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A Revolução Cultura Chinesa foi uma campanha político-ideológica promovida por Mao Tsé-Tung entre 1966 e 1976 na República Popular da China. Na Revolução Cultural, Mao mobilizou as massas do país, sobretudo estudantes, nas chamadas Guardas Vermelhas, para perseguir todos aqueles que eram enxergados como um “risco à revolução”.
A Revolução Cultural criou uma intensa perseguição ideológica na China e resultou em grande violência, voltada principalmente contra os intelectuais do país. Estima-se que milhões de pessoas tenham sido perseguidas e morrido nessa fase, que somente se encerrou quando Mao faleceu, em 1976.
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Contexto histórico
A Revolução Cultural foi lançada por Mao Tsé-Tung em 1966 como uma resposta aos seus críticos no Partido Comunista Chinês (PCCh). A situação de Mao no PCCh na década de 1960 era de progressivo isolamento. Esse enfraquecimento de Mao no partido ocorreu, principalmente, por conta do fracasso do plano Grande Salto à Frente.
Esse plano consistia no incentivo à industrialização por meio de uma produção acelerada de aço por parte dos trabalhadores chineses. O plano, no entanto, foi um grande fracasso e resultou na morte de milhões de pessoas de fome, uma vez que a produção agrícola do país enfraqueceu-se consideravelmente e resultou na Grande Fome, que causou a morte de mais de 20 milhões de pessoas.
Isso resultou no afastamento de Mao da presidência da China, sendo substituído por Liu Shao-Chi, em 1959. Mao, porém, continuou na presidência do Partido Comunista Chinês e dedicou-se, na década de 1960, ao trabalho de base por meio de programas de educação e aperfeiçoamento das massas chinesas.
Depois que Mao afastou-se da presidência, ele passou a ser criticado pelo novo presidente e por membros do partido que consideravam seus ideais inapropriados para a China. Além disso, naquela época, a União Soviética tinha passado pela desestalinização, isto é, o fim ao culto de Stalin. Essas críticas realizadas ao culto ao líder repercutiram na China e contribuíram para o rompimento das relações entre a URSS e a China.
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Causas
A Revolução Cultural Chinesa foi a tentativa lançada por Mao Tsé-Tung para recuperar o poder político que havia perdido no interior do PCCh desde o final da década de 1950. Para conseguir isso, Mao começou a atacar grupos dentro do partido, acusando-os de estarem aderindo ao conservadorismo e de estarem desvirtuando a Revolução Chinesa (1949), levando o país ao capitalismo.
Mao Tsé-Tung visava a retirar das posições de poder do partido membros que tinham origem na antiga burguesia chinesa e que cada vez mais criticavam os posicionamentos do líder da Revolução Chinesa. Além disso, Mao também buscava retirar do poder do partido todos os membros que defendiam a reaproximação da China com a União Soviética.
Revolução Cultural Chinesa
Essa campanha de perseguição político-ideológica já tinha sido realizada por Mao em outros momentos desde que tinha assumido o poder, como a Campanha Três Anti e a Campanha Antidireitista, ambas na década de 1950. Os historiadores consideram que a Revolução Cultural iniciou-se com uma crítica realizada no final de 1965 a uma peça chamada “A destituição de Hai Rui”.
Essa crítica foi realizada por Yao Wenyuan, um jornalista que participou ativamente da Revolução Cultural. Yao fez parte de um grupo de maoistas extremos chamado Gangue dos Quatro, que atuou com papel destacado durante os dez anos da Revolução Cultural.
Em maio de 1966, Mao resolveu tornar a disputa que acontecia nos quadros do partido pública e divulgou a Circular 16 de Maio, documento que convocava a população chinesa a se juntar para lutar contra o crescimento das posições reacionárias e burguesas no interior do PCCh. A partir daí, a Revolução Cultural tornou-se pública, e as massas, principalmente os jovens, aderiram em peso ao chamado de Mao.
A partir daí, formou-se a Guarda Vermelha, uma espécie de milícia que seguia os pensamentos de Mao, registrados no chamado “Livro Vermelho”. Esses grupos realizaram grande parte do trabalho da Revolução Cultural e perseguiam ideologicamente pessoas que não seguiam os princípios estabelecidos por Mao.
A Revolução Cultural Chinesa voltou-se contra o que Mao definia como os “Quatro Velhos”: velhas ideias, velhas culturas, velhos costumes e velhos hábitos. As massas foram instigadas a perseguir tudo aquilo que fosse contrário ao maoismo. A cultura antiquíssima da China foi um dos grandes alvos, bem como os intelectuais que teciam críticas a Mao.
Assim, o confucionismo, um sistema filosófico tradicional da China, passou a ser atacado, bem como as religiões existentes no país. Templos religiosos foram invadidos e destruídos, e textos sagrados começaram a ser queimados. A queima também foi realizada contra livros que eram entendidos como símbolo da cultura ocidental.
A perseguição era voltada contra toda a cultura de épocas anteriores à instalação dos comunistas na China (1949). Esse ataque contra a cultura atingiu também a educação do país, área que abrigava grande parte dos críticos à política praticada por Mao. Para isso, a Guarda Vermelha cumpria papel essencial.
Os membros da Guarda Vermelha eram pessoas que foram doutrinadas a denunciar professores e, até mesmo, seus próprios pais se esses apresentassem opiniões típicas de “burgueses” ou “ocidentais”. Formavam um grupo que atacava todos aqueles que pensavam diferente de Mao. Os membros da Guarda Vermelha reuniam-se em comitês formados em locais como fábricas e escolas.
A perseguição contra esses grupos enxergados como “burgueses” fez com que milhões de pessoas fossem mandadas para “campos de reeducação”, locais de trabalho forçado em que seriam “reeducadas” por meio de trabalho braçal. As pessoas enviadas para esses locais também passavam por um curso de formação política.
Os campos de reeducação ficavam “em aldeias onde não havia água encanada, sistema de esgoto e luz elétrica”|1|. A violência espalhou-se pelo país, uma vez que a Guarda Vermelha foi sendo cada vez mais empoderada por Mao. A violência física também foi utilizada como ferramenta de perseguição ideológica. Somente em Pequim, 1800 foram mortas em agosto e setembro de 1966 |2|.
A violência da perseguição tornou-se tão grande que Mao precisou intervir na situação e, em 27 de abril de 1969, o Exército chinês foi mobilizado para dissolver a Guarda Vermelha. Apesar de esse ser o fim oficial da Revolução Cultural, os historiadores falam que ela se estendeu até 1976 e só se encerrou com a morte de Mao Tsé-Tung.
Depois que Mao faleceu, Deng Xiaoping – membro do PCCh perseguido, enviado para um campo de reeducação e reintegrado ao partido tempos depois – tornou-se o presidente da China em 1978.
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Consequências
A Revolução Cultural foi iniciada por Mao como forma de retomar o controle do PCCh e acabar com os opositores internos. A campanha também procurava, literalmente, promover uma revolução cultural profunda na China com o objetivo de calar a oposição e sufocar a cultura do país.
Uma das consequências da Revolução Cultural foi a destruição quase completa do sistema educacional do país, desde a educação básica até – e principalmente – a educação superior. Isso foi resultado da intensa perseguição que foi realizada contra os professores naquele país. O historiador Eric Hobsbawm apresenta dados da crise no sistema educacional chinês:
Em 1970, o número total de estudantes em todas as Instituições de Ensino Superior da China era de 48 mil; nas escolas técnicas do país, 23 mil e nas Escolas de Formação de Professores, 15 mil […]. Em 1970, um total de 4260 jovens começou a estudar ciências sociais naturais […], e um total de noventa começou a estudar ciências sociais. Isto num país de, na época, 830 milhões de pessoas|3|.
Além disso, o caos trazido pela Revolução Cultural afetou a economia do país. A indústria, por exemplo, teve queda na sua produtividade. Na questão humanitária, os historiadores apontam que milhões de pessoas tenham sido vítimas da Revolução Cultural entre sessões de humilhação pública, violência física, trabalho forçado etc.
O número oficial de mortes causadas pela Revolução Cultural é de 34 mil pessoas, embora os historiadores apontem que, provavelmente, mais de um milhão de pessoas morreram como consequência desse acontecimento. A Gangue dos Quatro, o grupo de maoistas extremistas que coordenou grande parte das ações, teve seus membros presos e condenados à prisão por conta dos crimes cometidos nesse período.
Além disso, a perseguição à cultura tradicional da China resultou na destruição de milhares de artefatos antigos que faziam parte de um importante legado da história chinesa. Livros, como mencionamos, foram queimados aos milhares.
Atualmente, a Revolução Cultural é uma espécie de tabu na China. É um assunto pouco estudado nas escolas básicas e, até mesmo em nível superior, existem barreiras impostas àqueles que estudam o acontecimento. O próprio PCCh atualmente reconhece a Revolução Cultural como um erro que marcou um período extremamente caótico da história chinesa.
Notas
|1| SANTANA, Cristiane Soares de. Notas sobre a História da Revolução Cultural Chinesa (1966-1976). Para acessar, clique aqui.
|2| Overview of the Chinese Cultural Revolution. Para acessar, clique aqui [em inglês].
|3| HOBSBAWN, Eric. A Era dos Extremos: o breve século XX 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 454.
Por Daniel Neves
Graduado em História