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Os bárbaros eram, na ótica grega, todos os povos que não falavam o idioma grego e nem compartilhavam da mesma cultura e modo de organização da sociedade grega. O termo foi assimilado pelos romanos e tornou-se um sinônimo para referir-se aos povos estrangeiros de forma estereotipada.
Os germânicos foram rotulados como bárbaros no mundo romano. Eram povos que habitavam o norte da Europa, em uma região conhecida como Germânia. Os germânicos eram formados por diversos povos que, a partir do século III d.C., começaram a migrar e invadir as terras do Império Romano do Ocidente.
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Origem do termo bárbaro
A palavra bárbaro surgiu no idioma grego para referir-se a todos os povos que não falavam o idioma grego e não partilhavam da mesma cultura e forma de organização social e política dos gregos. O termo era, portanto, utilizado por eles para expressar seu desprezo pelas culturas alheias, indicando que elas não eram “avançadas” o suficiente.
A primeira menção à palavra bárbaros (no grego, barbaros ou Βάρβαρος) de que se tem conhecimento foi registrada na Ilíada, escrita por Homero. Nessa obra, o termo foi utilizado para referir-se à fala dos cários (diferente do idioma dos gregos), povo que habitava a região da Ásia Menor.
Acredita-se que foi a partir do século V a.C. que o termo bárbaro começou a ser de fato utilizado para referir-se às diferenças entre gregos e não gregos de maneira geral, não se resumindo apenas ao idioma. Isso porque, na cultura, além do idioma, ele foi usado para estabelecer critérios de diferenciação entre gregos e não gregos.
O termo ganhou um sentido estereotipado e, até mesmo, hostil a partir das Guerras Médicas. Por conta da guerra, o estrangeiro, nesse sentido o não grego, passou de fato a não ser bem recebido pelos gregos. Com isso, os bárbaros tornaram-se, na cultura grega, sinônimo de tudo que era indesejado e foram vistos como “incultos” e “incivilizados” (entendendo-se por civilização o modo de vida desenvolvido pelos próprios gregos).
Sendo assim, os primeiros povos chamados de bárbaros nessa perspectiva grega que enxergava o outro como “selvagem” e “primitivo” foram os persas. A designação, no entanto, poderia ser usada para outros povos não gregos, como os egípcios, os celtas, os fenícios, os trácios e muitos outros.
O termo bárbaro explica-se porque, aos ouvidos dos gregos, os idiomas de povos estrangeiros eram entendidos com uma sonoridade parecida com “bar bar bar”. Assim, a palavra bárbara é classificada como uma reduplicação onomatopaica, segundo a pesquisadora Ioannis Petropoulos|1|.
Com o tempo, a palavra foi assimilada pelos romanos, fortemente influenciados pela cultura grega. Assim, para eles, a palavra passou a ser utilizada no mesmo sentido dos gregos. Dessa forma, todos os povos que não possuíam a cultura grega ou romana eram considerados bárbaros e estereotipados como “incivilizados”, “incultos”, “primitivos” etc.
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Povos germânicos
Dentro da história romana, o termo bárbaro associou-se diretamente com os povos germânicos, que habitavam o norte da Europa e que, a partir do século II a.C., mantiveram contato frequente com os romanos. Os germânicos eram entendidos como bárbaros porque falavam idiomas diferentes e tinham organização política, social e econômica bem diferente da praticada pelos romanos.
Para os romanos, todo aquele que habitasse além das fronteiras de seu império era um bárbaro. No caso dos germânicos, essa fronteira estava estabelecida nos rios Reno e Danúbio. Todos os que habitavam as regiões além desses rios eram germânicos e, na ótica romana, bárbaros. A região para além desses rios ficou conhecida para os romanos como Germânia.
Acredita-se que o primeiro romano a identificar esses povos como germânicos tenha sido Júlio César, durante as guerras contra os gauleses. Ele, em seus relatos, começou a referir-se aos povos que habitavam além do Reno como germani. César usou essa nomenclatura para diferenciar os cimbros e os suevos dos povos celtas.
A classificação utilizada por Júlio César acabou sendo replicada por outros intelectuais romanos, como Tácito, historiador e político romano conhecido por escrever um livro relatando o modo de vida dos povos germânicos.
Como podemos identificar aqui, os povos germânicos, portanto, não foram apenas um povo, mas sim diversos povos reunidos pelos romanos dentro do mesmo grupo étnico. De fato, existia uma consanguinidade entre os germânicos, mas cada grupo organizava uma grande confederação militar que formava um povo germânico diferente do outro.
Entre os povos germânicos, podem ser citados:
Os germânicos tiveram muita relação com os romanos porque mantiveram contatos pacíficos e hostis com eles, principalmente a partir do século I d.C. Daí em diante, sobretudo nas regiões de fronteira, houve uma grande assimilação dos povos germânicos, pois os romanos cediam terra para eles em troca dos serviços militares e da manutenção da paz.
Os germânicos, em geral, eram seminômades e viviam do pastoreio e agricultura, praticando também o comércio vendendo escravizados, âmbar e outros tipos de mercadoria e adquirindo objetos como vidro e metais, por exemplo. Os germânicos tinham uma organização tribal e patriarcal que determinava que o líder seria o chefe militar, o guerreiro mais poderoso.
Diferentemente do que o senso comum estabeleceu, os germânicos não eram povos que tinham na guerra sua única habilidade. O historiador Jacques Le Goff afirmou que esses povos assimilaram muitas habilidades e técnicas durante seus deslocamentos|2|. Dos romanos, por exemplo, eles adquiriram o hábito de cunhar moedas.
Além disso, sabe-se que, em alguns povos germânicos, existiam leis que estabeleciam critérios para punir pessoas que mantinham uma conduta inadequada. Nessas leis estabeleciam-se multas para pessoas que cometessem algum delito e critérios para resolução de conflitos e a manutenção da paz interna. Acredita-se que elas tenham começado a ser elaboradas a partir do século III d.C.
Ainda assim, havia conflitos entre os povos germânicos, e o historiador romano Tácito registrou como os desentendimentos entre eles facilitavam o trabalho de assimilação e conquista realizado pelos romanos|3|.
Como mencionado, a relação entre romanos e germânicos nem sempre foi pacífica, e um dos grandes exemplos disso foi a Batalha da Floresta de Teutoburgo, que aconteceu em 9 d.C. Nessa batalha, os romanos, liderados por Públio Quintílio Varo, sofreram uma das maiores derrotas da história romana e três legiões foram destruídas por Armínio, líder dos queruscos.
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Invasões germânicas
Até o século III d.C., os povos germânicos ficavam em limes, região fronteiriça do Império Romano. A partir desse século, os diferentes povos germânicos começaram a mover-se e a migrar para dentro das terras romanas. Isso acabou precipitando o fim do Império Romano do Ocidente, uma vez que nessas terras estabeleceram-se diferentes povos estrangeiros.
Os historiadores especulam que três fatores podem ter sido cruciais para as migrações germânicas. Havia a procura por terras mais fertéis e a procura por locais com climas mais amenos para que pudessem estabelecer-se. Por fim, a chegada dos hunos, um povo vindo da Ásia Central, teria sido o terceiro fator. Os hunos eram temidos, e sua chegada teria disseminado pânico e feito com que diferentes povos começassem a migrar para fugir deles.
Com isso, diferentes povos estabeleceram-se em diferentes locais do Império Romano do Ocidente. Anglos e saxões foram para a Bretanha; francos estabeleceram-se na Gália; visigodos e suevos, na Península Ibérica; vândalos, no norte da África; ostrogodos, no norte da Península Itálica. O estabelecimento dos reinos germânicos contribuiu para acelerar o processo de assimilação cultural de romanos e germânicos que marcou a Europa na Idade Média. Caso queria aprofundar-se no estudo desse grande movimento migratório, leia: Invansões bárbaras.
Notas
|1| PETROPOULOS, Ioannis. Desconstruindo o conceito de bárbaro com a ajuda de Kaváfis. Para acessar, clique aqui.
|2| LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente medieval. Petropólis: Vozes, 2016. p. 23-24.
|3| GONÇALVES, Ana Teresa Marques. A construção da imagem do outro: romanos, germanos nas fronteiras do Império; uma análise da Germânia de Tácito. Para acessar, clique aqui.
Por Daniel Neves
Professor de História