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Durante o século XIX, a porção meridional da América do Sul conheceu diversos conflitos, bélicos e diplomáticos, envolvendo questões de delimitação de fronteiras entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Concomitante a isso, houve também disputas internas pelo poder nos países e mesmo disputas externas em um momento de formação nacional dos países da América do Sul. Foi nesse contexto tumultuado que ocorreu a chamada Guerra contra Aguirre, ou Guerra do Uruguai.
Ocorrida entre 1864 e 1865, a Guerra contra Aguirre envolveu as tropas do exército e da marinha do Império do Brasil e grupos militares do Uruguai. A guerra recebeu esse nome porque a ação brasileira ocorreu contra o então presidente do Uruguai Atanasio Cruz Aguirre. Foi um conflito breve, mas que demonstrou a participação brasileira nos assuntos políticos internos do Uruguai e resultou, logo após seu término, na Guerra do Paraguai.
Na primeira metade da década de 1860, o Uruguai vivenciava uma guerra civil que opunha, de um lado, os membros do Partido Blanco, formado principalmente por grandes latifundiários, e, de outro, os membros do Partido Colorado, composto por grandes comerciantes de Montevidéu.
Atanasio Cruz Aguirre era membro do Partido Blanco, tornou-se presidente uruguaio em 1864 e envolveu-se diretamente em disputas que ocorriam na fronteira do Uruguai com o Brasil. Estancieiros (fazendeiros de gado) gaúchos reclamavam dos roubos de gados, apontando uruguaios como os responsáveis. Já os uruguaios reclamavam das práticas dos estancieiros gaúchos em seu território (muitos tinham terras no país vizinho), principalmente a utilização de trabalho escravo e do comércio sem fiscalização para o Brasil. Aguirre parecia não se importar com as reclamações brasileiras.
No âmbito político interno uruguaio, Venâncio Flores, do Partido Colorado, era candidato à presidência e opunha-se a Aguirre. Este, por sua vez, acusava os colorados de serem apoiados por Brasil e Argentina, inclusive sendo os dois países uma das causas da guerra civil. Nenhum dos dois partidos uruguaios tinha condições de vencer militarmente seu opositor. Nesse sentido, a entrada do Brasil em um conflito no Uruguai acabou dando resposta à situação.
Uma comitiva de estancieiros gaúchos enviou uma reclamação da situação na fronteira ao Governo Federal no Rio de Janeiro. Este criou uma missão diplomática que foi enviada ao Uruguai para resolver a situação. Na fronteira, a situação tornava-se cada vez pior, com uma escalada de violência entre uruguaios e gaúchos. Aguirre não deu resposta ao pedido brasileiro, demonstrando o fracasso da ação diplomática.
Nessa situação, forças militares brasileiras foram enviadas à fronteira, sob liderança do almirante Joaquim Marques Lisboa, o Barão de Tamandaré. Este tinha sob seu comando uma esquadra de 10 embarcações. Em março de 1864, quatro mil homens do exército chegaram à fronteira.
Em agosto do mesmo ano, a tropa invadiu o território uruguaio. Nos meses seguintes, os brasileiros conseguiram tomar Melo, sitiando Paysandú e dirigindo-se a Montevidéu. Mas Aguirre somente foi derrubado em fevereiro de 1865, quando as forças militares brasileiras chegaram à capital uruguaia. Venâncio Flores assumiu o poder em 20 de fevereiro, cinco dias após Atanasio Aguirre capitular. Diz-se que o presidente deposto literalmente queimou os acordos diplomáticos entre Brasil e Uruguai.
Entretanto, em agosto de 1864, o presidente do Paraguai, Francisco Solano Lopez, tinha informado ao governo imperial brasileiro que qualquer interferência nas disputas políticas uruguaias alteraria o equilíbrio político na região do Rio da Prata, demonstrando sua ligação com Aguirre. Após sua capitulação em fevereiro de 1865, Atanasio Aguirre fugiu para o Paraguai. A retirada de Aguirre do poder pelo Império brasileiro foi, dessa forma, um dos motivos que levariam Brasil, Argentina e Uruguai a formarem a Tríplice Aliança e entrarem em guerra contra o Paraguai, na chamada Grande Guerra, para os paraguaios, ou Guerra do Paraguai, para os brasileiros.
Por Me. Tales Pinto