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Por muitos considerado o patrono da filosofia, Sócrates de Atenas viveu o apogeu do século de Péricles (séc. IV a.C.) e a consolidação da democracia grega. O antigo modelo de educação dos gregos, baseados na ideia do belo e bom guerreiro cede lugar às exigências do ensino do bem falar. O cidadão grego precisava falar, exprimir, debater e convencer para fazer valer seus interesses na assembleia.
De família humilde (seu pai era escultor-carpinteiro e sua mãe uma parteira), Sócrates viveu na pobreza resignando-se ao necessário para sua sobrevivência e abstendo completamente de superfluidades. Interessante notar como o seu estilo de vida é idêntico à sua posição filosófica.
Sócrates nada escreveu e os relatos que dele temos são obras de seus discípulos e difamadores. Mas sem dúvida, foi Platão, talvez o seu maior pupilo, quem o retratou melhor. Diz-se dele que vagava pelas ruas e praças (ágora) de Atenas questionando seus concidadãos sobre os valores e ideais que admitiam quando opinavam sobre o mundo. De uma cordialidade sem igual e de conversa agradável, era um apaixonado por discursos e, por isso, onde houvesse uma discussão, lá estava ele para ouvir e aprender.
No entanto, ao questionar seus interlocutores sobre aquilo que eles diziam, Sócrates produzia um certo mal-estar pelo fato de refutá-los, mostrando que eles não estavam tratando com exatidão dos conceitos que acreditavam conhecer. Muitos se diziam piedosos, virtuosos, corajosos, sábios e justos, mas ao serem questionados nada mais faziam do que dar exemplos particulares e não a definição do que é a Piedade, a Virtude, a Coragem, a Sabedoria e a Justiça. Sócrates mostrava aos seus concidadãos que quando afirmam, por exemplo, que algo é belo, eles deveriam dizer ou saber o que é a Beleza e não ficar enumerando quantas coisas belas existem. Procurava, então, uma definição universal do conceito que escapasse das opiniões particulares e fosse o fundamento do conhecimento desses objetos.
Mas a pergunta filosófica pela essência dos seres custou caro a Sócrates. Alguns, de fato, o seguiram, mas muitos, os poderosos e pseudossábios, viram nele um problema, pois denunciava a corrupção dos costumes e a possibilidade do erro, da mentira e da ilusão através dos discursos. E isso por dois motivos.
O primeiro é que a educação pelos mitos antigos já não satisfazia mais os anseios democráticos vigentes. O segundo motivo é que os novos educadores usavam o lógos (discurso, palavra, razão) não como meio de alcançar o conhecimento e a verdade, mas como instrumento de convencimento (persuasão) e poder. Por isso, Sócrates foi condenado à morte.
Em sua defesa, Sócrates, que não aceitou as acusações, mostra que o que fez, como cidadão do estado mais livre que existia era seguir o conselho que o oráculo de Delfos havia lhe prescrito. Este disse que Sócrates era o homem mais sábio da Grécia. Com isso na cabeça, Sócrates, que se julgava ignorante e nada conhecer, buscou, nas suas conversações, o entendimento do oráculo. Percebeu que a consciência de ser mesmo ignorante aos temas abordados em seus diálogos o tornava de fato um sábio já que, em geral, o interlocutor afirmava saber algo que, no fundo não conhecia, ao passo que Sócrates, não afirmava saber nada. Isso chocava ainda mais seus ouvintes que esperavam obter dele respostas para as aporias às quais chegavam o debate. Daí sua célebre máxima “só sei que nada sei”. Isso quer dizer duas coisas: que as pessoas seguem opiniões, a tradição, os costumes sem refletir sobre a essência dos valores pelos quais agem. E, também, que o reconhecimento da própria ignorância é o ponto de partida para sair de um mundo de ilusões e, daí, buscar o verdadeiro conhecimento. Mas como conhecer a essência das coisas e valores? Vem daí a sua outra máxima, inspirada no pórtico do deus Apolo: “conheça-te a ti mesmo”, ou seja, busque saber o que é o homem que é o provedor de todos os valores. A sabedoria, a verdade está na essência íntima do homem e não fora dele.
Portanto, o homem deveria buscar dentro de si, na sua alma ou consciência, aquilo que ele é e o que ele deve fazer, já que é a sua razão que conhece e julga corretamente sobre os seres. Por isso, diz-se que o pensamento de Sócrates, voltado para o homem, é o primeiro tipo de humanismo na história do pensamento.
Por João Francisco P. Cabral
Colaborador Brasil Escola
Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU
Mestrando em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP