Ana Cristina Cesar foi uma das principais representantes da Poesia Marginal, movimento literário conhecido também como Geração Mimeógrafo. Formada em Letras pela PUC-Rio, mestre em Comunicação pela UFRJ e em Teoria e Prática de Tradução Literária pela Universidade de Essex, na Inglaterra, Ana também foi poeta, jornalista, tradutora e crítica literária.
Nasceu no dia 02 de junho de 1952, no Rio de Janeiro, e foi em meio à geração do mimeógrafo que seu nome surgiu para a literatura brasileira. Movimento literário brasileiro das décadas de 1970 e 1980, a Poesia Marginal floresceu em um conturbado momento político, enfrentando a censura imposta pela ditadura militar. Ana diferenciou-se de seus contemporâneos por conta de um senso estético ímpar, além de um vasto repertório intelectual que levou sua poesia para além das agendas ideológicas. As principais características de sua poesia são a atração pelo insólito do cotidiano; ênfase na experiência existencial; valorização do coloquialismo; o discurso construído na primeira pessoa; o culto do instante, entre outras.
Ana Cristina Cesar cometeu suicídio aos 31 anos no dia 29 de outubro de 1983, no Rio de Janeiro. Para que você conheça um pouco mais a obra de um dos nomes mais talentosos da moderna poesia brasileira, o Brasil Escola selecionou cinco poemas de Ana Cristina Cesar que serão um convite para que você conheça mais sobre a escritora. Boa leitura!
O Homem Público N. 1 (Antologia)
Tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada.
Não há razão
para conservar
este fiapo de noite velha.
Que significa isso?
Há uma fita
que vai sendo cortada
deixando uma sombra
no papel.
Discursos detonam.
Não sou eu que estou ali
de roupa escura
sorrindo ou fingindo
ouvir.
No entanto
também escrevi coisas assim,
para pessoas que nem sei mais
quem são,
de uma doçura
venenosa
de tão funda.
Aventura na Casa Atarracada
Movido contraditoriamente
por desejo e ironia
não disse mas soltou,
numa noite fria,
aparentemente desalmado;
- Te pego lá na esquina,
na palpitação da jugular,
com soro de verdade e meia,
bem na veia, e cimento armado
para o primeiro a andar.
Ao que ela teria contestado, não,
desconversado, na beira do andaime
ainda a descoberto: - Eu também,
preciso de alguém que só me ame.
Pura preguiça, não se movia nem um passo.
Bem se sabe que ali ela não presta.
E ficaram assim, por mais de hora,
a tomar chá, quase na borda,
olhos nos olhos, e quase testa a testa.
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Aos nove anos, Ana Cristina já se considerava autora. O aviso na capa de um de seus cadernos adverte o leitor *
Fisionomia
não é mentira
é outra
a dor que dói
em mim
é um projeto
de passeio
em círculo
um malogro
do objeto
em foco
a intensidade
de luz
de tarde
no jardim
é outrart
outra a dor que dói
Contagem regressiva
Acreditei que se amasse de novo
esqueceria outros
pelo menos três ou quatro rostos que amei
Num delírio de arquivística
organizei a memória em alfabetos
como quem conta carneiros e amansa
no entanto flanco aberto não esqueço
e amo em ti os outros rostos.
Samba-Canção
Tantos poemas que perdi
Tantos que ouvi, de graça,
pelo telefone – taí,
eu fiz tudo pra você gostar,
fui mulher vulgar,
meia-bruxa, meia-fera,
risinho modernista
arranhado na garganta,
malandra, bicha,
bem viada, vândala,
talvez maquiavélica,
e um dia emburrei-me,
vali-me de mesuras
(era uma estratégia),
fiz comércio, avara,
embora um pouco burra,
porque inteligente me punha
logo rubra, ou ao contrário, cara
pálida que desconhece
o próprio cor-de-rosa,
e tantas fiz, talvez
querendo a glória, a outra
cena à luz de spots,
talvez apenas teu carinho,
mas tantas, tantas fiz…
Obras de Ana Cristina Cesar:
Poesia
Crítica
Variados
-
Correspondência Incompleta
-
Escritos no Rio (póstumo, organizado por Armando Freitas Filho)
-
Escritos em Londres (póstumo, organizado por Armando Freitas Filho)
-
Antologia 26 Poetas Hoje, de Heloísa Buarque
*Imagem do acervo do Instituto Moreira Salles
Por Luana Castro
Graduada em Letras