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O Classicismo foi um movimento cultural que fez parte do Renascimento europeu, durante os séculos XV e XVI. Como o próprio nome aponta, a proposta do Classicismo era um retorno às formas e temas da Antiguidade Clássica, ou seja, Grécia e Roma antigas.
Tópicos deste artigo
- 1 - Contexto histórico do Classicismo
- 2 - Principais características do Classicismo
- 3 - Classicismo em Portugal
- 4 - Principais autores e obras do Classicismo
- 5 - Exercícios resolvidos sobre Classicismo
Contexto histórico do Classicismo
O período da Idade Média durou cerca de 10 séculos na Europa (século V – século XV). Durante esse longo período de tempo, o desenvolvimento científico e cultural dependia do aval ou do aceite da Igreja Católica, que exercia influência política e socioeconômica em toda a Europa.
Enquanto a riqueza na Idade Média estava relacionada à posse da terra e à tradição, as trocas comerciais que se estabeleceram com o mercantilismo tornaram o dinheiro a grande fonte de poder. O intercâmbio com civilizações da Ásia e da África, sobretudo com povos de origem árabe, abriu para os europeus novos horizontes, como o desenvolvimento da matemática e os instrumentos de navegação, como o astrolábio.
Os espaços geográficos abriam-se, com a descoberta de novas rotas pelo mar, levando até a chegada aos territórios do grande continente americano: eram as Grandes Navegações.
Tudo isso foi possível graças ao Renascimento, movimento científico e cultural que tomou conta da Europa no século XV. Esquivando-se da censura ideológica da Igreja, pensadores e cientistas elaboraram novas teorias e invenções: Nicolau Copérnico propõe o modelo heliocêntrico do Universo, Galileu Galilei descobre as leis que regem a queda dos corpos, Johann Gutemberg inventa os tipos móveis para imprimir os livros, tarefa antes delegada aos monges copistas.
O horizonte cultural do Renascimento era a Antiguidade Clássica. A Grécia Antiga é considerada o berço do pensamento ocidental (tendo influenciado diretamente a cultura dos romanos), por isso o retorno às formas clássicas foi o propósito estético dos renascentistas. O Classicismo tem sua gênese na Itália, ao final do século XIII, com o surgimento do pensamento humanista.
Veja também: Humanismo: a estética da transição entre o medievo e o Renascimento
Principais características do Classicismo
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Busca pelo equilíbrio, pela proporção, pela objetividade e pela transparência.
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Obra mimética como reflexão de uma natureza que segue leis universais, ou seja, a obra como concerto harmônico.
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Contenção da subjetividade, dos ímpetos da interioridade: o que vale é a obra, não o que sente ou pensa o autor. O autor deve desaparecer perante a obra.
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Rigor formal: cada forma utilizada no texto clássico deve seguir um conjunto de regras próprio.
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Separação das artes: os gêneros textuais não se misturam. A poesia lírica tem seu próprio método e características que não devem ser confundidos com aqueles da poesia épica, ou da dramaturgia, por exemplo.
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Noção do ideal de beleza grego, também norteado pela proporção e pelo equilíbrio das formas.
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Neoplatonismo.
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Temas da mitologia greco-romana.
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Valorização da racionalidade em oposição à sentimentalidade e do universal em detrimento do particular.
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Antropocentrismo, a centralidade da existência humana em relação ao Universo e àquilo que o compõe.
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Obra como veiculadora de verdades e ensinamentos que permitam aperfeiçoar a alma humana.
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Adoção de formas textuais da Antiguidade Clássica, predominantemente a dramaturgia e os gêneros da tragédia e da comédia, e a poesia, nos gêneros lírico e épico.
Saiba mais: A arte na Grécia Antiga: inspiração para o Ocidente
Classicismo em Portugal
Embora na Itália o Classicismo tenha se insinuado em meados do século XIII, é apenas em 1527, com Sá de Miranda, que o movimento tem início em Portugal. Influenciado pelo dolce stil nuovo, “doce estilo novo”, em tradução livre, que aprendera na Itália, Sá de Miranda introduz à literatura o gênero do soneto decassílabo, que ficaria conhecido como “medida nova”, em oposição à “medida velha”, a das redondilhas (cinco ou sete sílabas métricas).
Foi predominante no Classicismo português a temática do neoplatonismo, escola filosófica que retomava a filosofia amorosa de Platão, tratando o amor não a partir da sensualidade, mas por seu viés filosófico e religioso. Além disso, os poetas do período valorizaram sobretudo os grandes feitos nacionais, as conquistas do povo português, assunto da poesia épica. Pode-se entender, portanto, que o Classicismo em Portugal voltou-se para dois principais temas: amor e bravura.
Principais autores e obras do Classicismo
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Francisco de Sá de Miranda (Coimbra, 1481 – Amares, 1558)
Precursor do Classicismo português, foi o responsável pela introdução do verso decassílabo em Portugal. Teve algumas poesias publicadas no Cancioneiro geral (1516), compilado antológico da poesia humanista.
Introduziu também, em língua portuguesa, as formas da canção da sextina e as produções em tercetos e em oitavas, sendo responsável pela formação dos poetas portugueses, tendo grande influência na literatura que se desenvolveu no período.
Eram parte de suas temáticas a reflexão moral, filosófica e política, além do lirismo amoroso. Escreveu também textos dramatúrgicos e cartas em forma de verso.
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Exemplo de soneto de Sá de Miranda
Comigo me desavim,
Sou posto em todo perigo;
Não posso viver comigo
Nem posso fugir de mim.
Com dor da gente fugia,
Antes que esta assi crecesse:
Agora já fugiria
De mim, se de mim pudesse.
Que meo espero ou que fim
Do vão trabalho que sigo,
Pois que trago a mim comigo
Tamanho imigo de mim?
(Sá de Miranda)
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Luís Vaz de Camões (1524/1525-1580)
O berço de nascimento de Camões é incerto: provavelmente Lisboa, provavelmente em 1524 ou 1525, mas as cidades de Coimbra, Santarém e Alenquer também reivindicam ser o local onde o poeta nasceu.
De origem fidalga, Camões teve uma educação sólida e era conhecedor de história, geografia e literatura. Deu início ao curso de Teologia na Universidade de Coimbra, que abandonou por levar uma vida incompatível com os preceitos religiosos. Conquistador, Camões teve muitas paixões e seus versos eram muito prestigiados pelas damas da corte.
Envolveu-se em duelos e fez inimizades, o que o levou a alistar-se e embarcar, como soldado, para Ceuta, lutando contra os mouros e perdendo o olho direito em combate. Já em liberdade, embarcou para a Índia, em 1554, e viveu também em Macau. Salvou-se de um naufrágio em 1556, levando consigo os originais de sua mais célebre obra, o poema épico Os Lusíadas. Morreu em Portugal, em 1580.
Camões é considerado o mais importante poeta de língua portuguesa e um dos maiores da literatura universal. Sua produção literária é múltipla e contempla tanto as formas eruditas quanto as formas populares, de trovas, inspiradas em velhas cantigas medievais. A obra de Camões pode ser dividida em dois eixos principais: a poesia lírica e a épica.
A lírica camoniana é composta principalmente de temas amorosos, bastante influenciada pelo neoplatonismo, que convive com os temas sensuais, estabelecendo quase sempre uma contradição. As antíteses da presença-ausência, amor espiritual-amor carnal, vida-morte, sonho-realidade são muito presentes em seus poemas, o que o torna um antecipador do movimento maneirista.
Além disso, Camões compôs na chamada “medida velha”, as redondilhas, ligadas à tradição popular, e na “medida nova”, o poema decassílabo, forma preferida para a exposição de temas e sentimentos complexos.
Veja também: A literatura cheia de antíteses e paradoxos do Barroco
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Exemplo da poesia de Camões
Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.
Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.
E se vires que pode merecer-te
Algua cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,
Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.
(Camões)
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Os Lusíadas
Camões ficou muito conhecido por seu trabalho como sonetista, mas sua grande obra foi Os Lusíadas, poema épico de cunho nacionalista que exalta o período das Grandes Navegações portuguesas. Inspirado em Virgílio e Homero pela forma e pelo tema, Camões utiliza-se também da mitologia greco-romana para tecer a epopeia: Baco teria se voltado contra os portugueses, por ser dono dos territórios indianos, e Vênus, por gostar do povo lusitano, estaria a seu favor.
Assim, a viagem real de Vasco da Gama mistura-se a essa narrativa mitológica. Escritos em 10 cantos com oito estrofes cada um, Os Lusíadas é obra de linguagem culta e elevada, conforme a característica da poesia épica, e canta heroicamente os reis e os fidalgos portugueses a partir da conquista dos novos territórios, adicionando também outros episódios gloriosos da história de Portugal.
Canto I
As armas e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo reino, que tanto sublimaram;
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando:
Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e a arte.
[...]
(Camões, Os Lusíadas.)
Exercícios resolvidos sobre Classicismo
1. (Enem 2012)
LXXVIII (Camões, 1525?-1580)
Leda serenidade deleitosa,
Que representa em terra um paraíso;
Entre rubis e perlas doce riso;
Debaixo de ouro e neve cor-de-rosa;
Presença moderada e graciosa,
Onde ensinando estão despejo e siso
Que se pode por arte e por aviso,
Como por natureza, ser fermosa;
Fala de quem a morte e a vida pende,
Rara, suave; enfim, Senhora, vossa;
Repouso nela alegre e comedido:
Estas as armas são com que me rende
E me cativa Amor; mas não que possa
Despojar-me da glória de rendido.
CAMÕES, L. Obra completa. Rio de janeiro: Nova Aguilar, 2008.
A pintura e o poema, embora sendo produtos de duas linguagens artísticas diferentes, participaram do mesmo contexto social e cultural de produção pelo fato de ambos
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apresentarem um retrato realista, evidenciado pelo unicórnio presente na pintura e pelos adjetivos usados no poema.
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valorizarem o excesso de enfeites na apresentação pessoal e na variação de atitudes da mulher, evidenciadas pelos adjetivos do poema.
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apresentarem um retrato ideal de mulher marcado pela sobriedade e o equilíbrio, evidenciados pela postura, expressão e vestimenta da moça e os adjetivos usados no poema.
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desprezarem o conceito medieval da idealização da mulher como base da produção artística, evidenciado pelos adjetivos usados no poema.
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apresentarem um retrato ideal de mulher marcado pela emotividade e o conflito interior, evidenciados pela expressão da moça e pelos adjetivos do poema.
Resolução
Alternativa C. Tanto os adjetivos do poema (“serenidade deleitosa”, “moderada e graciosa” etc.) como a postura e vestimentas da mulher retratada na pintura indicam os ideais classicistas da sobriedade e do equilíbrio.
2. (UFSCar, 2003) A questão seguinte baseia-se no poema épico Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, do qual se reproduzem, a seguir, três estrofes.
Mas um velho, de aspeito venerando, (= aspecto)
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós no mar ouvimos claramente,
C’um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito:
“Ó glória de mandar, ó vã cobiça
Desta vaidade a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C’uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!
Dura inquietação d’alma e da vida
Fonte de desamparos e adultérios,
Sagaz consumidora conhecida
De fazendas, de reinos e de impérios!
Chamam-te ilustre, chamam-te subida,
Sendo digna de infames vitupérios;
Chamam-te Fama e Glória soberana,
Nomes com quem se o povo néscio engana.”
Os versos de Camões foram retirados da passagem conhecida como O Velho do Restelo. Nela, o velho
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abençoa os marinheiros portugueses que vão atravessar os mares à procura de uma vida melhor.
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critica as navegações portuguesas por considerar que elas se baseiam na cobiça e busca de fama.
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emociona-se com a saída dos portugueses que vão atravessar os mares até chegar às Índias.
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destrata os marinheiros por não o terem convidado a participar de tão importante empresa.
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adverte os marinheiros portugueses dos perigos que eles podem encontrar para buscar fama em outras terras.
Resolução
Alternativa B. Logo na primeira estrofe, o velho, ao olhar para os marinheiros portugueses, balança três vezes a cabeça, em sinal de descontentamento, e põe-se a dizer que é a fama e a vontade de poder que movem os homens.