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Mandonismo

Mandonismo é uma prática social brasileira na qual um líder local exerce controle sobre a população, limitando o poder de decisão dela. Seu auge ocorreu durante o coronelismo.

Texto sobre o que é mandonismo.
O mandonismo também é chamado de mandonismo local.
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O mandonismo foi uma das principais instituições de poder nas áreas rurais do Brasil, do início da colonização até a Revolução de 1930. No mandonismo, um mandão, uma pessoa com recursos econômicos e poder político, controla a população local, fazendo com que ela, entre outras coisas, vote em seus candidatos.

Também chamado de mandonismo local, a prática teve origem no Brasil durante os anos iniciais da colonização, quando a Coroa portuguesa delegou a particulares a tarefa de colonizar o território. Na ausência do Estado, os grandes proprietários de terra se tornaram os verdadeiros governantes em suas terras, estabelecendo leis, julgando e punindo todos aqueles que viviam na sua área de influência.

Com a criação da Guarda Nacional, muitos mandões se tornaram coronéis da nova força militar, termo utilizado ainda hoje para nomear os mandões. Na Primeira República (1889-1930), o voto não era secreto, o que permitiu que os coronéis controlassem seu curral eleitoral, sendo ele de fundamental importância para o sistema político da época, chamado “coronelismo”. Com a ascensão de Vargas ao poder, a industrialização e a urbanização do Brasil, o mandonismo perdeu força.

Leia também: Como funcionava o voto de cabresto?

Tópicos deste artigo

Resumo sobre mandonismo

  • O mandonismo é uma prática na qual um mandão local possui controle político sobre a população de sua região.
  • O sistema de capitanias hereditárias possibilitou o desenvolvimento do mandonismo no Brasil.
  • Na América espanhola e na Espanha, o mandonismo é chamado de caciquismo.
  • O auge do mandonismo brasileiro ocorreu na Primeira República, durante o coronelismo.
  • Na Era Vargas houve o declínio do poder dos coronéis e, consequentemente, do mandonismo.
  • O mandonismo foi um fenômeno tipicamente rural, associado ao poder econômico e à posse da terra.

O que é o mandonismo?

O mandonismo é um fenômeno social brasileiro, comum nas áreas rurais, que consiste no controle de uma população por um mandão, chamado também senhor, coronel ou outros nomes, a depender da época e região. No mandonismo, o mandão controla recursos estratégicos, como a terra, a água ou empregos e cargos públicos e, por isso, consegue exercer controle sobre a população local.

Desde o Período Colonial, quando a Coroa delegou poderes para terceiros com as capitanias hereditárias, o mandonismo passou a ocorrer no Brasil. Seu auge, para a maior parte dos historiadores, ocorreu na Primeira República, quando os coronéis tiveram grande poder político na política nacional.

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Características do mandonismo

O mandonismo é um fenômeno predominantemente rural, ocorrendo principalmente em lugares mais afastados dos grandes centros urbanos e onde o Estado é ausente ou pouco presente. Outra característica do mandonismo é o de ser um fenômeno quase sempre associado ao latifúndio, com os mandões sendo, ao longo da história do Brasil, grandes produtores rurais ou pecuaristas, embora outros grupos sociais, como grandes comerciantes e clérigos, também tenham exercido o papel de mandões, sobretudo na Primeira República.

Veja também: O que foi a política do café com leite na República Velha?

Objetivos do mandonismo

Por ser um fenômeno de longa duração, o mandonismo modificou, ao longo do tempo, seus objetivos. No Período Colonial, por exemplo, o principal objetivo de quem exercia o mando era o de ter mão de obra e força militar à disposição. Na Primeira República, durante o coronelismo, o principal objetivo dos coronéis, os mandões da época, era conseguir votos, uma vez que seu curral eleitoral era fundamental na manutenção das estruturas de poder do período.

Pintura representando um coronel falando com populares, em alusão ao mandonismo.
Os coronéis, ou mandões, exerciam controle sobre a população local, inclusive sobre o seu voto.

Diferenças entre mandonismo, coronelismo e clientelismo

Não é fácil analisar esses três conceitos que são empregados, muitas vezes, como sinônimos por muitos pesquisadores brasileiros. Mas, utilizaremos aqui as definições propostas por José Murilo de Carvalho|1|. Para ele, o mandonismo é um fenômeno no qual uma pessoa ou família exerce poder sobre um grupo de pessoas. Existe desde o início da colonização brasileira e, de certa forma, perdura ainda hoje nos rincões do Brasil.

Segundo o pesquisador, clientelismo é um fenômeno social que, nas palavras do pesquisador, “envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto”. O clientelismo é uma das estratégias de controle utilizadas no mandonismo.

Já o coronelismo é um sistema político que existiu durante a Primeira República. Nesse sistema os coronéis, forma como ficaram conhecidos aqueles que exerciam o mando local no período, controlavam seus currais eleitorais e elegiam, dessa forma, seus candidatos. O coronelismo seria, portanto, “um momento particular do mandonismo” brasileiro, limitado ao período entre 1889 e 1930.

Mandonismo no Brasil

O mandonismo se iniciou no Brasil no Período Colonial, sobretudo a partir da criação das capitanias hereditárias, quando o governo português optou por terceirizar a colonização do país, deixando a tarefa para endinheiradas pessoas do Reino. Os donatários, por força de lei, eram a autoridade máxima em suas capitanias, cobrando impostos, distribuindo terras e aplicando a justiça.

Ilustração de militares da Guarda Nacional em texto sobre mandonismo.
Militares da Guarda Nacional em ilustração do século XIX. A patente de coronel era dada especialmente aos donos de terras.

Em 1831, no início do Período Regencial, o mandonismo se fortaleceu no Brasil com a criação da Guarda Nacional, que transferiu para o poder local a função de criar e manter forças militares. A patente regional mais alta da Guarda Nacional era a de “coronel”, cargo exercido, na maior parte das vezes, pelos grandes latifundiários. Durante todo o Segundo Reinado e durante a Primeira República, os coronéis tiveram importante papel político no Brasil.

Mandonismo no mundo

O mandonismo é um conceito utilizado na análise da realidade brasileira, embora muitos pesquisadores comparem o mandonismo brasileiro com caciquismo. O termo “cacique” é de origem arawak e era usado para nomear os líderes de suas aldeias. O termo “cacique” passou a ser utilizado pelos espanhóis na América para nomear os líderes indígenas de todos os povos indígenas. Eles foram classificados em “bons caciques”, para as lideranças indígenas que se aliaram aos espanhóis, e “maus caciques”, para aqueles que resistiram à conquista.

Com o passar do tempo passaram a ser chamados popularmente de caciques todos os líderes locais da América espanhola, inclusive os espanhóis e criollos. O termo “caciquismo”, semelhante ao mandonismo, foi cunhado pelo economista e político espanhol Joaquín Costa, entre o final do século XIX e início do XX, no contexto da Restauração Bourbon na Espanha. Em sua obra “Oligarquia e caciquismo”, Joaquín Costa descreveu a importância dos líderes locais e regionais nas eleições espanholas, semelhante ao coronelismo no Brasil.

Saiba mais: Início da Era Vargas — o governo provisório e as mudanças que acompanharam a chegada de Vargas ao poder

História do mandonismo

A Coroa portuguesa optou por terceirizar a colonização do Brasil, deixando para membros da aristocracia portuguesa a responsabilidade de colonizar as terras lusitanas na América e mantendo-se, inicialmente, afastada desse processo. O território brasileiro foi dividido em capitanias hereditárias, e cada uma delas foi doada para um capitão. Eles, por sua vez, redistribuíam partes de suas terras, as sesmarias.

Isolados do Estado português, senhores de engenho, grandes pecuaristas e grandes mineradores se tornaram os mandões nas áreas rurais. Eles redigiam as leis locais, exerciam a justiça e tinham controle sobre a população local, livre e escrava. Essa estrutura foi a base da origem do mandonismo no Brasil e se manteve por todo o Período Colonial.

A Independência do Brasil, em 1822, não mudou as estruturas políticas, econômicas e sociais do país, mantendo a monarquia, a escravidão, o poder local dos grandes senhores e, dessa forma, o mandonismo. No Período Regencial foi criada a Guarda Nacional, estrutura militar descentralizada que deu mais poder ainda aos mandões; muitos deles se tornaram “coronéis” da Guarda Nacional, forma como os mandões passaram a ser chamados no Brasil.

Com a Proclamação da República e implementação do federalismo, os coronéis ganharam poder e se tornaram importantes no jogo político nacional. Cada coronel possuía seu “curral eleitoral”, conjunto de cidadãos que estavam sob o seu controle. Através de alianças políticas, esses coronéis elegiam o governador de Estado, e novas alianças escolhiam o presidente da República. O coronelismo foi a expressão máxima do mandonismo no Brasil.

Na década de 1920, diversos políticos, grupos políticos e movimentos sociais passaram a protestar e a lutar contra o coronelismo. O principal desses movimentos foi o tenentismo. A chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, marcou o início do processo de enfraquecimento do mandonismo. Muitos coronéis passaram a ser desarmados pelo governo federal, e alguns foram presos.

Em 1932 foi promulgado o Código Eleitoral, que criou a Justiça Eleitoral, federalizou o processo eleitoral e tornou o voto secreto. Essas medidas ajudaram a enfraquecer ainda mais o mandonismo.

Nota

|1| CARVALHO, J. M. de. Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: Uma Discussão Conceitual. Scielo Brasil, 30 out. 1998. Disponível em: https://www.scielo.br/j/dados/a/bTjFzwWgV9cxV8YWnYtMvrz/

Fontes

ARAÚJO, F. Os senhores dos anéis e dos dedos: estudo sobre o mandonismo na atualidade brasileira. In: XI CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA. São Paulo: Unicamp. 1 a 5 set. 2003. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/722482544/sbs2003-sf06-francisco-araujo

CAMMACK, P. O Coronelismo e o Compromisso Coronelista: Uma Crítica. Cadernos do Departamento de Ciência Política, nş 5, Belo Horizonte, 1980.

CARVALHO, J. M. de. Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: Uma Discussão Conceitual. Scielo Brasil, 30 out. 1998. Disponível em: https://www.scielo.br/j/dados/a/bTjFzwWgV9cxV8YWnYtMvrz/

CARVALHO, J. M. de. Coronelismo. In: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, 1930-1983 Rio de Janeiro, Cpdoc/Fundação Getulio Vargas, Forense Universitária, 1981.

RIBEIRO, L. C. O mandonismo local e o movimento republicano. História: questões & debates, Curitiba, ano 3, n. 4, p. 65-85, jun. 1982.

Escritor do artigo
Escrito por: Jair Messias Ferreira Junior Pós-graduado em História pela Unicamp e professor da Educação Básica há mais de 20 anos. Também é formador de professores e produtor de materiais didáticos há mais de 10 anos.

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

JUNIOR, Jair Messias Ferreira. "Mandonismo"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/mandonismo.htm. Acesso em 24 de abril de 2025.

De estudante para estudante


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