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Anos de chumbo é a expressão usada em referência ao período entre o fim da década de 1960 e início da década seguinte no Brasil. Nesse período o Brasil foi governado, na maior parte do tempo, pelo presidente Médici, considerado um representante dos militares linha dura.
Durante os anos de chumbo, houve grande repressão aos grupos que se opunham à ditadura, com assassinatos, prisões ilegais e torturas. Foi nesse período também que a censura se ampliou no país.
Concomitantemente aos anos de chumbo, ocorreu o milagre econômico, momento de grande desenvolvimento da economia brasileira. Com o fim dele, e as denúncias sobre os crimes cometidos pelos militares, os anos de chumbo terminaram. Eleito indiretamente em 1974, Geisel deu início à abertura política do Brasil.
Leia também: Atos institucionais — decretos de força constitucional utilizados na Ditadura Militar
Tópicos deste artigo
- 1 - Resumo sobre os anos de chumbo
- 2 - O que foram os anos de chumbo?
- 3 - Contexto histórico dos anos de chumbo
- 4 - Origem do termo anos de chumbo
- 5 - Anos de chumbo no Brasil
- 6 - Anos de chumbo no mundo
- 7 - Consequência dos anos de chumbo
- 8 - Exercícios resolvidos sobre os anos de chumbo
Resumo sobre os anos de chumbo
- O termo anos de chumbo passou a ser utilizado na década de 1980 para designar momentos de grande violência na sociedade motivados por questões políticas.
- No Brasil, os anos de chumbo ocorreram entre 1968 e 1974. O período foi marcado como o de maior violência e censura durante toda Ditadura Civil-Militar.
- Durante o período, diversos grupos guerrilheiros surgiram no Brasil, todos eles foram derrotados pelas Forças Armadas.
- O AI-5 é considerado pela maior parte dos historiadores o marco inicial dos anos de chumbo.
- O Decreto Leila Diniz, de 1970, instituiu a censura prévia no Brasil.
- Os anos de chumbo terminaram com a ascensão dos generais moderados ao poder, em 1974. Geisel iniciou o processo de redemocratização.
O que foram os anos de chumbo?
Os anos de chumbo, no Brasil, foram os anos de maior repressão da Ditadura Civil- Militar. Ocorreu entre 1968 e 1974. O período se iniciou com a promulgação do Ato Institucional número 5, conhecido como AI-5, em dezembro de 1968. Com o ato, o Congresso Nacional foi fechado, assim como as Assembleias Legislativas estaduais, o habeas corpus foi suspenso e a censura endureceu. Mais de 420 pessoas perderam direito político após o AI-5, inclusive 93 deputados federais, que foram cassados.
Após o AI-5, diversos grupos guerrilheiros urbanos e rurais surgiram no Brasil. Esses grupos lutavam para derrubar a ditadura por meio de guerrilhas e ações contra a censura, como o sequestro de embaixadores. O período foi caracterizado pela grande violência praticada por guerrilheiros, agentes do Estado brasileiro e grupos paramilitares.
A maior parte dos anos de chumbo ocorreu durante o governo Médici, que durou até março de 1974. Seu sucessor, o general Ernesto Geisel, iniciou a chamada abertura política, considerada o marco final dos anos de chumbo.
Contexto histórico dos anos de chumbo
Em 31 de março de 1964, um golpe militar, com amplo apoio da sociedade civil, da Igreja, da mídia e da elite econômica brasileira, derrubou o presidente João Goulart e deu início a um período da história brasileira conhecido como Ditadura Civil-Militar.
O primeiro presidente militar foi Castelo Branco, considerado um militar moderado. Durante seu governo, foram criados os primeiros aparatos de repressão, assim como foram decretados os primeiros atos institucionais. Castelo Branco governou até março de 1967, quando foi sucedido por outro militar considerado moderado, o general Costa e Silva.
Durante o governo de Costa e Silva, diversas manifestações contra a ditadura foram realizadas, a mais famosa foi a Passeata dos 100 Mil, ocorrida em junho de 1968 e que reuniu diversos artistas. No mês seguinte, estourou em Osasco a Greve de 1968, iniciada na fábrica Cobrasma e que se espalhou para outras fábricas da cidade, depois para diversas regiões do Brasil. Em outubro do mesmo ano, foram presas 920 lideranças da União Nacional dos Estudantes, a UNE, que participavam de um congresso secreto na área rural do município de Ibiúna.
A chamada linha dura da ditadura, composta pelos militares mais radicais, como Emílio Garrastazu Médici, defendia que Costa e Silva e a ala moderada das Forças Armadas haviam perdido o controle da situação. Foi nesse momento que a chamada linha dura assumiu a liderança das Forças Armadas e decretou o AI-5, marco inicial dos anos de chumbo. Costa e Silva ficou doente em agosto de 1969, governando em seu lugar uma junta militar. Médici passou a governar o Brasil em outubro do mesmo ano.
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Videoaula sobre o governo Médici
Origem do termo anos de chumbo
A expressão anos de chumbo passou a ser usada na Europa a partir de 1981, quando foi lançado o filme alemão Die bleierne Zeit, literalmente “tempo de chumbo”. No filme, duas irmãs militantes políticas de esquerda vivem na Alemanha Ocidental da década de 1960. Após 1968, as duas seguem caminhos diferentes, Marianne se torna uma guerrilheira e Juliane continua a defender a não violência.
Marianne é presa pela polícia e, tempos depois, Juliane é informada de que ela suicidou na cadeia. Duvidando dessa versão, a irmã passa a investigar a misteriosa morte.
Anos de chumbo no Brasil
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Governo nos anos de chumbo
O AI-5 ocorreu no governo Costa e Silva, em um momento em que ele e sua ala estavam enfraquecidos; mas foi no governo Médici que os anos de chumbo atingiram o auge. Segundo a Comissão Nacional da Verdade, durante o governo Médici, 98 pessoas foram assassinadas por questões políticas, mais da metade dos assassinatos que a comissão identificou terem ocorrido nas duas décadas de ditadura.
Apenas um mês após assumir o poder, Médici conquistou uma grande vitória, divulgada largamente pelo aparato de propaganda do governo militar, o assassinato, em São Paulo, de Carlos Marighella, importante líder guerrilheiro.
Logo após o AI-5, em janeiro de 1969, o capitão do exército Carlos Lamarca desertou do quartel de Quitaúna, em Osasco, junto de outros três militares. Na deserção, os quatro militares levaram com eles mais de 60 fuzis, além de metralhadoras e farta munição. Lamarca passou a treinar guerrilheiros no Vale do Ribeira, em São Paulo. Foram descobertos e cercados pelas Forças Armadas, com tropas compostas por mais de 2500 soldados.
Lamarca conseguiu fugir do cerco e, meses depois, tentou iniciar uma guerrilha na Bahia, onde acabou descoberto e morto em 17 de setembro de 1971. O fato foi considerado outra grande vitória para o governo Médici e para a propaganda da ditadura.
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Economia nos anos de chumbo
Durante os anos de chumbo, o Brasil passou pelo chamado milagre econômico, também chamado de milagre brasileiro. Nesse período, entre 1968 e 1973, o PIB brasileiro cresceu em média mais de 10% ao ano. Em 1973, a economia cresceu 14%.
Grandes obras foram realizadas durante o milagre econômico, como a construção da Ponte Rio-Niterói, ainda hoje a maior do Brasil; da Usina Nuclear de Angra dos Reis; de parte da Rodovia Transamazônica, que cortaria o Brasil de leste a oeste; e a criação da Zona Franca de Manaus. O financiamento dessas obras veio de empréstimos internacionais e de investimentos de empresas estatais. Durante a ditadura, foram criadas 274 estatais.
Se, por um lado, a economia cresceu no período, o inverso ocorreu com o salário da maior parte dos trabalhadores brasileiros. Durante o milagre, o salário dos trabalhadores passou por um severo arrocho. O Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, o Ipea, afirma que, durante a ditadura, o salário mínimo perdeu metade do seu poder de compra.
Com a organização de sindicatos proibida, assim como as greves, os trabalhadores não organizaram grandes manifestações contra o arrocho no período. Outro fenômeno que se aprofundou durante o milagre econômico foi a desigualdade social, que agravou outros problemas sociais, como o êxodo rural e a fome.
O milagre econômico terminou em 1973. Nesse ano, a Opep reajustou o preço do barril de petróleo como retaliação aos Estados Unidos, dando origem à Crise do Petróleo. Sem os investimentos dos Estados Unidos e com o aumento do preço da energia, o milagre econômico foi bruscamente interrompido.
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Cultura nos anos de chumbo
O período dos anos de chumbo foi marcado pela censura de diversas manifestações artísticas. O período se iniciou com o AI-5, que permitiu a censura das manifestações artísticas. A partir da promulgação do Decreto Leila Diniz, de janeiro de 1970, foi imposta no Brasil a censura prévia. Durante a ditadura, cerca de 500 filmes, 200 livros, 450 peças teatrais e 500 letras de músicas foram vetados.
Contudo, apesar da censura, uma das características da cultura do período foi o forte engajamento dos artistas em defesa da democracia. Esses artistas usaram a criatividade para burlar a censura e realizar críticas ao autoritarismo, às torturas e aos problemas sociais do Brasil.
Leia também: Tropicalismo — o movimento cultural que buscava denunciar o cenário político brasileiro na ditadura
Anos de chumbo no mundo
- Itália: na Itália, os anos de chumbo ocorreram entre o final da década de 1960 e o final da década de 1980. Esses 20 anos foram marcados por diversos atentados a bomba, sequestros e assassinatos cometidos por grupos de extrema-direita e de extrema-esquerda. Os anos de chumbo da Itália se iniciaram em 1968, com manifestações das quais participaram jovens que criticavam a sociedade e a cultura do período, fenômeno que ocorreu em quase todo o mundo, inclusive no Brasil. Em 1969, um policial foi assassinado por manifestantes de esquerda.
No mesmo ano, um grupo terrorista de direita, em 12 de dezembro, cometeu um atentado a bomba na Praça de Fontana, em Milão, matando 17 pessoas. Na década de 1970, foram criadas as Brigadas Vermelhas, grupo de extrema-esquerda que assassinou diversas autoridades italianas durante sua existência.
Um dos principais grupos de extrema-direita era o Núcleo Revolucionário Armado, que promoveu o atentado a bomba na estação de Bolonha, matando 85 pessoas. Esse grupo acreditava na “estratégia de tensão”, pela qual os atentados provocariam o caos na sociedade italiana, aumentado as chances de a extrema-direita voltar ao poder no país.
- Marrocos: entre as décadas de 1960 e 1990, o Marrocos também passou pelos seus anos de chumbo. No período, o rei Hassan II controlou com mão de ferro o país, perseguindo e eliminando todos aqueles que militavam pela democracia. Em 2004, o Marrocos criou a Comissão de Equidade e Reconciliação, entidade que tem por principal objetivo investigar os crimes cometidos por Hassan II.
- Alemanha: na Alemanha Ocidental, os anos de chumbo ocorreram na década de 1970, quando o grupo de extrema-esquerda Fração do Exército Vermelho praticou diversos atentados contra lideranças do país. Esses atentados trouxeram a grande militarização e repressão a diversos movimentos de esquerda contra o governo da Alemanha Ocidental. No fim da década de 1970, os atentados diminuíram, mas eles continuaram até a década de 1990, quando o referido grupo terminou.
Consequência dos anos de chumbo
Os militares conseguiram, nos anos de chumbo, acabar com os grupos que se opuseram à ditadura por meio da luta armada, derrotando os principais deles e prendendo ou assassinando suas principais lideranças.
Apesar da censura, alguns dos crimes cometidos pela ditadura foram divulgados na mídia nacional e, principalmente, na mídia internacional. Em 1973, o milagre econômico terminou e a inflação voltou a subir. O apoio à ditadura começou a diminuir. A ala radical dos militares perdeu sua influência nas Forças Armadas e os moderados voltaram a dar as cartas.
Em 1974, o general Ernesto Geisel se tornou presidente do Brasil e iniciou o processo de redemocratização do país. Segundo as palavras do próprio Geisel, seria uma “abertura lenta, gradual e segura”.
Exercícios resolvidos sobre os anos de chumbo
Questão 1
(UFV) De 1964 a 1985, o Brasil viveu uma ditadura militar, num período que ficou conhecido como os “anos de chumbo”. Anos pesados para o povo brasileiro. Sobre esse período, é INCORRETO afirmar que:
a) a maior resistência à ditadura se deu através da imprensa, contra a qual não havia censura.
b) o Congresso Nacional não podia exercer sua função constitucional de fiscalizador das ações do Poder Executivo. Os generais-presidentes exerciam seu poder totalitário sobre a economia, a política e a cultura do país.
c) os sindicatos e as organizações estudantis eram vigiados pela polícia política, não tendo voz nem vez.
d) sempre houve resistência ao regime militar. Por meio de passeatas estudantis, guerrilhas urbanas e rurais e da mobilização da sociedade civil, operários, intelectuais, advogados, professores, camponeses, donas de casa, políticos e estudantes diziam não à ditadura.
Gabarito: A. A imprensa foi importante na resistência à ditadura, mas sofreu grande censura durante o período. O AI-5 e o Decreto Leila Diniz impuseram a censura prévia em nosso país, qualquer produção cultural deveria ser autorizada pelo governo antes de sua divulgação para o público.
Questão 2
(Unifor) “O AI-5 (...) congelou as esperanças de um oposicionismo civilizado. Com o Congresso Nacional fechado, centenas de parlamentares, prefeitos, vereadores e juízes cassados, milhares de pessoas presas e a imprensa literalmente amordaçada, a noite desceu sobre o país. Com esse Ato, e outros que se seguiram, militarizou-se por completo a vida política da nação. (...) na perseguição implacável aos adversários, reduzidos à condição de 'terroristas', o (...) Sistema transformou os porões do DOI-CODIs em salas dos horrores, onde a tortura e a morte eram onipresentes.” (Francisco M.P. Teixeira. História concisa do Brasil. São Paulo: Global, 1993. p. 304-5)
O texto identifica características de um período da história política brasileira conhecido como:
a) Dez Anos Perdidos
b) Anos de Chumbo
c) Anos das Secas
d) Anos Dourados
e) Belle Époque
Gabarito. B. Com o AI-5, iniciaram-se os chamados anos de chumbo, momento de maior repressão da ditadura aos opositores. De 1968 até 1974, ocorreram metade das mortes provocadas por questões políticas durante toda a ditadura, que durou duas décadas.
Fontes
GASPARI, Elio. A ditadura envergonhada. Editora Intrínseca, Rio de Janeiro, 2014.
GOMES, Angela de Castro. 1964: O golpe que derrubou um presidente, pôs fim ao regime democrático e instituiu a ditadura militar no Brasil. Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2014.
LIMA, Luís Octávio de. Os anos de chumbo: A militância, a repressão e a cultura de um tempo que definiu o destino do brasil. Editora Planeta, São Paulo, 2020.