focos de guerrilha armada urbana e rural. A Guerrilha do Araguaia foi um exemplo de guerrilha rural.
Corrida espacial e corrida armamentista
A despeito de toda essa gama de conflitos regionais descritos acima, a Guerra Fria também se caracterizou por outras formas de “guerra”, além da convencional. A rivalidade estendeu-se para outros domínios, como a guerra por informação, contrainformação e espionagem, protagonizadas pelas agências secretas americana e soviética, CIA e KGB, respectivamente; a “corrida armamentista”, na qual as duas superpotências procuravam desenvolver as melhores tecnologias bélicas e os melhores armamentos, incluindo armas nucleares; e, por fim, a “corrida espacial”, que consistiu na busca acirrada pelo desenvolvimento de tecnologia aeroespacial, como satélites artificiais e espaçonaves, com o objetivo de conquistar o espaço fora da atmosfera terrestre. O período de maior tensão da Guerra Fria ocorreu em outubro de 1962, quando houve a chamada “Crise dos Misseis”, em decorrência da descoberta de uma base para instalações de ogivas nucleares soviéticas em Cuba.
Situação no fim do século
Com o esfacelamento da URSS, em 1991, a Guerra Fria teve, definitivamente, fim. Todavia, em decorrência desse fim, novos conflitos setoriais desencadearam-se nos anos 1990, como as guerras na região dos Bálcãs – a Guerra Civil Iugoslava, por exemplo – e na região do Cáucaso, cujo exemplo mais significativo foi o conflito entre russos e chechenos na Primeira Guerra da Chechênia. Vale destacar também que foi na última década do século XX que houve a Guerra do Golfo contra a presença iraquiana (liderada pelo ditador Saddan Hussein) no Kwait. Essa guerra marcou a tentativa de estabelecimento da hegemonia estadunidense no Oriente Médio.
NOTAS
[1] SNIDER, Timothy. Terras de Sangue – A Europa entre Hitler e Stalin. Rio de Janeiro: Record, 2012. p. 468.
Por Me. Cláudio Fernandes