A Lei Áurea foi a lei que determinou a abolição da escravatura no Brasil, em 13 de maio de 1888. Por meio dessa lei, mais de 700 mil escravizados conquistaram sua liberdade, e seus antigos donos não receberam nenhuma indenização do Estado brasileiro. A responsável por assinar esse documento foi a princesa Isabel, na época, herdeira do trono.
A abolição do trabalho escravizado foi resultado da mobilização do movimento abolicionista, da sociedade brasileira e dos escravizados. A década de 1880 presenciou uma grande mobilização política, jurídica e social em defesa da abolição. Os ex-escravizados, no entanto, não receberam nenhum tipo de incentivo do governo após essa lei.
Leia também: Leis abolicionistas — transição do Brasil até a abolição total da escravatura
Tópicos deste artigo
Resumo sobre a Lei Áurea
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A Lei Áurea, assinada em 13 de maio de 1888, determinou a abolição do trabalho escravo no Brasil.
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Esse documento foi assinado pela princesa Isabel, a herdeira do trono.
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A abolição do trabalho escravo foi resultado da mobilização popular.
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Os ex-escravizados não receberam nenhum tipo de auxílio do governo após a abolição.
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O envolvimento da princesa Isabel com a causa abolicionista foi bastante limitado.
O que é a Lei Áurea?
A Lei Áurea, ou Lei Imperial nº 3.353, foi o dispositivo que extinguiu a escravidão no Brasil. Seu projeto (cujo texto original pode ser visto na imagem de abertura deste texto) foi elaborado e apresentado ao Senado Imperial Brasileiro pelo senador Rodrigo Augusto da Silva, no dia 11 de maio de 1888.
A votação dos senadores foi rápida, e, dois dias depois, em 13 de maio de 1888, a lei foi sancionada pela princesa Isabel, que exercia, na ocasião, a função de princesa regente, já que seu pai, o imperador d. Pedro II, estava fora do país para tratar de sua saúde.
Essa lei determinou que a abolição do trabalho escravizado no Brasil seria imediata e que os donos de escravizados não receberiam nenhuma indenização. Estima-se que cerca de 720 mil escravos tenham recebido a sua liberdade com esse documento. A abolição da escravatura foi resultado da mobilização política da população brasileira, dos escravizados e dos abolicionistas em defesa do fim dessa instituição.
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Antecedentes da Lei Áurea
A década de 1880 foi turbulenta para o reinado de Pedro II. Grande parte da população urbana, composta por profissionais liberais (médicos, jornalistas, advogados), era favorável à abolição, e muitos de seus membros estavam diretamente engajados na causa abolicionista. O próprio imperador também era contrário ao regime escravista, mas nunca havia conseguido a articulação política necessária para que a abolição ocorresse, apesar da grande pressão que os deputados liberais exerciam sobre o seu governo.
Três anos antes da Lei Áurea, o império havia sancionado outra lei, a de número 3.270, de 28 de setembro de 1885. Essa lei tornava livres todos os escravos com mais de 60 anos de idade e, por isso, ficou conhecida como Lei dos Sexagenários. Essa foi a última medida que o império tomou com relação à situação dos escravizados antes da Lei Áurea.
Somada ao fim do tráfico de escravos (1850) e à proibição de se manter cativas crianças nascidas de escravos (1871), a Lei dos Sexagenários avançava pouco na questão abolicionista. Na verdade, essa lei foi considerada uma grande derrota do movimento abolicionista naquele momento porque cumpria o papel de tentar interromper o avanço da sua causa.
No entanto, a sociedade brasileira não aceitava mais a manutenção da escravatura, e abolicionistas e escravizados estavam cada vez mais corajosos em suas posições. Além disso, a manutenção da escravatura pesava contra a imagem internacional do Brasil, o último país do Ocidente a manter o trabalho escravo em vigor.
Os fazendeiros escravocratas, por sua vez, estavam cada vez mais descontentes com o império e agiam politicamente para impedir o avanço da causa abolicionista aqui. Além disso, não havia planejamento nem interesse, por parte do Estado, na assimilação econômica e social da massa de negros libertos.
Veja também: Lei Euzébio de Queirós — fim do tráfico negreiro no Brasil
O que motivou a assinatura da Lei Áurea?
De 1885 a 1888, a situação nas cidades e até mesmo em algumas fazendas começou a ficar ainda mais turbulenta, dadas as frequentes fugas de escravos, bancadas por associações abolicionistas, como destaca o historiador José Murilo de Carvalho, em seu perfil biográfico de d. Pedro II:
A maré abolicionista tornou-se irresistível, transformando-se no primeiro grande movimento nacional de opinião pública. Nem as fazendas escaparam. Em São Paulo, um grupo abolicionista chamado “caifases” promovia fugas de escravos. As fugas multiplicaram-se, especialmente nas províncias de São Paulo e do Rio de Janeiro. Cresceu o número de quilombos, alguns patrocinados por abolicionistas, como o do Leblon, na capital do Império. [1]
O movimento abolicionista ganhou muita força na década de 1880 e sua atuação se deu de diferentes formas. Havia advogados que usavam a justiça para conquistar a alforria de escravizados sem indenização ou por valores baixos; grupos abolicionistas incentivavam a fuga de escravos, dando-lhes apoio logístico para fugirem e formarem quilombos; existia também auxílio para que escravos fugissem e fossem para o Ceará e Amazonas (estados que haviam abolido a escravidão) etc.
A abolição da escravatura foi, portanto, fruto da pressão social realizada pelos escravos e pela sociedade por meio do movimento abolicionista. Essa pressão e o temor de que a situação se escalasse para uma guerra civil, assim como nos Estados Unidos, deram forçar para que a abolição caminhasse.
O papel da princesa Isabel na Lei Áurea
Em 1887, gravemente afetado pela diabetes, d. Pedro II viajou para Europa a fim de iniciar um tratamento. A princesa Isabel, que estava na Europa, foi chamada pelo gabinete imperial de volta ao país. Já no Brasil, ela assumiu a regência e passou a governar no lugar do pai. O tema da abolição estava na ordem do dia e, em grande parte, havia um clima um tanto revolucionário nas ruas, com a ação de grupos como os caifazes.
A historiadora Mary del Priore afirma que o envolvimento da princesa Isabel com os assuntos da política brasileira era bem pequeno, uma vez que ela dava preferência às questões de sua vida privada, o mesmo comportamento se deu com a questão da abolição do trabalho escravizado.|2|
No contexto da aprovação da Lei do Ventre Livre, a participação da princesa se resumiu à assinatura do documento, decretando a lei em 1871. A partir do fortalecimento do abolicionismo no final da década de 1880, a princesa Isabel deu algumas declarações a respeito da causa, mas muito tímidas.
As cartas escritas pela princesa ainda reforçam que ela possuía escravos e tratava deles com muita naturalidade, não demonstrando preocupação com a questão da desumanidade da escravidão e não se importando com as condições de vida deles.
O fortalecimento da causa abolicionista e o declínio da saúde do imperador fizeram com que a então herdeira do império brasileiro ocupasse a posição de regente no momento em que a abolição foi decretada.
Saiba mais: Três grandes abolicionistas negros que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil
O que diz o texto da Lei Áurea?
O texto da Lei Áurea foi assinado pela princesa Isabel e por Rodrigo Augusto da Silva com uma pena dourada, cravejada de diamantes e pedras vermelhas. Há apenas dois curtos artigos no corpo do texto. Veja na íntegra:
A Princesa Imperial Regente, em nome de Sua Majestade o Imperador, o Senhor D. Pedro II, faz saber a todos os súditos do Império que a Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:
Art. 1°: É declarada extincta desde a data desta lei a escravidão no Brazil.
Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário.
Manda, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram, e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nella se contém.
Como ficou a vida dos ex-escravos após a Lei Áurea?
A Lei Áurea foi recebida pela população brasileira com grande festa, e uma multidão se reuniu nas ruas do Rio de Janeiro para celebrar essa conquista. Outras grandes cidades brasileiras também tiveram suas celebrações. Passada a euforia inicial, o cenário encontrado pelos ex-escravizados foi, em grande parte, desanimador.
Não foi dado, por parte do governo republicano — que assumiu o poder cerca de um ano e meio depois da Lei Áurea —, nenhum incentivo para os ex-escravos. Eles não receberam terras para torná-las produtivas nem apoio financeiro nem educação e emprego. Muitos deles tiveram que abandonar as regiões onde viviam em busca de empregos e de reconstruir a vida. Para saber mais sobre esse tópico, clique aqui.
Notas
|1| CARVALHO, José Murilo de. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 190-91.
|2| DEL PRIORE, Mary. O Castelo de Papel: uma história de Isabel de Bragança, princesa imperial do Brasil, e Gastão de Orléans, conde d’Eu. Rio de Janeiro: Rocco, 2013.
Créditos da imagem
[1] Arquivo Nacional/ Wikimedia Commons
Por Cláudio Fernandes e Daniel Neves
Professores de História