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Em 64 d.C., o Império Romano era governado por um dos mais controversos, extravagantes e mal-afamados imperadores, Nero, o último da dinastia julio-claudiana. Nos dias 18 e 19 de julho daquele ano, a cidade de Roma foi acometida por um dos maiores desastres da Antiguidade. Um grande incêndio devastou os domínios de Roma, provocando incontáveis perdas materiais e humanas, sobretudo nas regiões mais populosas e antigas, como Palatino e Suburra. Desde a época do grande incêndio de Roma, historiadores vêm discutindo sobre as causas e a responsabilidade do desastre.
Um dos historiadores da época de Nero que melhor narraram o episódio do incêndio foi Dion Cassisus. Veja um trecho dessa narrativa:
“Um extraordinário tumulto se apoderou de toda a cidade e pessoas corriam de um lado para outro como loucas. Alguns, ao tentarem ajudar seus vizinhos, eram informados que sua própria casa começava a queimar […]. Os que estavam no interior dos prédios precipitaram-se pelas ruas estreitas, na esperança de poderem ficar protegidos do lado de fora, enquanto outros, ao contrário, queriam se refugiar dentro das casas. Crianças, mulheres, homens e velhos, todos gritavam ou gemiam; não se podia ver ou escutar nada por causa da fumaça e dos gritos. Alguns ficavam parados, mudos e boquiabertos. Muitos dos que transportavam seus bens, ou os bens que haviam saqueado nas casas alheias, precipitavam-se uns contra os outros e ficavam soterrados sob o fardo que transportavam. […] as pessoas empurravam e eram empurradas, derrubavam os outros e eram derrubadas. Muitos eram esmagados e pisoteados. Assistia-se a tudo o que se produz numa tal catástrofe; e era impossível escapar, pois o que evitava um perigo caía imediatamente um outro e morria. (Dion Cassius, LXII, 16.)
Boa parte dos historiadores romanos, incluindo Dion Cassius, acusaram veementemente o imperador Nero pelo ato, alegando que ele teria bons motivos para arruinar o centro de seu império: 1) ter a possibilidade de reconstruir Roma ao seu gosto (à qual daria o nome de Neroni) e acusar os cristãos, que, na ocasião, estavam em crescente ascensão dentro do império, mudando os costumes antigos, convertendo e moralizando os pagãos. 2) Há ainda a hipótese de que Nero, em um dos seus ataques de insanidade e extravagância, teria incendiado a cidade para contemplar a destruição de Roma do alto da torre de Mecenas, enquanto cantava o poema Toiae Halosis, composto por ele mesmo e dedicado à destruição de Troia.
Tácito, também historiador da antiga Roma, foi um dos poucos autores antigos que se puseram a problematizar as causas do incêndio, levantando a hipótese de ter sido realmente acidental, haja vista que a cidade de Roma continha um número muito grande de construções em madeira, e os incêndios de pequeno porte eram frequentes.
Alguns historiadores modernos lançaram novas luzes sobre esse acontecimento ao descobrirem evidências de que Nero não se encontrava em Roma na ocasião do incêndio, e sim em uma região afastada da cidade. Além disso, alguns monumentos recém-construídos pelo referido imperador foram destruídos pelo incêndio, o que sinaliza a não intencionalidade da ação devastadora. Mas como grande parte da nobreza romana desaprovava as ações de Nero, sua imagem tornou-se diretamente associável com a calamidade. O fim do governo de Nero ocorreu quando, após um golpe de Estado orquestrado por vários governadores em 68 d.C., o imperador deu cabo de sua própria vida.
Por Me. Cláudio Fernandes