Notificações
Você não tem notificações no momento.
Novo canal do Brasil Escola no
WhatsApp!
Siga agora!
Whatsapp icon Whatsapp
Copy icon

O futuro da língua portuguesa

Você já se perguntou sobre o futuro da língua portuguesa? Nosso idioma passa por tantas alterações que fica difícil imaginar quais serão as regras daqui a alguns anos!

As línguas passam por constantes mudanças e evoluções, provando que são organismos vivos,  portanto, mutáveis
As línguas passam por constantes mudanças e evoluções, provando que são organismos vivos, portanto, mutáveis
Imprimir
Texto:
A+
A-
Ouça o texto abaixo!

PUBLICIDADE

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

(Carlos Drummond de Andrade, in “Alguma Poesia)

Em algum momento da sua vida você já deve ter lido esse poema de Carlos Drummond de Andrade, não é mesmo? Pois saiba que o consagrado poeta, considerado o maior do século XX, recebeu inúmeras críticas por causa desses versos. Ele colecionou recortes de jornal com artigos sobre o poema e cada opinião dos “entendidos” no assunto, e quando os versos completaram quarenta anos, Drummond publicou um livro divulgando todas as críticas recebidas, uma espécie de biografia de “No meio do caminho”. Mas o que haveria de errado com o poema publicado em 1928 na famosa Revista de Antropofagia? Por que ele despertou tanto interesse e provocou tanta celeuma?

Os versos de “No meio do caminho” foram considerados pobres e repetitivos, rejeitados por conta de seu “brasileirismo grosseiro, erro crasso de português” (essas foram as palavras usadas na crítica feita pelo jornal Folha da Manhã em 1942), uma crítica nada amistosa que condenava a substituição do verbo “haver” pelo verbo “ter”, considerado coloquial demais para ser usado na Literatura. Drummond ficava aborrecido com a polêmica em torno de seus versos e com a incapacidade que seus críticos tinham em compreender que a língua e a fala são elementos indissociáveis. O poeta já sabia disso há mais de oitenta anos, mas até hoje os “erros de português” são discutidos à exaustão, na maioria das vezes essas discussões desconsideram importantes elementos, como as variações linguísticas.

Felizmente, a língua portuguesa evoluiu, e substituir o verbo “haver” pelo verbo “ter” não rende mais nenhuma notinha pequenininha no canto do jornal. Isso nos traz um questionamento interessante, que nos faz lembrar que a língua é um organismo vivo e dinâmico. Mas, afinal, qual será o futuro da língua portuguesa? O que era absurdo há oitenta anos, hoje é absolutamente aceitável. Será que o que é absurdo hoje também será aceitável daqui a, por exemplo, cem anos? Provavelmente, sim. Os brasileiros de hoje dificilmente travariam um diálogo corriqueiro com brasileiros que viveram há duzentos anos, assim como nós seríamos possivelmente incompreendidos por brasileiros dos anos 2200. Já imaginou como seria engraçado esse encontro de gerações?

O português brasileiro é extremamente receptivo se comparado ao português lusitano, que, na defesa quase quixotesca do idioma, execra estrangeirismos e neologismos. No Brasil, a língua portuguesa é uma menina simpática, recebe bem novos vocábulos – vindos sobretudo do inglês – e, às vezes, até arruma um espaço no dicionário para que essas novas palavras fiquem mais à vontade em nossa lexicografia. Importar e adaptar palavras não é exatamente uma novidade: no início do século XX o francês era um dos idiomas mais importantes justamente porque a França exercia grande poder sobre o mundo. Então chique era falar francês e importar o máximo possível de vocábulos desse idioma. Depois, com a ascensão do poder estadunidense, a língua inglesa virou uma febre mundial, então copiamos expressões e palavras do inglês, subservientes ao seu poder cultural.

Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;)

Não se espante se de repente o mandarim, língua oficial da China, começar a infiltrar-se em terras brasileiras, porque a História prova que a tendência é copiarmos palavras de outros países que se tornaram importantes. Não se espante também se de repente falares considerados incultos começarem a ganhar prestígio linguístico, porque a moda agora é valorizar as diferenças entre grupos (viva à globalização!). Então alguns dialetos regionais do Brasil podem ganhar notabilidade e respeito, corroborando a ideia das variações linguísticas.

O gerundismo, vício de linguagem que hoje é visto com maus olhos pelos estudiosos da língua, pode vir a ser parte integrante da norma culta, basta que ganhe prestígio e alcance textos escritos sem que fiquemos espantados por isso. A grande verdade é que a evolução da língua portuguesa é visível, ela é cotidianamente modificada por seus falantes, seus verdadeiros donos. Somos nós quem decidimos quais palavras ficarão consagradas pelo uso e quais palavras serão descartadas pela falta de adesão dos falantes. As mudanças são tão rápidas que gramáticas e dicionários mal conseguem acompanhar, ficam aguardando que expressões e palavras permaneçam no idioma para só assim fazerem alterações nos compêndios. Portanto, o que hoje se configura como inovação da língua portuguesa poderá vir a ser padrão na escrita para nossos netos! Quanto à pergunta sobre o futuro da língua, a resposta só o tempo trará.

Exemplos da evolução da língua portuguesa:

● Na modalidade oral, e até mesmo na modalidade escrita, já substituímos os pronomes pessoais clássicos por outros mais coloquiais:

Nós não queremos só comida, nós queremos comida, diversão e arte” → “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.

● O futuro do presente vem sendo substituído pelo futuro perifrástico:

“Eu amarei até o fim de meus dias” → “Eu vou amar até o fim de meus dias”.

● A ênclise, pronome posto após o verbo, também dá sinais de que em breve desaparecerá:

Amo-te tanto, meu amor!” → “Eu te amo tanto, meu amor”.

 

Por Luana Castro
Graduada em Letras

Escritor do artigo
Escrito por: Luana Castro Alves Perez Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PEREZ, Luana Castro Alves. "O futuro da língua portuguesa"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/gramatica/o-futuro-lingua-portuguesa.htm. Acesso em 12 de outubro de 2024.

De estudante para estudante