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“A cartomante”, de Machado de Assis

“A cartomante” é um conto do escritor Machado de Assis. Essa narrativa realista traz a temática do adultério e, com ironia, critica o romantismo e a família burguesa.

O escritor Machado de Assis, autor do conto “A cartomante”. [1]
O escritor Machado de Assis, autor do conto “A cartomante”. [1]
Crédito da Imagem: shutterstock
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A cartomante” é um dos contos mais famosos do escritor Machado de Assis. Ele faz parte do livro Várias histórias (1896) e mostra um trágico desfecho para a relação extraconjugal entre os personagens Camilo e Rita. Assim, a temática do adultério, recorrente em narrativas do realismo, é utilizada como forma de criticar a família burguesa.

Sem idealizações, o narrador machadiano evidencia a traição praticada por Camilo, o qual é amante da esposa de Vilela, um amigo de infância. É feita a análise psicológica desse amante descrente, que zomba de Rita quando ela procura uma cartomante, mas acaba buscando o conforto da adivinha quando desconfia de que Vilela planeja uma sangrenta vingança.

Leia também: Bons dias! — análise desse livro de contos de Machado de Assis

Tópicos deste artigo

Resumo de “A cartomante”

  • O conto “A cartomante” fala do triângulo amoroso entre Camilo, Rita e Vilela.

  • Vilela e Camilo são amigos de infância, porém, Camilo se torna amante de Rita, a esposa do amigo.

  • Depois de receber uma carta anônima, Camilo decide se afastar da casa de Vilela.

  • O afastamento do amante faz com que Rita busque uma cartomante, que a reconforta.

  • Ao saber da consulta, Camilo zomba de Rita, pois ele não acredita em nada.

  • Ao receber um bilhete do amigo, Camilo desconfia de que ele sabe da verdade e pressente um desfecho trágico.

  • Para se acalmar, procura a cartomante, que afirma que o marido traído ignora a traição.

  • Ao chegar à casa de Vilela, Camilo descobre que o marido matou a esposa e morre com dois tiros de revólver.

Videoaula sobre “A cartomante”

Análise da obra “A cartomante”

  • Enredo da obra “A cartomante”

Camilo, funcionário público, e Vilela, um advogado, são amigos desde a infância. Após o casamento de Vilela, um triângulo amoroso se faz. Rita é mais velha, tem 30 anos de idade. Vilela tem 29, e Camilo, 26. Camilo e a amante têm afinidades: “Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios.”

Porém, um dia Camilo recebe uma carta anônima, “que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos”. Com medo, passa a ir menos à casa do amigo, até que “as visitas cessaram inteiramente”. Então Rita, desconfiada das ausências do amante, decide buscar uma cartomante, e isso é motivo para que Camilo zombe dela.

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Segundo Rita, a cartomante adivinhou que ela gostava de uma pessoa e que tinha medo de que Camilo (a tal pessoa) a esquecesse. Ele a adverte, diz que é “imprudente andar por essas casas”. Afinal, Vilela pode ficar sabendo... Camilo, ao contrário de Rita, não acredita em cartomantes.

Já foi “supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram”. Por fim, o narrador afirma que “Camilo não acreditava em nada”. Os amantes costumam se encontrar em uma casa na rua dos Barbonos. Após a visita de Rita à cartomante, “Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas”.

Tempos depois, Vilela parece sombrio e desconfiado, segundo a esposa. Então Camilo recebe um bilhete dele, que diz: “Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora”. É mais de meio-dia. Camilo começa a imaginar que Vilela o espera para lavar sua honra com sangue. E, cheio de medo e preocupação, segue em direção à casa do amigo traído.

No caminho, nota que está perto da casa da cartomante. O desespero o leva a consultar a mulher. Ela logo prevê que ele teve “um grande susto” e “quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma coisa ou não...”. Nesse ponto, Camilo, acreditando nas palavras da cartomante, explica: “A mim e a ela”.

Após consultar as cartas, a cartomante diz que ele não precisa ter medo, pois nada “aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo”. Camilo fica tão satisfeito que, em vez de dois mil-réis, paga dez mil-réis à cartomante. E, assim, despreocupadamente, chega à casa de Vilela, que logo abre a porta.

Vilela, com “as feições decompostas”, faz um sinal, indicando ao amigo uma “saleta interior”. Quando entram nela, “Camilo não pôde sufocar um grito de terror” ao ver Rita “morta e ensanguentada”. Então, “Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão”.|1|

  • Personagens da obra “A cartomante”

    • Rita

    • Camilo

    • Vilela

    • A cartomante

  • Tempo da obra “A cartomante”

A história se passa no ano de 1869 e apresenta tempo cronológico.

  • Espaço da obra “A cartomante”

A narrativa está ambientada na cidade do Rio de Janeiro.

  • Narrador da obra “A cartomante”

O narrador do conto “A cartomante” é onisciente, conhece pormenores da história e de seus personagens.

Leia também: O alienista — análise dessa obra machadiana que conta a história de Simão Bacamarte

Características da obra “A cartomante”

“A cartomante” é um conto de Machado de Assis e faz parte da obra Várias histórias, livro publicado, pela primeira vez, em 1896. Desse modo, é uma narrativa do realismo brasileiro e apresenta, como principal temática, o adultério. O conto possui caráter antirromântico e recorre ao monólogo interior, de forma a fazer a análise psicológica do personagem Camilo.

Trechos de “A cartomante”

“Hamlet observa a Horácio que há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras.”

“[...]. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente, e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as coisas que o cercam.”

“Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura; mas a batalha foi curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro.”

“Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas, diante dos olhos, fixas; ou então, — o que era ainda pior, — eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. ‘Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora.’ Ditas assim, pela voz do outro, tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo.”

“A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar... Camilo achou-se diante de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas coisas. A voz da mãe repetia-lhe uma porção de casos extraordinários: e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: ‘Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a filosofia...’ Que perdia ele, se...?”

“E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer coisa; parece que formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro.”

“A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.”|2|

Machado de Assis

Machado de Assis (Joaquim Maria Machado de Assis) nasceu em 21 de junho de 1839, na cidade do Rio de Janeiro. Negro e de origem pobre, precisou vencer preconceitos para se tornar um dos mais importantes autores brasileiros. Também trabalhou como aprendiz de tipógrafo, revisor, tradutor e funcionário público.

Machado de Assis
Machado de Assis é um dos maiores nomes, senão o maior, da literatura brasileira. [2]

Além de ser romancista, contista, dramaturgo e poeta, escreveu crônicas para diversos periódicos da época. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e o seu primeiro presidente. O escritor, que faleceu em 29 de setembro de 1908, no Rio de Janeiro, também recebeu o título de Oficial da Ordem da Rosa.

Notas

|1| e |2| MACHADO DE ASSIS. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v. 2.

Créditos das imagens

[1] mark designers / Shutterstock

[2] Arquivo Nacional / Domínio público (reprodução)

 

Por Warley Souza
Professor de Literatura 

Escritor do artigo
Escrito por: Warley Souza Professor de Português e Literatura, com licenciatura e mestrado em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

SOUZA, Warley. "“A cartomante”, de Machado de Assis"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/biografia-machado-assis.htm. Acesso em 29 de março de 2025.

De estudante para estudante


Videoaulas


Lista de exercícios


Exercício 1

(UFPI-PI)

“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.

O enunciado acima se refere a uma das obras de Machado de Assis intitulada:

a - Dom Casmurro
b – Memorial de Aires
c – Memórias póstumas de Brás Cubas
d - Quincas Borba
e – Esaú e Jacó

Exercício 2

ESAM-RN

“gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou. Daí, vem, talvez, a tristeza inconsolável dos que sabem os seus mortos na vala comum; parece-lhes que a podridão anônima os alcança a eles mesmos.”

Podemos dizer que o trecho acima pertence ao Realismo, já que apresenta as seguintes características:

a – dúvida em torno da validade da religião; descaso pelo homem como ser socializado; apologia dos sentimentos nobres.

b –descrença dos sentimentos humanos; morbidez em face do amor; conformismo diante da fragilidade do ser humano;

c –apologia do materialismo; desprezo pela atitude místico-religiosa dos homens; passividade diante da contínua presença da morte;

d –visão materialista do mundo; desprezo pelos valores sociais estabelecidos; desprezo pelo homem e pela vida;

e –ausência de visão sentimentalista do mundo; descrença em valores religiosos, consciência da fragilidade oral e física do ser humano.

Exercício 3

Machado de Assis, embora considerado um escritor que trabalhou uma ideologia muito mais evoluída, uma vez comparada a dos outros representantes que pertenceram à época realista, deixou algumas “pegadas” que tão bem evidenciaram os rumores de um novo tempo, tempo esse em detrimento, sobretudo aos moldes românticos. Procure, dessa forma, evidenciar algumas dessas características.

Exercício 4

Falar sobre Machado de Assis, sem sombra de dúvida, requer tempo e argumentos, dada a preciosidade artística desse nobre representante de nossas letras. Assim, procure evidenciar, ainda que em simples linhas, um pouco das características inerentes ao trabalho que ele desenvolveu, o qual nos rendeu um legado cultural sem margens para discussões.

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