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Milícia

A milícia é um grupo armado que atua como um poder paralelo às Forças Armadas no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, e em outros países. É uma força paramilitar.

Homens armados em alusão à milícia.
A milícia se apresenta como protetora dos indefesos, mas depois se torna a sua dominadora.[1]
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A milícia é um grupo armado que opera paralelamente ou com o consentimento das forças de segurança estatais, muitas vezes composto por agentes ou ex-agentes do Estado. No Brasil, esses grupos exercem um poder paralelo, atuando à margem da lei e controlando determinadas áreas e populações. São notórios, especialmente no Rio de Janeiro, por atividades ilegais como homicídios, extorsão, e controle de serviços essenciais.

Os objetivos das milícias no Brasil incluem a manutenção da ordem em suas áreas de atuação, a arrecadação de recursos por meio de “taxas de proteção”, e a associação com o poder público e a política para legitimar sua atuação e expandir seu controle.

Internacionalmente, as milícias variam em origens e objetivos, atuando como forças paramilitares ou grupos de autodefesa em diversos contextos, como na Rússia, com o Grupo Wagner, e na Alemanha, onde as milícias desempenharam um papel crucial na ascensão do nazismo.

Leia também: Como funciona o crime organizado

Tópicos deste artigo

Resumo sobre milícia

  • Milícias são grupos armados que operam paralelamente ou com o consentimento das forças de segurança do Estado.

  • Frequentemente são compostas por agentes ou ex-agentes do Estado.

  • Sua origem no Brasil remonta ao período da Ditadura Militar (1964-1985), com a formação de grupos de extermínio e esquadrões da morte.

  • A presença das milícias é particularmente notória no Rio de Janeiro, onde controlam vastas áreas e impõem um regime de violência e de medo.

  • Nos EUA, a milícia tem raízes em uma variedade de ideologias, muitas vezes de extrema-direita. Membros de milícias foram acusados de conspiração após o ataque ao Capitólio.

  • O Grupo Wagner, uma milícia que evoluiu para uma milionária empresa militar privada, tem atuado em conflitos internacionais e enfrentado acusações de crimes de guerra.

  • Na Alemanha, as milícias tiveram um papel crucial na ascensão do nazismo, com a SA e a SS atuando como forças paramilitares que promoviam a ideologia nazista.

O que é milícia?

Milícia é o nome de um grupo armado que atua paralelamente às forças de segurança do Estado, ou com o seu consentimento; muitas vezes composto por agentes ou ex-agentes do próprio Estado, como militares das forças armadas, policiais, bombeiros, guardas municipais e agentes penitenciários.

No Brasil, esses grupos formam um poder paralelo e operam à margem da lei, exercendo controle sobre determinadas áreas e populações.

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Quais são os crimes cometidos pela milícia?

O termo milícia ganhou notoriedade por aqui, principalmente no Rio de Janeiro, onde os milicianos são conhecidos por suas atividades ilegais e violentas, incluindo:

  • homicídio encomendado;

  • extorsão de moradores e comerciantes;

  • construção ilegal de imóveis;

  • controle de serviços como transporte e o acesso a serviços básicos (gás, internet, TV etc.).

Veja também: Comando Vermelho — facção criminosa que atua nas favelas do Rio de Janeiro

Como surgiu a milícia

História das milícias no Brasil

A história da milícia no Brasil remonta ao período da Ditadura Militar (1964-1985), quando houve a formação de grupos de extermínio e esquadrões da morte, muitos dos quais eram compostos por policiais e militares. Esses grupos praticavam a repressão e a eliminação de opositores do regime, e suas ações contribuíram para a cultura de violência e impunidade que ainda persiste após o fim do regime militar.

Alguns pesquisadores argumentam que a Ditadura Militar pode ter estabelecido as bases para a formação de grupos paramilitares. Primeiro porque foi construída, ao longo dos anos, uma aliança entre os agentes da ditadura e o crime organizado, especialmente o jogo do bicho e outros ramos da contravenção. Essa aliança contribuiu para a profissionalização de uma parte do crime organizado no Rio de Janeiro.

O segundo fator é que, após a redemocratização do Brasil, muitos dos envolvidos com os porões da ditadura formaram esquadrões da morte. Os membros desses grupos de extermínio, mais tarde, descobriram na milícia uma nova forma de exercer poder e influência.

História das milícias em outros países

A história da milícia é completamente diferente em países como Estados Unidos, Alemanha ou Rússia. Nos Estados Unidos, por exemplo, as milícias têm raízes que remontam ao período colonial, quando não havia forças policiais ou militares estabelecidas, e os primeiros imigrantes criaram suas próprias milícias para se protegerem.

Membro de uma milícia norte-americana segurando arma próximo a outros manifestantes.
Membro de uma milícia segurando uma arma semiautomática durante protesto da extrema-direita nos Estados Unidos.[2]

Ao longo do tempo, o conceito e os objetivos das milícias americanas evoluíram, e hoje existem grupos milicianos com uma variedade de ideologias, incluindo alguns que são partidários da extrema-direita.

Historicamente, as milícias modernas nos EUA também têm raízes em organizações racistas e antissemitas que surgiram entre os anos 1970 e 1980, em reação ao movimento por direitos civis da população negra. Os seus membros se vestem com roupas de combate e carregam armas de uso militar.

Dizem ser extremamente patrióticos e seus grupos têm nomes como Oath Keepers (Mantenedores do Juramento), Three Percenters (Os Três por Cento) e Posse Comitatus (Força do Condado, em tradução livre, e também o nome de uma lei americana que permite que um agente da lei recrute um civil para ajudá-lo a manter a ordem).

Eles acreditam em teorias da conspiração globais sobre ameaças à paz e à estabilidade, e que o governo federal está colaborando com essas conspirações e ameaçando a segurança do povo americano. Dizem que o governo está tentando tirar suas armas, privar-lhes de seus direitos e liberdades e que eles precisam lutar contra isso.

Atualmente, esses grupos são frequentemente vistos em eventos como a manifestação de extrema-direita em Charlottesville; se autointitulam como “uma terceira força”, uma linha auxiliar da força policial; e afirmam estarem ali para “defender a liberdade de expressão”.

A história da milícia é marcada por sua capacidade de adaptação a diferentes contextos históricos, políticos e sociais. As milícias variam desde grupos de autodefesa em tempos sem forças policiais estabelecidas até organizações paramilitares com ligações ideológicas e políticas, algumas das quais continuam a ter um papel violento na sociedade contemporânea.

Quais são os objetivos da milícia?

Os objetivos da milícia, no Brasil, incluem a manutenção da ordem em suas áreas de atuação, o que implica a expulsão de outros criminosos e a punição de comportamentos que perturbem os valores e negócios ilícitos que os milicianos impõem à comunidade. Além disso, buscam a arrecadação de recursos por meio de “taxas de proteção”, construção e venda de imóveis, grilagem de terras, comércio de botijões de gás, internet e outros serviços.

Outro objetivo da milícia é a associação com o poder público e a política, buscando legitimar sua atuação e expandir seu controle. A crescente infiltração na política é um aspecto particularmente preocupante da atuação das milícias. Candidatos com ligações com milícias buscaram e, em muitos casos, conseguiram cargos eletivos, tanto em níveis municipais quanto estaduais.

Essa estratégia visa não apenas garantir impunidade para suas atividades criminosas como também expandir seu controle sobre territórios e recursos públicos. A eleição de políticos ligados às milícias levantou sérias preocupações sobre a erosão das instituições democráticas e o fortalecimento do crime organizado dentro do aparato estatal.

Atuação da milícia no Brasil

A atuação da milícia no Brasil é mais notória no Rio de Janeiro. A Cidade Maravilhosa é, em vastas áreas, controlada por grupos milicianos que impõem um regime de medo e violência. As milícias cariocas são responsáveis por uma série de atividades ilegais, incluindo a exploração de serviços essenciais, como transporte e acesso à moradia, além de envolvimento direto em crimes violentos, como homicídios e tortura.

O Escritório do Crime foi um poderoso grupo miliciano no Rio de Janeiro. A especialidade dos seus membros: assassinato por encomenda. Associado ao ex-policial Adriano Magalhães da Nóbrega, morto em 2020 quando estava foragido da justiça, o grupo foi criado em meados dos anos 2000 por Nóbrega, um ex-membro do Bope — Batalhão de Operações Policiais Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Muitos dos seus membros morreram ou foram para a cadeia, especialmente depois que o Escritório do Crime ganhou notoriedade por uma série de assassinatos, destacando-se o caso da vereadora Marielle Franco, em agosto de 2018.

Placa na rua que homenageia a vereadora Marielle Franco, em texto sobre milícia.
O Escritório do Crime ganhou notoriedade devido à investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco.[3]

Um dos episódios mais trágicos que evidenciaram a atuação das milícias foi o desabamento de prédios na comunidade da Muzema, no Rio de Janeiro, em abril de 2019. Esses prédios foram construídos e vendidos de forma ilegal por milícias, sem seguir as normas de segurança e construção.

O desastre resultou na morte de várias pessoas e chamou a atenção para o controle que as milícias exercem sobre o mercado imobiliário em áreas periféricas, explorando a necessidade de habitação a preços acessíveis.

O crescimento demográfico acelerado e a falta de infraestrutura adequada nas grandes cidades brasileiras, especialmente no Rio de Janeiro, criaram um ambiente propício para a expansão das milícias.

A urbanização desenfreada e a formação de favelas sem serviços públicos básicos permitiram que esses grupos armados oferecessem alternativas ilegais para necessidades como segurança, transporte, e acesso a serviços de água e eletricidade, consolidando assim seu poder e influência sobre as comunidades.

A expansão desses grupos milicianos, portanto, é um desdobramento das deficiências na segurança pública e da corrupção dentro das instituições estatais, o que permite que as milícias cresçam e consolidem seu poder impunemente.

Saiba mais: O que significa ser de direita ou de esquerda na política?

Atuação da milícia no mundo

A milícia não está associada apenas ao contexto brasileiro. Existem grupos semelhantes, mas também os muito diferentes, em várias partes do mundo, atuando como forças paramilitares ou grupos de autodefesa, com destaque para os Estados Unidos, a Alemanha e a Rússia.

Milícia nos Estados Unidos

Como apontado, as milícias nos Estados Unidos têm origem no período colonial. Durante a Guerra de Independência dos Estados Unidos, as milícias locais foram fundamentais para o esforço de guerra contra o rei da Grã-Bretanha. Após a independência, a Segunda Emenda da Constituição dos Estados Unidos, ratificada em 1791, reconheceu o direito de manter e portar armas e a necessidade de existir uma milícia bem organizada para a segurança de um Estado livre.

Durante o século XIX, a milícia continuou a ser uma força importante, especialmente na fronteira e em conflitos internos. Na Guerra de Secessão, a guerra civil americana entre os estados da União e os da Confederação, ambos os lados mobilizaram as suas respectivas milícias para lutar.

No século XX, as milícias tradicionais deram lugar à Guarda Nacional, mas grupos paramilitares e de supremacia branca começaram a surgir, especialmente durante os movimentos de direitos civis e em resposta a tensões raciais e políticas dos anos 1960.

Atualmente, existem centenas de grupos milicianos ativos nos Estados Unidos, quase todos eles organizados pelo Movimento de Milícias, uma controversa organização política ultradireitista. Organizado nos anos 1990, segundo o historiador Mark Pitcavage, o movimento proclama que os seus grupos são garantidos por lei, mas não controlados pelo governo.

Eles de fato acreditam que são destinados a resistir a um governo tirânico, e que o governo estadunidense se tornou uma ditadura comandada por uma conspiração esquerdista conhecida como “nova ordem mundial”.

A ideologia do movimento tem levado alguns dos seus membros a cometerem atos criminosos, incluindo acumulação ilegal de armas e explosivos e conspirar para destruir edifícios ou assassinar funcionários públicos, além de inúmeros atos violentos e outros delitos menores.

O fim do governo Trump foi marcado pelo ataque ao Capitólio dos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021, quando membros de milícias de extrema-direita, como os Oath Keepers, foram acusados de conspiração sediciosa. Esse evento destacou o potencial de violência desses grupos e a ameaça que representam para a segurança e a democracia dos Estados Unidos.

Milícia na Rússia

Na Rússia, o termo milítsia refere-se ao nome genérico das forças policiais durante a União Soviética e em outros países de regime comunista. A milítsia soviética foi estabelecida após a Revolução de Outubro de 1917, substituindo a antiga força policial tsarista.

O governo provisório dissolveu a antiga polícia e criou a milítsia, introduzindo elementos mais democráticos, como a eleição dos seus chefes. Com o passar do tempo, a milítsia assumiu diversas funções, incluindo o controle de protestos e manifestações, especialmente durante a Perestroika, nos anos 1980.

Na Rússia, o Grupo Wagner é um exemplo notório de milícia que evoluiu para uma organização militar extremamente poderosa. Os seus combatentes têm atuado em diversos conflitos internacionais. O Grupo Wagner é uma empresa militar privada fundada em 2014 e composta por mercenários, muitos dos quais são ex-soldados de elite, prisioneiros, e civis russos e estrangeiros.

O grupo tem fortes ligações com o Kremlin e tem sido usado pelo governo russo em operações militares no exterior, como na Síria e em países africanos.

Desde que o governo russo declarou a intervenção na Ucrânia, em 2014, e principalmente após a invasão russa em 2022, o Grupo Wagner desempenhou um papel significativo, especialmente na captura da cidade ucraniana de Bakhmut. O grupo também foi acusado de cometer crimes de guerra, incluindo o assassinato e tortura de civis. Além disso, o líder do grupo, Yevgeny Prigozhin, recrutou prisioneiros russos para lutarem na Ucrânia, prometendo-lhes perdão e pagamento.

Recentemente, o Grupo Wagner entrou em conflito com o governo russo, com Prigozhin criticando abertamente o ministro da Defesa russo e o chefe de gabinete das Forças Armadas pela atuação na Guerra da Ucrânia. Esse desentendimento levou a uma crise militar na Rússia, com Prigozhin acusando o exército russo de bombardear suas bases e convocando uma rebelião armada contra o ministro da Defesa.

Bandeira com símbolo do Grupo Wagner e rosto do líder da milícia russa.
Yevgeny Prigozhin, líder do Grupo Wagner, criticou a atuação do governo russo na Guerra da Ucrânia.[4]

O governo russo reagiu instaurando um regime de operação antiterrorista na região de Moscou. Prigozhim morreu meses depois após o avião em que viajava cair. O Grupo Wagner, portanto, representa um fenômeno do potencial que a militarização privada tem para gerar, com implicações significativas para a política e a segurança internacionais, especialmente num contexto de guerra e de tensões com os governos.

Milícia na Alemanha

Durante a ascensão do nazismo, as milícias desempenharam um papel crucial na consolidação do poder de Adolf Hitler. A Sturmabteilung (SA), ou Tropas de Choque do Partido Nazista, foi uma das primeiras e mais influentes milícias alemãs, atuando como uma força paramilitar que intimidava opositores políticos e promovia a ideologia nazista.

A SA foi fundamental no estabelecimento do regime nazista, mas, após a Noite dos Longos Punhais, em 1934, sua influência diminuiu, e a Schutzstaffel (SS) emergiu como a principal organização paramilitar do regime. A SS, liderada por Heinrich Himmler, tornou-se uma das instituições mais poderosas e temidas da Alemanha Nazista, envolvendo-se em atividades de segurança e espionagem e na execução do Holocausto.

No final da Segunda Guerra Mundial, diante da iminente derrota, o regime nazista criou a Volkssturm, uma milícia nacional composta por homens não qualificados para o serviço militar regular. Essa força foi mobilizada em um esforço desesperado para defender o território alemão contra os avanços dos Aliados, mas foi insuficiente para alterar o curso da guerra.

No período contemporâneo, a Alemanha enfrenta desafios relacionados a grupos de extrema-direita que, embora não sejam milícias no sentido tradicional, compartilham algumas características com as organizações paramilitares do passado. Esses grupos tentam manipular o imaginário social para promover agendas xenófobas e nacionalistas, representando uma ameaça à ordem democrática.

Combate à milícia

Todos esses grupos milicianos, seja no Brasil, seja no exterior, podem ter diferentes origens e objetivos, variando desde a proteção de comunidades em regiões de conflito até a participação em atividades criminosas. Contudo, a natureza e as ações dessas milícias, em todos os casos, são influenciadas por fatores locais, como a estabilidade política, a presença do Estado e as condições socioeconômicas das regiões onde operam.

Portanto, para combater severamente esses criminosos, além de usar a lei, é preciso modificar as condições sociais que tornam possível a sua atuação.

Créditos das imagens

[1]Denis Kornilov/ Shutterstock

[2]Lyonstock/ Shutterstock

[3]Bruno Martins Imagens/ Shutterstock

[4]Danila2332/ Shutterstock

Fontes

MANSO, Bruno Paes. A República das Milícias: dos esquadrões da morte à era Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2020.

PAUZEIRO, Mariana Brito. Milícias S.A. São Paulo: Lumens Juris, 2022.

SOARES, Rafael. Milicianos. São Paulo: Companhia das Letras, 2023.  

Escritor do artigo
Escrito por: Rafael Pereira da Silva Mendes Licenciado e bacharel em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atuo como professor de Sociologia, Filosofia e História e redator de textos.

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

MENDES, Rafael Pereira da Silva. "Milícia"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/milicia.htm. Acesso em 21 de novembro de 2024.

De estudante para estudante


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