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Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em Röcken, cidade do então Reino da Prússia, em 1844. Descendente de pastores luteranos, o pensador contemporâneo dedicou-se aos estudos de teologia desde a sua juventude. Em sua adolescência, porém, ele começou a encontrar contradições nos escritos cristãos e passou, pouco a pouco, a questionar a religião em que foi doutrinado.
Na década de 1860, Nietzsche concluiu seus estudos de filologia clássica na Universidade de Leipzig, voltando-se para a investigação da cultura e língua grega. Nesse período, o filósofo foi fortemente influenciado pelo professor Friedrich Ritschl e pela leitura do livro O Mundo Como Vontade e Representação, do filósofo alemão Arthur Schopenhauer. Apesar da formação em filologia, Nietzsche aprofundou cada vez mais seus estudos em filosofia grega e em Schopenhauer, fato que o fez ser reconhecido pela posteridade como filósofo.
Em 1868, Nietzsche tornou-se professor de filologia da Universidade da Basileia e, em 1872, publicou o seu primeiro livro, intitulado O Nascimento da Tragédia, no qual analisou a cultura e a vida dos gregos clássicos a partir das tragédias produzidas no período. Seus estudos também apontaram para a vida moral daquele povo e o modo como eles encaravam a religião, as vontades e desejos corpóreos e a diferenciação entre as pessoas.
Tópicos deste artigo
- 1 - A moral
- 2 - A moral grega, a moral cristã e a inversão de valores morais
- 3 - A transvaloração dos valores morais
A moral
Em seus escritos do fim da década de 1870 e dos anos 1880, o filósofo passou a investigar, minuciosamente, a moral. Segundo o pensador, a história do ocidente deparou-se com um fenômeno bastante peculiar e que influenciou toda a posteridade: o advento do cristianismo. A partir do momento em que a religião cristã se institucionalizou, passou a vigorar um modo de viver e de criar valores morais voltado para os ensinamentos cristãos.
É importante ressaltar que Nietzsche, em momento algum, tenha criticado Jesus Cristo, mas sim o que fizeram do cristianismo a partir do momento em que a vida de Jesus se torna um fundamento para uma religião, ou seja, a partir dos apóstolos Paulo, Pedro e da fundação da Igreja Católica. Nietzsche afirmava que o cristianismo, imperioso a partir da Idade Média, impôs uma inversão de valores morais que culminaria no enfraquecimento do ser humano por ser a negação dos impulsos morais que falam mais alto em qualquer animal. Afirmações polêmicas como “o cristianismo é a revolta de tudo o que rasteja pelo chão contra aquilo que tem altura”1 condensam o pensamento nietzschiano.
A moral grega, a moral cristã e a inversão de valores morais
Para o filósofo, a vida humana não se dissocia da vida natural, o que requer o abandono da ideia iniciada por Sócrates de que o ser humano, por ser racional, diferencia-se completamente dos demais animais e da natureza. Para Nietzsche, esse modo de encarar a vida é negador da própria vida, pois retira do ser humano a sua força que reside justamente nos impulsos e nas paixões naturais. Os gregos antigos eram capazes de relacionar com uma religião que os permitia conviver com os impulsos naturais, o que refletia no seu modo de criar valores morais.
Para os gregos antigos, a força e a fraqueza eram os fatores constituintes da bondade e da ruindade dos homens: o forte era bom, e ser fraco era ruim. Ter altivez e coragem eram características dos homens considerados bons, e ser submisso e humilde eram características dos homens considerados ruins. Esse modo de valorar reflete o tipo de sociedade grega: uma sociedade aristocrática. Nietzsche não defendia o retorno de uma aristocracia e, tampouco, que o modo de valorar grego voltasse à tona. Ele apenas apresentava, como recurso didático, a moral grega para mostrar que o ser humano já foi capaz de uma moral fortalecedora.
A moral cristã opera, segundo o filósofo, uma completa inversão desses valores antigos: o que era considerado bom (forte, corajoso, altivo e contestador) passou a ser considerado característica do homem mau. O que era considerado ruim (submissão, humildade e fraqueza) passou a ser considerado característica do homem bom. Esse movimento não só inverte os valores, como também troca o termo “ruim” por “mau”. Segundo Nietzsche, essa inversão de valores se torna regra para a sociedade contemporânea e é capaz, a partir do momento em que se tornou a regra moral para o ocidente, de castrar a natureza humana e enfraquecer as pessoas, pois ela tira a centralidade da vida na própria vida (natural, fisiológica e biológica) e concentra-se em uma vida voltada para o além (a promessa cristã de uma vida eterna após a morte).
A transvaloração dos valores morais
Nietzsche criticou os valores morais e, em seguida, apontou uma solução: um passo a passo que se inicia na genealogia dos valores morais e passa pela transvaloração. A transvaloração não é uma atividade isolada e não se encerra em si mesma. É um processo contínuo que deve ser praticado ininterruptamente, visando sempre o fortalecimento do ser humano.
Transvalorar, segundo o filósofo, é, em suma, analisar os valores morais tendo em vista a manutenção daquilo que pode ser benéfico ao ser humano e a troca daqueles valores prejudiciais. Essa seria uma forma possível e viável de se estabelecer uma valoração moral capaz de fortalecer novamente o ser humano e torná-lo capaz de explorar a plenitude de sua potência.
1 NIETZSCHE, F. O Anticristo e ditirambos de Dionísio. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 51.
Por Francisco Porfírio
Graduado em Filosofia