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Gírias

As gírias são elementos interessantes que constituem a língua portuguesa. Amadas por uns, odiadas por outros, provam o poder do falante de transformar seu idioma.

As gírias são utilizadas para conferir maior expressividade à fala e não devem ser consideradas como vícios de linguagem ou desrespeito à norma culta
As gírias são utilizadas para conferir maior expressividade à fala e não devem ser consideradas como vícios de linguagem ou desrespeito à norma culta
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Eu sei o que você quer,
De longe a gente ganha o vacilão.
Sempre só de migué, respeite!
O ar gelou? é sem pressão!

Fazer por fazer nunca será a nossa,
A tripa do macaco que derruba a sua tora!

Quem pensa? Não tem pra servir real sapo,
E nem transcender pro momento que ligou!

Feito carrapato fala que quer aprender...

Não bolou por que?(...)”

(Não bolou por que? - Criolo)

Ficou confuso? Leu o trecho da música acima e não entendeu nada – ou quase nada ? Não se preocupe, apesar de alguns termos parecerem pouco familiares para algumas pessoas, ainda estamos falando de língua portuguesa. A língua é assim, cheia de peculiaridades, variações linguísticas e idiossincrasias.

Estamos falando das gírias. Elemento polêmico nas diversas línguas, amadas por uns e odiadas por outros, as gírias provam o constante movimento de nosso idioma. É inútil negar que a língua não é um elemento vivo e mutável, pois, de acordo com a época e com a moda, assume algumas características que podem se transformar em pouco tempo. As línguas estão inseridas em um contexto cultural e, conforme o panorama muda, ela também se modifica. Leia a música “Broto do jacaré”, sucesso de Roberto Carlos nos anos 60:

Vinha deslizando em minha prancha sozinho

E falei ao ver passar por mim um brotinho

Que bonitinha que ela é

Deslizando num jacaré

Ela me sorriu e uma coisa então

Eu tinha que fazer para chamar atenção
Abri os braços, gritei bem alto

Deslizando num jacaré

Mas uma onda mais forte chegou

E fora da aprancha me atirou

Quase que morro, quase me afoguei

E quando voltei o broto não encontrei

A minha prancha o vento para longe levou

Bebi água salgada porque não dava pé

Peguei a prancha mas não encontrei

O broto do jacaré.

(O broto do jacaré – Roberto Carlos)

Provavelmente você não entendeu muita coisa e nem mesmo sabe o sentido atribuído às palavras “broto” e “jacaré”, assim como provavelmente nossos pais e avós ficam “boiando” com as gírias que usamos para falar com nossos amigos. Agora, o que você deve saber é que, apesar de muitos estudiosos e eruditos “torcerem o nariz” para as gírias, classificando-as como “vícios de linguagem”, elas são importantes para a manutenção da língua e servem de marca temporal. Observando as gírias da música de Criolo, é possível deduzir que aquele é um comportamento linguístico atual, embora não seja padrão, assim como ao analisar a música de Roberto Carlos, há elementos que remetem ao contexto dos anos 60 e do movimento chamado Jovem Guarda.

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Mestre da literatura, Guimarães Rosa foi um hábil inventor de palavras, gírias e neologismos. Quem se arrisca a desmerecer sua obra por causa disso? *
Mestre da literatura, Guimarães Rosa foi um hábil inventor de palavras, gírias e neologismos. Quem se arrisca a desmerecer sua obra por causa disso? *

As gírias nascem da necessidade de se utilizar recursos expressivos na fala, e é o tempo que determinará a permanência ou descarte de uma expressão idiomática. Algumas gírias que eram muito utilizadas nos anos 60 hoje se tornaram obsoletas, porque certamente deixaram de cumprir sua função, sendo assim substituídas por novas palavras e expressões. Infelizmente, algumas pessoas associam as gírias à falta de cultura e ao desconhecimento da norma culta, pregando uma verdadeira “caça às bruxas” a esse movimento espontâneo da língua. Tentar coibir a juventude (que é quem melhor se apropria desse jeito diferente de falar) de usar gírias é inútil, mas vale saber que o princípio da adequação linguística deve ser lembrado sempre. Você, em uma entrevista de emprego, não vai se expressar da mesma maneira que se expressa quando conversa com seus amigos, não é verdade?

Para Ferdinand de Saussure, que foi um importante linguista e filósofo suíço, “é sincrônico tudo quanto se relacione com o aspecto estático da nossa ciência, diacrônico tudo que diz respeito às evoluções. Do mesmo modo, sincronia e diacronia designarão respectivamente um estado de língua e uma fase de evolução”. Ou seja, a própria Linguística, ciência que estuda a linguagem, considera que as gírias são uma evolução que contribuem para a tranformação da língua, e quem faz isso são os falantes, inseridos em diferentes grupos sociais.

*A imagem do escritor Guimarães Rosa é capa do periódico “Cadernos de Literatura Brasileira”, do Instituto Moreira Salles.


Por Luana Castro
Graduada em Letras

Escritor do artigo
Escrito por: Luana Castro Alves Perez Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PEREZ, Luana Castro Alves. "Gírias"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/gramatica/girias.htm. Acesso em 29 de março de 2024.

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