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Ao longo de sua história, a Rússia foi governada por diversos imperadores – a maioria deles vinculada a duas dinastias: Rurik e Romanov. A intenção deste texto é destacar alguns eventos do período da dinastia Rurik, que existiu entre os séculos IX e XVI.
Tópicos deste artigo
Dinastias russas
Conforme mencionado, a história política russa é marcada pela existência de duas grandes dinastias que governaram o país ao longo dos séculos. A dinastia Rurik iniciou-se quando o princípe Rurik foi convidado pelos senhores de Novgorod a assumir o trono de sua cidade em 862. A ascensão de Rurik ao trono de Novgorod e a sucessão de seus herdeiros deram início à Rus Kievana.
A Rus Kievana foi um Estado surgido a partir da conquista de territórios e da união de tribos eslavas e finlandesas sob o comando de Kiev (os sucessores de Rurik transferiram o trono de Novgorod para Kiev). Foi nesse período, inclusive, que o Catolicismo Ortodoxo ganhou força nessa região correspondente à atual Rússia.
A dinastia Rurik continuou hegemônica na região quando a Rus Kievana entrou em decadência. Eles ocuparam o trono do ascendente Grão-Ducado de Moscou. Os reis da dinastia rurik ocuparam o trono moscovita até o final do século XVI, e o fim dessa dinastia ocorreu a partir de 1598, quando morreu o czar Teodoro I e iniciou-se o Tempo das Dificuldades.
O Tempo das Dificuldades foi um período conturbado da história russa, sendo marcado por fome, guerras, violência generalizada e disputas dinásticas. A Rússia foi invadida por tropas estrangeiras da Polônia e Suécia enquanto o trono era disputado. A disputa pelo trono aconteceu porque não havia herdeiros diretos ao trono da dinastia Rurik.
Considera-se o fim desse período quando Mikhail Fiodorovitch Romanov foi escolhido e eleito pelos boiardos (nobres russos) para ocupar o trono moscovita. A ascensão de Mikhail (ou Miguel, aportuguesando) ao trono aconteceu em 1613 e, com ele, iniciou-se a dinastia Romanov, que governou a Rússia até 1917, quando o então último imperador, Nicolau II, foi destituído do trono durante os desdobramentos da Revolução Russa.
Durante a dinastia Romanov, o poder do Império Russo consolidou-se e centralizou-se. Novas regiões foram conquistadas e integradas ao império governado a partir de Moscou. A partir do século XVIII, os Romanov transferiram a sede do governo para São Petersburgo e lá permaneceram até a queda da dinastia.
Estabelecimento de Rurik e a Rus Kievana
Torres do Kremlin de Novgorod, cidade em que Rurik tornou-se rei em 862
O protótipo do que um dia se tornaria o Estado Russo nasceu no século IX, nas terras entre os rios Dniepre e Volga. Nessa época, toda aquela região era habitada por diversas tribos de povos eslavos e finlandeses, que sobreviviam da pesca, caça e coleta, bem como da agricultura e do comércio das mercadorias excedentes que eram produzidas.
A riqueza dos comércios estabelecidos naquela região (além de mercadorias das redondezas, os mercados dessa localidade possuíam mercadorias vindas do Oriente) atraiu exploradores vikings, sobretudo suecos, à procura de riqueza fácil. Esses exploradores vikings, conhecidos como varangianos, ganharam força e influência sobre as populações locais.
Um desses varangianos era Rurik, um príncipe sueco que foi convidado pelos nobres de Novgorod e das redondezas a ocupar o trono de sua cidade a partir de 862. Segundo Janet Martin, os senhores de Novgorod convidaram Rurik a assumir o comando da cidade porque acreditavam que ele conseguiria trazer segurança, garantindo assim a paz e a prosperidade de Novgorod|1|.
Rurik governou até 879 ou 882 (a data varia de acordo com a fonte), e seus sucessores deram continuidade ao seu legado. Seu sucessor foi Oleg, que transferiu a capital para Kiev e foi o responsável por conquistar inúmeros territórios. Durante seu governo, estabeleceu-se o Estado Kievano, conhecido como Rus Kievana.
A partir disso, o Estado Kievano cresceu e prosperou conforme o registro abaixo:
Segundo a Crónica, o número de tribos súbditas dos Ruriques aumentou, incluindo os Kriviches (na região das colinas Valdai), os Polianos (perto de Kiev, no rio Dniepre) e os Drevlianos a sul do rio Pripiat, tributário do Dniepre). Além disso, os Ruriques haviam tomado o controlo do Dniepre, uma artéria comercial importante. Da posição estratégica de Kiev, podiam controlar todo o tráfego que se movia para o Mar Negro, para a colónia bizantina de Kherson e em direção à rota marítima para o rio Don e o Império Cazar. Oleg, em 907, e Igor, em 944 com menos sucesso realizaram campanhas militares contra Constantinopla, que resultaram em tratados que permitiram que a Rus negociasse não só em Kherson, mas também nos mercados ricos da própria Constantinopla, onde contactavam com mercadores e tinham acesso a bens de praticamente todo o mundo conhecido|2|**.
À medida que a Rus Kievana crescia e prosperava, foi surgindo toda uma estrutura de burocracia governamental que dava suporte a todas as questões administrativas. Os reis passaram a dividir o território kievano, e sua administração era entregue a diferentes príncipes da linha de sucessão da dinastia Rurik.
A dinastia Rurik teve papel essencial na consolidação do cristianismo ortodoxo como religião hegemônica da Rússia. O cristianismo foi transformado em religião oficial durante o reinado de Vladimir (980-1015). Vladimir inicialmente havia adotado práticas religiosas pagãs que tinham características herdadas da religiosidade nórdica, eslava e fínica (finlandesa).
No entanto, durante seu reinado, Vladimir deixou essas práticas religiosas e adotou o cristianismo como religião. Abandonou suas diversas esposas e casou-se com a irmã do imperador bizantino Basílio. Foi estabelecida uma sé ortodoxa em Kiev e foram enviados clérigos por todo o domínio kievano para pregar o cristianismo ortodoxo.
O enriquecimento de Rus aliado ao fortalecimento do cristianismo ortodoxo naquele reino fez com que diferentes igrejas fossem construídas ao longo do tempo: Igreja da Transfiguração de Nosso Salvador, em 1035; Igreja da Mãe de Deus, entre 1136-1137, e a Catedral da Dormição em 1158. Essas diferentes igrejas foram construídas respectivamente nas cidades de Chernigov, Smolensk e Vladimir|3|.
O enfraquecimento do Estado Kievano ocorreu a partir do século XII, principalmente por uma série de disputas dinásticas que provocaram diversas guerras civis. A sucessão do trono em Kiev acontecia de maneira lateral, e o herdeiro seria o parente mais velho da geração mais velha da dinastia Rurik. Assim, havia muita confusão e disputa pelo trono. Isso, no longo prazo, enfraqueceu Kiev.
Seguiu-se ao enfraquecimento de Kiev uma invasão estrangeira: os mongóis. Entre 1237 e 1240, Batu Khan, neto do grande Gêngis Khan, conquistou os territórios pertencentes a Rus e impôs um canato (império), obrigando os russos kievanos a lhe pagar tributos. Os mongóis dominaram essa região correspondente à Rússia até 1480 e só foram expulsos por ação do Grão-Ducado de Moscou.
Uma mudança sensível que aconteceu nesse período foi a transferência do centro de poder de Kiev para Moscou, que passou a ser governada por membros da dinastia Rurik até o final do século XVI. Essa mudança foi gradual e aconteceu à medida que a cidade de Moscou se enriquecia e aumentava sua influência sobre as regiões vizinhas.
Fim da dinastia Rurik
Considera-se que a dinastia Rurik chegou ao fim quando, em 1598, Teodoro I faleceu, deixando o trono russo sem governantes, uma vez que não havia mais nenhum sucessor dos Rurik vivo. Isso inaugurou um período da história russa conhecido como Tempo das Dificuldades, como já mencionado.
O último herdeiro de Teodoro I havia sido Demétrio, filho mais novo de Ivan IV, morto em 1591 sob circunstâncias não esclarecidas. A falta de herdeiros fez com que dois impostores surgissem, alegando ser o Demétrio que havia morrido em 1591.
Os falsos Demétrios foram apoiados por diferentes nobres russos e aliaram-se com forças estrangeiras (polacos e suecos). Isso resultou na invasão do território russo tanto por tropas polonesas como por tropas suecas. Houve a perda de território para as duas nações, e o poder de Moscou foi ocupado brevemente por forças polonesas.
Tantas guerras aumentaram as dificuldades econômicas que já existiam na Rússia por causa de administrações ruins de czares anteriores. Isso resultou no enfraquecimento do poder moscovita, mas também espalhou fome por todo o interior do território russo. A questão dinástica foi resolvida em 1613, quando Mikhail Fiodorovitch Romanov (Miguel I) foi escolhido para ser o novo czar.
A paz com os invasores suecos e poloneses só foi resolvida a partir de acordos realizados ao longo da década de 1610, porém, os russos foram obrigados a ceder uma série de territórios para ambos. Iniciou-se a partir desse momento a dinastia dos Romanov (estiveram no poder da Rússia até 1917).
|1| MARTIN, Janet. De Kiev à Moscóvia. In.: FREEZE, Gregory L. (org.). História da Rússia. Lisboa: Edições 70, 2017, p. 37.
|2| Idem, p. 37.
|3| Idem, p. 41.
*Créditos da imagem: ppl e Shutterstock
**O trecho citado foi retirado de um livro traduzido para o português de Portugal, assim, segue com palavras e expressões típicas originais.
Por Daniel Neves
Graduado em História