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A crônica narrativa é um gênero literário marcado pela brevidade de ações ocorridas em tempo e espaço determinados. As histórias geralmente apresentam diálogos ágeis, marcados pela possibilidade de se explorar o humor, com finais surpreendentes e/ou inusitados.
De maneira bastante usual, personagens e situações colocam-se de maneira ficcional, embora sejam trabalhadas temáticas do cotidiano, em que se realizam reflexões sobre o comportamento humano, a fim de se construir crítica social. Considerando a intencionalidade do gênero, é comum o uso de linguagem coloquial, do dia a dia, refletindo as características das personagens.
É bastante comum que os autores de crônicas narrativas explorem fatos e acontecimentos do tempo presente, e que se construam narradores que olham pelo “buraco da fechadura”, revelando o comportamento das pessoas diante de questões sociais, políticas, artísticas, individuais, coletivas, entre tantas outras, mas que tenha o ser humano como foco.
Leia também: Como tornar um texto coeso?
Tópicos deste artigo
- 1 - Como fazer uma crônica narrativa
- 2 - Principais características da crônica narrativa
- 3 - Videoaula sobre crônica narrativa
- 4 - Exemplo de crônica narrativa
- 5 - Representantes da crônica narrativa na literatura brasileira
Como fazer uma crônica narrativa
Para se produzir uma crônica narrativa de excelência, é fundamental que se tenha em mente um projeto de texto que contemple:
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Um assunto interessante, do cotidiano, pelo qual seja possível realizar reflexões, críticas sociais;
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Identificação do melhor tipo de narrador, se observador ou personagem, para contar a história;
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Determinação do cenário e do tempo da narrativa, ou seja, quando e onde as ações serão vividas e desencadeadas;
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Um final surpreendente, além de escolher se a abordagem permitirá o uso do discurso humorístico para prender a atenção do leitor e tornar a leitura fluente e prazerosa.
Por fim, vejamos o que diz Artur da Távola sobre como se escrever uma crônica:
A crônica é (e será) a leitura do futuro: compacta, rápida, direta, aguda, penetrante, instantânea (dissolve-se com o uso diário). [...] A crônica é um hiato, uma interrupção da notícia, um suspiro da frase, um desabafo do parágrafo, um relax do estilo direto e seco da escrita do jornal, do qual se arroga ser o hiato literário, a literatura do jornal. O jornalismo da literatura. Literatura jornalística. Uma pausa de subjetividade, ao lado da objetividade da informação. Um instante de reflexão, diante da opinião peremptória da editoria. [1]
Saiba também: Crônica argumentativa: veja suas características
Principais características da crônica narrativa
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Trata-se de um texto curto, produzido usualmente para ser publicado em jornais, revistas ou mesmo em livros.
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Tempo e espaço bem definidos. Muitas vezes, as ações desenrolam-se em uma única cena, em um único instante.
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Por seu caráter de narrativa rápida, ágil, o texto apresenta poucas personagens, podendo ser narrado com foco em primeira ou terceira pessoa do discurso.
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A linguagem da crônica narrativa é simples, podendo ser coloquial, representativa das personagens e do próprio olhar do narrador para os fatos.
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É um texto em prosa, podendo, inclusive, ser escrito apenas com o uso de diálogos, sem a interferência do narrador. O título geralmente é criativo, e o final, surpreendente.
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Trabalha assuntos do cotidiano, temas próximos das experiências dos leitores, com o objetivo de se colocar o ser humano no foco da observação, construindo crítica social.
Videoaula sobre crônica narrativa
Exemplo de crônica narrativa
No restaurante
Carlos Drummond de Andrade
– Quero lasanha.
Aquele anteprojeto de mulher - quatro anos, no máximo, desabrochando na ultraminissaia – entrou decidido no restaurante. Não precisava de menu, não precisava de mesa, não precisava de nada. Sabia perfeitamente o que queria. Queria lasanha. O pai, que mal acabara de estacionar o carro em uma vaga de milagre, apareceu para dirigir a operação-jantar, que é, ou era, da competência dos senhores pais.
– Meu bem, venha cá.
– Quero lasanha.
– Escute aqui, querida. Primeiro, escolhe-se a mesa.
– Não, já escolhi. Lasanha.
Que parada – lia-se na cara do pai. Relutante a garotinha condescendeu em sentar-se primeiro, e depois encomendar o prato:
– Vou querer lasanha.
– Filhinha, por que não pedimos camarão? Você gosta tanto de camarão.
– Gosto, mas quero lasanha.
– Eu sei, eu sei que você adora camarão. A gente pede uma fritada bem bacana de camarão. Tá?
– Quero lasanha, papai. Não quero camarão.
– Vamos fazer uma coisa. Depois do camarão a gente traça uma lasanha. Que tal?
– Você come o camarão e eu como lasanha.
O garçom aproximou-se, e ela foi logo instruindo:
– Quero lasanha.
O pai corrigiu:
– Traga uma fritada de camarão pra dois. Caprichada.
A coisinha amuou. Então não podia querer? Queriam querer em nome dela? Por que é proibido comer lasanha? Essas interrogações apenas se liam no seu rosto, pois os lábios mantinham reserva. Quando o garçom voltou com os pratos e o serviço, ela atacou:
– Moço, tem lasanha?
– Perfeitamente, senhorita.
O pai, no contra-ataque:
– O senhor providenciou a fritada?
– Já sim, doutor.
– De camarões bem grandes?
– Daqueles legais, doutor.
– Bem, então me vê um chinite, e para ela... O que é que você quer, meu anjo?
– Uma lasanha.
– Traz um suco de laranja para ela.
Com o chopinho e o suco de laranja, veio a famosa fritada de camarão, que, para a surpresa do restaurante inteiro, interessado no desenrolar dos acontecimentos, não foi recusada pela senhorita. Ao contrário, papou-a, e bem. A silenciosa manducação atestava, ainda uma vez, no mundo, a vitória do mais forte.
– Estava uma coisa, hem? - comentou o pai, com um sorriso bem alimentado - Sábado que vem, a gente repete... Combinado?
– Agora a lasanha, não é, papai?
– Eu estou satisfeito. Uns camarões tão geniais! Mas você vai comer, mesmo?
– Eu e você, tá?
– Meu amor, eu...
– Tem de me acompanhar, ouviu? Pede a lasanha.
O pai baixou a cabeça, chamou o garçom, pediu. Aí, um casal, na mesa vizinha, bateu palmas. O resto da sala acompanhou. O pai não sabia onde se meter. A garotinha, impassível. Se, na conjuntura, o poder jovem cambaleia, vem aí, com força total, o poder ultrajovem.
Fonte: O Poder Ultrajovem e mais 79 textos em prosa e verso, 1972.
Leia também: Ciao: a última crônica de Carlos Drummond de Andrade
Representantes da crônica narrativa na literatura brasileira
Segundo alguns historiadores e críticos literários, a partir da década de 30 do século XX, a crônica consolidou-se como um gênero textual brasileiro, quando autores de renome passaram a publicar, sobretudo em jornais, textos dessa natureza. São exemplos de grandes autores que escreveram crônicas:
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Fernando Sabino;
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Clarice Lispector, entre outros.
Assim, tanto a dedicação desses escritores como o crescimento dos jornais no Brasil contribuíram, sobremaneira, para que a crônica fosse disseminada e tomada como um gênero literário, caindo no gosto dos brasileiros e firmando-se como um texto próximo dos seus leitores.
Mais recentemente em nossa história, podemos citar Rubem Braga e Luis Fernando Veríssimo como grandes representantes do gênero. Vale ressaltar ainda que, com o advento das mídias digitais, é possível encontrar esse texto circulando não apenas em livros e jornais, mas também em outros veículos, o que contribui para a popularização da crônica e para o seu acesso mais facilitado.
Crédito de imagem:
[1] Arquivo Nacional
Notas:
[1] TÁVOLA, Artur da. Ser jovem. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985, página 54.
Por Sara de Castro
Professora de Castro