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No dia 13 de setembro de 1957, o plenário da Assembleia Legislativa de Alagoas, situado na capital, Maceió, tornou-se palco de um cenário de guerra. Era o dia da votação final do processo de impeachment do então governador do estado, Muniz Falcão. Deputados contrários à destituição do governador entraram em confronto armado contra os deputados oposicionistas, favoráveis ao impeachment. Os motivos que conduziram esses atores históricos a tal cenário e o resultado gerado pelo confronto veremos a seguir.
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Muniz Falcão, governador de Alagoas
Sebastião Marinho Muniz Falcão (1915 a 1966) foi eleito governador de Alagoas em 1955 para o mandato de 1956-61. Falcão, porém, não era alagoano, mas, sim, pernambucano, radicado em Alagoas ainda nos anos 1940, onde foi exercer o cargo de delegado do trabalho. À época, o governador de Alagoas era Silvestre Péricles de Góis Monteiro, ao qual Muniz Falcão esteve vinculado. Falcão entrou para a vida política nessa mesma época, sendo eleito deputado federal por duas vezes.
Em 1955, porém, Muniz Falcão, vencendo o pleito das eleições para governador pelo PST (Partido Social Trabalhista), afastou-se do núcleo aristocrático dos Góis Monteiro e aderiu às influências ideológicas do Partido Comunista Brasileiro e de populistas, como Getúlio Vargas e Brizola. A oposição, ligada sobretudo à União Democrática Brasileira (UDN), de pronto, ficou reticente com as propostas do governador. Como escreve o pesquisador Jorge de Oliveira, em sua obra Curral da Morte: o impeachment de sangue, poder e política no Nordeste:
Os inimigos de Muniz chegaram a tentar transformá-lo no anticristo, alegando que, por suas ideias socialistas, não deveria governar Alagoas. Mas Muniz não era comunista. Apesar de ter o apoio do Partidão, suas ideias se aproximavam do populismo de Getúlio Vargas e de Leonel Brizola, um pouco parecido com as ideias do presidente da Argentina, Juan Domingo Perón. [1]
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Oposição e impeachment
Muniz Falcão tinha 22 deputados estaduais oposicionistas, a maior parte ligada à indústria do açúcar. Em seu primeiro ano como governador (1956), tentou colocar em prática medidas que iam frontalmente de encontro aos interesses dos industriais da cana. Segundo Jorge Oliveira, o governo anunciou que:
[…] mexeria nos bolsos de usineiros e grandes empresários, que pouco contribuíram para o desenvolvimento econômico e social do estado. Comunicou a criação de um novo imposto que passou a ser chamado “taxa pró-educação, economia, saúde”: um tributo de 2% sobre a produção de açúcar, álcool, tecidos, fumo e arroz, que seria reinvestido nos programas sociais e educacionais, na tentativa de reduzir os bolsões de pobreza e desigualdade social alarmantes de Alagoas. [1]
A reação dos oposicionistas às pretensões de Muniz Falcão veio com um pedido de impeachment do governador, elaborado pelo deputado Oséas Cardoso e protocolado em 9 de fevereiro de 1957. Os cinco pontos da denúncia de Cardoso eram:
1. atentato contra o livre funcionamento da Assembleia Legislativa;
2. emprego de ameaças para constranger Juiz de Direito a deixar de exercer seu ofício;
3. emprego de ameaças e violências contra deputados estaduais, a fim de afastá-los da Assembleia e de coagi-los no exercício de seus mandatos;
4. infração de lei federal de Ordem Pública;
5. realização de despesas não autorizadas por lei.
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Tiroteio
O processo correu contra Muniz Falcão ao longo de seis meses, aumentando a tensão entre oposicionistas e defensores do governador, que prometiam enfrentamento direto no dia do julgamento. Finalmente, tal dia chegou.
Em 13 de setembro, 35 deputados, 13 simpáticos a Falcão e 22 contra, foram para a Assembleia, com o detalhe de que todos estavam armados com revólveres e metralhadoras. Sacos de areia haviam sido colocados no interior da Assembleia para servirem como trincheiras. Em menos de 10 minutos, mais de mil tiros foram disparados. Oito pessoas ficaram feridas. Um parlamentar foi morto, Humberto Mendes, apoiador de Falcão. A votação, evidentemente, não ocorreu.
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Intervenção Federal e conclusão do processo
O tiroteio chocou o país e teve repercussão internacional. O então Presidente da República, Juscelino Kubitschek, teve de fazer uma intervenção federal em Alagoas para garantir que novos confrontos armados não ocorressem. O responsável direto pela intervenção foi o general Morais Âncora. Os deputados da oposição conseguiram, com a proteção do Exército, concluir a votação do impeachment, que destituiu o governador. Entretanto, a votação foi feita sem a presença de nenhum membro da oposição e foi, dias depois, considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal. Falcão voltou ao poder imediatamente ao governo, sendo depois anistiado definitivamente do processo de impeachment por uma comissão de deputados e desembargadores.
NOTAS
[1] OLIVEIRA, Jorge. Curral da Morte: o impeachment de sangue, poder e política no Nordeste. Rio de Janeiro: Record, 2010. p. 57.
Por Me. Cláudio Fernandes