PUBLICIDADE
Nutritivas e ricas em vitamina C, as laranjas estão presentes na alimentação de várias pessoas ao redor do mundo. No entanto, este artigo não falará dos benefícios da saborosa fruta, e sim de práticas ilícitas muito recorrentes nos chamados “crimes do colarinho branco” e que envolvem pessoas que são chamadas, no jargão popular e no mundo policial, de “laranjas”.
Os laranjas são, basicamente, pessoas que fornecem seus dados pessoais (nome, CPF e conta bancária, por exemplo) para terceiros efetuarem compras e registrarem bens no nome daquela pessoa que forneceu os dados. Também existem empresas de fachada, que são abertas apenas para encobrirem o enriquecimento ilícito de criminosos ou para serem fontes de corrupção por meio da falsa prestação de serviços para entidades públicas e privadas.
Leia também: O que é corrupção?
Tópicos deste artigo
Tipos de “laranjas”
→ Pessoa física laranja
Quando alguém solicita o nome de um terceiro, normalmente uma pessoa física (trata-se de um indivíduo, e não de uma empresa), para adquirir bens, esse alguém visa, por algum motivo, a ocultar esses bens ou fazer parecer, perante a Justiça ou a Receita Federal, que não tem aquele bem adquirido.
Os laranjas podem estar cientes do que estão fazendo e, para fazê-lo, recebem algo em troca. Também há casos em que pessoas, geralmente de baixo poder aquisitivo e pouca instrução, são induzidas a assinarem documentos e acabam tornando-se, sem saber, laranjas de criminosos — por inferência, é nesse último sentido (o de ingenuidade) que se confere ao termo laranja outro significado que não o da fruta, originalmente.
Por que alguém faz isso, seja de forma ingênua, seja de forma consciente? Listamos abaixo alguns motivos.
Ocultação de patrimônio para sonegação fiscal
No Brasil e em vários países do mundo, as alíquotas de contribuição com o imposto de renda são variáveis: quanto mais uma pessoa ganha, maior a porcentagem com a qual ela deve contribuir. Por isso, muitas pessoas cometem a chamada sonegação ou evasão fiscal, declarando para a Receita Federal renda menor do que elas efetivamente têm.
Porém, bens como imóveis, automóveis, ações, empresas e sociedades empresariais podem ser indícios suficientes para provar que a pessoa tem uma renda maior do que a que ela declarou. Por exemplo, se alguém declara para a Receita Federal que tem uma renda X, quando, na verdade, a sua renda é 10X, seria muito suspeito se esse alguém tivesse carros, imóveis e ações condizentes com a sua renda real. O que essa pessoa faz? Ela adquire os bens condizentes com a sua renda real, mas não os registra em seu nome, procurando os chamados laranjas para registrá-los.
Ocultação de enriquecimento ilícito
Se uma pessoa enriquece muito rápido e passa a adquirir bens que não condizem com a sua renda ou a sua profissão, ou ela está sonegando impostos ou está cometendo crimes ainda piores, como: corrupção passiva (quando uma pessoa, muitas vezes dentro do âmbito político, recebe um dinheiro ou um bem em troca de favores ilícitos), tráfico de drogas, tráfico de armas etc.
Quando um criminoso, seja de fraude na Receita Federal, seja do crime organizado, não quer levantar suspeitas sobre a fonte de seu dinheiro, ele esconde a sua verdadeira fortuna distribuindo-a entre laranjas, fazendo parecer que ele tem pouco e não levantando suspeitas das forças policiais e da Receita Federal.
Fornecimento de nome para aquisição de crédito
Comum entre os brasileiros, mesmo entre os trabalhadores honestos, essa prática consiste em comprar algo para alguém que está com o nome no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) — o famoso “nome sujo” — e não pode fazer compras parceladas ou adquirir crédito em bancos e instituições financeiras. Nesse caso, muitas vezes, há um acordo informal entre as duas partes e, na maioria dos casos, por tratar-se de bens de baixo custo, não há um interesse da Federação em fiscalizar esse tipo de prática.
→ Pessoa jurídica (empresa) laranja
- Empresas de fachada para ocultação de enriquecimento ilícito decorrentes do crime organizado: é comum que criminosos — geralmente ligados ao tráfico de drogas, tráfico de armas ou tráfico de seres humanos e outros ramos do crime organizado que movimentam muito dinheiro — abram empresas de fachada para “lavarem o dinheiro sujo” advindo do crime. Essas empresas, também conhecidas como empresas laranjas, na maioria das vezes, sequer funcionam, sendo apenas escritórios ou salas comerciais vazias que emitem notas fiscais falsas, as chamadas “notas frias”, para fazer parecer que o dinheiro resultante do crime seja de fonte lícita.
-
Empresas de fachada para falsa prestação de serviços: muito comum no âmbito político, essa prática visa à abertura de empresas laranjas que, supostamente, prestam serviços para empresas públicas (na maioria dos casos) e, às vezes, para empresas privadas. Elas emitem notas fiscais falsas e recebem por serviços que não foram prestados, lucrando em cima de grandes esquemas de corrupção. Essas empresas são, muitas vezes, mantidas por políticos e grandes empresários e registradas em nomes de laranjas para desvincular do real dono (alguém ligado à administração pública) a atividade por ele praticada.
Leia também: Lavagem de dinheiro
Como os laranjas prejudicam o país?
As práticas de ocultação de patrimônio prejudicam a população de diversas maneiras. Se um criminoso mantém laranjas para ocultar patrimônio advindo do crime, ele prejudica a população diretamente ao manter o crime organizado, que é responsável por fraudes e mortes de pessoas inocentes (no caso, principalmente, do tráfico de drogas e armas).
Se uma pessoa comete crime de evasão fiscal (sonegação de impostos), ela deixa de contribuir devidamente com a Receita Federal, o que causa um deficit na arrecadação de impostos que deveriam ser destinados aos investimentos em serviços públicos, como saúde, educação e segurança pública.
Punição para os laranjas
A prisão dos envolvidos em esquemas de laranjas é uma das punições, embora ocorra raramente.
Existe, desde 2013, uma lei específica que pune a prática de ocultação patrimonial e outras práticas ilícitas que prejudiquem a administração pública e o bem público. Trata-se da lei 12.846/13, que, entre outras coisas, pune aquelas empresas que se utilizam de terceiros (laranjas) ou que sejam as próprias laranjas em ações de corrupção, pagamento de propina ou falsa prestação de serviços que resultem em fraude ou lesões contra a administração pública.
As penas previstas para as empresas e pessoas responsáveis por essas práticas podem variar de multas e devolução do dinheiro desviado até prisão dos envolvidos. Porém, por envolverem esquemas milionários de pessoas influentes, as punições somente são aplicadas em casos raros em que a mídia torna pública a situação.
Por Francisco Porfírio
Professor de Sociologia