A Inconfidência Mineira foi uma conspiração política organizada por profissionais liberais, militares e membros da elite econômico-social da Capitania de Minas Gerais no fim da década de 1780 – época em que o Brasil ainda era colônia portuguesa. Os inconfidentes tinham como principal intenção retirar do poder local o governador (na ocasião nomeado pela Coroa portuguesa) Visconde de Barbacena, o que configurava uma afronta à autoridade do Império Português da Capitania de Minas gerais. Mas quais razões motivavam os inconfidentes? O que acontecia na Capitania de Minas Gerais nessa época?
Sabemos que a Capitania de Minas Gerais foi o grande polo de atividade mineradora do Brasil durante o período colonial. O ouro e as pedras preciosas da região, como o diamante, estimularam a migração de bandeirantes e aventureiros para a região, que acabaram fundando vilas importantes como Vila Rica (que depois passaria a se chamar Ouro Preto) e Diamantina. A Coroa portuguesa, para estabelecer o controle sobre esse tipo de atividade econômica, organizou politicamente a região, determinando tributações e construindo no local sistemas de “purificação do ouro”, como as Casas de Fundição. (Para saber mais detalhes sobre esse assunto, clique aqui).
Às Casas de Fundição era transportado todo o ouro extraído, que era levado ao fogo e fundido em barras. Das barras fundidas, o governador da Capitania (sempre nomeado pelo rei português) separava o quinto, isto é, cerca de 20%, e enviava para Portugal. O quinto era o principal imposto cobrado na Capitania de Minas Gerais. Ocorreu que, a partir da década de 1760, a economia mineradora começou a entrar em declínio em virtude, principalmente, da escassez do ouro. Todavia, mesmo assim, o quinto continuou a ser cobrado. O problema é que os mineiros não conseguiam mais suprir a demanda do quinto, e a Coroa portuguesa cogitou novas formas de compensar o deficit gerado.
Uma das soluções foi a chamada derrama. A derrama consistia na cobrança de tributação sobre todos os bens da população de determinada região, isto é, sobre cada bem que alguém possuísse ou fizesse usufruto seria cobrada uma porcentagem para cobrir a dívida com a Coroa. Nos fins de 1780, o governador designado para a Capitania de Minas, Visconde de Barbacena, tinha como algumas de suas obrigações pôr ordem na região e garantir a porcentagem destinada à Coroa. Em 1788, houve o rumor de que seria aplicada em Minas a maior de todas as derramas, o que provocou agitação em Vila Rica.
Como reação às medidas de Barbacena, alguns membros destacados da sociedade mineira da época decidiram organizar uma conspiração contra o governador e a Coroa. Grande parte dos conspiradores era influenciada pelas ideias de liberdade propagadas pelo Iluminismo francês – ideias essas que também dariam a tônica da Revolução Francesa – e por outras vertentes filosófico-políticas do século XVIII.
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Tiradentes, isto é, o alferes (membro da cavalaria dos Dragões de Minas) Joaquim José da Silva Xavier, era conhecedor da legislação republicana do recém-independente Estados Unidos da América. Os poetas Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa haviam entrado em contato com as obras de autores franceses em Coimbra, quando lá estiveram a estudo. Esses e outros conspiradores rejeitavam o caráter autoritário de Barbacena e também o modelo político absolutista de Portugal.
De todos os conspiradores, o mais radical foi o alferes Tiradentes, que chegou a planejar a morte de Barbacena. Toda a programação da revolta contra o governo da Capitania estava prevista para quando fosse aplicada a derrama de 1789. No entanto, um dos conspiradores, Joaquim Silvério dos Reis, delatou ao governador Barbacena toda a conspiração, dando inclusive o nome dos líderes. Silvério acreditava que, ao fazê-lo, Barbacena perdoaria as dívidas que ele havia contraído.
Munido de informações, Barbacena perseguiu e prendeu os principais envolvidos na conspiração, como nota o historiador Boris Fausto:
“Em março de 1789, Barbacena decretou a suspensão da derrama, enquanto os conspiradores eram denunciados por Silvério dos Reis. Devedor da Coroa como vários dos inconfidentes, Silvério dos Reis estivera próximo destes, mas optara por livrar-se de seus problemas denunciando o movimento. Seguiram-se as prisões em Minas e a de Tiradentes no Rio de Janeiro. O longo processo realizado na capital da Colônia só terminou em 18 de abril de 1792.” [1]
A Tiradentes, único a confessar o crime e assumir a culpa, foi aplicado um processo judicial que durou quase quatro anos. Sua pena foi a mais dura de todas: foi condenado à morte na forca. Todos os autos do processo (material reunido para realizar o julgamento) dirigidos contra o alferes e os demais membros da conspiração ficaram conhecido como devassa, uma peça jurídica com todo o detalhamento dos crimes de traição.
Após o longo processo, Tiradentes foi executado em 21 de abril. Seu corpo foi esquartejado, e os membros espalhados pela estrada que ligava a cidade do Rio de Janeiro (capital do país) a Vila Rica. Nessa última cidade, a cabeça de Tiradentes foi espetada em um poste, em uma praça. O objetivo dessa ação era simbólico. A Coroa queria transmitir a mensagem do que ocorreria com quem cometesse o mesmo crime de traição de conspiradores como Joaquim José da Silva Xavier.
NOTAS
[1] FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2013. p. 101.
Por Me. Cláudio Fernandes