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Artur Costa e Silva foi o segundo presidente do Brasil durante o período da Ditadura Militar, governando o país de 1967 a 1969. O governo de Costa e Silva marca o início das medidas desenvolvimentistas que levaram ao “milagre econômico”, além de ter sido marcado por ter iniciado os “anos de chumbo”, período de maior repressão da Ditadura Militar.
Tópicos deste artigo
- 1 - Governo Costa e Silva
- 2 - Política econômica
- 3 - A oposição cresce
- 4 - Ato Institucional nº 5
- 5 - Fim do governo Costa e Silva
Governo Costa e Silva
Artur Costa e Silva assumiu a presidência no dia 15 de março de 1967, após vencer a eleição indireta que foi disputada em 1966 e do qual ele foi o único candidato. A vitória de Costa e Silva para assumir a presidência foi resultado de uma campanha no interior do próprio Exército para que o aparato de repressão da Ditadura aumentasse.
O governo de seu antecessor, Castello Branco, é erroneamente enxergado como um momento de pouca repressão, mas, na verdade, estudos recentes mostram que se tratou de um período de transição no qual o aparato repressivo era estabelecido de uma maneira que não causasse ruptura do regime com a sociedade civil.
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Ainda assim, Castello Branco se viu pressionado pelas Forças Armadas a deixar o poder, e a transição foi realizada com a indicação de Costa e Silva. Paradoxalmente, a eleição de Costa e Silva foi enxergada por determinados elementos da sociedade como uma esperança de liberalização do regime, e o próprio marechal afirmava que prepararia uma “democracia autenticamente nossa”.1
Apesar do discurso, o governo Costa e Silva consolidou a transição para o período mais repressivo da ditadura, ampliando o aparato repressor do movimento, perseguindo movimentos estudantis e operários e concluindo esse processo com o decreto do Ato Institucional nº 5 no final do ano de 1968.
Política econômica
O governo Costa e Silva rompeu, em parte, com a política econômica do governo anterior. O antecessor Castello Branco teve uma política econômica caracterizada pelo arrocho, com congelamento de salários e dos gastos governamentais e redução do crédito visando diminuir o consumo e, consequentemente, a inflação. Castello Branco tomou medidas duras, principalmente sobre o salário do trabalhador, o que fazia o reajuste salarial ser sempre menor em relação à inflação do ano anterior.
A partir do governo Costa e Silva teve início uma política econômica desenvolvimentista, ou seja, que promovesse um rápido desenvolvimento econômico do país, em moldes parecidos aos aplicados na década de 1950, mas com outra inspiração ideológica. Além disso, a política econômica de Costa e Silva visava estimular o consumo e o investimento público.
Essa política inaugurada por Costa e Silva em 1967 deu nascimento ao período conhecido como “milagre econômico”, que se estendeu de 1968 a 1973. Tal período ficou caracterizado por um rápido aquecimento da economia e índices de crescimento econômico bastante elevados. A respeito do “milagre econômico”, as historiadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling fazem a seguinte consideração:
O milagre tinha explicação terrena. Misturava, com a repressão aos opositores, a censura aos jornais e demais meios de comunicação, de modo a impedir a veiculação de críticas à política econômica, e acrescentava os ingredientes da pauta dessa política: subsídio governamental e diversificação das exportações, desnacionalização da economia com a entrada crescente de empresas estrangeiras no mercado, controle do reajuste de preços e fixação centralizada dos reajustes de salários.2
Os resultados para a economia durante o “milagre econômico” foram expressivos: em 1968, o PIB cresceu 11,2%, e em 1969 o crescimento foi de 10%3, mas o preço a ser pago foi altíssimo. Nesse período aconteceu um acentuado processo de concentração de renda, intensificando a desigualdade da sociedade e o endividamento governamental, que começou a disparar.
A oposição cresce
A partir de 1967, a oposição ao regime cresceu em diversas frentes e se organizou. O resultado foi um iminente confronto entre o governo e estes grupos de oposição, o que levou ao endurecimento do regime, consolidando um processo que estava em curso desde a posse de Castello Branco, em 1964.
No campo político, quadros importantes que haviam apoiado o golpe começavam a romper com o regime. Entre eles se destacam Ademar de Barros e Carlos Lacerda, dois nomes do conservadorismo brasileiro que apoiaram abertamente o golpe em 1964. Carlos Lacerda inclusive chegou a afirmar: “Eu tinha o dever de mobilizar o povo para corrigir esse erro do qual […] participei.4
A ação tomada por Carlos Lacerda foi organizar a Frente Ampla, que teve atuação durante os anos do governo de Costa e Silva. A Frente Ampla foi um movimento político que defendia basicamente o retorno do Brasil à democracia, além de propor a continuidade de uma política econômica que promovesse o desenvolvimento do país.
A Frente Ampla contou com o apoio de Juscelino Kubitschek e João Goulart – ambos duramente criticados por Lacerda durante seus governos. Na perspectiva da Frente Ampla, deveriam ser realizadas novas eleições presidenciais, com o combate à ameaça que rondava o país – a ditadura. Proibida de atuar a partir de 1968, a Frente Ampla representou um esforço de Carlos Lacerda para criar uma ponte de diálogo com o regime com o objetivo de redemocratizar o país.
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O movimento estudantil durante o ciclo 1967/1968 teve atuação extremamente relevante na luta contra o regime. Os protestos fortaleceram-se a partir de março de 1968, quando o estudante Edson Luís foi morto pela polícia durante um pequeno protesto na cidade do Rio de Janeiro. Esse fato causou comoção, e o velório dele foi acompanhado por milhares de pessoas.
Iniciou-se então uma série de protestos gigantescos, que se estenderam até meados de julho de 1968. Os protestos dos meses seguintes foram duramente reprimidos pela polícia e os confrontos com os estudantes, bastante violentos. Um momento marcante aconteceu em 26 de junho, no que ficou conhecido como Passeata dos Cem Mil, que contou com ampla participação de estudantes, artistas e intelectuais.
A resposta do governo foi a repressão: em julho foi proibida a realização de protestos, e em agosto houve a invasão da Universidade de Brasília (UnB). O endurecimento dessa repressão fez com que diversos grupos estudantis aderissem à luta armada como forma de resistência ao regime.
Por fim, outro movimento de oposição que atuou de maneira consistente durante um certo período do governo de Artur Costa e Silva foi o movimento operário. O congelamento salarial implementado a partir de 1964 teve forte impacto sobre a renda do trabalhador. A continuidade dessa situação levou a duas importantes greves no país: uma em Minas Gerais e outra em São Paulo.
A greve em Minas começou em abril de 1968, em uma siderúrgica instalada em Contagem (região metropolitana de BH). O movimento pegou o governo de surpresa e mobilizou cerca de 16 mil trabalhadores. O governo foi obrigado a negociar e aceitou reajustar os salários em 10%, mas ainda assim houve repressão, com prisão de trabalhadores e ocupação da cidade de Contagem.
Três meses depois, outra greve estourou em Osasco, no estado de São Paulo, e foi iniciada com 10 mil trabalhadores cruzando os braços. Dessa vez, o governo não negociou e a repressão foi duríssima: a cidade foi ocupada, com centenas de trabalhadores presos, e as lideranças sindicais precisaram desaparecer na clandestinidade. A repressão do governo fez com que o movimento operário adormecesse durante uma década.
Ato Institucional nº 5
A resposta do regime ao fortalecimento dos movimentos de oposição foi a institucionalização da repressão. O Ato Institucional nº 5 (mais conhecido como AI-5) foi decretado em 13 de dezembro de 1968. O estopim para seu decreto foi a ação dos parlamentares em se opor à punição ao deputado Márcio Moreira Alves.
Em setembro de 1968, esse deputado havia criticado o regime chamando o Exército de “valhacouto de torturadores” (equivalente a asilo, refúgio, abrigo de torturadores). O governo exigiu que o político fosse processado, mas a ação governamental foi derrotada na Câmara dos Deputados por 216 votos contra 141 votos5. Com a ameaça de que o regime perdesse o controle sobre os quadros políticos, a resposta foi o endurecimento.
A reunião que definiu o decreto do AI-5 ficou conhecida como “Missa negra”, e o Ato Institucional foi lido em rádio para todo o país pelo ministro da Justiça, Gama e Silva. Lilia Schwarcz e Heloísa Starling definem esse Ato Institucional da seguinte maneira: “O AI-5 era uma ferramenta de intimidação pelo medo, não tinha prazo de vigência e seria empregado pela ditadura contra a oposição e a discordância”.6
Fim do governo Costa e Silva
O governo de Artur Costa e Silva estendeu-se até março de 1969, quando o presidente militar sofreu um derrame que o afastou definitivamente da presidência. Em consequência desse episódio, ele veio a falecer poucos meses depois. Até outubro de 1969, o Brasil foi governado por uma Junta Militar Provisória, que transmitiu o poder para Emílio Garrastazu Médici.
*Créditos da imagem: FGV / CPDOC
1NAPOLITANO, Marcos. 1964: história do regime militar. São Paulo: Contexto, 2016, p. 86.
2 SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 452-453.
3 FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2013, p. 411.
4 NAPOLITANO, Marcos. 1964: 1964: história do regime militar. São Paulo: Contexto, 2016, p. 84.
5 Idem, p. 93
6 SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 455.
Por Daniel Neves Silva
Professor de História