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Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, conheça mais sobre o papel dos quilombos no Brasil

Conversamos com Dominga Natália, nascida e criada na comunidade Kalunga, uma das sociedades quilombolas mais antigas do Brasil

Em 25/07/2024 16h42 , atualizado em 25/07/2024 17h30
Rostos de mulherse negras sobao mapa da américa latina e do caribe
Há mais de 200 milhões de pessoas negras na américa latina e caribe Crédito da Imagem: Gabriel Franco
Ouça o texto abaixo!

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O Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, 25 julho, é uma data com relevância internacional e nacional. Pois, nesta região (América-Latina e Caribe), mais de 200 milhões de pessoas se consideram descendentes de povos africanos. O Brasil, por sua vez, concentra mais de 40 milhões de mulheres negras.

Mas, muitos desafios ainda se impõem para este grupo, por exemplo, conforme uma pesquisa publicada pelo Ministério da Igualdade Racial (MIR), 42,51% das pessoas em extrema pobreza, registradas no CadÚnico, são mulheres negras.

Mesmo com todas as adversidades que se impõem, as mulheres negras fazem história e moldam o presente das nações latinas e caribenhas. Exemplo disto, é Tereza de Benguela, mulher quilombola, homenageada no dia de hoje.

Também conhecida como Rainha Tereza, ela foi uma personagem importante na luta contra a escravidão e ocupou uma posição de liderança no Quilombo do Piolho, no Mato Grosso.   

Leia mais sobre os quilombos no Brasil 

Na busca de compreender melhor a luta diária das mulheres negras e o papel dos quilombos na construção do Brasil, fomos conversar com Dominga Natália, nascida e criada na comunidade Kalunga, um dos maiores e mais antigos quilombos do Brasil, hoje, ela atua como coordenadora pedagógica na região.

Veja tudo que descobrimos!

Dominga Natália

Surgimento da comunidade Kalunga

Natália nos conta que nasceu na comunidade, assim como seus pais e filhos, ela trabalha como coordenadora pedagógica, atua no ramo de turismo e também presta voluntariado na comunidade como tesoureira. Ela nos conta parte da história contada pelos seus antepassados sobre a origem do quilombo:

"As pessoas vieram para o quilombo em busca de liberdade e de oportunidade de vida livre. Isso há mais de 300 anos.

Foi formado o quilombo às margens do Rio Paraná e partir daí foi ramificando para as comunidades, formando um total de 39 comunidades, envolvendo uma área de 263 mil hectares, distribuída em três municípios que é Cavalcante, Teresina e Monte Alegre de Goiás e tem uma população bem grande, com 8 mil kalungas, mais ou menos."

Quilombolas, os construtores do Brasil

Dominga afirma que, "querendo ou não", os povos quilombolas foram e são os construtores do Brasil. Ela reconhece que não foi uma trajetória harmônica e diz que tanto os quilombolas, como os povos indígenas, formaram a nação e fizeram parte desta miscigenação e construção de saberes que agrega várias formas de vida. 

Natália declara:

"Se constituiu o Brasil com essa rica diversidade cultural e ancestral"

Ela também afirma que os quilombolas são os protetores e guardiões da biodiversidade brasileira. No caso dos Kalungas, os defensores do Cerrado.

Veja mais sobre o Cerrado

Desafios das mulheres negras

Sobres os desafios impostos as mulheres negras, Natália diz que percebe uma melhora, pelo menos dentro da sua comunidade, onde as mulheres têm, cada vez mais, liberdade para atuarem em diversas áreas, principalmente no turismo. 

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Sobre a atuação no turismo, ela disse:

"Você acaba convivendo com pessoas do mundo inteiro. Então, o saber, as culturas, a gente acaba tendo mais conhecimento, sabendo os direitos e ouvindo das outras mulheres como é também a vida delas. A gente acaba tendo essa troca de experiência e saberes" 

Ela também fala que há comunidades geridas totalmente por mulheres, o que aumenta a responsabilidade na manutenção da cultura local. 

Dominga explica a invisibilização das mulheres na sociedade de uma maneira geral:

"A mulher, até na hora de chamar alguém para fazer um trabalho, às vezes a pessoa não faz aquilo que pedimos para fazer. A pessoa faz do jeito que ela acredita que seja importante e não do jeito que a gente pediu para ser feito.

Acredito que isso é uma falta de ouvir a fala da mulher, de entender que a mulher tem o direito dela também, a vontade. É muito frustrante, saber que a fala da gente não tem valor, mesmo a gente pagando, então até o dinheiro da gente não tem valor?"

Natália também nos conta de uma amiga sua, professora e reitora, que fez uma reserva de hotel e ao chegar no local não foi identificada como reitora, por ser uma mulher preta. 

Ensinamentos quilombolas

Questiono Natália quais aprendizados ela vê que a sua sociedade quilombola têm para o resto do país. Ela destaca o respeito mútuo e, principalmente, o respeito aos mais velhos, também fala sobre a união, que se mantém apesar de conflitos e desavenças.

Além disso, ela fala sobre a maneira que as decisões são tomadas, Dominga disse:

"Se a gente mora em uma comunidade, as decisões devem ser em conjunto, de um coletivo, e não de uma pessoa individual. É um ensinamento que eu acho que se fosse levado para o mundo, as pessoas viveriam melhor"

Caminho para a equidade

Natália afirma que a primeira coisa que precisa ser conquistada para a sociedade caminhar em direção à equidade entre as pessoas de diferentes tipos, é a regularização fundiária, ela declarou:

"Todo mundo tem que ter o direito de ter a liberdade de onde mora, ter a certeza que você está ali e sua família vai ficar por ali enquanto quiser. É uma liberdade fundamental que os quilombos vêm lutando desde antes da libertação, pela liberdade."

Por fim, ela fala sobre a necessidade de equiparar as oportunidades e de respeitar o outro, independente de cor, gênero, credo ou religião.

 

Por Tiago Vechi

Jornalista