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Quando estudamos a formação de determinada civilização, a língua e a literatura ocupam um lugar central, haja vista que uma nação, ou um povo, tem como um de seus elementos unificadores a língua materna – é a partir da língua e de outros elementos culturais que se forma a identidade de uma civilização. Na Antiguidade Clássica Ocidental, isto é, no universo greco-romano, as línguas de destaque foram, evidentemente, o grego e o latim. As principais cidades-estado gregas, como Tebas, Antenas e Esparta, tiveram grande influência dos poemas homéricos – que eram decorados e recitados desde a infância. Em Roma, isso também acontecia com relação aos textos de Virgílio, Horácio, Cícero, entre outros.
Quando, na transição da Idade Média para a Idade Moderna (séculos XIV e XV), começaram a se formar as primeiras nações modernas, como Portugal, Espanha e os vários principados italianos, teve início também um processo de eferverscência cultural, que procurou recuperar a tradição clássica da Antiguidade Ocidental, mencionada no parágrafo anterior. Essa eferverscência cultural receberia por parte dos historiadores o nome de Renascimento Cultural e teria eco nas artes plásticas (pintura e escultura), na arquitetura, no pensamento político e filosófico, na investigação científica e, é claro, na literatura. Com o desenvolvimento literário durante a época do Renascimento, as línguas vernáculas derivadas do latim, como o português, o italiano, o francês (provençal) e o espanhol, ganharam um contorno sistemático e esmerado.
No caso específico de Portugal, a identidade nacional lusitana começou a ser definida nos séculos XV e XVI, em meio à ambiência da expansão marítima, que implicou a formação de um imenso império ultramarino. Essa ambiência passou a suscitar uma organização narrativa dos grande feitos portugueses. Essas narrativas passaram a ser feitas por grandes poetas, como Luís de Camões, que, em seu poema épico Os Lusíadas, conta toda a história de Portugal desde as origens até meados do século XVI, como bem se explicita logo nas duas primeiras estrofes do poema:
As armas e os Barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando,
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
Aí está o anúncio de que serão cantadas (narradas) as glórias e os dramas de Portugal. A estrutura do verso é o decassílabo heroico (verso de dez sílabas métricas, sendo a sexta e a décima sílabas com acento tônico). Esse seria o verso principal desse período, usado também em sonetos e outras variações poéticas. No último verso da segunda estrofe, Camões faz uma alusão direta à concepção clássica de “arte poética”, isto é, ele fala de “engenho” e “arte” (no sentido de “inspiração” e “técnica/estilo”), que são termos explorados pelo poeta romano Horácio em sua obra Ars Poetica. O emprego dessa noção, que aparece também em muitos outros poemas de Camões, denota uma sólida filiação com a arte clássica. Por isso, esse período da literatura portuguesa também é definido como “Classicismo”, além de ser definido também por termo relativo à datação temporal: “Quinhentismo” (aludindo ao século XVI, 1500).
Além da obra de Camões, há outro grande poeta português da época do Renascimento, Francisco Sá de Miranda, que foi o responsável pela introdução da estrutura do soneto (dois quartetos – estrofes de quatro versos – e dois tercetos – estrofes de três versos) na língua portuguesa a partir de uma matriz renascentista italiana chamada Dolce Stil Nuovo, que teve na figura de Petrarca o seu principal representante.
No campo da prosa, teve destaque nesse período a chamada “literatura catequética”, isto é, relacionada com a pregação da fé católica. José de Anchieta e Frei Vicente de Salvador estão entre os principais nomes. Houve também, em prosa, o tipo de relato de viagens, que tem na Carta de Pero Vaz de Caminha um documento de suma importância para a língua e literatura portuguesa. Destaca-se ainda, no campo da arte dramática (teatro), a obra de Gil Vicente, que não pode deixar de estar relacionada com os grande nomes da literatura portuguesa da época do Renascimento.
Por Me. Cláudio Fernandes