UOL - O melhor conteúdo

O eu poético e o autor: diferenças que os demarcam

Precisamos estabelecer as diferenças que demarcam o eu poético e o autor, haja vista que o primeiro foi criado para expressar as ideias do segundo.

Diferenças demarcam o eu poético e o autor
Diferenças demarcam o eu poético e o autor
Imprimir
A+
A-
Escutar texto
Compartilhar
Facebook
X
WhatsApp
Play
Ouça o texto abaixo!
1x
PUBLICIDADE

O texto poético deve apresentar características indispensáveis, tais como: subjetividade, emoção, lirismo, entre outras. Partindo desse princípio, levantamos um questionamento que se mostra relevante: haveria um ponto de contato, uma semelhança, enfim, uma afinidade, entre quem escreve (no caso, o autor) e o enunciador de um poema, ou seja, a voz que fala, que se expressa dentre desse?

Assim, analisemos as palavras de um renomado crítico, Yves Stalloni, fazendo referência à concepção do eu lírico:

[...] O lirismo é a emanação de um eu – que o romantismo gostava de confundir com a pessoa do poeta, mas que pode se apagar por detrás de uma de suas personagens. 

STALLONI, Yves. Os gêneros literários. Rio de Janeiro: Difel, 2001, p. 151.

Por meio delas, dá-se a entender que não podemos confundir tais elementos, haja vista que autor é quem cria, notadamente, e o eu poético representa um ser criado para expressar as emoções intuídas pela autoria do poema.
Vejamos agora uma das criações de Carlos Drummond de Andrade, na qual se evidenciam traços de afinidade entre autor e eu poético, embora distintos pelas suas características:

Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;)

Confidência do itabirano

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

Como é sabido por todos nós, o autor nasceu realmente em Itabira, no entanto, a voz que expressa dentro do poema necessariamente assume outro perfil, outra identidade – eis o fato de estabelecermos tal distinção.

Vânia Duarte
Graduada em Letras

Escritor do artigo
Escrito por: Vânia Maria do Nascimento Duarte Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

DUARTE, Vânia Maria do Nascimento. "O eu poético e o autor: diferenças que os demarcam "; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/o-eu-poetico-autor-diferencas-que-os-demarcam.htm. Acesso em 21 de abril de 2025.

De estudante para estudante


Videoaulas


Lista de exercícios


Exercício 1

(FUVEST – 2001) 

Teu romantismo bebo, ó minha lua,

A teus raios divinos me abandono,

Torno-me vaporoso... e só de ver-te

Eu sinto os lábios meus se abrir de sono.

(Lira dos vinte anos – Álvares de Azevedo)

Nesse excerto, o eu-lírico parece aderir com intensidade aos temas de que fala, mas revela, de imediato, desinteresse e tédio. Essa atitude do eu-lírico manifesta a:

a) ironia romântica

b) tendência romântica

c) melancolia romântica

d) aversão dos românticos à natureza

e) fuga romântica para o sonho

Exercício 2

Confidência do itabirano

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

(Carlos Drummond de Andrade)

Sobre o poema de Drummond, é correto afirmar que:

I. O poeta emprega o recurso do eu-lírico para distanciar-se do tema desenvolvido nos versos.

II. A palavra “confidência” afasta o poeta do tema proposto.

III. Há vários indícios que corroboram com a afirmativa de que existem contrapontos importantes entre o eu-lírico e o autor do poema.

IV. A palavra “confidência” aproxima o autor do tema proposto.

Estão corretas as proposições:

a) I e II.

b) II e III.

c) III e IV.

d) I, III e IV.

Exercício 3

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda

Gira, a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

(Fernando Pessoa)

A partir da análise da palavra título, “Autopsicografia”, podemos afirmar que:

a) O texto mostra uma visão irônica do eu-lírico sobre as pessoas com as quais convive.

b) A palavra autopsicografia exclui qualquer possibilidade de envolvimento do autor como o poema.

c) O foco do eu-lírico é mostrar para o leitor suas desventuras amorosas.

d) A principal intenção do autor é estabelecer um diálogo como os leitores.

e) É possível observar, através da análise dos elementos, que o poema apresenta um contraponto entre o autor e o eu-lírico.

Exercício 4

(UFPA)

Se eu podess’ora meu coraçon,

Senhor1, forçar e poder-vos dizer

quanta coita2 mi fazedes sofrer

por vós, cuid’eu, assi Deus mi perdon,

que haveríades doo3 de mi.

Ca4, senhor, pero me fazedes mal

e mi nunca quisestes fazer bem,

se soubéssedes quanto mal mi vem

por vós, cuid’eu, par Deus que pod’e val5,

que haveríades doo de mi.

E, pero mi havedes gran desamor,

se soubéssedes quanto mal levei

e quanta coita, des que vos amei,

por vós, cuid’eu, per boa fé, senhor,

que haveríades doo de mi.

E mal seria se nom foss’assi.

(D. Dinis. In Portal Galego da Língua: Cantigas trovadorescas. Disponível em: http://agalgz.org)

1 – Senhor: senhora. 2 – Coita: sofrimento de amor. 3 – Doo: dó. 4 – Ca: porque. 5 – Val: valer, ajudar.

Considerando-se que o texto transcrito é uma cantiga de amor, é correto afirmar, sobre esse tipo de produção poética, que

a) o trovador, de acordo com as regras do amor cortês, ao cantar a alegria de amar, na cantiga de amor, revela em seus poemas o nome da mulher amada.

b) o homem, nesse tipo de composição poética, nutre esperanças de um dia conquistar a mulher amada, que, mesmo sendo imperfeita, é objeto de desejo.

c) na lírica trovadoresca, essa modalidade de cantiga caracteriza-se por conter a confissão amorosa da mulher, que lamenta a ausência do namorado que viajou e a abandonou.

d) o trovador se coloca no lugar da mulher que sofre com a partida do amado e confessa seus sentimentos a um confidente (mãe, amiga ou algum elemento da natureza).

e) o eu-lírico é um homem apaixonado que sofre e se coloca na posição de servo da “senhor”; a mulher (ou o seu amor) é vista como algo inatingível, aspecto que confere à cantiga de amor um tom lamentativo.