A Revolução de 1930 é considerada o acontecimento da história do período republicano brasileiro que pôs fim à chamada República Velha e, mais do que isso, foi o acontecimento que também deu fim às articulações políticas entre as oligarquias regionais do Brasil, que sobrepunham os seus interesses particulares aos interesses do Estado e da Nação como um todo. O principal protagonista da Revolução de 1930 foi Getúlio Dorneles Vargas, então presidente (nome que se dava aos governadores da época) do estado do Rio Grande do Sul. Para melhor compreendermos esse episódio de nossa história, é necessário saber qual era o cenário político da época. É o que será exposto no tópico seguinte.
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O cenário político do biênio 1929-1930 foi um dos mais conturbados não só para o Brasil, mas também para boa parte do mundo, sobretudo em virtude das consequências da Grande Depressão Americana, provocada pelo “crash” da Bolsa de Nova York. A economia cafeeira paulista, que movimentava grande parte da economia brasileira à época, foi diretamente atingida por esses fatores externos. A oligarquia que comandava esse setor da economia também tinha o controle do poder político e buscava delinear um futuro de recondução à estabilidade econômica por meio da sucessão no cargo da presidência da República. Em 1929, o presidente era o paulista Washington Luís, que, contrariando os acordos da “política do café com leite”, indicou como seu sucessor outro político paulista, Júlio Prestes.
Essa desavença entre as oligarquias de São Paulo e Minas foi acompanhada da organização de uma outra frente, formada por políticos de outros estados, como Rio Grande do Sul, Pernambuco, Paraíba e Rio de Janeiro. Essa frente ficou conhecida como Aliança Liberal, ou AL. O objetivo da AL era lançar candidatos à presidência e à vice-presidência que viabilizassem uma alternativa ao joguete oligárquico. Os candidatos em questão, para disputar as eleições de 1930, eram Getúlio Vargas, presidente do Rio Grande do Sul (para a presidência), e João Pessoa, presidente da Paraíba (para a vice-presidência).
Apesar da grande popularidade que a Aliança Liberal chegou a atingir, a chapa de Vargas e Pessoa não conseguiu concorrer em pé de igualdade com a máquina eleitoreira dos paulistas. Washington Luís trabalhou firme para que Júlio Prestes fosse eleito. Isso implicava a mobilização de toda a estrutura de fraudes das urnas, coerções e compras de votos e busca de apoio de outros presidentes de estados – no total, 17 apoiaram Júlio Prestes. O resultado foi esmagador. Com a apuração dos votos, em 21 de maio de 1930, contou-se 1.091.709 votos a favor de Prestes contra 742.794 obtidos por Vargas.
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Associação da AL com os tenentes e o assassinato de João Pessoa
Insatisfeitos com o resultado fraudulento, os membros da Aliança Liberal passaram a articular soluções alternativas para o caso. A mais proeminente era a saída revolucionária. Para tanto, era necessário o apoio de militares. Esse apoio foi encontrado entre os oficiais de baixa patente, os tenentes, que já possuíam um histórico de atividade no campo político desde o início da República Velha. Como dizem as historiadoras Lilia Schawarcz e Holoisa Starling, em seu livro Brasil: uma biografia:
A alternativa de enveredar por uma solução armada não era fanfarronada dos jovens líderes civis – ela contava com a firme adesão dos tenentes. O grupo de oficiais subalternos, remanescentes das intervenções militares dos anos 1920, estava ferido nos seus brios, buscava o poder que não conseguiria desde a Proclamação da República e não se sentia disposto a deixar esse poder escapar sem luta. Os tenentes possuíam experiência militar, eram idealistas, politicamente inquietos, gozavam da admiração da tropa e de simpatia entre os setores médios da população e a massa de trabalhadores urbanos. [1]
O apoio dos tenentes também implicava a associação entre as lideranças civis de prestígio, como Vargas, e “um punhado de jovens oficiais capacitado a aliar a influência dentro e fora dos quartéis com a condução militar da rebelião pretendida pelos três estados dissidentes – Juarez Távora, Siqueira Campos, Eduardo Gomes, João Alberto, Miguel Costa, Agildo Barata, Juracy Magalhães.” [2]. Entretanto, faltava o estopim, o gatilho, para que a revolução estourasse e ganhasse a adesão popular. Esse estopim ocorreu na Paraíba.
O candidato a vice de Getúlio, João Pessoa, foi assassinado em 26 de julho de 1930, em uma confeitaria na cidade de Recife. O assassino era João Duarte Dantas, adversário político de Pessoa. Entretanto, as motivações do assassinato foram de cunho mais pessoal do que político. Dantas acusou Pessoa de ter ordenado a invasão de seu escritório, onde foram colhidas cartas íntimas, que foram publicadas e disseminadas pela Paraíba.
Quaisquer que fossem os motivos de Dantas, o assassinato de pessoa logo se transformou na alavanca para a revolução. Ações militares passaram a ocorrer em vários locais diferentes do Brasil ao mesmo tempo. Em 24 de outubro, o poder estava nas mãos da AL. Washington Luís foi deposto do cargo e logo exilado.
Saiba mais: O que foi o tenentismo?
Getúlio Vargas no poder
Getúlio Vargas, como líder articulador da revolução, logo ficou incumbido da organização do novo governo, que teria caráter provisório, cujo objetivo maior era desintegrar a estrutura política oligárquica. Como dizem as historiadoras citadas acima:
Vargas não pretendia pôr em risco sua própria conquista. Estava claro que, se promovesse eleições, as elites regionais, cujas estruturas de mando na esfera estadual permaneciam intactas, venceriam. Para institucionalizar a nova ordem, seria preciso transformar o sistema político e consolidar um amplo programa de reformas sociais, administrativas e políticas. O projeto era ambicioso, não podia ser executado da noite para o dia, mas nem o próprio Távora poderia prever que a ditadura que defendia, em 1930, se estenderia por quinze longos anos, com um breve interregno constitucional de 1934 a 1937. [3]
Notas
[1] Schawrcz, Lilia M. e Starling, Heloisa M. Brasil: Uma Biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p.356.
[2] Ibid. p. 356.
[3] Ibid. p. 360.