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A peste negra é como ficou conhecida a peste bubônica, doença causada pela bactéria Yersinia pestis, que atingiu o continente europeu em meados do século XIV. Os historiadores acreditam que a doença surgiu em algum lugar da Ásia Central e foi levada por genoveses para o continente europeu.
O resultado foi catastrófico, pois a doença atingiu praticamente todo o continente e resultou na morte de milhões de pessoas. As estimativas mais tradicionais falam que cerca de 1/3 da população europeia morreu por causa da crise de peste negra, mas algumas estatísticas sugerem que a quantidade de mortos possa ter ultrapassado a metade da população europeia.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Onde surgiu a peste negra?
- 2 - Difusão da peste negra pela Europa
- 3 - Como era a vida das pessoas durante a peste negra?
- 4 - Sintomas da peste negra
- 5 - Consequências
Onde surgiu a peste negra?
A peste bubônica é uma doença causada pelo Yersinia pestis, uma bactéria que é encontrada em pulgas que ficam em ratos contaminados. Quando as pulgas contaminadas têm contato com seres humanos, a transmissão da doença acontece. A partir daí, a peste pode ser transmitida de humano para humano pelas secreções do corpo ou pela via respiratória.
Os historiadores acreditam que a peste negra surgiu na Ásia Central. Existem inúmeras teorias sobre o lugar específico onde a doença surgiu, mas a mais aceita sugere que o lugar de origem é a China e que, durante muito tempo, a peste tenha atuado exclusivamente na Ásia Central. A partir do século XIV, ela se espalhou por terra e por mar pelo Oriente.
Regiões como a Mongólia, parte da China, Síria, Mesopotâmia e Egito teriam sido atingidas no começo do século XIV, causando a morte de cerca de 24 milhões de pessoas nesses locais|1|. A doença teve contato com os europeus por meio de um conflito que aconteceu em Caffa, colônia genovesa localizada na Crimeia (região atualmente disputada por Ucrânia e Rússia).
Em 1343, Caffa foi sitiada por tropas tártaras do Canato da Horda Dourada. O conflito seguiu com interrupções até que, em 1346, as tropas tártaras foram dizimadas por um surto de peste negra. Os tártaros decidiram utilizar a doença como arma e lançaram cadáveres contaminados para dentro da cidade.
O resultado foi imediato e a cidade de Caffa também começou a sucumbir perante o surto de peste. Fugindo da doença, genovenses começaram a abandonar Caffa, retornando para a Península Itálica. Nesse retorno, os genoveses levaram a enfermidade para locais como Constantinopla, Gênova e Marselha, o que resultou na disseminação por todo o continente europeu.
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Difusão da peste negra pela Europa
A partir dos portos no litoral mediterrâneo, a peste negra difundiu-se pela Europa. Em 1347, a doença chegou à Sicília, ilha ao sul da Península Itálica; em 1348, chegou a Marselha, sul da França; em 1349, alcançou Gênova e o norte da Itália e, partir daí, espalhou-se por toda a Europa.
A difusão dessa doença levou morte por toda o continente europeu, uma vez que ninguém sabia o que a causava. Isso naturalmente fez surgir todo tipo de especulação a respeito das causas da peste. Alguns falavam que era um castigo divino, por exemplo; outros acusavam os judeus de serem os responsáveis.
Logo os europeus identificaram que a doença era altamente contagiosa. Uma das formas de contágio é a respiratória, assim, uma pessoa infectada pode facilmente transmitir por via respiratória ou por suas roupas, por exemplo, a doença para outros. A peste negra atuava de maneira fulminante, e a pessoa que a contraía falecia em questão de dias.
A peste transmitida pela via respiratória é conhecida como peste pneumônica. Segundo o historiador Hilário Franco Júnior, a pessoa doente falecia em até três dias depois de contraí-la|2|. Já o historiador Jacques Le Goff fala que muitas das pessoas que demonstravam os sintomas da peste faleciam dentro de 24 horas após manifestar os primeiros sinais|3|.
Como era a vida das pessoas durante a peste negra?
A difusão da peste negra resultou na morte de milhares de pessoas. A doença espalhou-se por cidades e pelo campo, embora tivesse ação mais mortal nos grandes centros urbanos. Locais inteiros foram devastados, e o caos disseminou-se. Algumas regiões da Europa começaram a perseguir os doentes, isolando os que adoeciam para deixá-los morrer. Em alguns casos, os doentes eram executados.
O escritor italiano Giovanni Boccaccio presenciou a peste negra com seus próprios olhos e deixou relatos a respeito do que viu. Ele falou dos sintomas, do alto grau de contágio da doença, mas também abordou o desmoronamento da ordem com a disseminação da peste, pois muitas das autoridades foram contaminadas e, eventualmente, faleciam. O relato de Boccaccio concentra-se no que ele presenciou em Florença, cidade italiana.
Boccaccio também falou das diferentes reações que as pessoas tiveram no período de crise da doença. Ele relata que muitos procuraram o isolamento, evitando manter qualquer tipo de contato com pessoas, sobretudo os que estavam doentes. Aqueles que eram mais ricos e possuíam propriedades de campo, fugiram das cidades e foram abrigar-se nesses locais afastados.
Com o tempo, os médicos perceberam que o contato com os doentes e com os corpos dos mortos não deveria acontecer. Com isso, os doentes eram isolados e o contato com eles era limitado àqueles que realizavam o tratamento médico. Padres também mantinham contato com os acometidos, principalmente porque realizavam os ritos religiosos relacionados com o perdão dos pecados e o funeral.
Essa percepção de que o contato com os doentes contribuía para disseminar a doença fez com que as famílias parassem de se reunir à beira daqueles que estavam doentes. Reuniões de funerais também acabaram deixando de acontecer, e os que tratavam dos doentes passaram a utilizar roupas específicas, feitas de couro, para impedir que as secreções dos doentes penetrassem no tecido. Os médicos também passaram a utilizar uma máscara em forma de bico de pássaro, que era preenchido com ervas aromáticas. Acreditava-se que essas roupas evitavam a contaminação.
Os padres foram um dos grupos que mais sofreram, pois tinham contato direto com os doentes e com os corpos dos que faleciam. Como muitos dos padres viviam em mosteiros, locais que havia uma grande aglomeração de religiosos – muitos em idade avançada –, quando um padre contraía a doença, ela era rapidamente transmitida para outros.
A historiadora Tamara Quírico trouxe um relato de um cenóbio (residência de monges), em Florença, onde cerca de ¾ dos religiosos que habitavam lá faleceram em decorrência da peste|5|. Isso afetava os rituais funerários praticados, uma vez que não havia sacerdotes para atender a quantidade de mortos.
Além de não haver sacerdotes suficientes, não existiam coveiros, e os sepultamentos começaram a ser realizados em massa, isto é, em valas comuns, tamanha a quantidade de pessoas que morriam. Todavia, com a percepção de que os cadáveres também eram vetores de contaminação, muitos passaram a abandonar as práticas de sepultamento e começaram a incendiar os corpos dos falecidos. Até as roupas utilizadas pelos doenças e outros itens começaram a ser queimados.
Como já mencionado, muitas autoridades começaram a impor certo isolamento para evitar a propagação da doença. O cirurgião Guy de Chauliac, de Avignon, na França, falava que pais não podiam visitar seus filhos e vice-versa em razão do alto risco de contágio. Boccaccio relatou também que algumas obras para melhorar a limpeza e condições de higiene da cidade e a proibição da entrada de doentes também ocorreram em Florença|4|.
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Sintomas da peste negra
O médico Drauzio Varella afirma que a peste negra pode causar febre de 41° graus, além de vômitos com a presença de sangue e complicações no pulmão. Para os que tinham problemas pulmonares, a morte era praticamente garantida|6|. Boccaccio também deixou alguns relatos a respeito de como a doença se manifestava nas pessoas. Ele diz que a peste começava:
[…] com o surgimento de certas tumefações na virilha ou nas axilas de homens e mulheres, algumas das quais atingiam o tamanho de uma maçã comum e outras o de um ovo, umas mais e outras menos, e a elas o povo dava o nome de bubões. E os referidos bubões mortíferos, não se limitando às duas citadas partes do corpo, em breve espaço de tempo começaram a nascer e a surgir indiferentemente em todas as outras partes, após o que a qualidade da enfermidade começou a mudar, passando a manchas negras ou lívidas, que em muitos surgiam nos braços, nas coxas e em qualquer outra parte do corpo, umas grandes e ralas, outras diminutas e espessas. E, tal como ocorrera e ainda ocorria com o bubão, tais manchas eram indício inegável de morte próxima para todos aqueles em quem aparecessem|4|.
Por meio desse relato, podemos perceber que as regiões inchadas do corpo por causa da doença eram chamadas de bubões, por isso peste bubônica. A expressão peste negra, por sua vez, faz referência às manchas pretas que apareciam no corpo das vítimas que contraíam a doença.
Consequências
O primeiro e o maior surto de peste negra ocorreu entre 1348 e 1350, mas outros surtos aconteceram ao longo de todo o século XIV. A peste foi uma doença que esteve presente na vida dos europeus até 1720, quando o último surto foi registrado em Marselha, na França. A atuação da doença na Europa ao longo do século XIV contribuiu para uma redução populacional drástica.
As estimativas tradicionais falam que a enfermidade foi responsável pela redução de 1/3 da população do continente europeu, mas alguns historiadores, como Jacques Le Goff, têm trazido novos dados, demonstrando que a quantidade de mortos possa ter sido maior que isso. Le Goff fala que entre metade e 2/3 da população europeia possa ter morrido por causa da doença e, em alguns locais, como a Inglaterra, ele sugere que a mortalidade esteve na casa dos 70%|7|.
Notas
|1| REZENDE, Joffre Marcondes de. As grandes epidemias da história. Para acessar, clique aqui.
|2| JÚNIOR, Hilário Franco. A Idade Média: nascimento do Ocidente. São Paulo: Brasiliense, 2006, p. 29.
|3| LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 227.
|4| BOCCACCIO, Giovanni. Decameron. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2013.
|5| QUÍRICO, Tamara. Peste Negra e escatologia: os efeitos da expectativa da morte sobre a religiosidade do século XIV. Para acessar, clique aqui.
|6| A Peste Negra. Para acessar, clique aqui.
|7| LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 228.
Créditos da imagem:
[1] matrioshka e Shutterstock
Por Daniel Neves Silva
Professor de História