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Ideologia

A ideologia é um termo de vários sentidos, podendo ser um estudo do conjunto de ideias ou uma manipulação hegemônica para dominar as pessoas.

Ilustração de uma sombra dominando um grupo de pessoas em referência à ideologia.
A ideologia, quando aliada à política, pode ser instrumento de manipulação.
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O termo “ideologia” é polissêmico, ou seja, possui vários sentidos. Essa multiplicidade de sentidos torna difícil a precisa identificação e conceituação da palavra. Teoricamente, a ideologia em si é quase tão antiga quanto a filosofia, tendo seus primórdios remetidos à Antiguidade Clássica, com os pensamentos do filósofo Aristóteles. Porém, o termo somente foi criado na modernidade com o filósofo francês Destutt de Tracy, ganhando o escopo de uma ciência que abordaria a formação e a construção das ideias.

Os positivistas, liderados pelo também filósofo francês Auguste Comte, firmaram suas teorias na necessidade da ideologia como aquela ciência que seria capaz de tornar o que é abstrato passível de um estudo mais rigoroso. Porém, uma corrente crítica do termo instalou-se no século XIX, propondo uma visão que perdura até hoje.

Leia também: Poder – conceito amplamente discutido nas Ciências Humanas na contemporaneidade

Tópicos deste artigo

O que é ideologia?

O senso comum entende a ideologia como um simples conjunto de ideias ou uma idealização sobre algo. Porém, a ideologia é muito mais do que isso. Podemos conceituar ideologia de duas formas: a visão clássica e a visão crítica. Na visão clássica, o termo tem o significado de uma espécie de ciência capaz de organizar metodicamente e estudar rigorosamente o conjunto de ideias que formam a intelectualidade humana. Na visão crítica, a ideologia é uma ilusão criada por uma classe para manter a aparente legitimidade de um sistema de dominação.

A filósofa brasileira Marilena Chaui escreveu, em seu livro O que é ideologia?, que a origem da ideologia está entre os gregos, que, sem saber do debate que se instauraria mais de 2.000 anos depois, separavam em sua vida intelectual dois tipos de atividade: a atividade técnica e prática, denominada de poiésis, e a atividade do livre pensamento filosófico intelectual sobre a ética e a política, denominada de práxis.

A poiésis era a atividade dos comerciantes, artistas, artesãos, soldados e escravos, ou seja, era o trabalho e a produção técnica, que não demandavam esforço intelectual. A práxis era a filosofia e o cuidado intelectual com a política e com a ética, demandando esforço intelectual. Essa última era superior à primeira e lidava com a ação respaldada por ideias.

Os gregos clássicos valorizavam, portanto, as ideias, e cada postulado filosófico deles era proposto como sendo uma realidade única e universal. Assim sendo, eles não conseguiam enxergar que havia um contexto histórico e uma visão pessoal de mundo que os faziam pensar daquela maneira. Os filósofos clássicos, como Platão e Aristóteles, já possuíam ideologias, mas não sabiam.

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A visão clássica de ideologia teve origem com o filósofo francês moderno Destutt de Tracy. Tracy era um entusiasta dos ideais promovidos pelo iluminismo e acreditava que a Revolução Francesa era o melhor meio de promover as mudanças necessárias na sociedade francesa para que o país pudesse, de fato, progredir. Ele era antimonarquista convicto e também era considerado um pensador materialista. Para o materialismo, apenas os fatos concretos e materiais devem tomar a frente para qualquer compreensão do mundo, valorizando a ciência e rejeitando a metafísica e a religião ou qualquer outro tipo de abstração ou idealismo.

 Destutt de Tracy, o criador do termo ideologia.
 Destutt de Tracy, o criador do termo ideologia.    

Segundo Tracy, a melhor maneira de estudar as ideias de maneira científica e historicamente bem alocadas era por meio da ideologia. O filósofo francês considerado o “pai” da Sociologia e fundador do positivismo, Auguste Comte, afirmou o valor dessa ciência proposta por Destutt de Tracy, enxergando-a como o principal meio de avanço do pensamento no abstrato campo das ideias.

Ideologia para Karl Marx

O filósofo e sociólogo alemão Karl Marx, considerado o fundador do socialismo científico e criador do método de análise social materialista histórico dialético, foi quem teceu um olhar crítico sobre a ideologia. A partir da visão crítica de Marx, o termo passou a ser designado como algo negativo. O materialismo histórico marxista não via a possibilidade de separar a produção de ideias da realidade histórica e material, defendendo que as ideias surgem em um determinado contexto e por um determinado motivo.

Para Marx, a ideologia tornou-se, então, instrumento de dominação da classe dominante (a burguesia) sobre a classe dominada (o proletariado). Havia, segundo o filósofo, uma infraestrutura (a economia) que mantinha o sistema capitalista de dominação. Essa infraestrutura era respaldada e legitimada por uma superestrutura, que consistiria no Estado, na política, na cultura, na religião e nas ideologias.

Marx acreditava que houve a criação de um grande aparato ideológico para fazer parecer que a manutenção e o predomínio dos interesses da burguesia sobre os interesses do proletariado era legítimo, moral e correto. Com isso, o Estado surgiu como um mecanismo de dominação com o sistema político. A cultura, a religião e a ideologia eram os meios de dominação cultural, que fazia com que o proletariado aceitasse a dominação. A ideologia era o meio de manter as pessoas calmas por meio de uma ilusão: a de que o capitalismo e a propriedade privada eram meios justos.

O filósofo marxista francês contemporâneo Louis Althusser aprimorou a visão crítica sobre a ideologia no século XX, partindo da visão marxista. Para Althusser, a ideologia opera por intermédio de um discurso lacunar. É um discurso aparentemente real, válido, que não está totalmente incorreto, mas deixa lacunas. As lacunas deixadas pelo discurso ideológico resultam em brechas para a legitimação falsa daquilo que não é legítimo. O discurso lacunar afirma coisas reais e, com isso, parece real, mas deixa brechas onde se encaixam as coisas irreais, aparentando ser verdadeiro, mas sendo, na realidade, falso.

Louis Althusser, o filósofo que atribuiu à ideologia o título de discurso lacunar.
Louis Althusser, o filósofo que atribuiu à ideologia o título de discurso lacunar.

Para que serve a ideologia?

Partindo da concepção clássica proposta por Destutt de Tracy, a ideologia serviria para compreender e organizar historicamente o conjunto de ideias formuladas pela sociedade. Para a vertente crítica, a ideologia serviria para manter a aparente veracidade de um discurso falso, com a finalidade de manter uma estrutura de dominação sobre as pessoas ou de tornar uma ideia falsa ou pequena como hegemônica.

Podemos exemplificar com alguns casos para tornar a compreensão da ideologia mais fácil:

  • Meritocracia: no sistema capitalista liberal, marcado pela desigualdade de classes e pela dominação de uma classe social mais forte, criou-se uma ideologia do mérito. Nesse sistema, acredita-se que o esforço individual é que faz a desigualdade. Quem estuda mais, trabalha mais e possui qualidades administrativas mais desenvolvidas consegue sobrepor-se economicamente. Consequentemente, as camadas mais pobres seriam compostas por pessoas que não merecem a riqueza por não terem se esforçado o bastante para conseguir a riqueza ou por não saberem administrar o dinheiro.
  • Ideologia de gênero: a partir do século XX, começou-se a discutir mais sobre as questões de gênero em razão do impulso dado pelos movimentos feministas à discussão do papel da mulher na sociedade. Com isso, passou-se a se discutir o que é ser mulher e o que é ser homem, e algumas teorias chegaram à conclusão de que ser homem e ser mulher não está vinculado ao sexo biológico, mas, sim, a uma questão de papéis sociais e culturais. Isso se tornou uma legitimação para pessoas transsexuais se assumirem enquanto pertencentes a um gênero oposto. Como modo de desqualificar essas teorias, setores conservadores da sociedade, chamaram as teorias de gênero de “ideologia de gênero”, conseguindo, assim, desqualificar o discurso de gênero como um discurso falso no âmbito da linguagem. É preciso deixar claro que uma pessoa que concorda com as teorias de gênero nunca deve usar a expressão “ideologia de gênero”, pois isso significa automática reprovação do discurso sobre o gênero.

Veja também: Dominação para Max Weber – a aceitação e a subordinação           

Tipos de ideologia

Do mesmo modo que se deve ter cuidado com o uso do termo ideologia aliado ao termo gênero, deve-se ter cuidado com a utilização do termo ideologia aliado a outros termos políticos. Se você concorda com um tipo de visão política, jamais a chame de ideologia. Se você acha que tal teoria compreende um conjunto de ideias falsas, ilusórias ou enganadoras, aí se justifica chamá-la de ideologia.

Porém, o senso comum chama de ideologia qualquer tipo de discurso, teoria ou conjunto de ideias, achando que qualquer visão política pode ser chamada de ideologia política. Assim sendo, criou-se um conjunto de “ideologias”, estando algumas delas dispostas a seguir:

  • Ideologia capitalista;
  • Ideologia liberal;
  • Ideologia conservadora;
  • Ideologia comunista;
  • Ideologia anarquista;
  • Ideologia democrática;
  • Ideologia nazista;
  • Ideologia fascista.
Escritor do artigo
Escrito por: Francisco Porfírio Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PORFíRIO, Francisco. "Ideologia"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/ideologia.htm. Acesso em 21 de dezembro de 2024.

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