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Desde suas origens, o cristianismo, enquanto doutrina, apresentava uma característica bastante peculiar se comparado com outras religiões monoteístas, como o islamismo e o judaísmo: a explícita separação entre a ordem temporal e a ordem espiritual, entre o poder terreno e o poder celeste. Em inúmeras passagens dos evangelhos canônicos, Jesus Cristo rejeita “aquilo que é de César” (poder secular, temporal) e reivindica para si aquilo que é dos Céus, o poder espiritual, poder sobre as almas. A obra “Cidade de Deus”, de Santo Agostinho, já refletia muito bem está incompatibilidade. No século XI, a chamada Reforma Gregoriana procurou resolver esse impasse entre Igreja e Sacro Império.
Essa característica do cristianismo determinou os rumos que a civilização ocidental trilharia em direção à constituição de uma ordem política que assegurasse o equilíbrio na Europa após a queda do Império Romano. O Império Bizantino, como tentativa de continuidade do Império Romano no Oriente, procurou desenvolver uma estrutura política que mesclasse o poder secular e o espiritual na figura do imperador. Esse tipo de política ficou conhecido como cesaropapismo. Entretanto, os reinos que se formaram na parte Ocidental da Europa durante a Idade Média não conseguiram subordinar a autoridade espiritual da Igreja à sua estrutura política.
Em alguns momentos, a situação entre imperadores e papas chegou a gerar enormes tensões. Com o Sacro Império Romano-Germânico, alguns dos imperadores tentaram exercer influência sobre o clero, interferindo inclusive na nomeação de cargos dentro da Igreja. A rejeição da Igreja às propostas dos imperadores provocou a chamada Querela das Investiduras, isto é, disputas entre papas e imperadores com relação ao direito de investir (nomear e autorizar) clérigos e nobres.
Um dos principais momentos dessa querela foi a Reforma Gregoriana, ocorrida no século XI. Essa reforma levou esse nome em referência ao Papa Gregório VII (1020-1085), que elaborou um programa de regulamentações do pontificado católico. As principais diretrizes da reforma de Gregório VII foram redigidas no famoso documento intitulado Dictatus Papae (Ditos do Papa). Essas diretrizes passaram a ser o molde de várias alterações que foram feitas pela Igreja Católica e articuladas com os imperadores até 1215 com o IV Concílio de Latrão.
Entre essas diretrizes, estavam: um estabelecimento claro das diferenças de papeis entre os leigos (pessoas não ordenadas ao sacerdócio da Igreja) e clérigos — essa primeira diretriz reforçava a instituição do celibato clerical (os padres não podiam contrair matrimônio ou manter relações sexuais), que vigorava desde o século IV; a instituição dos sete sacramentos: batismo, crisma, eucaristia, ordem (apenas para clérigos), casamento (apenas para leigos), confissão e unção dos enfermos. Essa última diretriz visava também à orientação espiritual durante toda a vida do fiel católico a fim de torná-lo cônscio do papel da Igreja como “corpo de Cristo” na Terra. Além disso, houve o reconhecimento das ordens monásticas mendicantes, como os franciscanos e dominicanos.
Por Me. Cláudio Fernandes