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Gilberto Freyre foi um dos mais importantes sociólogos do Brasil, tendo construído uma obra inteiramente dedicada à análise das relações sociais no período colonial brasileiro e como essas relações contribuíram para a formação do povo brasileiro no século XX. Seu destaque deu-se por defender uma teoria de que a miscigenação formaria uma população melhor e mais forte, ao contrário do que pensavam as teorias etnocêntricas, higienistas e eugênicas dos antropólogos e intelectuais do século XIX e XX.
Enquanto era comum na época pensar que deveria haver uma pureza racial, Freyre caminha na contramão disso dizendo que a miscigenação é positiva. No entanto, a sua obra, apesar de ter uma base antirracista, contribuiu para as críticas aos movimentos antirracistas por ter formulado uma espécie de mito da democracia racial no Brasil colonial e no Brasil republicano, apontando a miscigenação como fundamento para essa ideologia.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Biografia de Gilberto Freyre
- 2 - O que Gilberto Freyre defendia?
- 3 - Casa-Grande e Senzala
- 4 - Frases de Gilberto Freyre
Biografia de Gilberto Freyre
O antropólogo e sociólogo brasileiro Gilberto Freyre nasceu na cidade de Recife, Pernambuco, em 15 de março de 1900. De família tradicional na sociedade recifense, seu pai, Alfredo Freyre, era professor, advogado e juiz. Freyre estudou no antigo Colégio Americano Gilreath, atualmente Colégio Americano Batista, instituição de ensino tradicional dirigida por algum tempo por seu pai. Freyre despontou-se desde cedo como um talento para a literatura e as ciências humanas. Ainda no colégio, o sociólogo participou como editor e redator do jornal O Lábaro, produzido pelo Colégio Americano Gilreath.
Freyre estudou sociologia, mas não no Brasil, pois ainda não havia sido fundado o primeiro curso superior de sociologia no país, o que somente aconteceu em 1933. Em 1918 o intelectual partiu para os Estados Unidos, onde cursou, na Universidade de Baylor, o bacharelado em artes liberais e a especialização em ciências políticas e sociais. Na Universidade de Columbia, Freyre cursou o mestrado e o doutorado em ciências políticas, jurídicas e sociais, defendendo a tese de doutorado intitulada A vida social no Brasil em meados do século XIX.
Na década de 1920, ele retornou ao Brasil após os seus estudos nos Estados Unidos e várias viagens pela Europa, voltando também a residir em Recife. Em 1926 participou da formulação do Manifesto Regionalista, grupo contrário à Semana de Arte Moderna de 1922, de caráter nacionalista. Os regionalistas eram contra a “deglutição” da cultura europeia para formular uma cultura brasileira, defendida pelos modernistas, valorizando somente aquilo que era originalmente brasileiro.
Entre 1927 e 1930, Freyre foi chefe de gabinete do governador de Pernambuco, Estácio Coimbra, e, em 1933, no exílio político provocado pela Revolução de 1930 e com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, publicou o seu mais famoso livro: Casa-grande e Senzala. Em 1946 foi eleito deputado federal constituinte. Freyre recebeu vários prêmios e doutorados honoris causa e foi contemplado com o título de Cavaleiro do Império Britânico, concedido pela Rainha Elizabeth II, da Inglaterra.
O que Gilberto Freyre defendia?
Freyre foi na contramão de quase todas as teorias antropológicas que surgiram no século XIX por meio de intelectuais como Herbert Spencer. As teorias antropológicas clássicas eram etnocêntricas e defendiam a supremacia da “raça” branca em relação às demais. Políticos e intelectuais brasileiros trouxeram tais ideias de “pureza racial” para o Brasil e tentaram, no início do século XX, um “branqueamento” da população brasileira como proposta para a melhoria da sociedade.
Para Gilberto Freyre, a miscigenação era positiva. Como estudioso de antropologia, Freyre era adepto das teorias do antropólogo alemão, radicado nos Estados Unidos, Franz Boas. Boas defendia que a cultura de um povo deveria ser estudada não em comparação à própria cultura do antropólogo, mas com uma imersão desse profissional naquela cultura como se fizesse parte dela. Isso permitiria ao estudioso olhá-la de perto e sem preconceitos.
Para Freyre, o Brasil colonial apresentou uma sociedade que miscigenou e integrou africanos, índios e brancos, e era isso que teria formado uma raça mais forte, mais intelectualmente capaz e com uma cultura mais elaborada.
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Teorias de Gilberto Freyre
A teoria mais difundida de Gilberto Freyre perpassou toda a sua obra. Em Casa grande e senzala, ela começou a ser discutida, apesar de ainda não ter sido enunciada. Era a teoria da democracia racial, criticada por defensores da luta contra o racismo por apresentar-se como um mito de que havia democracia nas relações entre senhores e escravos no período colonial. Para Freyre, a miscigenação era um fator corroborativo para pensar-se em uma relação democrática entre senhores e escravos, apesar da relação de escravidão impregnada entre os dois.
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Casa-Grande e Senzala
A obra Casa-Gande e Senzala foi a mais difundida de Gilberto Freyre, sendo traduzida para mais de 10 idiomas. A escrita do livro iniciou-se num momento em que o autor exilou-se em Portugal, por conta da divergência política com o novo governo de Getúlio Vargas, que chegou ao poder com um golpe em 1930.
Em Casa-Gande e Senzala, Freyre procurou sair do óbvio nas análises sociais: política, economia, sociedade em geral. Ele preferiu aprofundar-se em outros temas: vida doméstica, constituição familiar, formação das casas-grandes (onde viviam os senhores brancos) e senzalas (onde viviam os negros), para entender o engenho de açúcar e a propriedade rural como os centros do Brasil colonial.
Uma mistificação que Freyre ajudou a promover, talvez por influência de seu professor de antropologia em Columbia, foi a de que a miscigenação e a localização geográfica do Brasil (na linha tropical) eram fatores negativos que colocavam o país em uma posição inferior à Europa. A teoria da democracia racial trata-se de uma mistificação ideológica que Freyre, infelizmente, ajudou a construir baseado na ideia errônea de que a relação entre senhores e escravos era pacífica, que os índios aceitaram a colonização de maneira pacífica e que isso promoveu uma relação democrática e a miscigenação.
Essa visão freyreana, apesar de ter algum valor para o entendimento da vida colonial no Brasil, não se concretiza. As análises atuais sobre a desigualdade social, inclusive, associam verdadeiramente a desigualdade e a exclusão com a questão social. Talvez o ponto de partida de Freyre que o levou a formular a teoria da democracia racial (e que era a relação racial explicitamente segregacionista dos Estados Unidos) tenha o levado a perceber uma democracia racial no Brasil por haver nele uma relação mais branda entre negros e brancos.
No entanto, o racismo velado e estrutural nunca deixou de existir por aqui, e a desigualdade social mostra-se como um fator fortemente provocado pela escravidão e pela relação de submissão à qual negros e índios foram obrigados pelo homem branco. Portanto, a tese principal de Casa-Gande e Senzala parece não se sustentar, ao passo que o livro constitui uma interessante ferramenta para a compreensão da vida cotidiana da sociedade colonial.
Frases de Gilberto Freyre
“O saber deve ser como um rio, cujas águas doces, grossas, copiosas, transbordem do indivíduo, e se espraiem, estancando a sede dos outros. Sem um fim social, o saber será a maior das futilidades.”
“Em nenhuma parte do Brasil a formação da família processou-se tão aristocraticamente como entre canaviais.”
“A culinária é uma das maiores expressões do comportamento humano, do saber humano, da criatividade humana, muito do saber humano está naquilo que você come.”
“O Brasil é a mais avançada democracia racial do mundo.”
“Da cunhã é que nos veio o melhor da cultura indígena. O asseio pessoal. A higiene do corpo. O milho. O caju. O mingau. O brasileiro de hoje, amante do banho e sempre de pente e espelhinho no bolso, o cabelo brilhante de loção ou de óleo de coco, reflete a influência de tão remotas avós.”
Crédito de imagem
[1] Domínio público / Acervo Arquivo Nacional
Por Francisco Porfírio
Professor de Sociologia