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Mario Quintana nasceu em 1906 e morreu em 1994. Além de poeta, foi tradutor. Publicou seu primeiro livro em 1938: A rua dos cata-ventos. Recebeu os prêmios Fernando Chinaglia, Machado de Assis, e Jabuti, além do título de cidadão honorário de Porto Alegre, da medalha Negrinho do Pastoreio e do título de doutor honoris causa das seguintes instituições: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Unicamp e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O poeta pertence à segunda geração modernista (1930-1945), marcada pela reflexão sobre o mundo contemporâneo e pela liberdade formal. No entanto, Quintana apresenta uma poesia mais individual, caracterizada pelo humor e pela simplicidade. Como bem se definiu o poeta, na revista IstoÉ: “Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese”.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Biografia de Mario Quintana
- 2 - Características literárias de Mario Quintana
- 3 - Obras de Mario Quintana
- 4 - Exemplo de poemas
- 5 - Frases de Mario Quintana
Biografia de Mario Quintana
O poeta Mario Quintana nasceu em 30 de julho de 1906, em Alegrete (RS). Publicou seus primeiros textos na revista Hyloea, do colégio militar em que estudou de 1919 a 1924. Em 1926, seu conto A sétima personagem venceu o concurso de contos do jornal Diário de Notícias, em Porto Alegre. No entanto, A rua dos cata-ventos, seu primeiro livro, foi publicado quando o escritor já tinha mais de 30 anos.
Em 1966, sua obra Antologia poética recebeu o prêmio Fernando Chinaglia de melhor livro do ano. Em 1967, Quintana recebeu o título de cidadão honorário de Porto Alegre. Os textos de sua coluna “Caderno H” (iniciada em 1943), na Revista Província de São Pedro e depois no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre, foram reunidos em livro, com mesmo nome, publicado em 1973.
Em 1976, o poeta foi homenageado com a medalha Negrinho do Pastoreio, condecoração do governo do Rio Grande do Sul. Em 1980, recebeu o prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra. No ano seguinte, em 1981, o prêmio Jabuti, na categoria Personalidade Literária do Ano.
Em 1982, o poeta recebeu o título de doutor honoris causa, concedido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O mesmo título foi dado, em 1989, pela Unicamp e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em 1983, o Hotel Majestic, onde o poeta morou de 1968 a 1980, em Porto Alegre, transformou-se na Casa de Cultura Mario Quintana.
O escritor Mario Quintana, além de escrever poesias, traduziu obras de autores como Marcel Proust (1871-1922), Virginia Woolf (1882-1941) e Voltaire (1694-1778). No ano de seu falecimento, em 5 de maio de 1994, alguns de seus textos foram publicados na revista literária Liberté, do Canadá.
Características literárias de Mario Quintana
As obras de Mario Quintana não apresentam fácil classificação em relação ao seu pertencimento a este ou àquele estilo de época. No entanto, o escritor, normalmente, é associado, pelos críticos literários, à segunda geração modernista.
Essa geração, conhecida como “fase de reconstrução”, não realiza mais a releitura do passado histórico feita pela primeira geração. Agora, os escritores e escritoras passam a dedicar-se à reflexão sobre o mundo contemporâneo, o que gera um conflito espiritual, pois a crença religiosa é confrontada com uma realidade de desesperança (crises políticas e a Segunda Guerra Mundial).
Além disso, uma vez que não têm mais a missão de romper com o passado (a tradição), poetas e poetisas possuem maior liberdade de escolha no que se refere também à estrutura formal do poema, podendo optar por versos livres (sem métrica e sem rima), versos brancos (com métrica e sem rima) ou versos regulares (com métrica e rima).
Para J. C. Pozenato|1|, “Mario Quintana é, a rigor, o primeiro poeta gaúcho a fazer lirismo urbano, onde se sente o estigma da vida citadina da província”. Já Regina Zilberman|2| afirma que Mario Quintana teria se “abeberado, durante sua formação, na poética simbolista, que nunca abandona seus versos”. Além disso, segundo ela, Quintana fez questão “de acentuar a independência de sua poética, recusando-se a frequentar qualquer escola literária [...]”.
Essa atitude indicaria “a afirmação da identidade pessoal perante a massificação, reagindo ao avanço nivelador da sociedade industrial [...]”. Para Zilberman, Mario Quintana, evitando “dois assuntos bastante frequentados pelos poetas modernistas, quais sejam, a reflexão sobre o lugar do homem no mundo e na sociedade, [...], e a expressão religiosa, [...], explora antes uma linha provocativamente individualista”.
De forma geral, a escrita de Mario Quintana é marcada por humor e simplicidade. Já no aspecto formal, sua poesia recorre tanto aos versos livres quanto à rigidez na metrificação de sonetos.
Leia também: Rachel de Queiroz – outra representante da segunda fase modernista
Obras de Mario Quintana
Mario Quintana publicou os seguintes livros:
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A rua dos cata-ventos (1940)
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Canções (1946)
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Sapato florido (1948)
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O aprendiz de feiticeiro (1950)
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Espelho mágico (1951)
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Inéditos e esparsos (1953)
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Caderno H (1973)
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Apontamentos de história sobrenatural (1976)
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Quintanares (1976)
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A vaca e o hipogrifo (1977)
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Esconderijos do tempo (1980)
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Baú de espantos (1986)
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Da preguiça como método de trabalho (1987)
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Preparativos de viagem (1987)
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Porta giratória (1988)
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A cor do invisível (1989)
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Velório sem defunto (1990)
Obras infantil juvenil:
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O batalhão das letras (1948)
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Pé de pilão (1975)
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Lili inventa o mundo (1983)
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Nariz de vidro (1984)
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Sapo amarelo (1984)
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Primavera cruza o rio (1985)
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Sapato furado (1994)
Exemplo de poemas
Escolhemos três poemas do livro Apontamentos de história sobrenatural, de Mario Quintana, para comentar aqui. O primeiro deles é “O adolescente”. Esse poema fala do medo que envolve a curiosidade do adolescente, que é comparado a um “jovem felino”, portanto, selvagem, que sai, pela primeira vez, da gruta (de casa) e, mesmo com medo, vai descobrir o mundo lá fora; pois, no universo adolescente, existe apenas a novidade e o desejo:
A vida é tão bela que chega a dar medo.
Não o medo que paralisa e gela,
estátua súbita,
mas
esse medo fascinante e fremente de curiosidade que faz
o jovem felino seguir para a frente farejando o vento
ao sair, a primeira vez, da gruta.
Medo que ofusca: luz!
Cumplicemente,
as folhas contam-te um segredo
velho como o mundo:
Adolescente, olha! A vida é nova...
A vida é nova e anda nua
— vestida apenas com o teu desejo!
O segundo poema é “O espelho”, em que o eu lírico, ao passar diante do espelho de seu quarto, vê algo além de si mesmo, vê o que veio antes dele, seus antepassados. Como o espelho reflete a imagem daquele que está diante dele, é possível entender que o eu lírico é também aqueles que vieram antes, os seus ancestrais. Ao resgatar essa história, ele define sua própria identidade, pois é o presente mas também o passado, daí o “desconcerto” do Tempo:
E como eu passasse por diante do espelho
não vi meu quarto com as suas estantes
nem este meu rosto
onde escorre o tempo.
Vi primeiro uns retratos na parede:
janelas onde olham avós hirsutos
e as vovozinhas de saia-balão
como paraquedistas às avessas que subissem do fundo do tempo.
O relógio marcava a hora
mas não dizia o dia. O Tempo,
desconcertado,
estava parado.
Sim, estava parado
em cima do telhado…
como um cata-vento que perdeu as asas!
Por fim, o terceiro poema: “O poeta e a ode”. Ode é, normalmente, um poema com versos simétricos, isto é, com o mesmo número de sílabas. É uma composição solene, feita para exaltar alguém ou algo. Portanto, é uma poesia contida, com regras, e tem o objetivo de agradar. Por isso, o eu lírico compara, ironicamente, o “poeta da ode” a um “cavalo de circo”.
Na segunda estrofe, quando o eu lírico afirma que “Em severa medida/ Bate o ritmo dos cascos”, a “medida” a que se refere é o ato de metrificar o poema, comparado ao ritmo dos cascos de um cavalo. Desse modo, por trás de toda essa disciplina, é impossível conhecer o cavalo selvagem que mora no poeta, o qual abre mão de sua liberdade de criação. O “poeta da ode” não passa, portanto, de um nobre animal.
Sua firme elegância.
Sua força contida.
O poeta da ode
É um cavalo de circo.
Em severa medida
Bate o ritmo dos cascos.
De momento a momento,
Impacto implacável,
Tomba o acento na sílaba.
Dura a crina de bronze.
Rijo o pescoço alto.
Quem lhe sabe da tensa
Fúria, do sagrado
Ímpeto de voo?
Nobre animal, o poeta.
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Frases de Mario Quintana
Em 14 de novembro de 1984, Mario Quintana escreveu um texto para a revista IstoÉ, em que falou sobre si mesmo. Desse texto, tiramos algumas frases que merecem destaque:
“Eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente.”
“Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão.”
“Estou com 78 anos, mas sem idade.”
“Sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura.”
“Poesia é insatisfação, um anseio de autossuperação.”
“Um poeta satisfeito não satisfaz.”
A seguir, algumas frases (versos) extraídas do livro Apontamentos de história sobrenatural:
“A morte odeia as curvas, a morte é reta.”
“Quem faz um poema salva um afogado.”
“Poeta é o que encontra uma moedinha perdida...”
“O domingo é um cachorro escondido debaixo da cama.”
“Deus é mais simples do que as religiões.”
“Não são todos os que realizam os velhos sonhos da infância!”
Notas
|1| Apud ARAÚJO, Patrícia Vitória Mendes dos Santos; MITIDIERI, André Luis; ARENDT, João Claudio. Mario Quintana na história literária sul-rio-grandense.
|2|Apud ARAÚJO, Patrícia Vitória Mendes dos Santos; MITIDIERI, André Luis; ARENDT, João Claudio. Mario Quintana na história literária sul-rio-grandense.
Crédito da imagem
[1] Editora Globo [reprodução]
Por Warley Souza
Professor de Literatura