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O governo de Barack Obama teve como seu maior desafio encarar os efeitos da crise econômica mundial. Os eleitores que apoiaram Obama criaram uma grande expectativa com relação às práticas políticas do presidente democrata, cujo partido possui um histórico de promover políticas de caráter intervencionista na economia e assistencialista na forma de projetos sociais. Esse caráter do partido democrata foi desenhado durante a crise econômica de 1929. Durante a Grande Depressão, foi lançado em 1933, por Franklin Theodore Roosevelt, o New Deal, conjunto de políticas aplicadas para amenizar os efeitos econômicos e sociais da crise, inaugurando uma modalidade que esteve presente em todos os governos democratas posteriores: o fortalecimento do papel do Estado.
Na época conhecida como keynesianismo, a ideologia de regulação estatal começou a ser vista com descrédito durante a década de 1970, quando o neoliberalismo, doutrina favorável à desregulamentação dos mercados, alcançou notoriedade. Em pleno século XXI e no auge da doutrina neoliberal, Obama retornou a algumas práticas intervencionistas, necessárias, de certa forma, para provocar uma releitura do papel do Estado diante de uma grave crise econômica. Nesse caso, a reforma da saúde foi o carro-chefe das políticas sociais que o atual governo estadunidense tentou estabelecer.
O sistema de saúde dos Estados Unidos é o resultado de políticas implementadas em 1965 pelo presidente democrata Lyndon B. Johnson, que assumiu o cargo após a morte de John F. Kennedy. Na verdade, foi Kennedy quem tentou alterar a legislação para fomentar um plano de segurança médica para os idosos, mas sua iniciativa não encontrou êxito junto ao Congresso. Johnson conseguiu aprovar essas mudanças, criando o Medicare - programa de saúde exclusivo para os idosos a partir dos 65 anos - e o Medicaid - prestação de atendimento médico exclusivo para a população de baixa renda.
Em 1993, outro democrata, Bill Clinton, apresentou uma ampla proposta para atualizar as leis em questão, com um maior controle estatal que reduziria a liberdade de atuação de empresas privadas. Suas ideias enfrentaram a oposição e o lobby das seguradoras, não foram bem vistas pelos republicanos e dividiram opiniões entre os democratas, resultando em uma das maiores derrotas políticas do governo Clinton. Alheio às polêmicas, Obama retomou o debate logo no início do seu mandato com uma proposta ousada: a obrigatoriedade da cobertura de um plano de saúde para toda a população presente em território norte-americano até o ano de 2014.
Em síntese, a proposta denominada Affordable Care Act e apelidada de Obamacare pela imprensa define que:
- Todo cidadão estadunidense deve possuir cobertura privada de saúde, sob pena de multa, ainda que em valores simbólicos;
- Aqueles que não tiverem renda suficiente para pagar pelos serviços podem receber subsídios do governo;
- Jovens com até 26 anos têm o direito de permanecerem dependentes do plano de saúde de seus pais;
- Os planos de saúde devem oferecer assistência em determinados exames preventivos, como a mamografia, de forma gratuita;
-Maior abrangência e qualidade dos serviços oferecidos pelo Medicaid;
- As companhias não podem negar seus serviços para pessoas que tiverem doenças preexistentes.
A crise econômica produziu um número maior de desempregados e, consequentemente, de pessoas sem a assistência de um plano de saúde. Outro componente relacionado à crise foi o desestímulo do empresariado e empregadores, que simplesmente eliminaram o benefício de seus funcionários para reduzir seus gastos. Por tudo isso, quase 50 milhões de pessoas não possuem esse tipo de cobertura nos Estados Unidos.
Ao conseguir a aprovação no Senado, em 2010, Obama obteve uma vitória importante para os democratas e para sua ideologia de fortalecer a atuação do Estado como provedor de projetos sociais. O que representou um contraponto para essa conquista foi a reação dos republicanos, que passaram a impor dificuldades para a aprovação de outros projetos de interesse dos democratas, como o aumento do teto da dívida externa do país, votado em 2011. Apesar do consenso de que o governo dos Estados Unidos precisava de uma autorização para aumentar o limite de tomada de empréstimos para sanar gastos públicos, os republicanos recomendaram cortes exatamente no Medicare para reduzir as despesas públicas, enquanto Obama propôs aumentar os impostos das fortunas de cidadãos do país. Caso a medida não fosse concretizada, poderia fazer os Estados Unidos decretar uma moratória junto aos seus principais credores, o que abalaria ainda mais a confiança em torno da estabilidade econômica do país.
Vários estados alegaram que a reforma da saúde era inconstitucional, mas numa decisão histórica em 2012, a Suprema Corte decretou a constitucionalidade das novas regras, poucos meses antes das eleições presidenciais. O candidato republicano Mitt Romney chegou a afirmar que iria desfazer as mudanças propostas, e cerca de 60% da população não estava de acordo com o Obamacare, conforme pesquisa realizada durante a corrida eleitoral. Polêmicas à parte, as urnas foram favoráveis a Obama. Quanto ao sucesso da reforma do sistema de saúde, será preciso mais tempo para fazer esse tipo de avaliação. Ou talvez esperar pelos próximos 4 anos de mandato de Barack Obama...
*Créditos da imagem: Spirit of america e Shutterstock.com
Júlio César Lázaro da Silva
Colaborador Brasil Escola
Graduado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista - UNESP
Mestre em Geografia Humana pela Universidade Estadual Paulista - UNESP