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Uma das páginas pouco conhecidas da história da Segunda Guerra Mundial é a respeito do preconceito racial sofrido por americanos descendentes de japoneses. Esse preconceito já era crescente nos Estados Unidos desde a década de 1900, porém, após o ataque à base naval de Pearl Harbor, a histeria de guerra levou o país a decretar o internamento de mais de 100 mil cidadãos em diferentes campos de internamento.
Os campos construídos para o aprisionamento dessas pessoas durante a Segunda Guerra Mundial eram chamados pelos americanos de internment camps, o que, em tradução livre, significa “campos de internamento”. No entanto, o termo em português mais recorrente para referir-se a esses locais é “campo de concentração”.
Tópicos deste artigo
- 1 - Antecedentes e o preconceito contra japoneses nos EUA
- 2 - Ataque a Pearl Harbor e o internamento dos nipo-americanos
- 3 - Campos de internação de nipo-americanos
- 4 - Reconstrução
Antecedentes e o preconceito contra japoneses nos EUA
A história dos Estados Unidos da virada do século XIX para o século XX foi marcada pela chegada de grande volume de imigrantes, que buscavam no país melhores condições de vida. Um dos principais grupos de imigrantes que os Estados Unidos receberam nesse período foi o de japoneses. Esses imigrantes desejavam estabelecer-se, prosperar e, assim que possível, retornar ao Japão.
Os japoneses que imigraram aos Estados Unidos nessa época concentraram-se no Havaí e na Costa Oeste e trabalhavam, principalmente, em fazendas locais e na construção de ferrovias. À medida que os anos passavam, mais imigrantes chegavam ao país. Em 1900, havia mais de 10 mil japoneses nos Estados Unidos|1| e, em 1910, esse número já era superior a 70 mil|2|.
O alto crescimento da população japonesa na Costa Oeste dos Estados Unidos levou ao surgimento de um forte preconceito racial voltado contra essa minoria. Assim, a partir da primeira década do século XX, algumas medidas contra a população de origem japonesa, principalmente concentrada no Estado da Califórnia, foram tomadas.
Ao longo das décadas de 1910 e 1920, desenvolveu-se um estereótipo de que o cidadão nipo-americano, ou seja, de origem japonesa, não era americano (ou era menos americano), pois acreditava-se que ele não tinha a intenção de ser assimilado culturalmente. O resultado disso foi o surgimento de uma lei que proibia a entrada de novos imigrantes orientais nos Estados Unidos, além de leis que proibiam os descendentes de japoneses de possuir terras e obter a nacionalidade americana.
À medida que a tensão entre Estados Unidos e Japão aumentou, passou-se a defender cada vez mais ações discriminatórias contra a população de ascendência japonesa, inclusive por parte de pessoas influentes da sociedade americana, como o governador da Califórnia, Hiram Johnson, que defendia abertamente um discurso racista contra os nipo-americanos.
Ataque a Pearl Harbor e o internamento dos nipo-americanos
Em 7 de dezembro de 1941, o Japão executou o ataque à base naval de Pearl Harbor, que se localizava no Havaí. Como essa era uma das maiores bases navais americanas, esse ataque foi responsável pela morte de mais de 2.400 soldados americanos. Apesar da evidência de que um ataque japonês aconteceria a qualquer momento, a base de Pearl Harbor estava totalmente despreparada e foi surpreendida pelos japoneses.
O ataque contra Pearl Harbor levou os Estados Unidos a declararem guerra contra o Japão no dia seguinte. Esse ataque chocou a opinião pública dos Estados Unidos e causou o crescimento da discriminação contra a população de origem japonesa no país. Novos estereótipos surgiram, e o preconceito era disseminado na sociedade tanto em meios políticos quanto na mídia.
Pouco antes do ataque a Pearl Habor, uma investigação encabeçada pela inteligência americana havia sido conduzida por ordem do presidente, Franklin Delano Roosevelt. Nessa investigação, pretendia-se saber o nível de lealdade da população americana de ascendência japonesa. O estudo concluiu que não havia colaboracionismo com o inimigo entre os cidadãos de origem japonesa.
No entanto, mesmo com evidências de que não havia colaboracionismo interno, impulsionado pela histeria dos tempos de guerra, o governo americano optou por tomar medidas mais enérgicas contra a população nipo-americana, vista naquele momento como inimigo interno. Assim, em 19 de fevereiro de 1942, foi decretada a Ordem Executiva 9066, que permitia a detenção de americanos de origem japonesa em campos de internamento.
Campos de internação de nipo-americanos
Torre de vigilância construída no campo de internamento de Manzanar
A Ordem Executiva 9066 iniciou um processo no qual toda pessoa que possuísse pelo menos 1/16 de ascendência japonesa deveria ser evacuada e transferida para um local específico determinado pelo exército. Essas pessoas foram obrigadas a desfazer-se de seus bens e empregos e, em seguida, foram encaminhadas para centros de detenção provisórios.
Toda a logística da evacuação de nipo-americanos para campos de detenção foi organizada pelo coronel Karl Bendetsen. Inicialmente, os internos foram instalados em campos provisórios, enquanto os campos de internação eram construídos. Ao todo, foram dez campos de internamento espalhados por diferentes locais nos Estados Unidos: Califórnia, Idaho, Wyoming, Utah, Arizona, Arkansas e Colorado.
A administração dos campos foi entregue para a War Relocation Authority (WRA), o que em tradução livre para o português significa “Autoridade de Relocação de Guerra”. As pessoas foram transferidas para os campos de internação aos montes, em vagões de trem apertados, e encontraram uma estrutura precária onde foram instaladas. Esses campos eram cercados com cerca de arame farpado e eram monitorados por torres altas de vigilância e por seguranças fortemente armados.
As casas construídas nos campos de internação não foram projetadas para suportar o rígido inverno e as altas temperaturas de verão, que são comuns nos Estados Unidos. Além disso, os internos compartilhavam os locais de banho e possuíam um atendimento médico bastante limitado. As péssimas condições internas desses lugares contribuíram para o adoecimento de muitos detentos.
Os cidadãos nipo-americanos instalados nos campos logo desenvolveram por conta própria o mínimo possível de estrutura que pudesse melhorar sua condição de vida. Assim, desenvolveram escolas, plantações, hospitais improvisados e construíram móveis para suas casas.
Essa realidade de vida estendeu-se para alguns cidadãos de origem japonesa até o começo de 1946, quando o último campo foi definitivamente fechado e os internos foram libertados. O fechamento dos campos de internamento iniciou-se a partir da rendição do Japão na Segunda Guerra, em 1945.
Reconstrução
Grande parte dos mais de 110 mil japoneses realocados em campos de internação perdeu tudo que possuía. Após o fechamento dos campos, eles precisaram reconstruir suas vidas, pois não receberam nenhum tipo de auxílio do governo que promovesse a integração deles novamente na sociedade. Além disso, o preconceito contra nipo-americanos permaneceu forte na sociedade americana durante muito tempo.
Algumas instituições, como a Japanese American Citizens League (Liga dos Cidadãos Nipo-americanos) e a National Coalition for Japanese American Redress (Coalizão Nacional pela Reparação dos Nipo-americanos), foram extremamente importantes na luta por maiores direitos sociais para essa minoria da população americana.
Na década de 1980, durante o governo de Ronald Reagan, todos os sobreviventes dos campos de internação receberam um pedido formal de desculpas do governo americano e, como indenização, a quantia de vinte mil dólares.
|1| PÉTURSSON, Erlingur Þór. Japanese American Internment: a Great Injustice. Disponível em: http://skemman.is/en/stream/get/1946/19305/44902/1/Japanese_American_Internment_A_Great_Injustice_-_Erlingur_%C3%9E%C3%B3r_P%C3%A9tursson.pdf
|2| ICHINASI, Yamato. Japanese in the United States: A critical study of the problems of the japanese immigrants and their children. Palo Alto: Stanford University Press, 1932, p. 122.
Por Daniel Neves
Graduado em História