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A Constituição de 1946 foi promulgada no dia 18 de setembro e foi o marco da primeira experiência democrática do Brasil: a Quarta República, também conhecida como República Populista. Essa Constituição foi resultado de um esforço realizado na política brasileira para a implantação de um regime mais democrático.
A Constituição de 1946 foi considerada pelos historiadores um documento que expressou os valores do liberalismo presente na política brasileira. Garantiu princípios democráticos, mas ainda manteve alguns aspectos conservadores, como a proibição do voto dos analfabetos. Esse documento foi substituído, em 1967, pelos militares, que haviam tomado o poder do país, em 1964.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Contexto da Constituição de 1946
- 2 - Montagem da Quarta República
- 3 - Principais pontos da Constituição de 1946
- 4 - Pontos negativos da Constituição de 1946
Contexto da Constituição de 1946
A Constituição de 1946 foi resultado da derrubada do Estado Novo, evento que se concretizou em outubro de 1945, com a deposição de Getúlio Vargas. O Estado Novo foi a ditadura gestada por Getúlio Vargas, na década de 1930, e que contou com forte apoio dos militares. Na ditadura varguista houve forte repressão, censura e uso da tortura como arma política.
A partir da década de 1940, sobretudo com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, os ares da política brasileira mudaram, e aquele apoio que Vargas recebeu para impor sua política autoritária transformou-se em apoio para a implantação de uma política em termos mais democráticos e liberais.
Todo o contexto internacional influenciava fortemente para que a opção pela saída democrática e liberal fosse tomada no país. Vargas percebeu esse clima e procurou transformar sua estratégica política. Daí nasceu o trabalhismo, uma ideologia política voltada para a promoção de certa igualdade social, mediada por um diálogo direto entre Vargas e os trabalhadores.
Em 1945, a pressão sobre Vargas era grande, e ele resolveu ceder espaço para aqueles que exigiam a democratização do Brasil. Eleição presidencial foi convocada para o final de 1945, presos políticos do Estado Novo foram anistiados, e permissão para o surgimento de novos partidos políticos foi concedida.
Nesse cenário, enquanto a pressão sobre Vargas aumentava, novos partidos políticos foram criados para viabilizar as candidaturas políticas para a eleição presidencial do final de 1945.
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O Partido Social Democrático (PSD), um partido de centro, surgiu de antigos burocratas do Estado Novo, e lançou a candidatura do general Eurico Gaspar Dutra.
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A União Democrática Nacional (UDN), por sua vez, era um partido conservador formado tanto por ex-aliados quanto por antigos adversários de Vargas, que se uniram para barrar o legado político do varguismo. Lançaram a candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes.
Um movimento de apoio a Getúlio Vargas surgiu em 1945 e ficou conhecido como queremismo. O movimento queremista reivindicava a manutenção de Vargas na presidência do Brasil, embora concordasse com a realização de eleição para formação de uma Assembleia Constituinte. Os queremistas chegaram a realizar inúmeras manifestações em apoio ao então presidente.
Vargas mantinha uma postura dúbia a respeito de suas intenções, e não era de fato claro se ele abandonaria ou não a presidência no final, pois, embora já tivesse anunciado que não concorreria, a oposição desconfiava de suas intenções. Em outubro, ele nomeou seu irmão para a chefia da polícia do Distrito Federal. Isso mobilizou o Exército, que, por meio de Goés Monteiro e Eurico Dutra, no dia 29 de outubro de 1945, deu-lhe um ultimato para que abandonasse a presidência.
Junto a isso, tropas militares foram mobilizadas para cercar o palácio presidencial. Vargas, relutante, renunciou à presidência e, no dia seguinte, viajou para sua propriedade no Rio Grande do Sul. Portanto, um golpe militar derrubou-o da presidência. José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal, assumiu a presidência interinamente até a eleição de um novo presidente.
Montagem da Quarta República
Com a deposição de Vargas, um novo presidente foi eleito para o Brasil. Na disputa em 1945, os três candidatos foram Eduardo Gomes, Eurico Dutra e Yedo Fiúza, candidato lançado pelo Partido Comunista do Brasil (PCB). No final da corrida eleitoral, Getúlio Vargas e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) manifestaram seu apoio a Eurico Dutra, e ele foi eleito com 55% dos votos.
Com a eleição presidencial foram realizadas eleições gerais, em 2 de dezembro de 1945, que determinaram novos senadores e deputados federais. Aqueles que foram eleitos formaram a Assembleia Constituinte que elaborou e promulgou a Constituição de 1946. Essa Assembleia foi distribuída da seguinte maneira|1|:
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PSD: 177 cadeiras;
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UDN: 87 cadeiras;
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PTB: 24 cadeiras;
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PCB: 15 cadeiras;
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Outras 17 cadeiras foram distribuídas a partidos pequenos da época.
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Principais pontos da Constituição de 1946
A Constituição de 1946 foi resultado do trabalho realizado pela Assembleia Constituinte. Os parlamentares tomaram posse em fevereiro de 1946, e os trabalhos de elaboração do projeto daquela Constituição iniciaram-se em 15 de março. No dia 9 de setembro, foi encerrada a redação do novo Texto Constitucional, e a votação para sua aprovação foi finalizada em 17 de setembro. A promulgação do texto foi realizada, portanto, em 18 de setembro de 1946.
A respeito da Constituição de 1946, as historiadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling afirmaram que ela “manteve as conquistas sociais desde a década de 1930, mas repôs a exigência de democracia e do exercício dos direitos políticos como condições incontornáveis para a vida pública brasileira”|2|.
A nova Constituição brasileira reforçou os valores da democracia e consolidou a instalação desse sistema pela primeira vez no Brasil. O sistema político que surgiu dessa nova Carta foi baseado em um sistema representativo, com eleições para os cargos em todas as esferas: União, estados e municípios.
No caso da presidência, definiu-se o mandato de cinco anos, sem direito à reeleição. Seria eleito aquele que tivesse a maioria dos votos em turno único. A proibição da reeleição também se estendia ao cargo de governador. Os cargos do Legislativo (deputados e senadores), por sua vez, teriam direito à reeleição. Deputados teriam cargo de quatro anos, e senadores teriam mandato de oito anos. Na questão do voto, a Constituição garantiu direito ao voto secreto.
O caráter liberal da Constituição de 1946 determinou que ela tivesse uma delimitação muito bem definida dos limites de cada um dos três poderes — Executivo, Legislativo e Judiciário. O documento garantia autonomia política para os estados e concedia importantes direitos individuais, como a liberdade de imprensa e opinião.
A princípio, a Constituição de 1946 garantia liberdade para funcionamento dos sindicatos, mas mantinha mecanismos de controle sobre eles (a partir do governo de Eurico Dutra, uma lei que ampliava a repressão do Estado sobre os sindicatos foi criada). A Carta ampliou direitos da população, reconhecendo a educação para todos e garantindo o acesso ao voto, embora houvesse limitações neste aspecto.
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Pontos negativos da Constituição de 1946
Na questão do voto, estendeu-se o direito a todos os cidadãos brasileiros (sufrágio universal) que tivessem mais de 18 anos, mas o caráter conservador da maioria dos constituintes determinou que os analfabetos fossem excluídos e não tivessem acesso a ele. Apesar disso, houve certa ampliação desse direito.
A Constituição de 1946, embora entendida como um documento democrático, possuía as suas limitações e não atendia por inteiro as demandas populares em crescimento na época. A reforma agrária ficou inviabilizada porque o documento definia sua realização apenas por meio de indenização em dinheiro. Essa questão foi um dos grandes problemas da Quarta República e foi motivo de crise no governo de João Goulart.
Outros problemas dessa Constituição foram demonstrados por Lilia Schwarcz e Heloísa Starling|3|:
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Reconhecia o direito de greve, mas determinava que sua regulação fosse mediante lei futura;
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Não incorporava os trabalhadores rurais aos direitos trabalhistas;
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Permitia intervenção dos militares na política brasileira.
Essa Constituição esteve em vigência até 1964. Com o Golpe Civil-Militar de 1964, o documento foi suspenso por seis meses, por meio do AI-1, e depois oficialmente substituído pela Constituição outorgada em 1967.
Notas
|1| NOGUEIRA, Octaciano. A Constituição de 1946. Getúlio, o sujeito culto. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 553.
|2| SCHWARCZ, Lilia Moritz e STARLING, Heloísa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 396.
|3| Idem, p. 397.
Créditos das imagens
[1] FGV/CPDOC