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Os conflitos na África são disputas que acontecem entre diferentes grupos políticos ou grupos étnicos e religiosos nos países africanos ou entre duas ou mais nações distintas do continente, motivados por questões socioculturais, políticas e econômicas. As raízes desses conflitos podem ser identificadas no processo de partilha da África, promovida durante o final do século XIX pelos países europeus durante a Conferência de Berlim, que marcou o início do imperialismo (ou neocolonialismo) no continente africano.
Atualmente existem instabilidades em 35 países africanos, dentre os quais podemos citar o Sudão e o Sudão do Sul. As consequências desses conflitos recaem, sobretudo, na população: milhões de desabrigados e refugiados, um número muito alto de mortes, e o agravamento das desigualdades socioeconômicas e da miséria são algumas delas.
Leia também: Quais são os principais conflitos que ocorrem no Leste Europeu?
Tópicos deste artigo
- 1 - Resumo sobre os conflitos na África
- 2 - Origem dos conflitos na África
- 3 - Causas dos conflitos na África
- 4 - Quais são os principais conflitos na África?
- 5 - Conflitos na África atualmente
- 6 - Consequências dos conflitos na África
Resumo sobre os conflitos na África
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A origem dos conflitos na África pode ser identificada na partilha do continente, estabelecida na Conferência de Berlim, e no neocolonialismo, que decorreu entre os séculos XIX e XX.
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São causados por disputas territoriais e políticas, divergências entre grupos étnicos e religiosos, ascensão de governos autoritários, aumento da pobreza e da crise humanitária, entre outros.
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Alguns dos principais conflitos na África aconteceram nas seguintes localidades: Sudão, Sudão do Sul, região de Darfur, Angola, e Ruanda.
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No total, 35 países da África apresentam, atualmente, algum tipo de conflito.
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Os conflitos nos países da África aumentam a pobreza da população, resultam em muitos refugiados e pessoas desabrigadas, ampliam as crises econômica e política, fragilizam a infraestrutura territorial e ocasionam milhares de mortes.
Origem dos conflitos na África
Os conflitos na África têm origem no processo histórico de partilha do continente e na exploração promovida pelas nações europeias durante o período que ficou conhecido como neocolonialismo ou imperialismo, que se estendeu entre a segunda metade do século XIX e o final do século XX.
A África é um continente vasto e bastante diverso, com uma grande pluralidade étnica. Estima-se que, durante o século XIX, a população africana era formada por quase 110 milhões de pessoas, pertencentes a centenas de grupos étnicos distintos. Cada um desses povos apresentava uma estrutura social e política própria, além de particularidades culturais, como o idioma falado e a religião. Nenhum desses elementos foi levado em consideração na partilha do continente africano.
A divisão do continente africano foi realizada sob pretextos religiosos e supostamente civilizatórios, tendo sido efetivada durante a Conferência de Berlim. Essa conferência foi uma reunião dos líderes de 14 países da Europa que aconteceu entre 1884 e 1885 e na qual, de acordo com os interesses de cada uma dessas nações, foram estabelecidas fronteiras artificiais na África. Com isso, o continente foi dividido em colônias pertencentes a países como Portugal, França, Reino Unido e Bélgica.
A partilha desconsiderou quaisquer aspectos socioculturais e divergências existentes entre os grupos étnicos, e as fronteiras delineadas durante a Conferência de Berlim foram mantidas por muitos países africanos mesmo depois da sua independência. Sabe-se que, durante a dominação europeia, a rivalidade entre os grupos era até mesmo aproveitada pelos colonizadores, e, quando essa rivalidade não existia, ela era suscitada. Os reflexos desse processo, somados a outras questões internas, levaram a muitos dos conflitos que se desenrolaram no continente africano desde então.
Causas dos conflitos na África
Os conflitos e as guerras nos países da África têm como causas principais:
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disputas territoriais e soberania política, notadamente em regiões de fronteira;
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divergências entre grupos étnicos e grupos religiosos;
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domínio sobre os recursos naturais (combustíveis fósseis, água, terra);
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crises políticas internas, sobretudo em territórios marcados por um histórico de instabilidade governamental e golpes de Estado;
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governos autoritários e violência policial;
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agravamento da situação de crise humanitária em muitos territórios.
Quais são os principais conflitos na África?
→ Conflito entre o Sudão e o Sudão do Sul
O Sudão é um país localizado no noroeste da África. Antes mesmo da independência sudanesa com relação ao Reino Unido, uma guerra civil se instalou na então colônia, no ano de 1955, em função da presença de grupos separatistas no sul, que demandavam a criação de um território próprio, independente do Sudão.
A divergência entre grupos religiosos é apontada também como causa desse conflito: enquanto os muçulmanos eram maioria no norte, a porção meridional do país era composta por maioria cristã ou que professava fé de matrizes diversas, como o animismo.
O governo sudanês recebeu o apoio de nações como o Egito e a União Soviética, e o conflito se estendeu até o ano de 1972, com um saldo de mais de 500.000 mortos. Em 27 de março daquele ano, o Sudão e os rebeldes do sul assinaram o Acordo de Adis Abeba, que colocou fim na Primeira Guerra Civil Sudanesa. Pouco mais de uma década mais tarde, entretanto, o conflito recomeçou, e recebeu a denominação de Segunda Guerra Civil Sudanesa.
A segunda etapa da guerra civil no Sudão, iniciada em 1983, também foi travada entre a região sul e o restante do país. A violação de cláusulas do acordo firmado no fim do conflito precedente é uma das causas desse novo conflito, a exemplo da tentativa do Sudão de exercer o controle sobre reservas de petróleo descobertas na fronteira com o que hoje é conhecido como Sudão do Sul. Questões religiosas também motivaram a eclosão do conflito, notadamente a imposição da lei islâmica (Sharia) por parte de Cartum, governo do Sudão, a todas as áreas do território, incluindo povos não muçulmanos do sul.
Mais de 2.000.000 de vidas foram perdidas durante a segunda guerra civil sudanesa, que chegou ao fim com um acordo de paz assinado em 2005. No ano de 2011, um referendo oficializou a criação do território do Sudão do Sul, hoje um país independente e o mais jovem do mundo.
Apesar da independência política do Sudão do Sul, o país depende do território do Sudão para o escoamento de sua produção de petróleo, base de sua economia.|1| Em 2013, a rivalidade política entre Salva Kiir, presidente do Sudão do Sul, e Riek Machar, que até então era o seu vice-presidente, fez o país imergir em uma guerra civil que perdurou até o ano de 2020 e agravou o quadro de fome e miséria que já se fazia presente no Sudão do Sul.
→ Conflitos na região de Darfur (Sudão)
Darfur é uma região localizada no oeste do Sudão, onde as principais atividades econômicas são a agricultura e a pecuária extensiva. Muitos dos conflitos na região foram deflagrados por disputas pelo uso da terra, ao mesmo tempo em que existem divergências étnicas e religiosas que ocasionam acirramento das tensões e a escalada dos ataques. Enquanto um terço da população de Darfur é muçulmana e recebe amplo apoio do governo do Sudão, outra parcela pertence a diferentes grupos étnicos, como Fur e Zaghawa.
Rebeldes pertencentes aos grupos não muçulmanos, apoiados por grupos do Chade, promoveram ataques ao governo sudanês em 2003, que respondeu de maneira imediata, contando com o apoio não oficial de milícias. A situação se agravou após 2015, com a ofensiva sudanesa sobre a região que levou à morte de centenas de milhares de pessoas, além de quase 3 milhões de desabrigados. A instabilidade político-social e os conflitos na região permanecem até o presente. Para saber mais sobre o conflito na região de Darfur, clique aqui.
→ Conflito em Ruanda
A população de Ruanda, país localizado no sudoeste do continente africano, é formada majoritariamente por dois grupos étnicos rivais: os hutus e os tutsis. Os rutus constituem a maioria dos habitantes de Ruanda, mas, por muitos anos, foram os tutsis que tiveram maior influência política no território, o que remonta ao período da colonização promovida pela Bélgica. Ruanda se tornou um país independente no ano de 1962, o que foi resultado da derrubada do poder dos tutsis pela ação dos hutus, que chegaram ao governo.
A ascensão dos hutus ao poder levou ao exílio de muitos membros do grupo tutsi, alguns dos quais formaram um grupo rebelde denominado Frente Patriótica Ruandesa (FPR). A invasão que a FRP promoveu em Ruanda no ano de 1990 deflagrou uma guerra civil no país que vitimou mais de 800.000 pessoas. O período mais dramático da guerra em Ruanda se deu em 1994, quando uma queda de avião provocou a morte do presidente Juvenal Habyarimana, acidente que os hutus atribuíram aos tutsis.
Como reação, extremistas orquestraram o assassinato em massa que transcorreu de maneira brutal durante 100 dias entre abril e julho de 1994, fazendo mais de 11.000 vítimas nesse curto intervalo de tempo. Entre os mortos estavam pessoas do grupo étnico tutsi, em sua maioria, incluindo crianças e mulheres, e alguns membros da etnia hutu. O conflito em Ruanda refletiu na República Democrática do Congo, país vizinho para onde muitos refugiados se deslocaram.
→ Conflito na Angola
A guerra civil em Angola, país do sudeste da África, teve início após a sua independência com relação a Portugal no ano de 1975 e durou quase três décadas, sendo encerrada em 2002. O conflito teve influência do contexto bipolar da Guerra Fria e foi travado entre diferentes grupos opostos, que, embora tivessem atuado em prol da independência angolana, mantinham rivalidade entre si.
Destacam-se a atuação do Movimento Popular pela Libertação da Angola (MPLA), que se posicionava do lado do bloco socialista, liderado pela União Soviética (URSS), e que recebia o apoio de Cuba e do Congo, e a da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), ao lado da África do Sul e dos Estados Unidos, que participou indiretamente mediante o financiamento do conflito. Mais de 500.000 pessoas morreram durante a guerra civil angolana, que terminou com a assinatura de um acordo de paz em 4 de abril de 2002 e a vitória do MPLA.
Saiba mais: Conflitos entre Israel e Palestina — a origem dos conflitos que ocorrem desde 1940
Conflitos na África atualmente
Embora alguns dos conflitos que estudamos no tópico anterior tenham sido encerrados, as tensões entre grupos rebeldes permanecem ativas e acentuam a instabilidade política nesses territórios. Junto da região de Darfur, no Sudão, Ruanda e Angola, há um total de 35 países africanos que apresentam conflitos internos, os quais têm naturezas distintas: conflitos entre diferentes grupos étnicos e religiosos, guerra civil, domínio de grupos extremistas, entre outros.
Dentre os países africanos onde existem conflitos ativos atualmente, podemos destacar os seguintes:
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Burkina Faso, na região do Sahel, onde se registra a atuação de grupos extremistas armados;
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República Centro-Africana, que enfrenta uma guerra civil;
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Mali, que registrou golpes de Estado recentes, além de uma guerra civil em curso;
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Etiópia, onde diversos grupos políticos têm provocado a intensificação de conflitos civis;
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Nigéria, onde a atuação do grupo terrorista Boko Haram aumenta a instabilidade social e política no território nigeriano e em países vizinhos.
Consequências dos conflitos na África
A África concentra alguns dos países com menor índice de desenvolvimento humano do mundo, marcados pela elevada disparidade econômica, pela escassez de recursos e por alto índice de pobreza entre a população. Quando analisamos os dados com maior cuidado, percebemos que mais da metade das 54 nações africanas se encontra, atualmente, envolvida em algum tipo de guerra ou instabilidade política que gera consequências no curto, médio e longo prazo.
As principais consequências dos conflitos na África são:
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aprofundamento das desigualdades socioeconômicas e das crises econômicas, com a ampliação da miséria e da pobreza;
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agravamento da insegurança alimentar e nutricional;
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prejuízos à rede de infraestruturas dos territórios, muitas das quais já eram deficitárias;
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crises políticas e aumento da fragilidade dos governos dos países envolvidos;
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crises humanitárias, com o aumento do número de refugiados deslocados internamente, nos países onde o conflito ocorre, ou que buscam abrigo em outros territórios;
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mortes de membros da sociedade civil e entre os militares.
Nota
|1| LUCCI, Elian Alabi. Território e sociedade no mundo globalizado: ensino médio, 3. São Paulo, SP: Saraiva, 2016. 3 ed. 281 p.
Crédito de imagem
[1] Richard Juilliart / Shutterstock
[4] Adriana Mahdalova / Shutterstock
Por Paloma Guitarrara
Professora de Geografia