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Um percurso histórico
Um dos mais importantes nomes da filosofia da ciência era, na verdade, físico: Thomas Kuhn, estudante de pós-graduação em Física em Harvard, ao ministrar um curso que deveria explicar ciência para não cientistas, aproximou-se da história da ciência e, depois, da filosofia da ciência. O primeiro resultado dessa incursão de quinze anos pela história da ciência foi o seu ensaio, “A Estrutura das Revoluções Científicas”, publicado em Foundations of the Unity of Science, a Enciclopédia das Ciências Unificadas.
Pouco tempo depois da publicação, a noção principal de sua obra, “paradigma”, já havia sido incorporada aos discursos mais variados, de artes à psicologia, contudo sem referência ao sentido do autor. Em 1992, após trinta anos da publicação, a obra já havia sido traduzida para mais de vinte idiomas e vendido mais de um milhão de cópias. No artigo The March of Paradigms da revista Science, de 1999, consta que, em 1998, mais de cem artigos das principais revistas utilizaram o termo “paradigma” em vez de “método” e “teoria”.
Tais dados nos fazem perceber a influência que Kuhn exerceu sobre a comunidade científica que, antes dele, baseava-se nos pensadores do Círculo de Viena e na obra de Karl Popper. Embora com distinções profundas – Karl Popper, inclusive, propõe uma alternativa ao princípio da verificabilidade, pedra de toque dos pensadores do Círculo de Viena –, Popper e os pensadores do Círculo de Viena compartilhavam uma visão da ciência descolada da história e da crítica à metafísica. A ciência era entendida por eles a partir da noção de progresso: a ciência desenvolver-se-ia se aplicado um método rigoroso válido para todas as ciências.
Popper questionou o princípio da verificabilidade dos pensadores do Círculo: se eles pensavam que aquilo que não tivesse possibilidade de verificação deveria ser retirado do saber científico, como os enunciados metafísicos, Popper chamou a atenção para a limitação do método indutivo. A ciência poderia, segundo ele, selecionar os fenômenos a serem estudados a partir de uma suposição, de forma que sempre conseguiriam provar seus pontos de vista.
Por isso, Popper elaborou o princípio da falseabilidade: em vez de verificar experiências empíricas que possam confirmar uma teoria, o cientista deveria buscar fatos particulares que pudessem refutar a hipótese. A teoria que resistisse à refutação pela experiência seria considerada comprovada e nisso, a capacidade de ser refutada, consistiria sua superioridade em relação à metafísica.
A noção de paradigma
Thomas Kuhn, em oposição a Popper, que pensava que a ciência progrediria por meio de refutações, forjou o conceito de “paradigma”. No entanto, o que ele pretendia dizer com “paradigma” não tem um sentido único em sua obra, A Estrutura das Revoluções Científicas: nela constam vinte e dois significados diferentes. Tal pluralidade de sentidos levou-o a escrever um “posfácio”, em 1969, no qual admitia dois sentidos.
Vamos entender melhor:
Em uma definição simples, para Kuhn, a ciência desenvolver-se-ia pela criação e abandono de paradigmas, modelos consensuais adotados pela comunidade científica de uma época. Depois do estabelecimento de um paradigma, haveria um período histórico em que os cientistas desenvolveriam as noções e problemas a partir do paradigma adotado. Esse período foi chamado por ele de “Ciência Normal”, período no qual se acumulam descobertas, um período de estabilidade de opiniões a respeito de pontos fundamentais. Quando o paradigma é questionado, surge um momento de crise; no entanto, o paradigma ainda não é abandonado. Os cientistas mobilizam seus esforços para resolver as anomalias. Chega-se a um ponto, porém, em que não é mais possível resolver tais anomalias e isso leva a uma revolução científica, momento no qual desponta um novo paradigma. Esse paradigma não é superior ao anterior, apenas atende mais as necessidades do período histórico em que os cientistas estão inseridos.
Por Wigvan Pereira
Graduado em Filosofia