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Sabe-se que o processo de Colonização do Brasil teve com um dos principais elementos o uso da mão de obra escrava, em especial a de negros africanos. Contudo, além das formas específicas de trabalho escravo que se desenvolveram no Brasil, houve um dispositivo, ou mecanismo, de produção agrícola que utilizava a mão de obra negra de um modo diferente daquele aplicado na plantation, isto é, no modelo das grandes plantações de monocultura largamente usado no período colonial, não apenas no Brasil, mas em outras regiões da América. Esse mecanismo foi chamado por alguns historiadores de brecha camponesa.
A brecha camponesa consistia na concessão de um espaço pequeno de terras ao mercado e ao consumo interno da colônia, que tinha relativa diversificação de produtos agrícolas cultivados. Essas pequenas faixas de terras eram concedidas aos escravos pelos donos dos latifúndios, que pretendiam, a um só tempo, usufruir dos produtos que os escravos cultivavam e evitar conflitos diretos com eles. Essa forma de produção esteve associada também à criação de animais também para consumo interno.
O historiador Ciro Flamarion Cardoso é um dos autores brasileiros que mais se dedicaram a estudar esse assunto. Em um de seus livros, ele destacou que a expressão “brecha camponesa” foi criada pelo pesquisador Tadeus Lepkowski para abarcar duas modalidades de tratamento das pequenas faixas de terras que os escravos recebiam dos senhores nas Américas e no Caribe; modalidades essas que se assemelhavam ao tratamento tipicamente camponês. Segundo Flamarion Cardoso, as duas modalidades da brecha camponesa poderiam ser:
“1) a “brecha camponesa” podia ter uma função meramente complementar à distribuição de rações aos escravos, a intervalos regulares, pelos senhores ou seus representantes: neste caso, as parcelas entregues aos cativos limitavam-se a quintais próximos às suas cabanas, e o tempo livre de que dispunham era menor; 2) ou, então, podia colocar-se como alternativa às distribuições de rações, as quais desapareciam, ou quase: os escravos recebiam, neste caso, lotes situados fora do núcleo central da plantation, além dos quintais adjacentes às suas moradias, e dispunham de mais tempo para cultivar suas parcelas.” [1]
Vê-se que o tratamento dado às parcelas de terras variava de acordo com os interesses dos senhores. No Brasil, esse dispositivo foi sancionado e legalizado por intermédio de ordens régias a partir do final do século XVII. Em alguns casos, o escravo tinha apenas um único dia livre para lidar com sua própria agricultura; em outros, o escravo podia desenvolver as técnicas de cultivo tipicamente africanas sem interferência externa ao seu trabalho.
NOTAS:
[1] CARDOSO, Ciro Flamarion S. Escravo ou camponês? O protocampesinato negro nas Américas. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 88.
Por Me. Cláudio Fernandes