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O hedonismo não é apenas uma teoria filosófica, sendo primeiramente uma doutrina ética. O hedonismo surge na Grécia Antiga visando apresentar um sentido para a caminhada da vida: a busca pelo prazer, realizada, conforme uma doutrina, por meio de tarefas.
No entanto, o hedonismo ganhou diversos contornos e significados ao longo do tempo. Mesmo na Antiguidade, já havia diferentes posições sobre o hedonismo, na Modernidade ele ganhou eco entre os escritores e artistas libertinos, e hoje ele é visto como uma busca incessante pelo prazer como meio de dar sentido a uma vida ausente dele.
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Tópicos deste artigo
Conceito de hedonismo
Hedonismo vem do grego Hedonê — nome de uma guia, uma daemon ou uma deusa, na mitologia grega, que representa o prazer. Filha de Eros e Psiquê, Hedonê era a representação encarnada de uma vida prazerosa. O hedonismo é uma doutrina, ou filosofia de vida, que defende a busca por prazer como finalidade da vida humana. Buscar prazer é o que move as paixões, os desejos e todo o mecanismo da vida, sendo, portanto, na visão de hedonistas, a primeira e mais completa ponte para a finalidade última da vida: a felicidade.
História do hedonismo
O hedonismo surge na Antiguidade Clássica, mais precisamente na transição da filosofia clássica para a filosofia helenística. Quem o criou foi o filósofo grego Aristipo de Cirene. Ele acreditava, assim como Aristóteles, haver uma finalidade para a vida humana. No entanto, Aristóteles colocou o alvo dessa finalidade na felicidade, enquanto Aristipo cultivava a ideia de finalidade no prazer. O hedonismo de Aristipo era a pura e simplesmente uma teoria que guiava a vida por meio da plena busca pelo prazer.
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Hedonismo antigo
Para compreendermos o hedonismo como doutrina, devemos galgar seu surgimento em Aristipo e passarmos para outro pensador também grego, mas desta vez um helenista: Epicuro de Samos. Epicuro inaugura uma doutrina filosófica helenista complexa, conhecida pela posteridade como epicurismo. O epicurismo foi tão complexo e marcante que ficou conhecido como uma das escolas filosóficas do período helenista. Epicuro, em sua teoria, elaborou uma física com proposições para a compreensão da organização da natureza. Por outro lado, o filósofo articulou uma ética que aponta uma doutrina de vida centrada num hedonismo seletivo: a vida deve pautar-se pela busca de prazeres naturais.
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Hedonismo renascentista
Durante o renascentismo, houve uma retomada de certos valores morais, culturais e epistemológicos da Antiguidade greco-romana. Junto a essa retomada veio a valorização da vida, dos prazeres sensoriais e do corpo, o que ficou proibido durante a Idade Média. Se a Idade Média era o período anti-hedonista por excelência, o renascentismo trouxe a retomada repentina da defesa do direito ao prazer, inclusive ao prazer intelectual.
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Hedonismo na Modernidade
Na Modernidade, período histórico situado entre o fim do renascentismo e meados do século XIX, o hedonismo ganhou contornos e rumos distintos. Por um lado, havia a Igreja Católica e as vertentes protestantes (estas últimas ainda mais radicais) que o condenavam com veemência. Por outro lado, a personalidade do homem moderno médio e de uma certa elite intelectual, artística e burguesa era a face perfeita do hedonismo.
Grandes bailes celebrando a vida e os prazeres eram dados, os salões enchiam-se com pessoas em sarais literários, recitando poesias hedonistas; artistas, escritores, intelectuais e burgueses uniam-se para a busca conjunta do prazer. Foi nesse contexto que surgiu a personalidade mais representativa, radical e controversa do hedonismo na literatura: Donatien Alphonse François de Sade ou simplesmente Marquês de Sade. Na teoria moral, o hedonismo ganhou um destaque no utilitarismo ético de Jeremy Bentham e John Stuart Mill.
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Hedonismo em nossos dias
A contemporaneidade é hedonista. Somos pessoas cada vez mais cercadas por nosso individualismo, que, tomando um formato egoísta, faz com que o ego busque apenas o prazer e a satisfação imediata e individual. Não somos nem aquele modelo ideal epicurista, nem o bom vivant dos círculos burgueses modernos. Somos consumidores hedonistas, pois o prazer em nosso tempo tornou-se sinônimo de consumo. Somos também pessoas que buscam prazer nas relações superficiais e fugazes, como analisou o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, que vêm os vínculos afetivos como líquidos que se moldam e se rompem com facilidade.
O sexo, que, durante muito tempo, foi visto pela cultura cristã como símbolo resguardado pela sagrada bênção divina por meio do casamento, torna a ser encarado como um simples ato de prazer. Isso para as mulheres, pois não teve cultura cristã que segurou a ânsia masculina pelo prazer sexual, seja em prostíbulos, seja com amantes, escravas, sendo sexo consensual ou estupro.
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Hedonismo epicurista
Epicuro, filósofo grego do período helenístico, tornou-se responsável por uma escola filosófica que passou a ser chamada de epicurismo, por conta de seu fundador. Entre Grécia e Roma, o epicurismo foi difundido por séculos, sendo menos duradouro apenas que o estoicismo. Durante o período helenístico, as escolas filosóficas propunham verdadeiras doutrinas de vida. As doutrinas visavam apresentar modos de vida que encurtassem o caminho entre o ser humano e a felicidade.
Epicuro apresentou uma teoria que define que o ser humano deve buscar o prazer. No entanto, não havia nela a simplicidade da teoria de Aristipo de Cirene, chamada de hedonismo cirenaico. O hedonismo epicurista era complexo e fazia uma divisão de tipos de prazer: havia os prazeres naturais e os prazeres não naturais. Para Epicuro, o ser humano deveria buscar os prazeres naturais, pois eles seriam os únicos que o levariam verdadeiramente à felicidade. Os prazeres não naturais estão ligados àquilo que sai do controle da pessoa ou surgem, muitas vezes, por convenção social. Eles também são efêmeros, o que pode aumentar o potencial de adicção.
Podemos citar como prazeres não naturais o sexo, o uso de entorpecentes e a busca por convenções que supostamente trazem prazer, como o poder, a riqueza e a fama. Entorpecentes e sexo oferecem prazer, mas devem ser administrados com cautela, pois o vício é uma escravização que tira a liberdade individual da pessoa. A riqueza, a fama e o poder dependem de uma série de fatores que estão fora do indivíduo, ou seja, o próprio indivíduo não as controla. Isso pode causar frustração quando sair dos rumos desejados.
Os prazeres naturais, aqueles que realmente levam à felicidade, devem ser buscados sem moderação. Esses prazeres estão ligados ao intelecto e enobrecem o espírito, tornando a vida supostamente mais plena e feliz. Eles não são efêmeros, não causam dependência e nem decepcionam, portanto, são os prazeres mais recomendados. Os utilitaristas ingleses, principalmente na vertente desenvolvida por John Stuart Mill e Harriet Taylor Mill, apostaram na utilidade desse tipo de prazer como norte para o princípio ético utilitarista: ações éticas são aquelas que causam maior prazer ao maior número de pessoas e menor dano ao menor número.
Podemos concluir que o hedonismo epicurista não consiste numa busca desenfreada por prazeres, mas no domínio do desejo e na moderação. O epicurismo difere-se do hedonismo cirenaico por delimitar o prazer desejável de maneira específica e por defender o controle dos impulsos e dos desejos.
Tipos de hedonismo
- Hedonismo cirenaico: forma pura e simples da ideia de hedonismo defendida por Aristipo de Cirene.
- Hedonismo epicurista: como foi descrito no último tópico, é um tipo que diferencia os prazeres que devem ser buscados.
- Hedonismo utilitarista: prevê como ação ética aquela que segue um cálculo racional, tornando o resultado da ação em algo que deve provocar o maior prazer ao maior número de pessoas possíveis.
- Hedonismo psicológico: é a ideia de que há uma ligação entre prazer e felicidade, e a felicidade é a finalidade da vida humana.
Crédito da imagem
[1] Miguel Hermoso Cuesta / Commons
Por Francisco Porfírio
Professor de Filosofia