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Escrita cuneiforme

A escrita cuneiforme foi o primeiro método de escrita criado e desenvolvida pelo povo sumério por volta do ano 3200 a.C. Sua invenção significou o início da Idade Antiga.

Registros da escrita cuneiforme em pedra.
Registros da escrita cuneiforme em pedra.
Crédito da Imagem: Shutterstock.com
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A escrita cuneiforme foi o primeiro registro escrito utilizado pela humanidade. Surgiu há mais de cinco mil anos entre o povo sumério e foi disseminada por outros povos do Oriente Próximo, como os acádios, os hititas e os assírios. Na Antiguidade, apenas os escribas, os funcionários públicos importantes e os representantes da alta classe social tinham conhecimento para ler e escrever, uma prática que demandava anos de estudos e práticas.

Leia também: História da escrita — da criação às diversas transformações ao longo do tempo

Tópicos deste artigo

Resumo sobre escrita cuneiforme

  • A escrita cuneiforme foi o primeiro método de escrita, utilizado primeiramente pelos povos sumérios por volta do ano 3200 a.C.
  • O método era realizado por meio de uma cunha, espécie de estilete que gravava pequenos símbolos triangulares na argila.
  • Sua criação significou o aumento no fluxo de informações entre os povos antigos, pois oferecia maior praticidade tanto na escrita quanto na leitura.
  • A prática da escrita cuneiforme se modificou ao longo do tempo, recebendo maior complexidade ao passo que era disseminada pelo Oriente Médio e Próximo.
  • Um dos primeiros povos estrangeiros a se apropriarem da escrita e torná-la mais complexa foram os acádios.
  • Graças à invenção da escrita cuneiforme, a Mesopotâmia se tornou pioneira no desenvolvimento de diversos tipos de registros, como o Código de Hamurabi e a Epopeia de Gilgamesh.
  • A troca de mensagens escritas na Mesopotâmia se tornou tão comum que era possível se comunicar até mesmo com outras civilizações, conforme demonstra a compilação de cartas trocadas entre babilônicos e egípcios no decorrer século XIV a.C.

O que é a escrita cuneiforme?

A escrita cuneiforme é o primeiro método de escrita de que se tem registro na história. Estima-se que foi utilizada pela primeira vez por volta do ano 3200 a.C., pelos povos sumérios, ao sul da Mesopotâmia. Sua descoberta, na divisão temporal da história, significa o término do Período Neolítico e o início da Idade Antiga.

O que categoriza o método como escrita é a forma como ele era reproduzido: por meio de símbolos fonéticos que substituíram as pictografias (representações literais de objetos e coisas) e as ideografias (que remetem a ideias e temas abstratos). Por intermédio da escrita cuneiforme, os caracteres deixaram de ter representações e passaram a se igualar à linguagem: o que era lido também poderia ser falado.

→ Por que a escrita cuneiforme recebeu esse nome?

A escrita cuneiforme era realizada por meio da inscrição de caracteres em argila, inseridos por meio de uma ferramenta afiada — a cunha —, que dá nome ao método de escrita.

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Origem da escrita cuneiforme

A escrita cuneiforme foi criada pelo povo sumério, que se fixou aos arredores dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia — região que atualmente corresponde a diversos países do Oriente Médio, especialmente o Iraque. Os sumérios desenvolveram a escrita cuneiforme em decorrência da urgência em se registrar reservas de alimento provenientes da agricultura.

O Período Neolítico foi marcado pela lenta substituição do nomadismo pelo sedentarismo, ou seja, as práticas agrícolas e a criação de gado se tornaram parte da rotina dos primeiros povos. Por meio dessas práticas, registros escritos tornaram-se necessários, já que a escrita oferecia um método de controle da produção dos alimentos e apontava os ciclos da natureza, como as épocas de chuva e seca ou os períodos de cheias dos rios. Não coincidentemente, foram os sumérios que criaram o primeiro sistema de numeração.

A escrita cuneiforme demorou milênios para ser desenvolvida. Por volta do ano 8000 a.C. (também época do desenvolvimento da agricultura), as primeiras representações de registros tinham como função controlar unidades de contabilidade, como a quantidade de grãos coletados ou o número de ovelhas num pasto. Paralelamente, os símbolos utilizados passaram de simples objetos geométricos a representações complexas no decorrer dos milênios.

Não se sabe exatamente qual foi o primeiro registro em escrita cuneiforme, já que existem vários lugares do Oriente Médio (e mesmo além) em que já se encontraram vestígios. Vários deles foram descobertos na antiga cidade de Uruk, no atual Iraque, e datam de cerca de 3200 anos a.C. No entanto, há diversos registros da escrita que podem ser tão antigos quanto ou mais. Durante os primeiros períodos da Antiguidade, sua prática chegou a ser disseminada até mesmo na Pérsia, na Palestina e no Egito.

Trecho da Epopeia de Gigalmesh em escrita cuneiforme.
Trecho da Epopeia de Gigalmesh, a obra literária mais antiga da história, que narra as aventuras do rei de Uruk.

A escrita cuneiforme foi primeiramente utilizada pelos sumérios, e, mais tarde, disseminada pelos acádios, povo que ocuparia o sul da Mesopotâmia a partir do terceiro milênio a.C. Assim como a língua acadiana era mais complexa que a suméria (ao invés de monossilábica e imutável, as suas palavras se declinavam e flexionavam), também se desenvolveu uma escrita mais complexa, que seria constantemente readaptada e utilizada por milênios.

Veja também: Povos da Mesopotâmia — tudo sobre as primeiras civilizações da humanidade

Fases e tipos de escrita cuneiforme

Embora a escrita cuneiforme tenha se consolidado no milênio III a.C., o seu desenvolvimento marcou também a evolução do Período Neolítico. Desde 7000 a 3000 a.C., a escrita se desenvolveu por meio de três fases:

  • Estágio das fichas: iniciado em 7000 a.C., consistia na elaboração de pequenos objetos com diferentes representações literais ou ideográficas.
  • Fase das esferas: sua amostra mais antiga data de, mais ou menos, 4000 a.C., quando se confeccionava bolas de argila com marcas provenientes das fichas, registradas quando essas esferas ainda não haviam secado.
  • Estágio dos tabletes: também do quarto milênio a.C., na prática, eram como as esferas, mas aplainados.

Até então, esses registros não eram escritas, já que, em vez da expressão por meio de letras que compusessem palavras, tratava-se de transmitir representações de objetos e ideias. Mesmo assim, foi pelo uso de símbolos pictográficos que se desenvolveram também os primeiros caracteres que comporiam a escrita cuneiforme de maneira apropriada. Por isso, pode-se classificar a escrita cuneiforme em dois tipos:

→ Tipo pictográfico

Os primeiros registros dos sumérios, que datam do III milênio a.C., ainda se apropriavam da utilização de símbolos pictográficos ou ideográficos. Em seu ápice de utilização, havia uma relação de até 2000 símbolos, dos quais cerca de 300 tinham caracteres que, apropriadamente, desenvolveriam a escrita cuneiforme. Por isso, o tipo pictográfico, embora não seja uma escrita propriamente dita, é essencial para o desenvolvimento total da grafia cuneiforme: certos caracteres eram “lidos” da mesma forma que falados, em vez de explicados.

Tipo silábico

O método fonético se mostrou eficiente por transmitir, sem modificações, as instruções inseridas no texto, e, por isso, passou a se tornar prioridade entre os povos mesopotâmicos. Suas fontes mais antigas datam de aproximadamente 2800 a.C. Paulatinamente, os registros criados pelos mesopotâmicos deixaram de ser pictográficos para receberem conotação fonética, ou seja, a expressão artística foi substituída pelo conhecimento ou instrução escrita, agora transmitida por meio de caracteres que remetiam a sílabas.

Isso significava que os registros se assimilavam à linguagem, pois era possível transmitir em fala o que era literalmente escrito nos tabletes. O tipo silábico recebeu forte influência dos acádios, que se apropriaram da escrita cuneiforme e a tornaram mais complexa, inserindo palavras polissilábicas e declinações.

Qual a função da escrita cuneiforme?

Conforme vimos, os primeiros usos de registros em argila tinham como objetivo controlar a produção de alimentos. Com o tempo, esses registros adquiriram maior complexidade, incluindo transações comerciais, registros de posses e demarcações de terrenos.

Com o advento da política, a documentação de bens e taxas, por exemplo, fez-se presente nos registros administrativos das cidades-Estado. Cartas trocadas entre líderes também se tornaram comuns, não apenas entre uma cidade-Estado e outra, mas entre diferentes civilizações. Foi o caso das Cartas de Amarna, coleção de quase 400 correspondências trocadas entre babilônicos e egípcios no decorrer do século XIV a.C.

Cinco cartas de Armana em escrita cuneiforme.
Cinco cartas de Armana em escrita cuneiforme, trocadas entre babilônicos e egípcios.[1]

Deve-se também à escrita cuneiforme o registro de leis, conforme demonstra o Código de Hamurabi, primeiro código de normas jurídicas já registrado. Formulado pelos babilônicos por volta de 1780 a.C., seus 281 preceitos foram talhados em um monumento de pedra de cerca de 2,25 metros de altura, por meio de 3600 linhas que compilam as leis administrativas, civis e penais do Primeiro Império Babilônico.

Código de Hamurabi, criado pelos babilônicos, gravado em uma pedra em escrita cuneiforme.
Código de Hamurabi, criado pelos babilônicos, gravado em uma pedra em escrita cuneiforme.

Além de documentos oficiais, a escrita era importante na produção de poemas, como épicos e mitos. A mais antiga dessas histórias, a Epopeia de Gilgamesh, data de mais ou menos 2000 a.C.; nela, narra-se, em 11 tábuas, as aventuras de Gilgamesh, rei de Uruk, em busca da imortalidade. A epopeia, de origem suméria, é considerada a obra literária mais antiga da história.

A prática da escrita era exercida principalmente pelos escribas, que tinham sua formação no ofício por meio de um rigoroso treinamento e anos de experiência com a produção de textos. Por ser uma habilidade de poucos, esses escribas tendiam a ser admitidos nas áreas política e religiosa (geralmente indissociáveis).

A formação dos escribas se dava por meio de uma escola, a eduba (ou “casa dos tabletes”), como a chamavam os sumérios. No entanto, alguns sacerdotes, funcionários públicos e nobres também recebiam treinamento para exercer a escrita.

Mesmo que fosse disseminada por uma pequena seleção de especialistas, no entanto, a prática da escrita se tornou comum entre as antigas civilizações babilônicas por meio da disseminação de leis, obras literárias ou simples trocas de correspondência.

Como era feita a escrita cuneiforme?

A escrita cuneiforme era praticada por meio de uma cunha, ferramenta feita de junco, cana ou bambu que se assemelhava a um estilete com ponta triangular (por isso, seus caracteres têm geralmente essa forma).

Essa cunha era pressionada de cima para baixo sobre uma placa úmida de argila, que endurecia por meio de dois métodos e conforme seu propósito: ao ar livre, para textos práticos e cotidianos; ou por meio de fornos, quando sua finalidade era a emissão de algum documento importante (assim, a placa tornava-se rígida e evitava posteriores alterações em seu conteúdo).

As tabuletas mais antigas produzidas pelos sumérios dispunham de caracteres distribuídos em sequência vertical e eram lidas de cima para baixo, da esquerda para a direita. Essa prática, por sua vez, era demorada. Como artifício para se produzir mais em menos tempo, os escribas passaram a desenhar da esquerda para a direita, de forma que o movimento do pulso passou a se tornar menos cansativo.

Foi pelo mesmo motivo que, no decorrer dos séculos, os símbolos pictográficos e ideográficos passaram a ser substituídos por conteúdos fonéticos. Estes, além de serem mais práticos de reproduzir, eram também mais compreensíveis — em vez de apenas sugerir, os símbolos passaram a narrar.

A própria escrita em cunha evoluiu no decorrer dos milênios: entre os períodos sumério arcaico, acadiano e neo-assírio (entre os séculos XXV a.C. e VIII a.C. aproximadamente), o número de incisões realizadas por meio da cunha diminuiu para cada caractere. O que, a princípio, ainda procurava representar detalhes do objeto retratado passou a ser redigido de maneira mais simples, prática e ágil.

Placa encontrada na antiga cidade de Adab, com caracteres pictográficos e cuneiformes (aprox. 2500 a.C.).
Placa encontrada na antiga cidade de Adab, com caracteres pictográficos e cuneiformes (aprox. 2500 a.C.).

Leitura da escrita cuneiforme

Assim como o desenvolvimento da escrita explicada acima, sua leitura também foi realizada de diferentes maneiras no decorrer do tempo. Quando dos primeiros usos de comunicação por meio da inscrição em argila, os símbolos eram lidos de cima para baixo e da esquerda para a direita. Por volta do ano 3200 a.C., eles passaram a ser reproduzidos por meio de uma rotação de 90 graus e da esquerda para a direita, no intuito de serem registrados com maior agilidade.

A partir do sumério arcaico, por volta de 2500 a.C., a escrita foi praticada por meio das cunhas; no entanto, a leitura dos textos era destinada a poucos, devido à complexidade e à baixa porcentagem de pessoas que tinham acesso à educação literária nas civilizações mesopotâmicas.

Diferenças entre escrita cuneiforme e escrita hieroglífica

Enquanto a escrita cuneiforme se desenvolveu na Mesopotâmia, a escrita hieroglífica foi utilizada pela civilização egípcia. Estima-se que o início de sua prática remeta também ao ano 3200 a.C. — época em que a escrita cuneiforme passou a ser usada pelos mesopotâmicos.

Os hieróglifos consistiam em representações pictográficas e ideográficas complexas, disseminadas principalmente em monumentos de pedra ou por meio de papiros (o predecessor do papel, oriundo de uma planta de mesmo nome, comum no Oriente Próximo). Embora alguns de seus caracteres tivessem fins fonéticos, a sua maioria ainda representava ideias, objetos ou elementos.

Hieróglifos na tumba do faraó Seti, em texto sobre escrita cuneiforme.
Hieróglifos na tumba de um faraó. Diferentemente dos sumérios, os egípcios costumavam usar a escrita para fins religiosos.

A utilização dos hieróglifos tinha, na maior parte, conotação religiosa. Os egípcios, que, por milênios, habituaram-se a um sistema teocrático de governo, tinham relações estreitas com a crença em divindades e hábitos ritualísticos. Por isso, a escrita em hieróglifos geralmente era utilizada com o objetivo de se comunicar com os deuses.

Saiba mais: Biblioteca de Alexandria — um dos centros culturais mais importantes da Antiguidade

Evolução da escrita

  • 7000 a.C.: Representações pictográficas em argila passaram a ser utilizadas para o registro de controle de alimentos e transações comerciais. Inicialmente, tratava-se de pequenos objetos modelados para fins contábeis. Mais tarde, eles passaram a ser grafados em esferas de barro para registro das transações comerciais e de produção de alimentos.
  • 3200 a.C.: As formas pictográficas foram giradas em 90º para a direita a fim de serem lidas da esquerda para a direita. Devido ao menor consumo de tempo na formulação de documentos, a escrita foi disseminada entre os sumérios e outros povos mesopotâmicos. Nesse mesmo período, surgiram os primeiros registros de hieróglifos no Egito.
  • 2500 a.C.: Período do sumério arcaico, quando os pictogramas foram substituídos por símbolos fonéticos que eram impressos em argila por meio de uma ferramenta pontiaguda chamada cunha.
  • 2000 a.C.: Após a invasão acádia sobre o sul da Mesopotâmia, a escrita cuneiforme se tornou mais complexa. Foi publicada a Epopeia de Gilgamesh, primeira obra literária da história.
  • 1780 a.C.: Babilônicos desenvolvem o Código de Hamurabi, primeiro código de leis formulado.
  • 1000 a.C.: Desenvolvimento do primeiro alfabeto pelos fenícios, composto por 22 caracteres.
  • 800 a.C.: Apropriação e adaptação do alfabeto fenício para o grego, que seria disseminado em diversas línguas ocidentais.
  • 800 d.C.: A grafia minúscula carolíngia foi padronizada na Europa Ocidental a fim de facilitar o fluxo caligráfico de escrita e leitura.
  • 1450 d.C.: O alemão Johannes Gutenberg inventou a prensa móvel, que permitiu a impressão e disseminação da escrita na Europa.

Créditos da imagem

[1] Wikimedia Commons (reprodução)

Fontes

FINKEL, Irving; TAYLOR, Jonathan. Cuneiform. Londres: The British Museum, 2015.

GRÓF, Gabriel L. A origem da escrita na Mesopotâmia como problema interdisciplinar. Revista TEL. Irati: UNICENTRO, v.11, n.1, p.26-50, 2020.

JACQ, Christian. O mundo mágico do Antigo Egito. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

ROBINSON, Andrew. Escrita: uma breve introdução. Porto Alegre: L&PM, 2016.

POZZER, Katia M. P. Escritas e escribas: o cuneiforme no antigo Oriente Próximo. Classica. São Paulo: Universidade Luterana do Brasil, v.11/12, n.11/12, p.61-80, 1999.

WALKER, C.B.F. Cuneiform: Reading the past. Bath: The Bath Press, 2000.

Escritor do artigo
Escrito por: Cassio Remus de Paula Cássio é doutor em História pela UFPR, mestre e bacharel em História pela UEPG. Atua como professor de História, Filosofia e Sociologia.

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PAULA, Cassio Remus de. "Escrita cuneiforme"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/escrita-cuneiforme.htm. Acesso em 29 de outubro de 2024.

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