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Sabemos que a história da civilização islâmica é permeada por guerras. Seu desenvolvimento histórico esteve fundamentado na expansão territorial por meio ou da força ou da submissão religiosa daqueles que se interpusessem em seu caminho. Entre as inúmeras batalhas em que os muçulmanos estiveram envolvidos, aquela considerada a mais importante é a batalha de Badr. Essa batalha ocorreu na cidade homônima, que ficava próxima a Meca, cidade natal do profeta Maomé e núcleo dos coraixitas, tribo a que pertencia o fundador do islã. Foi justamente contra os coraixitas que a batalha de Badr foi travada. Para compreendermos bem a importância desse acontecimento, é necessário contextualizá-lo.
A batalha de Badr ocorreu em 16 de março de 624 d.C., dois anos após a chamada Hégira, isto é, a fuga de Maomé e seus seguidores de Meca para Iatreb, que posteriormente passou a se chamar Medina (“a cidade do Profeta”). Maomé e os muçulmanos foram obrigados a emigrar de Meca em decorrência do embate com o politeísmo árabe vigente em Meca. Como Maomé apresentava-se como Profeta de Alá e conseguia arrebanhar um número crescente de conversos, logo ele passou a sofrer hostilidades das tribos árabes que habitam Meca, em especial daquela à qual pertencia, os coraixitas.
Ao instalar-se em Medina, Maomé estabeleceu relações comerciais com as tribos de judeus dessa cidade e também passou a traçar as primeiras formas de organização política e militar dos muçulmanos. A unificação das tribos árabes que o seguiam era um dos principais exemplos da habilidade política de Maomé. Entre os seus objetivos principais, estava a conquista de Meca, cidade sagrada, lugar da pedra Caaba, venerada pelos pagãos (caídos na “ignorância”, segundo o Corão), mas que, segundo o profeta, teria sido trazida do Céu pelo Anjo Gabriel. Para que o islã se estabelecesse em Meca e a tornasse o centro da fé dos muçulmanos, era necessário que as tribos pagãs fossem subjugadas.
Maomé passou a organizar, desde Medina, exércitos de muçulmanos para assaltar as caravanas de camelos que saíam de Meca a fim de comerciar em outras regiões. Essas caravanas transportavam de tudo, desde alimento e especiaria até tecidos e objetos de valor. Centenas de camelos eram utilizados em uma única caravana. Assaltar e apossar-se dos bens das caravanas era uma forma de mostrar às tribos de Meca e ao restante da Arábia que os muçulmanos estavam dispostos a conquistar a Península, não apenas por meio da religião, mas também pela guerra. Um dos motivos dos assaltos também era a vendeta, a vingança, de Maomé contra os coraixitas de Meca. É sabido que depois da Hégira, de 622 d.C., Maomé tornou-se motivo de zombaria entre os coraixitas. Conquistar Meca seria uma resposta a isso.
A batalha de Badr foi um desdobramento de um ataque a essas caravanas que foi comandado por Abu Sufyan, um notório inimigo dos muçulmanos. A guerra começou ao nível da informação. Tanto observadores da caravana quanto observadores muçulmanos alertavam seus líderes sobre os passos que dava o inimigo. Sufyan pediu reforços a Meca para enfrentar o exército de saqueadores e proteger a caravana; Maomé planejou atacar os homens e camelos de Sufyan nos poços de Badr, na rota de caravanas da Síria. O embate fatal ocorreu nessa região.
Apesar de superiores em número, os mequenses perderam a batalha para os muçulmanos. O próprio Maomé não via possibilidade de vitória avassaladora sobre os mequenses e atribuiu o sucesso da campanha em Badr a um milagre de Alá, como explica o orientalista David Samuel Margoliouth:
Nenhum acontecimento na história do Islã foi mais importante do que a batalha de Badr. O Alcorão a chama, acertadamente, de Dia da Libertação, o dia em cuja véspera os muçulmanos eram fracos, o dia depois do qual ficaram fortes. É difícil superestimar seu valor para o próprio Maomé. Ele possivelmente o considerava um milagre, e quando o declarou como tal muitos de seus vizinhos aceitaram a afirmação sem hesitar. Sua participação na luta parece ter sido pequena – ele se limitou, na realidade, a atirar um punhado de pequenas pedras no rosto dos inimigos. Sabiamente, porém, reivindicou o conjunto da obra, não como trabalho seu, mas de Deus. O destino que tinha recaído sobre o inimigo foi uma justa retribuição àqueles que ousaram resistir a Deus e a seu Profeta. Como vimos, a necessidade de possuir o poder de realizar um milagre era algo que amargurava a vida de Maomé. Agora, finalmente, a provação acabara. [1].
Seis anos depois, em 630 d.C., a cidade de Meca já estaria completamente sob o domínio muçulmano. Após a morte do profeta em 632 d.C., a Península Arábica, a Ásia Menor, parte do Sul da Europa e o Norte da África foram rapidamente submetidos à fé e à espada do Islã.
NOTAS
[1] MARGOLIOTH, D.S. Maomé e a ascensão do Islã. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012. p. 238.
Por Me. Cláudio Fernandes