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Impossível não associar imediatamente o nome de Olavo Bilac ao parnasianismo, importante e polêmico movimento literário de nossas letras. Embora não tenha sido o precursor do movimento parnasiano, tornou-se o mais famoso poeta do estilo, ao lado dos escritores Alberto de Oliveira e Raimundo Correia. Bilac foi ávido defensor da literatura clássica, e tal engajamento pode ser notado em seus poemas, que resgataram, além dos elementos da literatura greco-romana, as formas fixas do lirismo.
Olavo Bilac deu preferência às formas fixas, tendo especial apreço ao soneto, forma clássica do gênero lírico documentada pela primeira vez na primeira metade do século II, na obra do escritor italiano Giacomo da Lentini. Embora o escritor hoje seja conhecido por seu vocabulário quase inacessível, por seu formalismo e culto à forma em detrimento do conteúdo, os sonetos de Olavo Bilac agradavam ao público e à crítica literária e foram repetidos à exaustão nos saraus e salões literários entre os anos de 1900 e meados da década de 1920. Sua popularidade, sobretudo entre a alta sociedade carioca da época, rendeu-lhe a alcunha de “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, título concedido pela revista Fon-fon, importante semanário que circulava na primeira metade do século XX.
Para que você conheça um pouco mais do preciosismo, da pureza da forma e da linguagem do poeta, o Brasil Escola selecionou cinco poemas de Olavo Bilac para você ler e admirar. Esses poemas foram tidos pela crítica literária como verdadeiras obras-primas do “Príncipe dos Poetas Brasileiros”. Boa leitura!
Olavo Bilac entre os membros-fundadores da Academia Brasileira de Letras (em pé, o quarto da esquerda para a direita)
OUVIR ESTRELAS
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."
(Poesias, Via-Láctea, 1888.)
NEL MEZZO DEL CAMIN...
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha...
E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.
Hoje, segues de novo... Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.
E eu, solitário, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.
(Poesias, Sarças de fogo, 1888.)
A UM POETA
Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, no silêncio e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!
Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica, mas sóbria, como um templo grego.
Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:
Porque a Beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.
(Tarde, 1919.)
LÍNGUA PORTUGUESA
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura;
Ouro nativo, que, na ganga impura,
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceanos largos!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
(Tarde, 1919.)
AS ONDAS
Entre as trêmulas mornas ardentias,
A noite no alto mar anima as ondas.
Sobem das fundas úmidas Golcondas,
Pérolas vivas, as nereidas frias:
Entrelaçam-se, correm fugidias,
Voltam, cruzando-se; e, em lascivas rondas,
Vestem as formas alvas e redondas
De algas roxas e glaucas pedrarias.
Coxas de vago ônix, ventres polidos
De alabatro, quadris de argêntea espuma,
Seios de dúbia opala ardem na treva;
E bocas verdes, cheias de gemidos,
Que o fósforo incendeia e o âmbar perfuma,
Soluçam beijos vãos que o vento leva...
(Tarde, 1919.)
Por Luana Castro
Graduada em Letras