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Os sofistas foram amplamente criticados desde Sócrates até meados do século XIX. Em sua maioria, esses pensadores estiveram na cidade de Atenas, em razão da organização política dessa cidade-estado no século V a.C., mas não eram cidadãos. Por cobrarem para ensinar, principalmente retórica e gramática, foram chamados por Platão de enganadores hábeis, e por Henry Sidgwick, de charlatães.
Há indícios de que a palavra sofista teve conotação positiva nos escritos dos grandes poetas gregos e em Heródoto, o pai da história. A crítica histórica aos sofistas não se iniciou com Sócrates, contudo é inegável a influência dos escritos de Platão e Aristóteles na caracterização desses pensadores.
Tópicos deste artigo
- 1 - Características dos sofistas
- 2 - Principais sofistas
- 3 - A crítica de Sócrates
- 4 - Importância dos sofistas para a filosofia
- 5 - Trechos selecionados
Características dos sofistas
O grupo de pensadores identificado como sofistas caracterizou-se principalmente pela ausência de uma doutrina em comum e pelo ensino voltado a um fim instrumental. Eram vistos como habilidosos oradores pelas pessoas, reconhecendo-se a importância das palavras e do uso da lógica. Eles podem ser considerados instrutores itinerantes contratados para ensinar retórica para fins políticos.
O que restou de seus pensamentos foram poucos fragmentos e menções em outros textos. Muito do que sabemos sobre esses pensadores está contido nos diálogos platônicos e nos escritos de Aristóteles, nos quais são diretamente criticados. As críticas contrastam com a etimologia da palavra “sofista”, cuja origem é sophós e significa sábio ou habilidoso, mas passa a denotar aqueles que aparentam ser sábios, entretanto não alcançam a verdade.
A tentativa de identificar um pensador como sofista não é uma dificuldade historiográfica, mas sim indicar o que seria comum nesses pensadores, conforme Platão afirma em seu diálogo O sofista. Alguns pesquisadores concordam que esse fator seria a crença de que a virtude é ensinável, a qual é justamente o foco da crítica de Sócrates.
Leia também: Metafísica de Aristóteles – conjunto de tratados aristotélicos
Principais sofistas
Quem foi o primeiro ou principal sofista? Essa resposta não pode ser afirmada com facilidade, já que Protágoras, considerado o primeiro sofista, teria afirmado, conforme lemos no diálogo Protágoras, de Platão, que outros antes dele já praticavam a sofística, mas com métodos distintos do seu. Já no livro As vidas dos sofistas, do grego Filóstrato, escrito em meados do século III, essa arte é identificada com a retórica.
Protágoras, da antiga cidade grega Abdera (na região da Trácia), nasceu em 490 a.C. e é considerado o primeiro sofista. É indicado como discípulo de Demócrito e conhecido por afirmar que “o homem é a medida de todas as coisas”. Um conhecimento além das opiniões, em outras palavras, das aparências, não seria possível. Muitos filósofos indicam nessa afirmação a base do pensamento relativista.
Hípias foi um sofista natural do oeste da Grécia (atual cidade da Élida) que atribuía a si a capacidade de versar sobre assuntos variados, fruto de sua excelente memória, como astronomia, matemática, pintura e poesia. Xenofonte indica que Hípias teria debatido com Sócrates sobre justiça diferenciando as leis naturais e das convencionais.
Trasímaco figura principalmente no início de A república, em que expressa a opinião de que “a justiça seria apenas a vantagem do mais forte”. Há certeza apenas de que nasceu na antiga cidade da Calcedônia (atual Kadıköy, na província de Istambul), sendo poucas as informações sobre sua vida e seus possíveis escritos.
Górgias nasceu em Leontinos, atual Lentini (localizada na província italiana de Siracusa), e não é apresentado como um sofista por Sócrates. Essa observação resulta de sua recusa em acreditar que a virtude é ensinável. Grande parte de seu livro Sobre o que não é chegou até nós e apresenta um problema: mesmo que se algo existisse, não poderíamos conhecê-lo e não se pode comunicar o que não é conhecido. Estaria, assim, apresentando uma crítica a Parmênides.
A crítica de Sócrates
O aspecto negativo que atribuímos aos sofistas é baseado na crítica de Sócrates a esse grupo de pensadores. Vemos nos diálogos platônicos, por meio de Sócrates, que os sofistas propõem apenas verdades relativas. Na ausência de uma verdade absoluta, torna-se mais fácil praticar a erística, a saber, a tentativa de alcançar sucesso em qualquer debate. Uma das descrições, que alguns sofistas atribuíam a si mesmos, era a habilidade de refutar qualquer assunto. Sua elogiável oratória favorecia a aparência de sábios, mas o interesse pela verdade não estava presente.
O que o sofista oferecia, então, era um produto àqueles que pagavam pelo seu serviço. A proposta socrática, por outro lado, visava transformar aqueles com os quais dialogava, libertando-os do domínio das sombras e conduzindo-os para um conhecimento real. Sem esse procedimento dialético, que inclui o abandono das opiniões, qualquer discurso belo pode convencer tanto da falsidade quanto da verdade sobre um assunto.
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Importância dos sofistas para a filosofia
Embora os fragmentos que restaram sejam pouquíssimos, estudos recentes procuram observar as contribuições próprias desses pensadores para uma cultura que começava a questionar seus valores religiosos. A valorização do cuidado com as palavras e a distinção entre leis naturais e leis artificiais são as propostas mais relevantes para os períodos posteriores da filosofia. Não se pode esquecer, também, que o estudo da retórica foi em grande parte motivado pelo uso que esses pensadores fizeram do discurso na política ateniense.
O que não se pode duvidar, em todo caso, é que esses pensadores foram considerados sábios, no sentido próprio da palavra, e representaram um momento importante na história da filosofia.
Trechos selecionados
Sobre a verdade, atribuído a Antifonte:
"A justiça consiste, então, em não transgredir as prescrições da cidade na qual se é cidadão. Isso dito, um homem utilizaria a justiça em seu maior proveito se, na presença de testemunhas, respeitasse as leis, mas, uma vez só e sem testemunhas, se respeitasse as prescrições da natureza; pois as prescrições das leis são impostas, enquanto as da natureza são necessárias; e as da lei são o resultado de um acordo, não se produzindo naturalmente, enquanto que as da natureza se produzem naturalmente, não sendo o resultado de um acordo." |1|
Elogio de Helena, de Górgias:
“[E]xiste uma mesma relação entre poder do discurso e disposição da alma, dispositivo das drogas e natureza dos corpos: assim como tal droga faz sair do corpo um tal humor, e que umas fazem cessar a doença, outras a vida, assim também, dentre os discursos, alguns afligem, outros encantam, fazem medo, inflamam os ouvintes, e alguns, por efeito de alguma má persuasão, drogam a alma e a enfeitiçam." |1|
Notas
|1| CASSIN, Barbara. O efeito sofístico: Sofística, filosofia, retórica, literatura. Tradução de Ana Lúcia de Oliveira, Maria Cristina Franco Ferraz, Paulo Pinheiro. São Paulo: Editora 34, 2005.