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Crise na Venezuela

A crise na Venezuela é resultado do fracasso do projeto político chavista, sobretudo com o governo de Nicolás Maduro, iniciado em 2013, após o falecimento de Hugo Chávez.

A crise na Venezuela tem afetado o país desde 2013, e a situação está cada dia mais grave.
A crise na Venezuela tem afetado o país desde 2013, e a situação está cada dia mais grave.
Crédito da Imagem: Shutterstock
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Desde meados de 2013, a Venezuela arrasta-se em uma crise que piora a cada dia. Atualmente, o país encontra-se em uma encruzilhada, enfrentando uma crise política em razão da disputa entre Nicolás Maduro (e seu partido — Partido Socialista Unido da Venezuela) e a oposição venezuelana, que denuncia os abusos de poder cometidos pelo presidente. Além disso, existem a crise econômica, a crise humanitária e ainda o risco de uma intervenção liderada pelos Estados Unidos.

Leia também: Biografia e trajetória política de Nicolás Maduro

Tópicos deste artigo

Antecedentes históricos: o chavismo na Venezuela

Uma compreensão do que ocorre na Venezuela só é possível por meio de uma breve análise sobre o chavismo nesse país. A ascensão política de Hugo Chávez na Venezuela aconteceu na década de 1990. Chávez era um paraquedista do exército venezuelano e envolveu-se em uma tentativa de golpe contra o então presidente Carlos Pérez no ano de 1992.

Chávez era membro do Movimento Bolivariano Revolucionário 200, um movimento de esquerda que visava à tomada do poder no país. O golpe fracassou, Chávez foi preso, mas tornou-se uma figura extremamente popular no país e foi libertado pelo presidente seguinte da Venezuela, Rafael Caldeira.

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Chávez saiu da prisão e lançou-se à candidatura presidencial, com um discurso de ataque aos políticos do país e prometendo refazer a democracia venezuelana. Afirmava buscar a realização de maior justiça social por meio do principal produto do país, o petróleo. Hugo Chávez venceu a eleição em 1998 e iniciou um longo processo no poder, que se estendeu por catorze anos. Nesse período, Chávez venceu quatro eleições (1998, 2000, 2006 e 2012).

Durante os catorze anos no poder, Hugo Chávez promoveu uma ampla distribuição de renda no país. Conseguiu aumentar o Produto Interno Bruto (PIB) da Venezuela, diminuiu sensivelmente o número de pobres do país, reduziu a mortalidade infantil etc. O chavismo, porém, contribuiu abertamente para a corrosão da democracia venezuelana.

Chávez aparelhou o Supremo Tribunal do país ao aumentar o número de juízes de 20 para 32. Os 12 novos juízes eram adeptos do chavismo. Durante seu governo, Hugo Chávez também promoveu a perseguição de opositores e procurou, por meio de pequenas reformas, perpetuar-se no poder.

As contradições do chavismo criaram uma situação na qual muitos tornaram-se defensores convictos do governo, porque as ações de distribuição de renda e de combate à pobreza beneficiaram essas pessoas. Por outro lado, as ações do governo criaram uma oposição, que atuou de maneira radicalizada, inclusive tentando retirar Chávez do poder à força, como ocorreu em 2002.

Nicolás Maduro
Nicolás Maduro assumiu a presidência da Venezuela após o falecimento de Hugo Chávez em 2013.*

Depois do falecimento de Hugo Chávez, vítima de um câncer, o poder do país passou de maneira provisória para o vice, Nicolás Maduro. De 2013 em diante, Maduro tornou-se presidente de fato do país, após ser eleito com uma vitória apertada sobre Henrique Caprilles. Desde então, o quadro na Venezuela agravou-se consideravelmente, e a crise econômica embrionária tomou grandes proporções.

A crise da economia venezuelana

A crise na Venezuela está diretamente ligada com a desvalorização do petróleo no mercado internacional, o que aconteceu a partir de 2014. As reservas de petróleo foram descobertas na Venezuela no começo do século XX e, desde então, tornaram-se a principal fonte de riqueza do país sul-americano.

A Venezuela é membro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e, atualmente, é o país com as maiores reservas de petróleo do mundo. Durante o governo chavista, todos os ganhos sociais da Venezuela foram financiados com o dinheiro que era trazido ao país por meio da venda de petróleo.

Porém, a riqueza do petróleo criou um país extremamente dependente dessa commodity (produto que tem seu valor baseado pela oferta no mercado internacional). A dependência do petróleo fez com que a Venezuela não investisse o suficiente na sua própria indústria e agricultura. Assim, o país comprava tudo o que não produzia.

O estopim da crise foi a queda do preço do barril do petróleo no mercado internacional. Em junho de 2014, o preço do barril de petróleo era de US$111,87 e, em janeiro de 2015, o valor era de US$48,07. Isso teve resultado direto no PIB do país, que caiu quase 4% no ano de 2014. A queda do valor do petróleo impactou diretamente o abastecimento do mercado venezuelano, uma vez que, sem dinheiro, o governo parou de comprar itens básicos do cotidiano da população.

Mercado venezuelano
Mercado venezuelano completamente vazio como um reflexo da crise econômica que atinge o país.**

Além disso, a partir de 2017, o governo americano, liderado pelo presidente Donald Trump, começou a impor uma série de sanções à economia venezuelana, em represália ao autoritarismo de Nicolás Maduro no comando da Venezuela. Essas sanções agravaram a situação econômica e forçaram o país a reduzir a quantidade de petróleo exportado, por exemplo. Essa redução da produção de petróleo também é fruto da má gestão da estatal venezuelana, a Petróleos de Venezuela (PDVSA).

Essa atual crise econômica da Venezuela transformou-se na maior crise da história econômica do país. A redução do valor do barril do petróleo, a ineficiência do governo e as sanções americanas levaram o país à situação atual. Itens básicos, como medicamentos, alimentos e papel higiênico, não são encontrados facilmente nos supermercados, e, quando são encontrados, seus preços são exorbitantes.

A falta de alimentos levou milhares de venezuelanos a passarem fome, e dados comprovam que, em 2017, a população emagreceu, em média, 11 kg|1|. Muitas mães têm entregado seus filhos às autoridades por não terem condições de sustentá-los, e muitas famílias têm sido obrigadas a comprarem carne estragada, pois é a única a que têm acesso.

A crise da economia venezuelana pode ser mais bem entendida por meio das estatísticas:

  • A inflação da Venezuela em 2018 ultrapassou 1.300.000%|2|.

  • A pobreza extrema do país saltou de 23,6%, em 2014, para 61,2%, em 2017|3|.

  • Entre 2013 e 2017, o PIB do país caiu 37%, e a estimativa para 2018 é de que ele tenha caído 15% (ainda não existem dados oficiais sobre o PIB venezuelano em 2018)|4|.

  • O salário-mínimo atual da Venezuela corresponde atualmente a R$77|5|.

  • Em decorrência da crise política e econômica no país, quase três milhões de venezuelanos deixaram o país|6|.

A crise política, econômica e humanitária que atingiu a Venezuela fez com que sua população procurasse refúgio em nações vizinhas. Como recém-mencionado, quase três milhões de venezuelanos já fugiram do país desde 2015, e acredita-se que, até o fim de 2019, esse número possa alcançar a quantidade de cinco milhões de pessoas. Os dois países que mais receberam refugiados venezuelanos foram Colômbia e Peru. A entrada de refugiados venezuelanos no Brasil resultou em uma crise migratória em Roraima, estado de poucos recursos localizado no norte do país. Para entender mais sobre os impactos da imigração venezuelana no Brasil, sugerimos a leitura deste texto.

Crise política

A crise política é outra faceta do quadro caótico que a Venezuela encara atualmente. No governo de Hugo Chávez, a relação com a oposição já era tumultuada — como mencionado, houve uma tentativa de golpe contra Chávez em 2002. No entanto, durante o governo de Maduro, a guinada do país rumo ao autoritarismo foi total, e sua situação atual é delicada.

Como já visto, o projeto político do chavismo começou a ser intensamente criticado por conta de sua guinada ao autoritarismo. Depois da morte de Chávez, a disputa pelo poder intensificou-se, e a eleição de 2013 foi um símbolo disso: Maduro venceu a disputa contra Henrique Caprilles, obtendo 50,61% dos votos contra 49,12% de seu opositor, uma margem de diferença muito pequena.

Maduro assumiu a Venezuela quando a crise da economia do país começava a despontar. Isso reforçou a oposição do país contra o governo e levou Maduro a usar de mecanismos de força para combater e calar seus opositores. Em 2016, por exemplo, a oposição de Maduro começou a articular-se para convocar um referendo revogatório do mandato de Maduro. O Conselho Nacional Eleitoral do país, porém, adiou a data de acolhimento das assinaturas necessárias, e o processo de referendo revogatório não evoluiu por isso.

A pressão sobre o governo Maduro era grande, porque, em 2015, a correlação de forças no Legislativo venezuelano alterou-se quando a oposição conseguiu eleger a maioria de parlamentares. A pressão sobre Maduro vinda da Assembleia Nacional o fez adotar um mecanismo para enfraquecê-la, e, em 2017, Maduro propôs a convocação de uma Constituinte para redigir uma nova Constituição para a Venezuela.

A oposição acusou Maduro de utilizar a convocação de uma Constituinte como uma forma para combater e enfraquecer a atuação dos parlamentares na Assembleia Nacional, e, por isso, a oposição não lançou nenhum candidato para se eleger por esse modo. O referendo de convocação da Constituinte foi acusado de ser fraudado pelo governo.

Protesto contra Nicolás Maduro
Imagem de protesto organizado contra Maduro. No cartaz diz: “Todos somos suspeitos e perseguidos pelo regime”.***

Enquanto toda essa disputa política acontecia, as ruas venezuelanas ferviam com as manifestações sociais contra o governo de Maduro. A reação do governo foi a de reprimir os protestos com violência. Além disso, os opositores começaram a ser perseguidos e presos. Existem denúncias de que tropas do governo estão coordenando execuções de pessoas que se manifestam contra Maduro.

Em 2018, foi realizada eleição presidencial na Venezuela, com Nicolás Maduro concorrendo à reeleição contra Henri Falcón. A oposição venezuelana estava enfraquecida devido à perseguição promovida pelo governo, e Maduro obteve a vitória ao conquistar quase 68% dos votos. Acontece que essa eleição não foi reconhecida pela oposição e nem por parte da comunidade internacional, incluindo o Brasil. A denúncia da oposição foi de fraude realizada por agentes do governo na contagem e por meio da compra de votos.

O mais recente capítulo da crise política da Venezuela deu-se pelo pronunciamento do presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, realizado no começo de 2019. O político venezuelano de 35 anos autoproclamou-se presidente interino da Venezuela enquanto o país estiver em processo de transição de poder.

Juan Guaidó
Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional que se autoproclamou presidente da Venezuela no começo de 2019.****

Desnecessário mencionar que o anúncio de Guaidó foi imediatamente rejeitado por Maduro. A situação deste, por sua vez, está cada vez mais delicada, porque parte da comunidade internacional reconheceu Juan Guaidó como presidente venezuelano. Isso inclui os países: Estados Unidos, Canadá, Espanha, França e, até mesmo, o Brasil.

Os países como Rússia, China, África do Sul e Cuba declararam apoio a Maduro, e o presidente venezuelano sustenta-se no poder única e exclusivamente pelo fato de ter ainda o apoio das Forças Armadas venezuelanas. Isso acontece porque Maduro reforçou seu apoio aos militares, fornecendo-lhes importantes cargos no governo venezuelano em troca de fidelidade. Até o momento, a presidência do país segue em disputa, com Nicolás Maduro sendo o presidente de fato do país, mas com Juan Guaidó tendo certo reconhecimento internacional.

Os riscos atuais que envolvem a crise da Venezuela são o de ameça de guerra e o de uma intervenção americana no país. Estudiosos e especialistas de Relações Internacionais apontam que os Estados Unidos têm conduzido a situação da Venezuela de maneira a forçar a troca de regime no país. Com o agravamento da crise, a comunidade internacional passou a pressionar a Venezuela para que o país recebesse equipes de ajuda humanitária.

Pacaraima
Pacaraima, cidade do estado de Roraima que faz fronteira com a Venezuela e tem sofrido os impactos da crise de imigração de venezuelanos.*****

A Venezuela, por sua vez, nega essa ajuda humanitária, alegando que ela é apenas uma justificativa dos Estados Unidos para intervirem diretamente no país. A reação do presidente Maduro foi ordenar o fechamento das fronteiras do país com Colômbia, Brasil e Aruba. A situação nas fronteiras com Colômbia e Brasil está tensa, com notícias de que militares venezuelanos têm reprimido a população, que se aglomera nas regiões fronteiriças exigindo passagem.

A tensão levou muitos a levantarem a possibilidade de um conflito armado entre Brasil e Venezuela, mas declarações de agentes do governo brasileiro deram conta de que o país continuará com a linha de não intervenção no país vizinho. A tensão atual segue devido a uma possível intervenção dos Estados Unidos na Venezuela — ação criticada por muitos como forma de os Estados Unidos obterem acesso à produção petrolífera do país. A situação na Venezuela segue indefinida, e somente a transição democrática deve servir de solução para a crise que se instalou no país.

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|1| Fome obriga mães a darem os próprios filhos na Venezuela. Para acessar, clique aqui.
|2| Inflação da Venezuela supera 1.000.000% em 12 meses. Para acessar, clique aqui.
|3| Encuesta sobre condiciones de vida en Venezuela. Para acessar, clique aqui [em espanhol].
|4| O que levou a Venezuela ao colapso econômico e à maior crise da sua história. Para acessar, clique aqui.
|5| Maduro anuncia aumento de 300% no salário mínimo na Venezuela. Para acessar, clique aqui.
|6| ONU informa que 2,7 milhões de venezuelanos já deixaram seu país, desde 2015. Para acessar, clique aqui.


*Créditos da imagem: Golden Brown / Shutterstock
**Créditos da imagem: Sunsinger / Shutterstock
***Créditos da imagem: Edgloris Marys / Shutterstock
****Créditos da imagem: Ruben Alfonzo / Shutterstock
*****Créditos da imagem: Matyas Rehak / Shutterstock


Por Daniel Neves
Graduado em História

Escritor do artigo
Escrito por: Daniel Neves Silva Formado em História pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) e especialista em História e Narrativas Audiovisuais pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Atua como professor de História desde 2010.

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

SILVA, Daniel Neves. "Crise na Venezuela"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historia-da-america/crise-na-venezuela.htm. Acesso em 25 de abril de 2024.

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