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"Minha querida amiga Cora Coralina: Seu 'Vintém de Cobre' é, para mim, moeda de ouro, e de um ouro que não sofre as oscilações do mercado. É poesia das mais diretas e comunicativas que já tenho lido e amado. Que riqueza de experiência humana, que sensibilidade especial e que lirismo identificado com as fontes da vida! Aninha hoje não nos pertence. É patrimônio de nós todos, que nascemos no Brasil e amamos a poesia (...)."
(Fragmento de correspondência entre Carlos Drummond de Andrade e Cora Coralina)
Quando teve seu primeiro livro publicado pela respeitada Editora José Olympio, Cora Coralina remeteu alguns exemplares para renomados escritores da literatura brasileira, entre eles, Carlos Drummond de Andrade. Foi então que Aninha, como ela carinhosamente se denominava em seus poemas, deixou de ser a doceira que escrevia poemas para ser considerada uma importante voz literária. Drummond foi fundamental para que a poesia de Cora Coralina fosse divulgada e assim alcançasse reconhecimento nacional.
Cora Coralina é, na verdade, pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas. Nascida na Cidade de Goiás em 20 de agosto de 1889, Cora só se tornou conhecida do grande público aos setenta anos de idade, embora escrevesse desde menina. Aos dezesseis anos uma crônica de sua autoria foi publicada pelo jornal Tribuna Espírita, do Rio de Janeiro, e desde então a escritora cultivou, ao longo da vida, o vínculo com a literatura, embora esta não fosse sua prioridade. Casou-se e teve seis filhos, viveu em várias cidades do interior de São Paulo e, já viúva, regressou para a sua cidade natal.
Na casa sobre a ponte do Rio Vermelho, Cora Coralina viveu os últimos anos de sua vida. Foi lá que pôde dedicar-se à literatura e tornar-se um dos maiores símbolos da cidade, que hoje é Patrimônio Histórico da Humanidade. Após sua morte em 1985, a casa, herança secular de família, tornou-se uma espécie de museu, que conta a história da escritora e guarda preciosos itens, como as correspondências trocadas com o amigo Carlos Drummond de Andrade. Para que você conheça um pouco mais da singeleza dos versos de Cora Coralina, o Brasil Escola escolheu cinco poemas que vão mostrar para você toda a grandiosidade das coisas simples que residem na poética de Cora. Boa leitura!
MULHER DA VIDA
Mulher da Vida,
Minha irmã.
De todos os tempos.
De todos os povos.
De todas as latitudes.
Ela vem do fundo imemorial das idades
e carrega a carga pesada
dos mais torpes sinônimos,
apelidos e ápodos:
Mulher da zona,
Mulher da rua,
Mulher perdida,
Mulher à toa.
Mulher da vida,
Minha irmã.
ANINHA E SUAS PEDRAS
Não te deixes destruir...
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.
Mascarados
Saiu o Semeador a semear
Semeou o dia todo
e a noite o apanhou ainda
com as mãos cheias de sementes.
Ele semeava tranquilo
sem pensar na colheita
porque muito tinha colhido
do que outros semearam.
Jovem, seja você esse semeador
Semeia com otimismo
Semeia com idealismo
as sementes vivas
da Paz e da Justiça.
Assim eu vejo a vida
A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.
Considerações de Aninha
Melhor do que a criatura,
fez o criador a criação.
A criatura é limitada.
O tempo, o espaço,
normas e costumes.
Erros e acertos.
A criação é ilimitada.
Excede o tempo e o meio.
Projeta-se no Cosmos.
*A imagem que ilustra o artigo foi feita a partir de capas de livros da escritora publicados pela Global Editora.
Por Luana Castro
Graduada em Letras