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A República Velha, período da história brasileira mais conhecido pelos historiadores como Primeira República, estendeu-se de 1889 a 1930. Foi a primeira fase da República no Brasil e, como tal, foi um período cheio de tensões, seja na economia, seja na política e também na sociedade como um todo.
A desigualdade social, os aumentos nos impostos, as necessidades não atendidas, o racismo, o medo, a insatisfação política etc., tudo isso foi raiz para revoltas na Primeira República. Ao longo dos mais de quarenta anos dessa primeira fase, aconteceram diferentes revoltas no campo, na cidade e até mesmo no meio militar.
O objetivo deste texto é listar as principais revoltas que aconteceram durante a Primeira República, trazendo um pequeno resumo a respeito de cada uma delas.
Tópicos deste artigo
- 1 - Resumo
- 2 - Guerra de Canudos (1896-1897)
- 3 - Guerra do Contestado (1912-1916)
- 4 - Revolta da Vacina (1904)
- 5 - Revolta da Chibata (1910)
- 6 - Outras revoltas
- 7 - Revoltas urbanas e rurais na República Velha
Resumo
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As revoltas na Primeira República foram motivadas por inúmeros fatores, como desigualdade social e pobreza, violência policial, medo, fanatismo religioso etc.
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As quatro principais revoltas do período, isto é, as mais estudadas são: Canudos, Contestado, Revolta da Vacina e Revolta da Chibata.
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A Guerra de Canudos aconteceu entre 1896-97 e foi motivada pela insatisfação das elites baianas com a formação do arraial que possuía um líder religioso desvinculado da Igreja e uma experiência social com ares de igualitarismo.
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A Guerra do Contestado aconteceu em uma região disputada por Paraná e Santa Catarina e envolvia a insatisfação dos sertanejos com a pobreza e o fervor religioso.
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A Revolta da Vacina foi motivada pela insatisfação da população com a violência do processo de modernização do Rio de Janeiro aliada ao medo da campanha de vacinação forçada.
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A Revolta da Chibata teve como estopim a insatisfação dos marinheiros negros e mestiços com os castigos físicos que sofriam na Marinha.
Guerra de Canudos (1896-1897)
Ruínas do arraial de Canudos.**
A Guerra de Canudos aconteceu no sertão da Bahia entre 1896 e 1897 e colocou o Exército brasileiro contra os habitantes de um arraial chamado Belo Monte. O arraial era liderado por Antônio Conselheiro, um beato (líder religioso local) que se instalou na região em 1893, após participar de protestos contra o aumento de impostos que tinha acontecido desde a Proclamação da República.
O arraial, que ficou conhecido como Belo Monte, ficava às margens do rio Vaza-Barris e já era habitado. Com a chegada de Antônio Conselheiro, o local cresceu e chegou a possuir cerca de 24 mil habitantes.|1| Belo Monte transformou-se em um centro que trazia novas perspectivas de vida a uma população de ex-escravos carente e que não tinha acesso à terra.
A atuação de Antônio Conselheiro como líder religioso também foi extremamente importante e responsável por atrair milhares de pessoas à procura do beato, e isso fez de Canudos um centro de romaria. Canudos não era um arraial com estilo de vida igualitário, mas, nas palavras das historiadoras Lilia Schwarcz e Heloisa Starling, tratava-se “de uma experiência social e política distinta daquela do governo central republicano”.|2|
A liderança religiosa de Antônio Conselheiro apresentava-se como um risco à Igreja, devido a sua grande popularidade e à experiência social e política com traços de igualitarismo. Ambos aspectos representavam uma ameaçava às elites econômicas locais, que se baseavam no latifúndio e no domínio dos coronéis. Sendo assim, Canudos era um risco para as elites da Primeira República e, por isso, na ótica dessas elites, precisava ser eliminada.
Assim, foram organizadas expedições militares com o objetivo de destruir o arraial. A primeira expedição foi organizada pelo estado da Bahia e foi derrotada pela resistência formada em Canudos. As segunda e terceira expedições foram organizadas por tropas do Exército e também foram derrotadas, tendo inclusive seu comandante morto em combate.
Na quarta expedição, organizada a partir de abril de 1897, a tropa enviada era composta cerca de 6500 soldados (incluindo os oficiais) equipados com armamentos modernos — incluindo canhões. O resultado final foi Canudos arrasado. As tropas queimaram e dinamitaram o arraial, e os prisioneiros foram degolados.
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Guerra do Contestado (1912-1916)
A Guerra do Contestado aconteceu em uma área disputada pelos estados de Santa Catarina e Paraná entre 1912 e 1916. Assim como aconteceu em Canudos, na região do Contestado, uma série de sertanejos pobres e desalentados encontrou, no discurso de um líder religioso, chamado José Maria, uma alternativa para sua vida e passou a segui-lo.
O contexto em que ocorreu o Contestado era tenso. Primeiro, havia a disputa territorial entre Santa Catarina e Paraná. Além disso, parte da região contestada foi entregue para Percival Farquhar (um magnata conhecido por construir a ferrovia Madeira-Mamoré) para que construísse uma ferrovia que ligasse o Rio Grande do Sul a São Paulo.
No acordo de cessão de terras, a Farquhar também foram entregues terras num raio de 15 km da ferrovia, para que ele pudesse explorar a madeira disponível na região. Acontece que a região já era habitada por pessoas que viviam de uma agricultura de subsistência e da erva-mate. A empresa vinculada a Farquhar, responsável pela exploração da madeira nessas terras, organizou tropas de jagunços para expulsar os habitantes da área.
Além disso, milhares de trabalhadores da ferrovia perderam seus empregos, o que reforçou o grupo de pessoas pobres. A guerra em si começou em outubro de 1912, quando um grupo de pessoas lideradas por José Maria instalou-se em Irani, na região contestada pelos dois estados. O agrupamento de pessoas em Irani foi entendido pelo Paraná como uma invasão coordenada pelos catarinenses, e, assim, esse estado atacou os sertanejos. Nesse ataque, José Maria acabou sendo morto.
Após a morte de José Maria, o fervor religioso prosseguiu com os sertanejos fundando uma série de comunidades autônomas. A existência dessas comunidades era enxergada pelos coronéis locais como uma ameaça, e foi daí que se iniciou a repressão contra as comunidades autônomas formadas pelos sertanejos.
A raiz do conflito é explicada pelo historiador Paulo Pinheiro Machado da seguinte maneira:
Os episódios de perseguição policial contra o monge José Maria foram motivados pelo temor da concentração de gente pobre do campo. As autoridades locais e estaduais, em sua maioria grandes fazendeiros e oficiais da Guarda Nacional, sentiam que tinham como missão subjugar os sertanejos que não se submetiam mais aos seus respectivos coronéis. Formavam-se grupos autônomos, com fortes vínculos religiosos, nos quais expectativas místicas mesclavam-se à crítica social. Originalmente, essas comunidades não eram hostis nem militarizadas, mas seu anseio por independência despertou a ira dos governantes, da imprensa e dos fazendeiros.|3|
A Guerra do Contestado estendeu-se até janeiro de 1916 e foi responsável pela morte de cerca de 10 mil pessoas. As comunidades autônomas foram destruídas e, nas décadas seguintes, foi realizado um processo de branqueamento daquela região.
Revolta da Vacina (1904)
A Revolta da Vacina aconteceu entre 10 e 16 de novembro de 1904, na cidade do Rio de Janeiro, à época, capital do Brasil. A Revolta da Vacina foi uma revolta popular que aconteceu pela insatisfação da população por conta da violência do processo de sanitarização da capital. Naquele momento, o Rio de Janeiro passava por uma campanha de vacinação forçada da população contra a varíola.
O contexto da Revolta da Vacina no Rio de Janeiro era conturbado e teve como estopim a campanha de vacinação forçada. O Brasil, na época, era governado por Rodrigues Alves, e a capital, por ordem presidencial, passava por um processo de modernização e revitalização. Nesse processo, ordenou-se, por exemplo, o alargamento de uma série de avenidas da cidade.
O processo de revitalização, por sua vez, acontecia às custas da desocupação de milhares de pessoas do centro do Rio de Janeiro. As desocupações aconteciam de maneira violenta e eram realizadas exatamente para dar lugar às obras de modernização e revitalização. Junto disso foi realizada uma campanha de erradicação de doenças que afetavam intensamente o país naquele período, como a varíola e a febre amarela.
A campanha de vacinação era liderada pelo sanitarista Oswaldo Cruz, e a forma como ela foi conduzida aliada à falta de informação levaram a população a rebelar-se. As vacinações compulsórias aconteciam de maneira violenta, e, além disso, serviços, como matrícula em escolas, passaram a exigir cartão de vacinação.
O temor da população à vacinação levou a uma grande revolta nas ruas do Rio de Janeiro durante os dias citados. O resultado da revolta, além da destruição material na capital, foi a morte de 30 pessoas e mais de uma centena de feridos.
Revolta da Chibata (1910)
A Revolta da Chibata aconteceu em 1910 e teve como estopim a insatisfação dos marinheiros negros contra os castigos físicos a que eram sujeitos na corporação. No começo do século XX, a Marinha brasileira era uma instituição marcada pelo racismo, uma vez que os cargos mais baixos da corporação eram ocupados por negros e mestiços que eram punidos com chibatadas quando alguma regra era violada.
Em 1910, os marinheiros já haviam manifestado sua insatisfação contra as chibatadas quando alguém era punido. O estopim para a revolta dos marinheiros aconteceu quando Marcelino Rodrigues Menezes foi punido com 250 chibatadas sem ter direito a tratamento médico. Os marinheiros, insatisfeitos com os castigos físicos, o racismo e a desigualdade social, rebelaram-se.
Os marinheiros tomaram o controle de quatro embarcações da Marinha exigindo o fim dos castigos físicos. O líder dos revoltosos era João Cândido, conhecido também como Almirante Negro. Os membros da revolta redigiram um manifesto ao presidente Hermes da Fonseca e ameaçaram atacar o Rio de Janeiro caso não tivessem suas reivindicações atendidas.
A Revolta da Chibata foi duramente reprimida com milhares de marinheiros sendo dispensados. Outros acabaram sendo presos, torturados e enviados para a Ilha das Cobras, enquanto outros ainda foram enviados para trabalhar em seringais na Amazônia. Muitos dos que foram enviados para os seringais foram fuzilados no trajeto.
Outras revoltas
As quatro revoltas tratadas anteriormente foram apenas as revoltas mais conhecidas do período, pois, ao longo da Primeira República, diversas outras aconteceram em diferentes partes do Brasil, tais como:
Revoltas urbanas e rurais na República Velha
Muitos historiadores classificam as revoltas da República Velha (ou Primeira República) como rurais ou urbanas. No caso das revoltas rurais, o historiador Boris Fausto ainda afirma que elas podem ser classificadas de três maneiras distintas|4|:
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As que combinaram conteúdo religioso com carência social: Canudos e Revolta de Juazeiro.
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As que combinaram conteúdo religioso com reivindicação social: Contestado.
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As que expressaram reivindicações sociais sem conteúdo religioso: greves de trabalhadores rurais organizadas na década de 1910.
Dessa divisão de revoltas urbanas e revoltas rurais, segue um quadro abaixo que classifica algumas das que aconteceram durante a Primeira República.
Revoltas urbanas |
Revoltas rurais |
Revolta da Vacina |
Canudos |
Revolta da Chibata |
Contestado |
Revolta dos 18 do Forte de Copacabana |
Revolta de Juazeiro |
Greves operárias |
Cangaço |
|1| SCHWARCZ, Lilia Moritz e STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 333.
|2| Idem, p. 333.
|3| MACHADO, Paulo Pinheiro. Tragédia anunciada. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 7, nº 85, p. 18-19, out. 2012.
|4| FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2013, p. 253-254.
*Créditos da imagem: FGV/CPDOC
**Créditos da imagem: FGV/CPDOC
Por Daniel Neves
Graduado em História