Reforma Protestante

A Reforma Protestante foi um movimento de rompimento com a Igreja Católica iniciado em 1517, na Alemanha, quando Martinho Lutero publica suas <i>95 Teses</i>.

A Reforma Protestante foi um movimento de rompimento com a Igreja Católica de parte da cristandade e que deu origem a diversas denominações cristãs, cujo marco inicial se dá em 1517, na Alemanha, quando Martinho Lutero publica suas 95 Teses, nas quais faz diversas críticas à Igreja Católica, como a venda de indulgências e a corrupção do clero. A partir disso, há o surgimento de diversos novos ramos do cristianismo não vinculados à Igreja Católica, como o luteranismo, o anglicanismo e o calvinismo.

Leia também: Protestantismo — detalhes sobre essa vertente cristã que surgiu a partir da Reforma Protestante

Tópicos deste artigo

Resumo sobre Reforma Protestante

  • A Reforma Protestante foi um movimento religioso, intelectual e político que transformou a Europa a partir de 1517, quando Martinho Lutero publicou as 95 Teses, criticando a Igreja Católica.
  • Suas ideias desencadearam o surgimento de novas tradições cristãs, como o luteranismo, o calvinismo e o anglicanismo, e abriram caminho para inúmeras denominações posteriores.
  • Mais do que um conflito doutrinário, a Reforma Protestante envolveu disputas políticas, tensões econômicas, mudanças culturais e o avanço da imprensa, contribuindo para a formação da Europa moderna.
  • Ela resultou de tensões religiosas, políticas e culturais acumuladas por séculos. A corrupção na alta hierarquia da Igreja Católica abalou sua autoridade.
  • A imprensa e o Humanismo facilitaram a circulação de ideias e o acesso direto à Bíblia. Príncipes alemães apoiaram Lutero para reduzir a influência papal, e a burguesia ascendente se identificou com valores reforçados depois pelo calvinismo. Esses elementos, juntos, tornaram possível a ruptura que transformou o cristianismo e a Europa.
  • Lutero formulou três pilares doutrinários: justificação pela fé, autoridade das Escrituras e sacerdócio universal. Além disso, ele reformou a liturgia ao usar o alemão, valorizar a pregação, traduzir a Bíblia e simplificar o culto.
  • As doutrinas da Reforma Protestante surgiram das críticas de Lutero. Apesar da diversidade de tradições, algumas marcas teológicas se consolidaram:
    • a autoridade exclusiva da Bíblia (Sola Scriptura);
    • a salvação pela fé (Sola Fide) e pela graça divina (Sola Gratia);
    • Cristo como único mediador (Solus Christus);
    • a glória dirigida somente a Deus (Soli Deo Gloria).
  • O calvinismo, formulado por João Calvino em Genebra, tornou-se um dos principais desdobramentos da Reforma Protestante. Sua doutrina central, a predestinação absoluta, afirmava que Deus decide o destino eterno antes do nascimento. Diferente de Lutero e da teologia católica, Calvino sistematizou a fé reformada nas obras (Institutas), oferecendo também um modelo disciplinar e comunitário.
  • A ética do trabalho reforçada por Calvino e sua valorização da prosperidade atraíram a burguesia nascente. O calvinismo organizou igrejas participativas, muitas chamadas depois de presbiterianas, e se espalhou pela Europa e pelas Américas, influenciando a democracia liberal, o capitalismo e ideias modernas de cidadania.
  • O Dia da Reforma Protestante é celebrado todo dia 31 de outubro e marca a publicação das 95 Teses por Lutero. Em países protestantes, a data ganha destaque com debates, com eventos culturais e, em partes da Alemanha, com feriado oficial.
  • A Contrarreforma foi a resposta da Igreja Católica à Reforma Protestante, promovendo renovação doutrinária e disciplinar. Seu marco central foi o Concílio de Trento (1545–1563), que reafirmou a autoridade papal, a tradição, os sacramentos e a importância das boas obras, além de exigir formação rigorosa do clero.
A Reforma Protestante foi motivada, principalmente, pela insatisfação de Martinho Lutero com a Igreja Católica. (Créditos: Isa Galvão | Brasil Escola)

O que foi a Reforma Protestante?

A Reforma Protestante foi um amplo movimento histórico de cunho fortemente religioso, mas também intelectual, social e político, que transformou profundamente a Europa a partir do século XVI, marcado principalmente pelo surgimento de ramos do cristianismo não vinculados ou submetidos à Igreja Católica, como o luteranismo, o anglicanismo e o calvinismo.

O marco inicial da Reforma Protestante ocorreu em 31 de outubro de 1517, quando o alemão Martinho Lutero, que era então um monge católico agostiniano e professor universitário de Teologia, torna públicas uma série de severas críticas à Igreja Católica e à condução dessa instituição por parte do papa.

Martinho Lutero pregando suas 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg em 31 de outubro de 1517.

Foi a publicação das chamadas 95 Teses, de Lutero, que deu início a um processo de rompimento com a Igreja Católica de boa parte da cristandade europeia, rompendo consensos religiosos seculares e multiplicando novas formas de cristianismo. Além disso, esse processo desencadeou uma profunda reorganização política e cultural do Ocidente.

Em torno de Lutero, surgiu a Igreja Luterana na Alemanha, presente, ainda hoje, em diversos países. Apesar das diferenças entre essa igreja e a Igreja Católica, há ainda muitas similaridades. No entanto, o precedente aberto pela fundação dessa nova igreja cristã permitiu que outras igrejas surgissem depois, como as igrejas calvinistas, vinculadas aos ensinamentos do teólogo franco-suíço João Calvino, a Igreja Anglicana, vinculada ao Estado inglês, bem como denominações surgidas nos séculos XIX e XX, como as igrejas pentecostais, neopentecostais e cristãs evangélicas. Novas igrejas cristãs não submetidas ao catolicismo romano ainda surgem atualmente em todo o mundo.

Entretanto, a Reforma Protestante não pode ser entendida apenas como um conflito religioso doutrinário em torno de visões sobre como deveria ou não ser vivido o cristianismo na prática, mas como algo mais amplo, como um fenômeno com muitas dimensões, pois envolveu disputas sobre autoridade política, tensões econômicas e transformações culturais.

A animosidade dos reis que se fortaleciam nesse período com as intromissões da Igreja Católica em seus domínios, a ascensão da burguesia, que não se identificava com os valores de humildade e da pobreza pregados pela Igreja Católica (apesar da riqueza exuberante do clero), além da expansão da leitura e da educação, alimentadas pela então recente invenção da imprensa na Alemanha, favoreceram o enfrentamento da poderosa Igreja Católica na Europa nesse período. Porém, em vez de apenas dar início a novas igrejas cristãs na Europa, esse movimento fez parte de uma profunda transformação política, econômica e social que deu origem à Europa moderna capitalista, liberal-iluminista e estruturada em Estados Nacionais soberanos.

Nada indica, no entanto, que o monge Martinho Lutero pretendia inicialmente fundar uma nova igreja cristã, uma vez que ele queria reformar práticas e estruturas da Igreja Católica que via como abusivas e em desencontro com os princípios cristãos expressos por Santo Agostinho e por outros importantes nomes. No entanto, a reação da alta hierarquia da Igreja Católica, especialmente do papa, e as rápidas repercussões políticas que se sucederam acabaram levando ao rompimento formal e a uma reconfiguração duradoura do cristianismo ocidental.

Veja também: Martinho Lutero — conheça o monge alemão que deu início à Reforma Protestante

Causas da Reforma Protestante

A Reforma Protestante não surgiu de um acontecimento isolado, resultando de um conjunto de tensões que foram se acumulando ao longo de séculos dentro da cristandade ocidental. Essas tensões envolveram não só questões religiosas, mas também questões políticas, sociais e culturais, as quais prepararam terreno para que as ideias de Martinho Lutero recebessem apoio não só de grande parte da população, como também de pessoas poderosas e influentes, como os príncipes alemães.

→ Corrupção na alta hierarquia da Igreja Católica 

Uma das principais causas da Reforma Protestante foi a crise da autoridade da Igreja Católica, da alta hierarquia dessa instituição, inclusive do papa, pois eram percebidos, por amplos setores da sociedade europeia, como vinculados a abusos de poder, à prática constante de corrupção, ao distanciamento entre os valores cristãos pregados e a postura dessas lideranças, muitas vezes sedentos por poder e por dinheiro e, não raro, presentes em escândalos sexuais.

Muitos papas desse período destacaram-se pela quantidade de filhos, que viviam com eles e com suas amantes na Basílica de São Pedro (hoje no Estado do Vaticano), como foi o caso do papa Alexandre VI (nascido Rodrigo Bórgia), que pontificou de 1492 a 1503, poucos anos antes da eclosão da Reforma Protestante. Durante seu papado, e mesmo antes, Alexandre VI teve múltiplos filhos: pelo menos sete, com amantes diferentes, sendo a mais conhecida Vannozza Catanei. Seus filhos mais famosos foram César Bórgia e Lucrécia Bórgia.

A prática do celibato obrigatório para os sacerdotes do rito latino (incluindo o papa) havia sido reforçada e consolidada séculos antes, mas era frequentemente ignorada por muitos clérigos e até por papas durante a Idade Média e o Renascimento. A situação da família Bórgia é um dos exemplos mais notórios desse período e de como a população, intelectuais mais críticos, membros da nobreza e mesmo sacerdotes católicos mais comprometidos com os princípios religiosos, como era o caso do monge Lutero, foram se distanciando da alta hierarquia do clero romano, que possuía um forte déficit de legitimidade junto aos cristãos mais fervorosos e bem-informados.

Além disso, havia casos notórios e bem documentados de práticas que envolviam a compra e a venda de posições eclesiásticas, incluindo acusações graves relacionadas à eleição do papado, nos séculos XV e XVI. A prática, conhecida como simonia, era comum na época e foi um dos principais alvos das críticas que levaram à Reforma Protestante.

O período, no geral, foi marcado por intensa ambição política e cobiça dentro do Colégio de Cardeais. As vagas de 1484 e 1559, em particular, foram descritas como "infames" devido ao comportamento simoníaco generalizado. Documentos da época, incluindo relatos do mestre de cerimônias papal Johann Burchard, indicam que a eleição de Rodrigo Bórgia, ainda tomando como exemplo o papa Alexandre VI acima mencionado, foi o resultado de suborno explícito e de promessas de cargos e de benefícios (simonia) a vários cardeais. Ele usou seu grande poder e riqueza para comprar os votos dos cardeais, resultando em uma das eleições papais mais infames da história. |1|

Entretanto, apesar dos graves e muito conhecidos então casos de corrupção da cúpula da Igreja Católica, o que funcionou como estopim imediato do conflito entre Lutero e a hierarquia católica e esteve no centro dos debates foi venda das indulgências.

As indulgências eram, inicialmente, a remissão, total ou parcial, da pena pelos pecados através do sacramento da penitência, uma prática comum na Igreja Católica Medieval. Com o tempo e com a corrupção da alta cúpula da Igreja, passou-se a vender tais indulgências, o que transformou essa prática em um comércio, o que revoltou Lutero, que via nessa prática uma espécie de comercialização da salvação, e foi o estopim imediato da Reforma Protestante em 1517, estando no centro das polêmicas derivadas das então publicadas 95 Teses.

→ Prensa de Gutenberg e o Humanismo renascentista

Prensa de Gutenberg, inventada em 1455 e que teve um efeito direto no florescimento do Humanismo e no desenvolvimento da Reforma Protestante. [1]

Outro elemento decisivo para que desencadeasse a Reforma Protestante foi a mudança cultural provocada pelo Humanismo renascentista.

A prensa de tipos móveis, desenvolvida por Johannes Gutenberg por volta de 1440 na cidade de Mainz, na Alemanha (não por acaso, local onde começa a Reforma Protestante), revolucionou a impressão de textos e de livros na Europa e é o marco da invenção da imprensa moderna. A maior disponibilidade de textos favoreceu um retorno às fontes clássicas gregas e latinas (ad fontes), isto é, possibilitou e incentivou o estudo direto da Bíblia e dos textos dos primeiros séculos do cristianismo, como os de Santo Agostinho, grande influência do monge agostiniano Martinho Lutero em suas críticas às práticas da Igreja Católica de seu tempo.

Um dos pilares da Reforma Protestante foi a ênfase na leitura individual da Bíblia. A prensa possibilitou a tradução e a impressão da Bíblia em línguas nacionais (primeiramente o alemão, com tradução do próprio Lutero) em grande quantidade e a baixo custo. Antes disso, os textos bíblicos eram escritos em línguas dominadas apenas por clérigos eruditos, como grego e latim, e suas cópias eram feitas à mão pelos monges copistas, sendo, por isso, raras, caras e inacessíveis.

A produção em massa da Bíblia agora em línguas vernáculas (faladas pelas pessoas comuns) permitiu que os fiéis lessem e interpretassem as Escrituras por si mesmos, minando o monopólio da Igreja Católica sobre a interpretação religiosa. Além disso, a produção em massa de panfletos e de livros tornou a censura por parte das autoridades eclesiásticas muito mais difícil, pois era quase impossível confiscar todas as cópias em circulação.

Outro ponto importante é que Martinho Lutero e outros reformadores utilizaram a prensa de forma estratégica para divulgar suas 95 Teses e outros escritos que desafiavam a autoridade da Igreja Católica. A velocidade de impressão permitiu que essas ideias circulassem rapidamente por toda a Europa, antes que se pudesse suprimi-las.

Em suma, a prensa de Gutenberg não apenas transmitiu informações, mas agiu como um catalisador que amplificou as transformações culturais e religiosas da época, tornando a informação, agora muito mais disseminada, um motor de mudança social, cultural e religiosa.

→ Contexto político favorável

A corrupção na alta hierarquia da Igreja Católica e a maior circulação de ideias agora possibilitada pela prensa de Gutenberg não teriam possivelmente sido suficientes para que a Reforma Protestante acontecesse se não houvesse um grupo politicamente poderoso e interessado nas ideias que Martinho Lutero apresentava no ano de 1517.

Esse grupo, inicialmente, foi o dos príncipes alemães, que viram nas críticas do respeitado teólogo e monge Lutero uma oportunidade para desafiar a autoridade da Igreja Católica que há muito interferia em seus domínios, dividindo seus poderes, sua autoridade e sua riqueza em seus territórios. Os príncipes e as cidades do então Sacro Império Romano buscavam maior autonomia em relação ao poder papal, e, assim, o que começou como uma mera disputa religiosa que teria terminado na excomunhão de Lutero e na repressão pontual de alguns fiéis que o acompanhassem, o que já havia ocorridos inúmeras outras vezes na história da Igreja Católica, acabou se transformando em uma disputa política, em uma oportunidade de reorganização política no mundo germânico que favorecesse a autonomia dos príncipes alemães.

Entre esses príncipes que se aproximaram de Lutero nesse contexto e o protegeram, destaca-se Frederico III, Eleitor da Saxônia, também conhecido como Frederico, o Sábio. Ele se inclinou para as ideias da Reforma Protestante e foi um protetor crucial de Lutero, seu súdito e professor na Universidade de Wittenberg. Em 1520, Frederico se recusou a cumprir a ordem do Papa Leão X de prender Lutero. Após a Dieta de Worms em 1521, na qual Lutero foi declarado um proscrito (banimento imperial) pelo Imperador Carlos V, Frederico o escondeu no Castelo de Wartburg. Durante sua estadia disfarçado no castelo, Lutero usou esse tempo para traduzir o Novo Testamento do grego para o alemão, um marco fundamental para a disseminação da reforma. A motivação de Frederico não era apenas religiosa, mas também política, pois ele tinha interesse em afirmar a autoridade de seus territórios contra o poder papal e imperial.

→ Identificação com os valores da burguesia ascendente

No século XVI, a Europa passava por transformações econômicas significativas, marcadas pela transição do feudalismo para o capitalismo, com a crescente importância do comércio e do acúmulo de capital. A Igreja Católica, com a condenação da usura (empréstimo a juros), a glorificação da pobreza e a valorização da vida monástica, entrava em conflito direto com a mentalidade e com as práticas comerciais da burguesia ascendente.

O franco-suíço João Calvino, com sua doutrina, algumas décadas após Martinho Lutero, ofereceu uma nova ética religiosa que forneceu justificativas morais e espirituais para as atividades burguesas. Contrariando a visão católica, o calvinismo considerava o trabalho árduo, disciplinado e honesto como uma vocação divina (um serviço a Deus, e não uma punição). O lucro e o acúmulo de capital, resultantes desse trabalho diligente, deixavam de ser vistos como pecados e passavam a ser vistos como bênçãos divinas, o que angariou rapidamente forte identificação e apoio junto à burguesia ascendente.

O que Lutero defendia?

Martinho Lutero foi quem deu início à Reforma Protestante.

As ideias de Martinho Lutero surgiram inicialmente apenas como uma crítica pastoral e teológica de um monge, teólogo e professor que estudava os textos sagrados e as obras de Santo Agostinho e de autores como Jan Hus e comparava o que aprendia com o que via no cotidiano da sua prática como sacerdote católico. No entanto, devido ao contexto político, econômico e cultural favorável, suas ideias rapidamente ganharam grande relevância e se desenvolveram, transformando-se em um corpo coerente de princípios que redefiniram o cristianismo ocidental.

O ponto de partida, central na sua primeira obra veiculada, as 95 Teses, foi sua oposição à venda de indulgências, que, segundo Lutero, transmitia a falsa ideia de que o perdão divino poderia ser obtido por meio de transações financeiras. Para ele, a salvação é um dom gratuito de Deus, recebido unicamente por meio de Sua graça (Sola Gratia), e não por obras humanas ou méritos. Esse princípio se tornou o coração de sua teologia.

A partir disso, Lutero formulou três eixos doutrinários:

  1. Justificação pela fé (Sola fide): A salvação não depende das obras humanas, como era muito difundido entre os católicos, mas da confiança na graça de Deus. Essa ideia luterana rompe com séculos de interpretação tradicional católica e coloca o fiel em relação direta com Deus.
  2. Autoridade das Escrituras (Sola Scriptura): Lutero afirmava que a Bíblia era a única regra infalível de fé. Ele toma aqui a palavra “regra” no sentido religioso da palavra, de conjunto de diretrizes e de regulamentos para a conduta do cristão. Isso significava, na prática, limitar a autoridade eclesiástica quando esses sacerdotes se afastassem, em suas atitudes e em suas interpretações, das escrituras sagradas, o que foi um ponto decisivo de conflito com a Igreja Católica.
  3. Sacerdócio universal dos fiéis: Segundo a visão de Lutero, todos os cristãos batizados possuem igual dignidade espiritual e acesso a Deus, não sendo dependentes de mediadores clericais, como padres, bispos, papas ou mesmo pastores. Essa ideia teve impacto profundo na cultura europeia, estimulando uma maior participação dos leigos (não sacerdotes) na vida religiosa de suas comunidades reformadas.
A Missa Alemã (1526), de Martinho Lutero, está relacionada à reforma litúrgica promovida pela Reforma Protestante.

Além desses três princípios fundamentais, Lutero defendia a reforma litúrgica, isto é, a reforma dos ritos com que se praticava a religião. A principal inovação litúrgica de Lutero foi a substituição do latim pelo alemão nos cultos (Missa Alemã, de 1526). Isso permitiu que os fiéis compreendessem o que estava sendo dito e participassem ativamente, em contraste com a prática católica da época, em que o clero realizava as missas em latim, uma língua inacessível à maioria das pessoas.

A pregação da Palavra de Deus ganhou um lugar de destaque no culto, como elemento essencial para a fé e para a compreensão do evangelho. A tradução da Bíblia para o alemão por Lutero foi crucial, permitindo a leitura e a interpretação pessoal das Escrituras por todos os fiéis, não apenas pelo clero. Lutero também valorizou o canto congregacional, escrevendo hinos (corais) para que toda a assembleia pudesse louvar a Deus em sua própria língua. A música tornou-se parte integrante da adoração. Ocorreu, também, a simplificação da liturgia, mantendo apenas os elementos que tinham fundamento bíblico claro, como o batismo e a eucaristia (Ceia do Senhor), e removendo rituais considerados supersticiosos ou sem base nas Escrituras.

Outra mudança importante e que tem a ver com os príncipes que apoiaram Lutero é que a estrutura hierárquica papal foi abolida no luteranismo e substituída por formas de governo eclesiástico que variavam localmente, muitas vezes envolvendo a supervisão de bispos ou de sínodos (assembleias de clérigos e de leigos), com foco na pregação e no cuidado pastoral.

As igrejas luteranas se tornaram instituições nacionais, circunscritas aos territórios dos países em que atuavam, havendo hoje a Igreja Luterana da Alemanha, a Igreja Luterana da Noruega, a Igreja Luterana da Dinamarca, entre outras, sem que nenhuma possa interferir nos assuntos da outra.

Doutrinas da Reforma Protestante

As doutrinas centrais da Reforma Protestante foram construídas inicialmente a partir das críticas de Martinho Lutero à Igreja Católica, mas, posteriormente, superaram seu pensamento individual, tornando-se princípios comuns a diferentes movimentos reformadores. Não houve um modelo único de fé protestante, tendo sido produzidas diversas tradições religiosas. Ainda assim, alguns fundamentos teológicos se tornaram marcas típicas do pensamento protestante desse primeiro século que se seguiu.

→ Somente a Escritura (Sola Scriptura)

A Bíblia, para os protestantes, é a única fonte de autoridade em matéria de fé. Isso não elimina a importância das tradições e das interpretações, mas subordina todas elas a um exame com base no texto bíblico. Esse princípio rompeu com a dependência exclusiva da mediação institucional da Igreja.

→ Somente a fé (Sola Fide)

A salvação recebida de Deus pelo fiel não é mérito de um ser humano, mas apenas um resultado da confiança na graça divina (fé). Essa doutrina foi decisiva para separar as igrejas reformadas do sistema tradicional de penitências, de indulgências e de obras de reparação pelos pecados, muito importantes, tanto na época quanto agora, no meio católico.

→ Somente a graça (Sola Gratia)

A iniciativa da salvação pertence inteiramente a Deus. O ser humano não pode conquistar o favor divino nem o merecer, apenas recebê-lo. Essa ênfase na graça de Deus redefine o relacionamento entre Deus e os fiéis e retira a ênfase das peregrinações, das romarias, dos jejuns, das penitências e de outras formas tradicionalmente católicas de buscar merecer o perdão de Deus pelos pecados.

→ Somente Cristo (Solus Christus)

Cristo é o único mediador entre Deus e a humanidade. Esse princípio reduz a centralidade de intercessões de santos, de anjos e mesmo de membros do clero como ponte de salvação. É nesse ponto que reside uma das mais importantes polêmicas entre os cristãos católicos e reformados, que diz respeito ao papel de Nossa Senhora (Maria, mãe de Jesus), bem como de outros santos, na salvação individual.

Para os reformados, o papel do indivíduo é intransferível, e, portanto, seria fútil e possivelmente pecaminoso (idolatria) recorrer a outros seres humanos, como a Maria e aos demais santos, como meio de redenção e de graça. Por sua vez, no catolicismo, a veneração de Maria e dos santos como intercessores é central até os dias de hoje. Cabe ressaltar que havia muito respeito e admiração dos primeiros reformados por Maria e por diversos santos, como Santo Agostinho e os apóstolos do Cristo. A animosidade dos reformados se voltava para com as imagens desses santos e para com a devoção dos fiéis católicos para com eles e não dos reformados para com a pessoa desses santos em si.

→ Glória Somente a Deus (Soli Deo gloria)

A fé, o culto e a vida cristã devem ser orientados para a glória de Deus e não para méritos humanos ou institucionais. Isso significa que, para os reformados dessa primeira tradição, não se deve glorificar líderes religiosos, nem políticos, nem artísticos, nem militares, nem mesmo instituições ou outras criações humanas. Deve-se tratar todos os seres humanos e todas as suas criações, por mais heroicos, poderosos ou importantes que sejam, como iguais em Cristo e reservar toda a glorificação e a adoração somente a Deus.

Confira também: Catolicismo — mais detalhes sobre essa vertente do catolicismo

Calvinismo e a Reforma Protestante

João Calvino foi o responsável pelo surgimento de uma nova vertente do cristianismo, o calvinismo.

O calvinismo surgiu com o teólogo francês João Calvino, radicado em Genebra, na Suíça, como um desdobramento da Reforma Protestante, tendo como doutrina central a predestinação absoluta, que dizia que o destino de salvação ou de condenação de uma pessoa é decidido por Deus antes do nascimento, o que divergia da doutrina luterana, que, embora não prescindisse da predestinação, enfatizava a fé como central na salvação individual. Divergia também da doutrina católica, que enfatizava as boas obras.

A importância do calvinismo foi imensa para a Reforma Protestante, pois ofereceu uma doutrina que atraiu a burguesia ao valorizar o trabalho e a prosperidade como sinais da graça divina, e se tornou uma das maiores ramificações do protestantismo, expandindo-se por toda a Europa e posteriormente para as Américas.

Embora compartilhasse os princípios gerais trazidos por Martinho Lutero, como a autoridade das Escrituras (Sola Scriptura), o calvinismo desenvolveu características teológicas, litúrgicas e organizacionais próprias.

Institutas da Religião Cristã, de João Calvino, são um grande destaque da Reforma Protestante.

Um grande diferencial de Calvino foi ter sido capaz de sistematizar a teologia reformada em uma obra coerente, as chamadas Institutas da Religião Cristã, que se tornaram referência para outros líderes protestantes de então e de posteriormente. Com sua obra, ofereceu não somente doutrinas teológicas, mas um modelo completo de organização e de disciplina comunitária, fazendo de Genebra um experimento de cidade reformada que atraiu estudantes, clérigos e refugiados religiosos de toda a Europa de então.

Entre os pontos centrais do calvinismo, podemos destacar:

  • Doutrina da predestinação: Calvino entendia que a salvação dependia exclusivamente da vontade divina e não de méritos humanos. Embora fosse uma ideia presente tanto no luteranismo quanto no catolicismo, o calvinismo deu uma centralidade e integrou essa ideia de uma maneira tão rigorosa que fez o papel da fé (central no luteranismo) e das boas obras (central no catolicismo) ser visto como irrelevante para a concessão da graça divina.
  • Ética do trabalho e elogio da prosperidade: Segundo Calvino, Deus dava sinais de que alguém havia ou não sido predestinado à salvação. A boa conduta, a austeridade pessoal, a prosperidade individual e a dedicação de alguém ao trabalho e à família eram, para ele, fortes sinais de salvação. Assim, Calvino acabou inadvertidamente estimulando seus fiéis a perseguirem essas atitudes, bem como a prosperidade material, como meio de se sentirem salvos, o que foi bastante adequado aos valores da burguesia e do capitalismo nascentes de então. Calvino não possuía, portanto, uma doutrina específica da prosperidade, mas indiretamente contribuiu para que surgisse essa interpretação muito adequada ao espírito desse tempo.
  • Soberania absoluta de Deus: Para Calvino, Deus governa todas as coisas com autoridade plena, desde os eventos cósmicos até os detalhes mais ínfimos da vida diária. Tudo acontece de acordo com o Seu plano e com a Sua vontade, que são perfeitos. O fiel encontra paz e segurança nessa doutrina ao reconhecer que não há acaso ou sorte, mas um propósito divino em todas as circunstâncias, sejam boas, sejam ruins. Isso gera uma atitude de confiança e de submissão à vontade de Deus, mesmo diante do sofrimento ou de situações incompreensíveis.
  • Organização eclesiástica participativa: O modelo calvinista de organização religiosa reforçou a participação de presbíteros e de leigos na gestão da vida eclesial, tanto que grande parte das igrejas calvinistas no mundo são chamadas de “presbiterianas”, em referência ao seu modelo de organização e de gestão. Esse modelo ultrapassou os limites da religião e influenciou formas locais de deliberação e de autogoverno das comunidades dos demais assuntos públicos, tanto na Europa como na América, sendo central na formação do modelo de governo municipal dos Estados Unidos da América. O calvinismo, portanto, teve um impacto duradouro no âmbito da política, estando atrelado à história do desenvolvimento da democracia liberal moderna.

Raramente as comunidades calvinistas assumem essa nomenclatura: na Inglaterra, foram chamadas de “puritanos”, na Escócia, de “presbiterianos”, na França de “huguenotes”, entre outras denominações que variam de acordo com os rótulos que lhes são dados pelas populações dos locais a que levam suas missões religiosas. No Brasil, quase todas as comunidades calvinistas são chamadas de “presbiterianas”.

O calvinismo se espalhou fortemente, nos séculos seguintes, pela Europa e pelas Américas, influenciando os debates públicos nessas localidades sobre trabalho, sobre educação, sobre ética pública e sobre ideais de cidadania, sendo uma doutrina religiosa profundamente vinculada à formação do mundo moderno, tanto no âmbito político da democracia liberal quanto no econômico do capitalismo industrial e financeiro.

Legado da Reforma Protestante

O legado da Reforma Protestante é complexo e amplo e está presente não somente no âmbito religioso, como também nos campos político, cultural e intelectual do mundo moderno. O protestantismo não transformou apenas a vida religiosa da Europa, mas desencadeou mudanças duradouras em toda a sociedade ocidental.

→ Legado religioso da Reforma Protestante 

Em termos religiosos, a Reforma Protestante deu origem a uma série de novas denominações cristãs, como luteranos, calvinistas, anglicanos, anabatistas, bem como inúmeras outras que surgiram posteriormente. Essa proliferação de igrejas independentes do catolicismo rompeu com o modelo de unidade religiosa do Ocidente medieval e inaugurou uma era de diversidade religiosa. Essa multiplicidade de fés cristãs levou, ao longo dos séculos seguintes, ao desenvolvimento de espaços de tolerância religiosa para com fés não cristãs e, em alguns contextos, à liberdade de consciência (que inclui a liberdade de não professar nenhuma fé e mesmo de ser ateu).

→ Legado político da Reforma Protestante

No âmbito político, a Reforma Protestante contribuiu para a redefinição das relações entre religião e poder e foi a base factual que possibilitou, à imaginação dos filósofos do século das luzes (XVIII), teorizar sobre a separação entre Igreja e Estado e Estado Laico. Mas, antes disso, já no século XVI, a adoção do protestantismo favoreceu a autonomia de inúmeros reinos frente à autoridade papal, favorecendo a consolidação dos Estados Nacionais modernos.

Já o calvinismo favoreceu o desenvolvimento de uma cultura de participação popular nos assuntos públicos por conta do modelo participativo adotado na condução das igrejas calvinistas. Isso influenciou debates sobre participação comunitária nas decisões coletivas, sobre deliberação de assuntos de interesse coletivo e, posteriormente, sobre cidadania.

→ Legado cultural e educacional da Reforma Protestante

Outro legado importante da Reforma Protestante está no profundo impacto que ela teve na educação e na alfabetização das populações. Até o século XVI, era muito raro, para alguém que não fosse membro do clero católico, saber ler e escrever. Mesmo os nobres tinham pouca formação nesse aspecto, privilegiando em sua educação aspectos como equitação e esgrima e deixando as letras para os “padres”.

Como a leitura e a interpretação da Bíblia são centrais para a vida religiosa no protestantismo, houve um grande incentivo à escolarização e à expansão das instituições de ensino. Isso, somado ao maior volume de livros disponíveis por conta da recente invenção da prensa por Gutenberg e à valorização do estudo e da leitura, especialmente nos países protestantes, a partir do século XVI, ajudou a pavimentar o caminho para a difusão do conhecimento e para a massificação da alfabetização.

No campo cultural, a Reforma Protestante estimulou novas formas de pensar a vida cotidiana, o trabalho e a disciplina pessoal. Nos países calvinistas, especialmente, a ética do trabalho ganhou nova legitimidade, influenciando uma ética favorável ao desenvolvimento da burguesia e do capitalismo que então se estabelecia. |2|

Dia da Reforma Protestante

O Dia da Reforma Protestante é celebrado em 31 de outubro, pois foi nessa data que Martinho Lutero publicou suas célebres 95 Teses, criticando a venda de indulgências pela Igreja Católica e fazendo diversas outras críticas que deram início ao movimento.

Em países com forte tradição protestante, como Alemanha, Suíça e Estados Unidos, a data é bastante celebrada e tem bastante visibilidade, sendo objeto de debates públicos, de concertos musicais, de exposições históricas e de atividades educativas. Em alguns estados alemães, é feriado oficial, o que reforça o caráter simbólico e identitário da data para essas comunidades.

Lutero é respeitado e reconhecido nesse dia pelo papel que teve no advento do movimento, mas ele não é visto ou tratado pelos luteranos como seria um santo para os católicos. A data, portanto, não costuma enfatizar a figura de Lutero, o que iria contra o princípio luterano do Soli Deo Gloria (dar glória somente a Deus), mas busca dar foco à história e especialmente aos valores da Reforma Protestante, que são a leitura crítica, a consciência religiosa, a liberdade de pensamento e a responsabilidade individual de cada um diante da fé e de Deus.

Nos últimos anos, o Dia da Reforma Protestante também tem sido um momento de diálogo entre as denominações cristãs, de encontro ecumênico, como em 2017, quando foram celebrados 500 anos de Reforma Protestante, e católicos e luteranos realizaram diversas celebrações conjuntas na Europa, como foi a cerimônia em Lund, na Suécia, destacando um crescente entendimento mútuo entre essas vertentes do cristianismo.

Contrarreforma

Também chamada de Reforma Católica, a Contrarreforma foi a resposta estruturada pela Igreja Católica ao avanço da Reforma Protestante no século XVI e às críticas internas que já circulavam há séculos a diversos aspectos que favoreceram a eclosão do movimento. Essa não foi apenas uma reação defensiva da Igreja, mas um amplo movimento de renovação disciplinar, institucional e mesmo religioso-espiritual dessa instituição milenar.

→ Concílio de Trento

Representação do Concílio de Trento, o grande destaque da Contrarreforma. [2]

O Concílio de Trento foi o marco principal da Contrarreforma, ocorrido entre os anos de 1545 e de 1563. Sistematizou doutrinas, reformou práticas e definiu de forma mais clara as posições católicas diante das muitas críticas protestantes que ressoavam.

Entre as definições importantes trazidas por esse concílio nessa disputa com os reformados, podemos destacar que se reafirmou a autoridade papal dentro da cristandade, defendeu-se a importância da tradição para os católicos, bem como os sete sacramentos (em vez dos apenas dois aceitos por Lutero) e a importância e o papel das boas obras na vida do cristão, mas também se reconheceu a necessidade de uma formação mais rigorosa para o clero católico, bem como para a escolha de bispos, de cardeais e de papas. Essas decisões, realizadas ao longo de anos de reuniões e de debates entre clérigos católicos de toda a Europa na cidade de Trento, deram à Igreja Católica uma identidade mais coesa e disciplinada a partir de então.

→ Jesuítas

Ouro elemento central da Contrarreforma foi o fortalecimento das ordens religiosas católicas reformadoras nesse contexto, surgidas nesse período e que defendiam mudanças na Igreja Católica, especialmente a moralização e a austeridade na condução dos negócios religiosos, bem como um combate mais firme à expansão do protestantismo, que ameaçava a existência do catolicismo como religião.

A ordem religiosa reformadora que mais se destacou nesse contexto foi a Companhia de Jesus, dos chamados jesuítas, fundada pelo ex-militar espanhol Inácio de Loyola em 1540. Os jesuítas se tornaram uma das principais forças de combate ao protestantismo e, ao mesmo tempo, lideraram reformas educacionais, missões religiosas em todo o mundo, inclusive nas Américas, na África e na Ásia, e uma forte dedicação à renovação espiritual da Igreja Católica. O sucesso dessa ordem, que se tornou extremamente poderosa no século que se seguiu, esteve em combinar, em seus membros, forte disciplina interna, educação de alto nível e atuação missionária global.

→ Arte barroca

A Contrarreforma também atuou fortemente no âmbito artístico e cultural. A arte barroca, com sua carga emocional, sua teatralidade e seu foco na experiência religiosa profunda, estava muito conectada com os elementos católicos do debate inter-religioso, como o uso de imagens, a representação de santos, de anjos e de Nossa Senhora, a exaltação do sofrimento e das penitências como elementos de boas obras que favorecem a salvação do ser humano.

Catedral de Múrcia, que possui arquitetura barroca. [3]

Arquitetura, pintura e música sacras foram poderosos instrumentos católicos diante dos reformados, que não podiam fazer tal uso das pinturas por considerarem esses elementos pecaminosos ou ao menos inadequados às doutrinas luterana e calvinista. É por isso que os artistas barrocos foram muito incentivados pela Igreja Católica, e as esteticamente espetaculares catedrais barrocas, com suas pinturas inefáveis e seus corais e órgãos comoventes, impediram mais fiéis de abandonar o catolicismo que todos os terrores da Inquisição juntos.

→ Inquisição

Os terrores empreendidos pela Igreja Católica para tentar manter seu poder e seus fiéis representam um dos momentos mais sombrios da história do cristianismo. Foi reabilitado e reforçado o Tribunal do Santo Ofício, responsável pela Santa Inquisição, isto é, a perseguição aos hereges, como eram chamados aqueles que discordavam dos dogmas católicos (como os cristãos reformados).

Milhares de pessoas foram presas, torturadas e mortas, muitas vezes em praças públicas, como nas fogueiras. Além dos luteranos e dos calvinistas, foram perseguidos também muitos judeus que haviam se convertido ao cristianismo somente de fachada (muitos o faziam para terem benefícios legais, fiscais e sociais), pessoas que tinham práticas místicas antigas ou que destoavam da liturgia tradicional católica, como as estigmatizadas “bruxas”, bem como toda sorte de opositores políticos importantes para as autoridades laicas aliadas dos bispos católicos e que  aproveitavam o ensejo para perseguir seus inimigos e ainda os impunham a pecha de “adoradores do demônio” e afins, evidentemente sem nenhum fundamento factual.

Index

O Index foi outro grande destaque da Contrarreforma.

Outro aspecto desse viés punitivista da Contrarreforma foi a criação do Index, cujo nome completo em latim era Index Librorum Prohibitorum, que significava a “Lista de Livros Proibidos” pela Igreja Católica. Essas obras agora não podiam ser impressas. Caso fossem obtidas pelas autoridades, eram queimadas, e seu portador era punido. Além disso, os livros que já existiam antes da confecção da lista, que ia sendo atualizada, tinham que ser entregues às autoridades eclesiásticas para serem queimados. Pilhas de livros queimados em praça pública é outra das cenas pavorosas desse momento histórico lastimável.

Acesse também: Contrarreforma — mais detalhes sobre a resposta da Igreja Católica à Reforma Protestante

Exercícios resolvidos sobre Reforma Protestante

Questão 1

A Reforma Protestante resultou de tensões acumuladas dentro da Igreja e da sociedade europeia, envolvendo fatores teológicos, políticos e culturais. Considerando esse contexto, qual alternativa melhor explica o motivo pelo qual as ideias de Lutero ganharam grande repercussão no início do século XVI?

A) A rápida adesão dos papas renascentistas ao projeto de reforma proposto por Lutero.
B) O apoio universal do clero europeu, que enxergou na Reforma Protestante a oportunidade de ampliar seu poder espiritual.
C) A expansão da imprensa, que permitiu a ampla circulação de textos e de críticas, e a existência de tensões religiosas e políticas anteriores.
D) A ausência de conflitos políticos no Sacro Império Romano Germânico, o que permitiu uma difusão pacífica das novas ideias.
E) O fato de Lutero ter criado um novo modelo de religião completamente desvinculado do cristianismo tradicional.

Resolução:

Alternativa C.

A difusão das ideias de Lutero só foi possível porque já havia críticas acumuladas à atuação da Igreja, especialmente em relação às indulgências e ao clero, e porque a imprensa permitiu que suas teses circulassem rapidamente. Além disso, muitos príncipes e cidades buscavam maior autonomia política em relação ao poder papal.

As demais alternativas apresentam distorções históricas: não houve adesão papal (A), nem apoio universal do clero (B), tampouco ausência de conflitos políticos (D). Lutero também não criou uma nova religião do zero (E), mas propôs reformas no cristianismo existente.

Questão 2

O calvinismo é uma vertente importante da Reforma Protestante, com características teológicas próprias. Entre as alternativas a seguir, identifique aquela que expressa corretamente um princípio fundamental do pensamento de João Calvino.

A) A salvação depende exclusivamente das obras humanas e da obediência estrita aos rituais da Igreja.
B) A autoridade suprema na vida religiosa pertence aos concílios eclesiásticos, acima das Escrituras.
C) A soberania absoluta de Deus e a ênfase em sua iniciativa na salvação, incluindo a doutrina da predestinação.
D) O papa é a única autoridade legítima para interpretar a Bíblia para toda a cristandade.
E) A separação total entre fé e participação comunitária, eliminando a necessidade de disciplina na vida religiosa.

Resolução:

Alternativa C.

O calvinismo enfatiza a soberania absoluta de Deus e a centralidade de sua vontade na salvação, formulando de maneira sistemática a doutrina da predestinação. As alternativas A, B, D e E contradizem elementos essenciais da Reforma Protestante: Calvino rejeita a salvação pelas obras (A), subordina todas as autoridades à Escritura (B), não reconhece a autoridade papal (D) e defende disciplina comunitária como expressão da fé (E).

Notas

|1| PATTENDEN, Miles. Papal elections and renunciations. In: ROLLO-KOSTER, Joëlle; VENTRESCA, Robert A.; EICHBAUER, Melodie H.; PATTENDEN, Miles (eds.). The Cambridge History of the Papacy. Cambridge: Cambridge University Press, 2025. p. 477-498. DOI: https://doi.org/10.1017/9781108750608.023.

|2| WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Tradução de José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

Créditos de imagem

[1] Graferocommons / Wikimedia Commons (reprodução)

[2] Palazzo Pretorio / Wikimedia Commons (reprodução)

[3] francisco jesus moñino gomez / Wikimedia Commons (reprodução)

Fontes

GONZÁLEZ, Justo L. A Era dos Reformadores. São Paulo: Vida Nova, 2003.

MACCULLOCH, Diarmaid. The Reformation: A History. New York: Viking; Penguin Books, 2003.

MCGRATH, Alister E. Reformation Thought: An Introduction. 4. ed. Oxford: Wiley-Blackwell, 2012.

PATTENDEN, Miles. Papal Elections and Renunciations. In: ROLLO-KOSTER, Joëlle; VENTRESCA, Robert A.; EICHBAUER, Melodie H.; PATTENDEN, Miles (eds.). The Cambridge History of the Papacy. Cambridge: Cambridge University Press, 2025. p. 477-498. DOI: https://doi.org/10.1017/9781108750608.023.

SCHILLING, Heinz. Martin Luther: Rebel in an Age of Upheaval. Oxford: Oxford University Press, 2017.

WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Tradução de José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

Deseja fazer uma citação?
BORGES, Alexandre Fernandes. "Reforma Protestante"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/reforma-protestante.htm. Acesso em 25 de dezembro de 2025.

Vídeoaulas


Lista de exercícios


Exercício 1

(MetroCapital Soluções) Foi um monge agostiniano e professor de teologia germânico que se tornou uma das figuras centrais da Reforma Protestante. Levantou-se, veementemente, contra diversos dogmas do catolicismo romano, contestando a doutrina de que o perdão de Deus poderia ser adquirido pelo comércio das indulgências. Essa discordância inicial resultou na publicação de suas famosas 95 Teses, em 1517, em um contexto de conflito aberto contra o vendedor de indulgências Johann Tetzel. Sua recusa em se retratar de seus escritos, a pedido do Papa Leão X, em 1520, e do imperador Carlos V, na Dieta de Worms, em 1521, resultou em sua excomunhão da Igreja Romana e em sua condenação como um fora da lei pelo imperador do Sacro Império Romano-Germânico.

Assinale a alternativa correta que apresenta o nome deste importante personagem da história:

a) João Calvino

b) Martinho Lutero

c) Philipp Melanchthon

d) Jan Hus

e) Frei Caneca

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Exercício 2

(Omni – adaptado) Mediante as reformas religiosas, assinale a alternativa que apresenta alguns princípios teológicos da reforma Calvinista:

a) rigidez moral e disciplina rigorosa: condenação das diversões, obediência aos governantes, crítica à idolatria, proibição do culto e do uso de imagens e ídolos tanto em templo quanto no lar.

b) preservação de elementos da tradição romana: liturgia, sacramentos e episcopado, permanência de dois sacramentos: Batismo e Eucaristia.

c) estímulo à congregações independentes, reguladas pela nova igreja, defesa de que o batismo poderia ser feito exclusivamente aos 21 anos, e abrangência social das reformas.

d) defendia que o rei da Inglaterra se estabelecesse como chefe da Igreja Calvinista.

e) nenhuma das alternativas.

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Exercício 3

(Ameosc – adaptado) Não está entre as principais medidas tomadas pela Igreja para deter o avanço do protestantismo:

a) estímulo à criação de novas ordens religiosas.

b) fortalecimento do Tribunal da Inquisição.

c) abolição do Índex.

d) criação de seminários para formar os padres.

e) proibição das indulgências

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Exercício 4

(Furb) O massacre de São Bartolomeu, desencadeado na noite de 24 de agosto de 1572, é o culminar da crise política e religiosa entre as elites católicas e protestantes que durou dez anos. Em Paris, as execuções de milhares de protestantes aconteceram ao longo de vários dias e o poder real foi acusado diretamente de instigar os fatos.

Foi consequência desse episódio a/o:

a) Édito de Nantes.

b) Tratado de Paris.

c) Édito de Tolerância.

d) Édito de Fontainebleau.

e) Tratado de Verdun.

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