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Os processos de independência dos países latino-americanos, em princípio, acenavam para a instalação de governos liberais e da democracia na América. O atraso colonial seria finalmente abandonado pelas promessas de felicidade e igualdade tão fortemente disseminadas pelo ideário iluminista. A França e os Estados Unidos transformaram-se em modelos de uma outra possível conjuntura social, política e econômica para as recém formadas nações americanas. Os antigos entraves do desenvolvimento seriam superados com a modernização, a ampliação dos direitos políticos e a justiça dos órgãos representativos.
No entanto, a origem desses movimentos de independência mostrava que as novas instituições políticas a serem instaladas no continente ofereciam uma possibilidade bem diferente. As democracias e constituições aqui elaboradas não foram conseqüência da ampla participação política de diferentes camadas sociais. A elite criolla capitaneou o fim do pacto colonial em vista das vantagens econômicas oferecidas pelas grandes nações industriais européias. Os almejos das populações menos favorecidas ficavam em um plano subalterno controlado pelo “fosso político e ideológico” que colocou as elites latino-americanas em situação privilegiada.
A grande maioria da população vivia à parte das implicações de uma ampla democracia. O poder era instituído pelas leis e legitimado pelos governos, porém, o seu centro decisório ainda estava atrelado a uma realidade sócio-econômica eminentemente agro-exportadora. A impessoalidade e a igualdade de diretos das repúblicas aqui criadas ainda conviviam com o desmando dos grandes proprietários, que colocavam seus interesses acima das leis, das constituições e do Estado. Dessa forma, os antigos laços de dependência vividos no interior da colônia pareciam somente ganhar uma nova roupagem.
Nesse contexto, ganhou proeminente força a figura do caudilho. Descendente da elite colonial criolla, o caudilho usou de seu poder econômico para o alcance das instituições políticas e, conseqüentemente, de seus interesses pessoais. O desrespeito e o abuso às instituições o permitiam até mesmo criar milícias que não reconheciam nenhum poder colocado acima de sua ganância. Dono de terras, ainda tinha o apoio – espontâneo ou coagido – de uma população desprovida de meios para sublevar-se contra o desmando e a opressão do caudilho.
Tendo uma relação ambígua com os poderes, o caudilho somente reconhecia as instituições que estivessem harmoniosamente submetidas à manutenção de seus privilégios. Transformando-se em um tipo de experiência política observável em toda a América Latina, o caudilhismo foi um fenômeno histórico vivenciado em países como Argentina, Brasil, Chile, Haiti e Peru. Mesmo usando da força para preservar-se, o fenômeno caudilhista não resistiu às transformações do tempo. Ao longo do século XX, os fenômenos de industrialização, urbanização e imigração européia enfraqueceram o poder de atuação dos caudilhos.
Por Rainer Sousa
Graduado em História