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A talidomida é um fármaco que passou a ser comercializado bastante na Europa, nas décadas de 50 e 60, como sedativo para aliviar náuseas em mulheres grávidas. Ele era feito na forma de sua mistura racêmica, ou seja, conforme se pode observar abaixo, a molécula desse composto é assimétrica, pois possui um carbono quiral (carbono com os quatro ligantes diferentes entre si). Isso significa que a talidomida possui dois isômeros espaciais ou estereoisômeros, que são mais bem chamados de enantiômeros, visto que são a imagem especular um do outro:
Os enantiômeros da talidomida possuem atividade óptica, sendo que o dextrogiro ou enantiômero (R) desvia o plano de luz polarizada para a direita, e o levogiro ou enantiômero (S) desvia o plano de luz polarizada para a esquerda. Assim, uma mistura racêmica é opticamente inativa porque contém partes iguais desses dois enantiômeros.
No entanto, essa diferença na conformação espacial dos átomos acaba por resultar em diferentes propriedades biológicas, ou seja, diferentes atividades exercidas em um organismo vivo. Com o tempo, descobriu-se que somente o isômero dextrogiro ou (R) era responsável pelas propriedades analgésicas, sedativas e antessentires, enquanto a talidomida levogira (S) é teratogênica, isto é, provoca mutações no feto.
Por essa razão, durante as décadas mencionadas nasceram cerca de 12 mil crianças com má formação. Entre os efeitos colaterais que a talidomida pode causar nos fetos estão: desenvolvimento incompleto ou defeituoso dos membros, malformação no coração (como a ausência de aurículas), intestino, útero e vesícula biliar; efeitos nos músculos dos olhos e da face, surdez, defeitos na tíbia e no fêmur, além de, como a imagem a seguir mostra, polegar com três juntas:
Malformação congênita dos pés, um dos efeitos do uso de talidomida sobre fetos*
O estudo sobre a quiralidade da talidomida, bem como de outros medicamentos, vem aumentando cada vez mais. Atualmente, a talidomida tem seu uso proibido em mulheres grávidas e em mulheres que não estejam utilizando dois métodos contraceptivos sob um rigoroso acompanhamento médico.
É importante ressaltar que mesmo quando o fármaco apresenta somente o enantiômero (R), ele ainda leva à má formação dos fetos porque, no organismo, o isômero dextrogiro sofre racemização e origina o isômero levogiro, que é o teratogênico.
Além disso, o perigo ainda existe porque a talidomida é um medicamento muito eficaz no combate a outras doenças, como a hanseníase. Por isso, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), na Resolução da Diretoria Colegiada – RDC/Anvisa nº 11, de 22 de março de 2011, dispõe sobre o controle da substância e do medicamento Talidomida. Ao longo do ano de 2013, a Anvisa promoveu cursos de capacitação com o objetivo de orientar os profissionais envolvidos em relação ao controle do medicamento Talidomida, reforçando o risco inerente a essa substância, discutir e esclarecer as dúvidas sobre o tema, além de prevenir o desvio desse fármaco.
* Crédito da imagem: Autor: Otis Historical Archives National Museum of Health and Medicine / Fonte: Wikimedia Commons.
Por Jennifer Fogaça
Graduada em Química