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José Saramago

Um dos mais importantes escritores do século XX, o português José Saramago reinventou a forma narrativa da prosa ficcional.

Fotografia do autor em abertura de exposição em sua homenagem no Palácio Nacional da Ajuda em Lisboa, Portugal.
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José Saramago – autor de prosa, poesia e teatro – reinventou a literatura do século XX. Militante político, grande defensor dos Direitos Humanos e perpétuo provocador, sua vasta obra, peculiar pelo estilo de composição, ocupa posição central nas publicações contemporâneas portuguesas. O escritor é vencedor do Prêmio Camões, a mais tradicional premiação de literatura em língua portuguesa, e do Prêmio Nobel de Literatura, a mais famosa premiação literária internacional.

Leia também: Romantismo em Portugal – características e autores

Tópicos deste artigo

Biografia de José Saramago

José Saramago nasceu em Azinhaga, aldeia portuguesa da província de Ribatejo, em 16 de novembro de 1922. Seus pais eram camponeses sem terra, e a família mudou-se para Lisboa pouco antes de o autor completar dois anos de idade. Neto e filho de camponeses analfabetos, Saramago teve o primeiro contato com a narrativa pela forma oral. Só pôde comprar um livro pela primeira vez aos 19 anos, com dinheiro emprestado de um amigo.

As dificuldades financeiras em que a família vivia impediram o autor de concluir os estudos – com 12 anos, ingressou no curso de serralheiro mecânico. Embora se tratasse de um curso técnico, a grade incluía também aulas de literatura, e foi a partir desse contato, propiciado por livros didáticos, que Saramago descobriu a poesia e o gosto literário, passando a frequentar assiduamente uma das bibliotecas públicas de Lisboa.

Trabalhou como serralheiro mecânico, desenhista e funcionário público, até ingressar na carreira editorial, que exerceu por tempo mais longo. Foi tradutor, jornalista e editor. Em 1947, publicou seu primeiro romance, intitulado Terra do Pecado. Ficou sem publicar até 1966.

Permaneceu à frente da editora Estúdios Cor por doze anos, exercendo funções de direção literária e produção, trabalhando, em paralelo, com traduções. Em 1971, deixou a editora e passou a trabalhar em jornais, como crítico literário, diretor adjunto e comentador político.

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A militância política, aliás, tornou-se oficial em 1969, quando ocorreu sua filiação ao Partido Comunista Português (PCP). Com a tentativa de golpe militar em novembro de 1975, Saramago perdeu o emprego no jornal e percebeu-se sem chance de conseguir outra ocupação, perseguido por sua posição política. Decidiu, então, dedicar-se inteiramente à literatura.

Em 1980, com a publicação de Levantados do chão, nasceu o estilo narrativo da ficção novelesca de Saramago. Depois vieram diversas obras; entre elas, a mais conhecida talvez seja O evangelho segundo Jesus Cristo, romance tido como polêmico e censurado pelo governo português, que vetou sua participação no Prêmio Literário Europeu. Foi nesse momento que Saramago mudou-se para a ilha de Lanzarote, no arquipélago de Canárias, com Pilar del Rio, jornalista espanhola, sua terceira e última esposa.

Recebeu o Prêmio Camões em 1995 e o Prêmio Nobel de Literatura em 1998. A visibilidade promovida por esses prêmios fez com que o autor viajasse mundo afora, participando de conferências, congressos, e liderando ações de cidadania em prol da defesa dos Direitos Humanos. Faleceu em sua casa, em Lanzarote, em 18 de junho de 2010.

Características literárias de José Saramago

José Saramago foi um autor de múltiplos gêneros – escreveu poemas, peças de teatro, crônicas, contos, novelas, romances e manteve também um blog. E foi a forma da prosa que o consagrou como grande escritor do século XX.

O estilo composicional da obra de Saramago é único e revolucionou a literatura de seu tempo. O autor ficou conhecido por abolir o uso tradicional da pontuação: diálogos iniciados sem travessão ou aspas indicando a troca de turno da fala; longos períodos escritos sem ponto final ou sinal de interrogação; capítulos inteiros sem quebra de parágrafo, sem numeração e sem título. Veja um excerto de O evangelho segundo Jesus Cristo:

“A mulher não respondeu logo, olhava-o, por sua vez, como se o avaliasse, a pessoa que era, que de dinheiros bem se via que não estava provido o pobre moço, e por fim disse, Guarda-me na tua lembrança, nada mais, e Jesus, Não esquecerei a tua bondade, e depois, enchendo-se de ânimo, Nem te esquecerei a ti, Porquê, sorriu a mulher, Porque és bela, Não me conheceste no tempo da minha beleza, Conheço-te na beleza desta hora. O sorriso dela esmoreceu, extinguiu-se, Sabes quem sou, o que faço, de que vivo, Sei, Não tiveste mais que olhar para mim e ficaste a saber tudo, Não sei nada, Que sou prostituta, Isso sei, Que me deito com homens por dinheiro, Sim, Então é o que eu digo, sabes tudo de mim, Sei só isso.”

(SARAMAGO, O evangelho segundo Jesus Cristo)

Esse novo aspecto formal proposto por Saramago revoluciona a literatura e remete ao ritmo da língua falada. Para além do fluxo do pensamento, na oralidade não há sinais de pontuação – embora haja indagações e trocas de turno ou de assunto. É também uma convocação provocativa ao leitor, que deve adotar uma postura ativa durante a leitura, complementando a obra com seu raciocínio, em novo exercício de apreciar as palavras e ouvir as entonações da pontuação ausente.

Não menos provocativo é o conteúdo de seus romances. Interessado na reflexão maior da condição humana, seus livros de ficção narram – com esse novo domínio da forma narrativa – personagens diante de situações de crise existencial, indivíduos em constante autorreflexão e embates socioculturais com o estado de coisas. Saramago foi um crítico ferrenho do sistema capitalista, e sua ficção (vez ou outra misturada ao fato histórico, caso de Memorial do convento, por exemplo) constantemente reverbera a degradação da vida humana causada pela lógica do lucro desenfreado.

À postura política afiada e à experimentação formal soma-se o elemento fantástico, frequentemente presente em sua obra. Em O ano da morte de Ricardo Reis, por exemplo, o fantasma de Fernando Pessoa vive a assombrar Ricardo Reis, heterônimo do poeta; o ano é 1936, e os fantasmas do ditador Salazar e do nazifascismo rondam Portugal e a Europa, respectivamente.

Em A jangada de pedra, a Península Ibérica desloca-se fisicamente do continente europeu e navega pelo Oceano Atlântico, como que à deriva, enquanto as personagens põem-se a investigar explicações para tal fenômeno. O enredo relembra o quanto Portugal e Espanha são próximos entre si, física e linguisticamente, e o quanto são dessemelhantes do restante da Europa.

Em As intermitências da morte, narra-se a história de um país onde as pessoas simplesmente param de morrer – pacientes em estado terminal, acidentados, ninguém mais morre. A morte torna-se personagem do romance, que se desenrola sugerindo uma reflexão que não se soluciona acerca do tema do ciclo da vida.

Veja também: Clarice Lispector – grande nome da literatura brasileira

Obras de José Saramago

  • Poesia

Os poemas possíveis (1966)
Provavelmente alegria (1970)
O ano de 1993 (1975)

  • Romances

Terra do pecado (1947)
Manual de pintura e caligrafia (1977)
Levantado do chão (1980)
Memorial do convento (1982)
O ano da morte de Ricardo Reis (1984)
A jangada de pedra (1986)
História do cerco de Lisboa (1989)
O evangelho segundo Jesus Cristo (1991)
Ensaio sobre a cegueira (1995)
Todos os nomes (1997)
A caverna (2000)
O homem duplicado (2002)
Ensaio sobre a lucidez (2004)
As intermitências da morte (2005)
A viagem do elefante (2008)
Caim (2009)
Claraboia (2011)

  • Dramaturgia

A noite (1979)
Que farei com este livro? (1980)
A segunda vida de Francisco de Assis (1987)
In Nomine Dei (1993)
Don Giovanni ou O Dissoluto Absolvido (2005)

  • Crônicas

Deste mundo e do outro (1971)
A bagagem do viajante (1973)
Os apontamentos (1976)
Poética dos cinco sentidos – o ouvido (1979)
Moby Dick em Lisboa (1996)
Folhas políticas (1976-1998)

  • Contos

Objecto quase (1978)
O conto da ilha desconhecida (1997)

  • Filmes – adaptações para o cinema

Ensaio sobre a cegueira (2008, dir. Fernando Meirelles)

A jangada de pedra (2008, dir. George Sluizer)

Embargo (2010, dir. Antônio Ferreira)

José e Pilar (2010, dir. Miguel Gonçalves Mendes)

O homem duplicado (2014, dir. Denis Villeneuve)

Principais prêmios de José Saramago

Faixa com retrato do autor figura na fachada da Fundação José Saramago, em Lisboa
Faixa com retrato do autor figura na fachada da Fundação José Saramago, em Lisboa, um museu e instituição cultural dedicada à memória do escritor. [2]

José Saramago recebeu um número enorme de prêmios, doutoramentos universitários honoris causa, medalhas de honra ao mérito e condecorações governamentais. A seguir destacamos alguns de seus prêmios literários:

  • 1979 - Prémio da Associação de Críticos Portugueses — Melhor Peça de Teatro, representada em 1979, por A Noite. Portugal.

  • 1981 - Prémio Cidade de Lisboa, por Levantado do Chão. Portugal.

  • 1982 - Prémio Literário do Município de Lisboa, por Memorial do Convento. Portugal.

  • 1984 - Prémio da Crítica do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários, pelo conjunto da sua obra. Portugal.

  • 1987 - Prémio Grinzane-Cavour, por O Ano da Morte de Ricardo Reis. Itália.

  • 1993 - Prémio The Independent Foreign Fiction, por O Ano da Morte de Ricardo Reis. Reino Unido.

  • 1993 - Grande Prémio de Teatro da Associação Portuguesa de Escritores, por In Nomine Dei. Portugal.

  • 1995 - Prémio Camões, pelo conjunto da sua obra. Portugal.

  • 1996 - Prémio Rosalía de Castro do Prémio Pen Clube (Galiza), pelo conjunto da sua obra. Espanha.

  • 1998 - Prémio Nobel da Literatura, pelo conjunto da sua obra. Suécia.

  • 2001 - Prémio Canárias Internacional pelo Governo das Canárias, pelo conjunto da sua obra. Espanha.

  • 2006 - Prémio Dolores Ibárruri, pelo conjunto da sua obra. Espanha.

  • 2009 - Prémio à Cooperação Internacional CajaGranada, Granada, pelo conjunto da sua obra. Espanha.

Frases de José Saramago

“Começar a ler foi para mim como entrar num bosque pela primeira vez e encontrar-me, de repente, com todas as árvores, todas as flores, todos os pássaros. Quando fazes isso, o que te deslumbra é o conjunto. Não dizes: gosto desta árvore mais que das outras. Não, cada livro em que entrava, tomava-o como algo único.”

“Não existe pontuação quando se fala. Falamos em um fluxo modulado por nossos pensamentos e emoções.”

“Eu digo a um leitor que está a ler um romance meu que ele seja capaz de ouvir dentro da cabeça a voz que está a dizer aquilo que ele está a ler. Ele está a fazer uma leitura silenciosa, o que é normal. O que peço, alguma coisa posso pedir aos leitores, mesmo no sentido de uma compreensão mais exata daquilo que está escrito, é que tente ouvir dentro de sua cabeça essa voz.”

“Eu sou tão pessimista que acho que a humanidade não tem remédio. Vamos de desastre em desastre e não aprendemos com os erros.”

Créditos das imagens:

[1] JHC_photo / Shutterstock.com

[2] Filipe.Samora / Shutterstock.com

Escritor do artigo
Escrito por: Luiza Brandino Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

BRANDINO, Luiza. "José Saramago"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/jose-saramago.htm. Acesso em 24 de abril de 2024.

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