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Há exatamente doze anos o mundo assistia de forma perplexa o desabamento das famosas Torres Gêmeas, o Word Trade Center, após os choques consecutivos de dois aviões comerciais. Não se tratava de um mero acidente aéreo – o que muitos podem ter pensado após o choque do primeiro avião – mas sim da execução de um plano encabeçado por Osama Bin Laden. Somando-se os dois ataques às Torres, ao ataque ao Pentágono e ao avião que caiu na Pensilvânia no mesmo dia, quase três mil pessoas morreram. Desde aquela manhã de 11 de setembro de 2001, não apenas a história dos Estados Unidos, mas a de todo o mundo, nunca mais seria a mesma.
Mas para compreender um pouco melhor o que foi o “Onze de Setembro” é preciso considerar, pelo menos em linhas gerais, o tipo de relação construída décadas antes entre Oriente e Ocidente, fato que fomentaria o ódio de grupos radicais e fundamentalistas. Como se sabe, o século XX foi marcado pelo pleno desenvolvimento do capitalismo no mundo com seu coroamento como sistema econômico dominante com o fim da Guerra Fria entre os anos 80 e 90. Dessa forma, historicamente, as grandes potências mundiais localizadas no Ocidente empreenderam cada vez mais o projeto de expansão de seus poderes econômico, político e ideológico no mundo, vendo no Oriente uma oportunidade de exploração, principalmente pelas características regionais: rica em reservas de petróleo, além de uma posição estratégica geograficamente. Tanto pela luta contra a expansão do bloco socialista no Oriente Médio (em plena Guerra Fria), bem como pelo pretexto de proporcionar e financiar o desenvolvimento econômico, a presença das potências ocidentais – em especial dos Estados Unidos – foi se tornando uma realidade nessa região.
Contudo, é preciso que se diga que se esse objetivo dos países capitalistas ocidentais em poder explorar o Oriente não é algo novo, da mesma forma não é novidade o repúdio e a contestação da presença ocidental por parcelas da população de vários países dessa região. Obviamente, a presença de outros países deixa patente o enfraquecimento e a perda de autonomia e soberania de uma nação. Em outras palavras, ficaria sugerido que a presença ocidental prejudicaria os países do Oriente, uma vez que estes (assim como outros países da chamada periferia do capitalismo) deveriam submeter seus interesses aos do capital estrangeiro, ocidental. Além disso, naturalmente, no bojo do capitalismo vem sua indústria cultural, assim como seus valores, os quais certamente iriam na contramão da cultura e da tradição religiosa do Oriente, acirrando um estranhamento do ponto de vista étnico.
Em meados da década de 1990, a Guerra do Golfo Pérsico, empreendida pelos Estados Unidos, seria uma prova desse seu interesse em se fazer presente. Da mesma forma, a tentativa de mediar um acordo nas questões do Oriente Médio entre palestinos e israelenses seria outro exemplo. Contudo, a maior aproximação e apoio a países como Israel não passaria despercebida. Segundo o site do Jornal Estadão (O Estado de São Paulo), em notícia publicada em setembro de 2009, Bin Laden afirmava que um dos fatores que teriam motivado o ataque às Torres Gêmeas seria o apoio (não apenas político, mas também financeiro) dos EUA à Israel. País de tradição judaica, Israel é historicamente inimigo do povo palestino (islâmico em sua grande maioria), fato que o colocaria como nação inimiga do Islã.
Porém, essas questões são bem mais complexas do que aqui se expõe, mas em linhas gerais apontam o que seria a matéria-prima para o fortalecimento de um ódio ao Ocidente que encontraria suas bases num fundamentalismo religioso de natureza islâmica, fundamentalismo este que declararia uma guerra santa. Vale destacar que esta não traduziria, necessariamente, a opinião de todo o povo do Oriente de maneira geral, mas sim de grupos extremistas como AL-Qaeda, Hezbolah, entre outros mais radicais. Estas seriam as bases de um pensamento que, em 2001, materializar-se-ia com os ataques ao Word Trade Center. O representante maior dessa cultura ocidental e de seu sistema econômico gerador de exploração e miséria eram os Estados Unidos e, dessa forma, a suntuosidade e a imponência das duas torres seriam os símbolos do inimigo.
A reação dos Estados Unidos aos ataques foi rápida, resultando nas Guerras do Afeganistão e do Iraque, embora a efetividade dos motivos e dos resultados desses empreendimentos seja discutida até hoje. Quase que de forma esquizofrênica, os Estados Unidos declararam uma guerra permanente contra o terror, contra os países que pudessem fazer parte do chamado “eixo do mal”, e que poderiam estar envolvidos direta ou indiretamente com o terrorismo, apoiando Osama Bin Laden. O que se seguiu foi a disseminação de um medo internacional de possíveis ataques, além do preconceito e intolerância contra a comunidade islâmica, uma das consequências mais negativas de todo esse episódio.
Esse rompante contra o terrorismo e a luta contra um inimigo do Ocidente, personificado na figura de Osama Bin Laden – ao ponto do governo Bush desconsiderar as opiniões e os tratados existentes entre a comunidade internacional, declarando guerras e invasões como no caso do Iraque – se resume em uma década de guerras e mortes de civis e soldados (também americanos) em nome de uma paz que ainda não está garantida. As ações eram em nome de um ataque preventivo às possíveis ações terroristas (às quais em tempo deveriam ser desarticuladas) e, dessa forma, seria interessante a criação de uma coalizão de países. Assim, nações europeias a exemplo da Inglaterra aderiram aos planos de guerra do governo Bush. Tal adesão ganhou mais sentido quando, ao longo desse período de dez anos, alguns ataques (de menores proporções) ocorreram em cidades importantes como Madri (em 2004) e Londres (2005).
Num primeiro momento, os esforços se concentraram no Afeganistão para a desarticulação do regime talibã (apoiadores de Bin Laden, logo da Al Qaeda), com um projeto, no mínimo contraditório, de impor a democracia como regime político para aquele país. Em seguida, os Estados Unidos redirecionaram sua estratégia de guerra, atacando o Iraque do ditador Sadam Hussein com o propósito de também levar a democracia. Pelo menos em tese, a guerra contra o Iraque se deu por conta do possível apoio de Sadam às organizações terroristas, além de sua suposta propriedade e produção de armas nucleares (para destruição em massa), acusação esta mais tarde desmentida. Assim, eram países que compunham o eixo do mal.
Contudo, olhando criticamente não apenas o resultado, mas as condições do desenvolvimento dessas ações dos Estados Unidos, especialistas afirmam que nas entrelinhas desses empreendimentos contra o terror estava um projeto de expansão e fortalecimento da hegemonia norte-americana no mundo e que tinha a questão do combate ao terrorismo mais como pretexto do que como objetivo.
Passados dez anos, é possível fazer um breve balanço das transformações ocorridas na ordem mundial, relacionando-as com esses famigerados ataques em uma manhã de setembro em Nova York. Apesar de Osama Bin Laden estar morto desde maio de 2011, e apesar de os Estados Unidos terem ocupado com relativo sucesso o Afeganistão e o Iraque (aliás, com a captura de Sadam e sua condenação à morte, posteriormente), a vitória americana não necessariamente se configurou a contento.
Alguns trilhões de dólares foram (e ainda serão) desembolsados pelo governo norte-americano em nome da guerra, o que, se somado à política econômica nacional nos últimos anos, fez com que os Estados Unidos aumentassem substancialmente sua dívida. As crises econômicas, como as de 2008 e 2011, enfrentadas pelo país (e, obviamente, pelo mundo) contribuiriam para o enfraquecimento da hegemonia americana, que agora divide espaço com países em forte crescimento econômico como a China (isso sem falar no fortalecimento de outros que compõem o BRICS, como o Brasil). Assim, o desvario por uma caça aos terroristas, mas que tinha como real objetivo realçar o poder norte-americano no mundo, resultou em um grande fracasso. De tal modo, os Estados Unidos saíram diminuídos, menores do que quando entraram nas guerras. Em outras palavras, ocorreu uma fragilização do imperialismo norte-americano (embora seja incontestável que os EUA são e serão poderosos por um bom tempo, dado seu poder bélico, tecnológico e financeiro no mundo), e uma consequente rearticulação dos atores internacionais, com o surgimento de novos blocos e da reorientação das relações entre os países.
Além disso, a luta contra o terror promoveu a exacerbação do xenofobismo, da intolerância, da perseguição ao islamismo, assim como práticas polêmicas pelas forças de Estado em nome de uma segurança e defesa nacionais. Prova disso seria o lamentável equívoco cometido pelo governo inglês ao matar um brasileiro (Jean Charles de Menezes) em 2005, por confundi-lo com um suspeito de terrorismo.
De fato, alguns pontos merecem destaque: não houve outro ataque de mesmas proporções que as do 11 de Setembro, e a Al-Qaeda realmente se fragilizou com a morte de Bin Laden. Porém, isso não significa, infelizmente, que outros eventos de cunho terrorista não venham a ocorrer. Afinal de contas, a forma como os Estado Unidos intervieram apenas ampliou sua imagem negativa para o Oriente, o que pode permitir que, para alguns, o discurso de grupos radicais e fundamentalistas faça mais sentido do que nunca. Mesmo assim, pode-se pensar numa avaliação menos pessimista quando se olha para a “Primavera Árabe” (Revolução Política que tem transformado regimes como o Egito e a Líbia), uma vez que os jovens do Oriente estariam percebendo a importância da luta política, desinteressando-se por medidas radicais e de violência tão características dos extremismos religiosos, fato que poderia diminuir adeptos aos grupos fundamentalistas. Assim, menos jovens poderiam estar interessados em se tornar pilotos suicidas em nome de Alá e do nacionalismo, mas sim compreendendo outras possibilidades de luta.
Paulo Silvino Ribeiro
Colaborador Brasil Escola
Bacharel em Ciências Sociais pela UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas
Mestre em Sociologia pela UNESP - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"
Doutorando em Sociologia pela UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas